«Não adiantou o Platini pedir desculpa ao Vitória SC» – Entrevista BnR com Manuel Cajuda

    – Herói incontestável no Minho –

    BnR: É conhecido em Braga como o “Pai do Braga”. Qual a explicação?

    MC: Não, não, de longe (risos). Pai do Braga são os milhares de adeptos, dirigentes, jogadores que passaram antes de mim. Muita gente me fala nisso, eu digo sempre que Pai não, um Tio afastado.

    BnR: Mas um Tio muito importante…

    MC: O Tio também acaba por ser importante. Eu quando fui para Braga, o clube tinha ficado em 15º ou 16º, ficou na linha de água, não desceu por um golo. Entrei quando acabou o campeonato, por isso fui buscar o SC Braga ao 15º lugar e deixei-o na Taça UEFA. Em 2001, o Braga ficou no 4º lugar e apurou-se para a Taça UEFA. Há uma evolução fantástica porque os processos foram todos renovados.

    BnR: Como foi essa renovação?

    MC: Na altura a equipa chamava-se a lojinha dos 300. Houve a necessidade de fazer alguma renovação e alguns sacrifícios. Um ano, os jogadores tinham que levar os equipamentos para casa e lavá-los. Isso foi aceite pelo grupo porque havia essa necessidade, era preciso alguém sacrificar-se pelo clube. Houve necessidade de construir um plantel com base nos escalões de formação, cheguei a ter 14 jogadores oriundos dos escalões de formação na equipa principal. Tive que lançar jogadores, tive que fazer um Braga diferente. Por isso, os 4ºs lugares que o Braga faz agora, para ser simpático, não me dizem nada. Isto não é depreciativo porque eu quando deixei o Braga deixei-o no 4º lugar.

    BnR: Diz isso porque o Braga tem hoje em dia melhores condições?

    MC: Sim, penso que hoje tem muito melhores condições. Tem pelo menos a obrigatoriedade de se assumir como um dos candidatos aos três primeiros lugares da classificação, um 4º lugar já é uma coisa perfeitamente natural para o Braga. Perante aquilo que o Braga cresceu, e cresceu muito depois, devo saudar a direção do Braga, Presidente Salvador e todos os treinadores e jogadores que vieram a seguir e a massa associativa. Mas a evolução em termos classificativos não foi para além daquilo que eu deixei.

    BnR: Conseguiu a subida de divisão pelo Vitória SC em 2006/07. O que esteve na base do sucesso dessa época?

    MC: O mesmo que esteve na base do sucesso das outras equipas. Houve um conjunto de pessoas que me ajudaram, roupeiros, jogadores, administração, e que compreenderam o meu projeto. Nesse aspeto, vou confessar uma coisa. Quando fui para o Braga disse que a primeira coisa que era importante para mim era tornar o Braga o clube mais importante do Minho. Com as classificações que consegui, o clube ficou à frente do Vitória de Guimarães. Quando fui para o Vitória, voltei a dizer o mesmo, para mim o que é importante é tornar o Vitória de Guimarães o clube mais importante do Minho. No ano em que lá estive, terminámos em 3º lugar e o Braga ficou mais atrás de nós. Portanto, aquilo que é uma satisfação pessoal não contra um clube nem contra o outro, é conseguir nos anos em que lá estive fazer daquelas equipas as mais fortes do Minho.

    Manuel Cajuda conseguiu a melhor classificação da história do Vitória SC
    Fonte: Facebook Manuel Cajuda

    BnR: Tendo em conta a rivalidade entre os dois clubes, os adeptos do Braga levaram a mal a sua ida para o Vitória SC?

    MC: Todos não, alguns sim. Falaram-me nisso mas compreenderam depois. Passei momentos fascinantes com a “guerra” entre eles. Recordo-me de uma vez no meu prédio, eu era treinador do Vitória e vivia em Braga, e um vizinho disse-me “Mister, se não fosse por si, eu queria que o Vitória se afundasse”. E eu ria e dizia “Epa, você está-me a querer mal”. Já me pediram imensas vezes para fazer comentários em jogos entre o Vitória e o Braga e eu nunca fiz nem irei fazer. Porque basta eu ter uma palavra que pode ser verdadeira e sincera, imaginemos num derby do Minho e eu digo que o favorito é uma equipa, para que isso do outro lado seja mal recebido. Farei sempre silêncio absoluto em relação a estas equipas porque eu não quero perder um amigo de Guimarães nem um amigo de Braga.

    BnR: Conseguiu a melhor classificação de sempre do clube na Primeira Divisão e o apuramento para a pré-eliminatória da Liga dos Campeões. Que recordações tem dessa época e do dia em que garantiram o 3º lugar?

    MC: Esse dia foi só a confirmação, tivemos a felicidade de fazer um campeonato extremamente regular, oscilámos quase sempre entre o 2º e o 3º lugar. Lembro-me muitas vezes de ir à flash interview no sábado, os outros só jogavam no domingo, e dizia “Hoje vou dormir no 2º lugar, amanhã não sei”. Andámos sempre naquela luta.

    BnR: Ficaram muito perto do Sporting não foi?

    MC: Foi. Penso que é na última ou penúltima jornada que perdemos a luta direta com o Sporting mas foi sempre até ao fim a luta pelo 2º lugar. Depois de alcançar isso tudo, só me deixou um travo amargo na carreira ter saído de lá. Eu não queria sair do Vitória de Guimarães, é uma história que nem vale a pena falar sobre isso, acabei por ser afastado. Na altura, entendia que o Vitória tinha todas as condições para fazer aquilo que eu disse em relação ao Braga que é meter-se na luta pelos três primeiros do campeonato. Tem uma massa associativa fantástica, um estádio fabuloso, tem condições e tem uma doutrina própria do futebol em Guimarães.

    BnR: Na pré-eliminatória da Liga dos Campeões contra o Basileia, sente que o Vitória foi “empurrado” para fora da competição?

    MC: Não foi empurrado, levou um pontapé enorme. É uma eliminatória que é clara, a dois minutos do fim fazemos um golo que nos dá a passagem, um golo perfeitamente legal que ainda hoje ninguém percebe, mesmo com VAR ou sem VAR, não havia na altura mas nem era preciso para ver que era um golo legal. Só que aquele árbitro auxiliar holandês marcou o fora-de-jogo e assim que o jogo acabou fugiu para o balneário. Foi uma vergonha. Não adiantou o Platini pedir desculpa ao Vitória SC, porque o erro estava feito. Isso prejudicou muito o processo que eu queria implementar no Vitória porque eram uns milhões que ia receber na altura e levou depois o clube a atravessar um deserto enorme.

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