– Eixo Norte-Sul –
“O Presidente do Gil Vicente queria que eu fosse para o Benfica, mas o FC Porto foi mais rápido”
BnR: Em que é que o futebol português era diferente do jugoslavo?
D: Na maneira de trabalhar. Quando cheguei ao Gil Vicente, toda a gente treinava com caneleiras, enquanto na Sérvia isso não acontecia. Levava-se muito a sério todos os treinos e os estrangeiros que chegavam tinham de se adaptar. Hoje em dia, considero-me mais treinador português do que sérvio, porque aceitei essa mentalidade de trabalho. Só assim é possível chegar a um patamar elevado. Não é por acaso que Portugal tem os resultados que sabemos; muitas vezes digo isto aos meus jogadores. Foi esta a principal diferença, porque os jogadores da antiga Jugoslávia também eram muito talentosos, com muita qualidade técnica como os portugueses, e neste aspeto não foi difícil.
BnR: Nos Galos, foste orientado por Vítor Oliveira. Com base na vossa vivência, como explicas o sucesso do treinador que ganhou o epíteto de “rei das subidas”?
D: O Vítor já subiu dez ou onze vezes de divisão, penso que até entrou nos recordes do Guiness. De certeza que vai ficar na história do futebol português. O que ele fez é algo inédito e fantástico. É um grande homem e foi um dos treinadores mais importantes na minha carreira. Recordo-me de uma conversa que tivemos, pouco tempo depois de ter chegado ao Gil, numa fase menos boa para mim; ele chamou-me ao balneário e disse-me que podia jogar na posição que quisesse. Deu-me liberdade, mas nunca abusei e sempre dei o máximo pela equipa. Felizmente consegui contribuir para os bons resultados da equipa e marquei muitos golos, mesmo não batendo as grandes penalidades.
BnR: Foi amor à primeira vista.
D: Sim, porque vim treinar à experiência com mais dois colegas e ao fim de quinze minutos de me ver jogar foi falar com o Presidente e disse-lhe que tinha de me contratar.
BnR: Os dois compatriotas com quem treinaste à experiência também ficaram?
D: Não. Um deles tinha possibilidades, mas as partes não chegaram a acordo e foi-se embora.
BnR: A posição de avançado móvel, na qual jogaste quase sempre durante ano e meio, era-te fácil desempenhar?
D: Eu tinha características que me permitiam jogar atrás do ponta-de-lança, do lado direito, do lado esquerdo… o Vítor percebeu que, pela maneira como o Gil Vicente jogava, eu tinha qualidade para render nessa posição. Atrás de mim tinha o Cacioli e o Tuck, jogadores que tinham um excelente passe para me colocar a bola, e como jogávamos em contra-ataque essa posição favorecia o nosso jogo. Mesmo quando cheguei ao FC Porto joguei como avançado e fui o segundo melhor marcador do campeonato, acumulando os golos da primeira metade da época no Gil com os que marquei pelo FC Porto.
BnR: Mudas-te para o FC Porto a meio da segunda época ao serviço dos Gilistas, apesar de também teres sobre a mesa propostas dos grandes de Lisboa.
D: Em setembro, a primeira proposta que me apresentaram foi do Sporting CP. Quando saí para o FC Porto, o Presidente do Gil Vicente queria que eu fosse para o SL Benfica, só que as pessoas que detinham o meu passe optaram pelo FC Porto, que foi muito mais rápido.
BnR: Pinto da Costa era implacável?
D: Sim, porque apesar do FC Porto ser um grande clube e jogar na Liga dos Campeões, foram muito concretos na abordagem e a melhor parte da minha carreira passei-a lá, apesar de também ter passado por outros grandes clubes, como o Benfica e o Partizan. Faltou-me um troféu europeu, embora tivéssemos estado muitas vezes perto de conquistá-lo.
BnR: Quando assinaste, sabias que Ivic não contava contigo?
D: O Ivic queria contratar outro jogador, que era croata: Goran Vucevic, que estava no Barcelona. Só que o Presidente Pinto da Costa e o Sr. Reinaldo Teles queriam-me a mim e foram praticamente eles que me contrataram, o que não deixou Ivic nada satisfeito. Na altura existia aquele problema entre Croácia e Sérvia e julgo que ele tinha problemas comigo por causa disso. Por exemplo, dez ou quinze dias após ter chegado ao Porto, demos uma entrevista ao jornal A Bola e um jornalista meu amigo contactou-me depois disso a dizer que afinal a entrevista já não ia sair porque o Ivic tinha ligado para lá a pedir para não a publicarem; sentiu que podia ter problemas na Croácia por ter dado uma entrevista comigo, numa altura em que os países estavam em “guerra aberta”.
BnR: Zahovic, Pavlin, Sokota… Como era a convivência entre colegas oriundos das repúblicas socialistas da Jugoslávia?
D: Era ótima! Nunca tive problemas com algum companheiro durante a minha carreira, fosse português, brasileiro ou da antiga Jugoslávia. Tudo o que vivemos dentro e fora de campo foi sempre com uma grande amizade.