«Deixa-me triste ver o Benfica a passar por esta situação, em que não se vê a liderança» – Entrevista BnR com Idalécio

    – O RP do Minho –

    «Sei que não são a Santa Casa da Misericórdia, mas não esperava mais sair do SC Braga pelo percurso que tinha feito lá»

    BnR: Voltando à tua carreira, sais do Farense e vais para SC Braga, e temos aqui dois fatores nesta transferência: a mudança para o Norte do país, que antigamente era mais difícil, também a pressão dos primeiros lugares, de um SC Braga que era quarto classificado. Como se deu essa chegada?

    IR: Deixa-me dizer-te que o SC Braga não era aquilo que é hoje. Era um clube que vinha com alguns problemas, o mister Cajuda já lá estava, tinha feito uma boa época, com jogadores desconhecidos. Eu tinha alguns problemas de salários no Farense e pedi ajuda ao Sr Manuel Barbosa para encontrar um clube melhor, e o SC Braga organizou-se para fazer um trabalho sério, não prometia muito, mas prometia pagar a tempo e horas. Fui ao escritório, a Lisboa, e assinei contrato, foi quando conheci o presidente, estava eu e Leonel, defesa esquerdo. Eu sempre fui considerado algarvio, chamavam-me torre do Algarve, porque fui para lá muito novo, mas muitos jogadores não tinham conseguido essa transição do Algarve, do sol, do futebol com mais espaços, com menos pressão, mais lento e menos agressivo, para o norte, que é exatamente o contrário: frio, chuva, mais agressividade, as equipas são mais combativas, se calhar devido ao clima também, tinham uma preparação mais forte.

    BnR: Adaptaste-te bem?

    IR: Felizmente, tive um grupo de trabalho e equipa técnica que me souberam receber e preparar para todos esses obstáculos, ainda era novo, tinha 22 anos, não era o clube que é hoje, mas foi um bom percurso. Nesse ano ficamos em quarto lugar, com um plantel competitivo, mas o importante foi ter cumprido sempre que tive oportunidade de jogar, dei o meu melhor. Só assinei por um ano, depois por dois anos e depois por três anos, foi um percurso de confiança e gratidão da minha parte, sempre suei a camisola, fui profissional e humilde para respeitar as decisões e acontecimentos do que é a nossa profissão enquanto jogador de futebol.

    Idalécio estreia-se a marcar pelo Braga frente ao Benfica

    BnR: Disseste que na tua primeira época no SC Braga atingiram o quarto lugar, depois ficaram em nono e décimo nas seguintes. O que foi fora do normal? O quarto lugar ou o nono/décimo?

    IR: Definitivamente foi o quarto lugar. Não sei se te lembras, mas entre os três grandes havia sempre Boavista e Vitória de Guimarães, que eram fortíssimos nessa altura, acho que o que foi extraordinário foi o quarto lugar, não o resto. Depois, com a exigência dos adeptos e da direção, a partir do momento em que ganhas alguma visibilidade, tens de te reforçar mais. Tens mais custos, depois tudo isto traz-te mais competitividade, acaba por existir o “este ganha mais que eu”, é uma guerra de conflitos que acaba por acontecer, muitas vezes os jogadores que já lá estavam viam os que vinham de fora, sendo que os estrangeiros eram vistos com bons olhos, e isso gerava conflitos na cabeça de muitos. Eu preocupei-me só comigo, devemos preocupar-nos connosco e deixar essas decisões para quem as toma. Mas equipas começaram a conhecer-nos melhor e a criar mais dificuldades também.

    BnR: Tu eras um jogador com um ego alto ou um apaziguador do balneário?

    IR: Tentei sempre ser um elemento de boa disposição no balneário, apaziguador, se tivesse de dar uma palavra de incentivo, numa situação menos agradável para algum colega, dava. Sempre tive conforto e procurei sempre ser um elemento saudável no ambiente de trabalho. Para brincadeira, vinham desafiar o Idalécio. Procurei sempre ajudar quem chegava, punha-me sempre no lugar desses jogadores que chegavam a um país diferente, e muitas vezes os diretores diziam-me: “Idalécio, eu não posso ir, vê se podes ir com o teu colega às finanças ou ao supermercado”, e muitos colegas brincavam comigo e diziam que eu era o Relações Públicas (RP) do clube.

    BnR: Fizeste 12 jogos na primeira época, três épocas com 26 jogos e depois, em 2000/2001, fazes sete jogos pela equipa B. Que aconteceu?

    IR: O clube começou a ter expectativas muito grandes, a haver uma competitividade muito grande, jogadores de muita qualidade. Salvo erro, o Odair faz 11 golos nessa época, era Odair e Artur Jorge a dupla de centrais, e a equipa B surge num período em que era difícil sermos convocados, em entrar nos 18. Era preferível ir para a B do que ficar sem jogar. A equipa B estava com algumas dificuldades também, era bom para todos, só não o era para os jovens da equipa B, que não iam jogar porque íamos nós lá jogar, era uma oportunidade para nós, que não éramos convocados. Foi uma boa gestão do clube, também levamos experiência para a equipa B, que precisava de resultados. Se calhar, nem todos aceitariam bem a decisão, mas para mim foi gratificante, tinha contrato com o clube, tive de aceitar.

    BnR: Depois sais para o Nacional, para a Madeira. Foi uma mudança amigável?

    IR: Foi uma mudança inesperada. Não esperava mais sair do Braga pelo percurso que tinha feito lá. Sei que não são a Santa Casa da Misericórdia, mas o problema foi que o presidente João Gomes Oliveira sai, e o clube fica um bocado perdido, com elementos sem capacidade para gerir, antes da chegada do presidente Salvador. Não foi só comigo, aconteceu com muitos outros colegas essa situação, acabámos por sair. O senhor que ficou a presidente era um elemento que me elogiava, estava sempre à conversa comigo, isto enquanto era elemento de direção, mas depois, quando foi para renovar contrato, pôs-me à conversa com a pessoa que era contabilista. Queriam oferecer-me três anos pela mesma quantia que já vinha a ganhar há Três anos, e eu queria melhorar as minhas condições. Não pedi uma fortuna, sei que andaram a dizer que fui ganhar uma fortuna para o Nacional mas isso é mentira. Foi uma má gestão, foi inesperado, mas tive de dar continuidade ao meu percurso. Queria vingar e tive a oportunidade, a partir do Óscar Dias, o empresário, de resolver a situação com o SC Braga. Antes de sair, ainda se ouviu falar da hipótese de ir para o estrangeiro, para o Bolton, Coventry ou Celtic, mas nunca se concretizou, não sei se era apenas especulação para promoção dos empresários, não sei se chegou uma proposta ao clube. Se calhar, eles pensaram que os agentes estavam a jogar com a direção e deu-se então a oportunidade de ir para o Nacional da Madeira, com o mister José Peseiro.

    BnR: Como foi a experiência na Madeira?

    IR: O Nacional tinha acabado de subir, o José Peseiro vinha de um excelente trabalho à frente do Nacional, com várias subidas de divisão. Foi um orgulho ter representado o Nacional e ter sido treinado pelo mister Peseiro, na altura um treinador jovem muito admirado por todos, onde aprendi também muito. Assino por três anos, formou-se uma grande equipa, entre eles o Adriano, o avançado, que esse destacou, o Rossato, defesa esquerdo, integramos uma equipa onde havia Jokanovic, Hugo Carreira, Hugo Freire. Integramos essa estrutura, uma equipa jovem considerada uma das melhores a jogar bom futebol, mas a precisar de algo mais. Esse algo mais chegou em dezembro, Paulo Assunção, que depois faz um percurso tremendo. Chega, nessa época, mal fisicamente, irreconhecível para o que foi depois o seu percurso. Depois, mais no final, atingiu a forma e foi um sucesso, um jogador de uma humildade e de uma capacidade tremendas. Eu depois acabo por sair, só fiz uma época, por causa de uma situação de saúde do meu pai.

    BnR: Não ficou nenhum ressentimento com o SC Braga?

    IR: Eu estou de consciência tranquila completamente, por aquilo que fiz, pelas amizades, pelo profissionalismo, nunca ficou nenhuma situação de mágoa. Se eles a têm para comigo, acho que não, porque fui convidado a participar num programa do clube e conversar com uns colegas a recordar o 1º de Maio. Tive pena de não apanhar o presidente Salvador, ou até não, até podia ter sido pior, mas em função do crescimento que o presidente trouxe ao clube, gostava de ter podido fazer parte desse crescimento. Foi um choque sair de Braga e passar a viver numa ilha, mas tinha a família por perto, nunca foi um problema. Não podíamos ir de carro, mas podíamos ir de avião, saí apenas pelo estado de saúde do meu pai.

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    Pedro Pinto Diniz
    Pedro Pinto Dinizhttp://www.bolanarede.pt
    O Pedro é um apaixonado por desporto. Em cada linha, procura transmitir toda a sua paixão pelo desporto-rei, o futebol, e por todos os aspetos que o envolvem. O Pedro tem o objetivo de se tornar jornalista desportivo e tem no Bola na Rede o seu primeiro passo para o sucesso.                                                                                                                                                 O Pedro escreve ao abrigo do novo Acordo Ortográfico.