«Não adiantou o Platini pedir desculpa ao Vitória SC» – Entrevista BnR com Manuel Cajuda

    – Ambição no Leixões e o futuro incerto –

    BnR: Foi contratado pelo Leixões em janeiro deste ano. O que é que a direção lhe pediu?

    MC: Fui contratado pelo Leixões numa tentativa de recuperar o atraso provocado por 10 jogos consecutivos sem ganhar. Não me exigiram que eu subisse de divisão, na altura não era impossível subir, mas pediram-me para fazer uma tentativa para recuperar disto. Confesso que a equipa estava, sob o aspeto psicológico, mental, não diria totalmente derrotada mas estava com grandes danos por 10 jogos sem conseguir ganhar. Nos últimos seis jogos em casa não tinha ganho nenhum, era preciso acima de tudo recuperar os jogadores e perdemos 2/3 semanas. Ainda por cima, tivemos logo a sorte menos feliz de, nos seis jogos que fizemos, jogámos com o primeiro, o segundo e o terceiro, não foi com os últimos.

    BnR: Qual o balanço que faz até ao momento?

    MC: Recuperámos a mística e quando o campeonato foi interrompido o Leixões já estava numa situação muito agradável em termos de comportamento no campo, já fazia vibrar os adeptos, já tinha um futebol muito mais interessante. Foi uma pena termos que interromper, estava extremamente satisfeito, já íamos no terceiro jogo consecutivo sem perder. Defrontámos o Farense, que na altura estava na liderança com o Nacional, e colocámos o Farense no 2º lugar. Defrontámos de uma forma muito clara, muito positiva, sendo superior em quase todos os parâmetros do jogo e foi uma pena esse processo evolutivo do Leixões ter sido interrompido, como foi tudo. Aquilo que depois na altura eu falei, quer com o diretor do futebol, quer com o presidente, foi que perante a situação do afastamento de 12 ou 13 pontos era muito difícil o Leixões subir de divisão.

    BnR: Qual é então o objetivo atual?

    MC: Antes do campeonato ser interrompido eu já mantinha a mesma ideia de que iria ficar no 3º ou 4º lugar, esse é um objetivo de que eu não abdico e tenho a certeza que o iria conseguir. Agora já não posso, perante todas estas coisas que aconteceram, ter noção do estado em que vamos recomeçar e oxalá recomecemos o mais depressa possível. Aqui enalteço todos os que estão a fazer para que o futebol volte depressa, os dirigentes, a Liga, a Federação Portuguesa de Futebol, o Governo, seguramente estão a fazer para voltarmos o mais depressa possível. Mas o processo do Leixões acabou por ser reconvertido aquilo que era o meu objetivo quando o campeonato foi interrompido era jogar para ficar no 3º ou 4º lugar e não abdicava disso. Agora vamos ver em que condições vamos voltar.

    BnR: Que desafios traz esta paragem?

    MC: Eu penso que veio trazer uma coisa muito aliciante para todos os treinadores, todos deviam pensar nisto. Esta situação anormal desafia-nos a ver quem arranja agora os melhores argumentos, os melhores métodos de preparação, os melhores métodos de recuperar as equipas. Penso é um desafio fascinante que se põe hoje aos treinadores. Pelo menos para mim está a ser, todos os dias aponto e noto sobre aquilo que poderá vir a acontecer. Não tomo ideias antecipadas, a ideia vai ser no dia em que eu tomar conta da minha realidade. Quando a administração do clube disser que volto ao trabalho, a ideia será em função de como é que os jogadores vão voltar e a partir daí eu escolho de todas aquelas ideias as que eu posso utilizar consoante aquilo que for a minha realidade na altura.

    BnR: Que medidas tomou para o plantel durante este período?

    MC: Percebi que muita gente fez muita coisa, eu fiz o mínimo possível. Continuo a dizer que há uma lei que a inteligência permite fazer, é a lei do menor esforço. Se eu conseguir fazer tudo com menor esforço só posso ser inteligente. Muita gente esteve nas redes sociais a mostrar treinos, sabendo acima de tudo que a realidade de cada um é a realidade de cada um. 80% dos jogadores moram em casas que não são grandes, são casas alugadas pelo clube. Não moram todos nas casa deles porque a maior parte está fora das suas cidades, não têm grandes espaços para treinar. Aquilo que sempre foi importante para mim foi ajudar os jogadores a perceber o que é estar confinado a um determinado espaço, estar em recolhimento, que é completamente diferente daquilo que é a nossa vivência normal.

    BnR: Como prevê que seja o regresso à “normalidade”?

    MC: A primeira análise que vamos fazer é os malefícios e os fatores stressantes que este período de confinamento veio trazer. Aquilo que a Direção-geral da Saúde disse é que provavelmente o pico da pandemia seria entre o final de abril e o princípio de maio. Logo a priori, quer dizer que isto vai ser um sacrifício para estar a fazer planos organizados. Não acredito muito num treino online, acredito que os jogadores têm de fazer aquilo que qualquer cidadão tem de fazer para minimizar as perdas em relação àquilo que tinha. Agora, nem todos têm um quintal grande, nem todos têm um jardim, alguns têm uma casa pequena e só podem correr 10 metros em casa. Há muito trabalho que se pode fazer, por exemplo, de flexibilidade, abdominais, agora a especificidade do futebol, sem querer ofender ninguém, é preciso ser artista para estar a controlar num GPS quanto é que uma pessoa corre. Aquilo que era perfeitamente identificável era no aspeto psicológico ajudar ao confinamento das pessoas.

    Manuel Cajuda assinou pelo Leixões em janeiro deste ano
    Fonte: Facebook Manuel Cajuda

    BnR: Como planeia fazer a recuperação da equipa?

    MC: Para recuperar a minha equipa o mais depressa possível dos danos que isto causou, que não sabemos ainda quais foram, tenho de analisar todos os argumentos, fazer uma análise à minha realidade no dia em que voltarmos e a partir daí escolher o melhor processo. Vou alterar o meu método de trabalho, não em função de uma metodologia qualquer mas do conjunto de metodologias que aprendi com o tempo. Muitas coisas vão ter que ser reconvertidas e não me venham arranjar desculpas, na minha opinião como técnico não são precisas seis semanas de preparação para acabar o campeonato. Há muitas formas de pôr as equipas a trabalhar desde que haja condições de saúde para isso.

    BnR: Falou há dias nos “adiantados mentais” que previam retomar a competição já em maio. Sente que os interesses financeiros estão a toldar o discernimento e que se está a menosprezar os perigos desta pandemia? Ou seja, sente que se está a ter pouca consideração pela saúde dos profissionais de futebol ao querer acelerar este regresso da competição sem haver noção do perigo que ainda corremos?

    MC: Não, não sinto que as pessoas estão a fazer isso. Compreendo e aceito mas, como lhe disse há pouco, acredito que as pessoas que gerem o futebol, o negócio, o estejam a fazer com todos os cuidados e todas as competências para voltarmos depressa e para que os danos sejam os menores possíveis. Acredito nos dirigentes, acho que essa afirmação dos “adiantados mentais” é um erro, eu podia ter dito de outra forma. Aliás, vi um presidente há dias num jornal que, em vez de dizer “adiantados mentais”, disse “discurso exagerado”. Eu podia ter escrito exagerado, o que eu entendi foi que o post que fiz em relação aos adiantados mentais não tem nada de ofensivo para quem quer que seja.

    BnR: Eu não achei que fosse ofensivo, sinceramente.

    MC: O que me questiono é como é que alguém pode determinar o fim de uma coisa que ainda não começou ou recomeçou? O adiantado mental para mim são as pessoas que conseguem antever com facilidade aquilo que vai acontecer. Umas vezes acertam, outras vezes não e claramente eles não acertaram, daí que já tenham feito três alterações e já digam que provavelmente os campeonatos vão acabar em agosto ou setembro, portanto não há uma data previsível.

    BnR: Tem havido muita gente a dar opinião…

    MC: Houve muitas opiniões, eu também dei opiniões e cheguei à conclusão que o melhor era não ser mais um a dar opiniões e esperar que as pessoas que têm essa competência resolvam depressa o problema para voltarmos o mais depressa possível. Seguramente que ninguém mais do que os representantes da Liga, a Liga de Futebol Profissional, a FPF e o Governo estão interessados em que o poder económico do futebol tenha o menor desgaste possível. O futebol a nível mundial pode ser considerado uma das maiores, senão mesmo a maior multinacional que existe, prevê-se que nos próximos 10 anos tenha um crescimento económico na ordem dos 10% de rentabilidade. O Campeonato do Mundo teve um lucro de 9,9 mil milhões de euros. Os dirigentes, que são gente empenhada, são quem pode decidir e eu estou convencido que eles vão decidir o que é o melhor para o futebol. Vai ter que recuperar economicamente como qualquer empresa, vai recuperar, mas não vai deixar de haver futebol e acredito que as pessoas estão a fazer o melhor possível e não estejam a ser egoístas. Se estiverem a ser egoístas, seguramente estão a defender os interesses que eles acham serem os melhores para o futebol.

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