«Tinha tudo acertado com o Sporting CP, mas o Costinha foi despedido e o negócio caiu» – Entrevista BnR com Matheus

    – Da transferência falhada para o Sporting CP à depressão na Ucrânia –

    «Sporting CP ofereceu-me 600 mil euros de prémio e 60 mil euros de salário, mas o Costinha saiu e não deu certo»

     BnR: Porque escolheste a Ucrânia? Não ficaste reticente?

    M: Não apareceram [propostas] só para a Ucrânia. Também apareceu para Inglaterra, só que eu não podia ir porque não tinha passaporte comunitário. Também apareceu o Sevilha, só que era propostas iguais às do SC Braga e eu disse que não. Nós, jogadores, queremos mudar de vida, fala-se que os jogadores ganham bem, mas jogamos até aos 30 anos e depois? E se não souber fazer mais nada? Aí lembro-me, na altura era casado, e recebi uma chamada de um empresário que tinha um clube da Itália que me queria e disse que ia mostrar-me o contrato. Disse que sim, mas para não ser só conversa: queria tudo preto no branco. Depois era uma da manhã e recebi uma chamada de um empresário chamado Cabral, de Guimarães. «Podemos falar?», eu disse que não, achei que fosse mais conversa de empresário, ele insistiu, insistiu, até que a minha filha acordou, fui dar leite para ela e ele continuava a insistir. Atendi e ele perguntou se podíamos tomar um café de manhã com o Marcelo Cipriano – o meu atual empresário, que jogou no Benfica e na Académica – e eu disse que sim. Eles chegaram com um contrato do Dnipro, mas eu disse que tinha outras propostas, já tinha dado a palavra ao SC Braga, mas eles disseram para falar com o treinador, que era o Juande Ramos. Nisto, liga-me o Salvador a dizer para ir ao clube porque havia uma proposta para eu ver. Cheguei, vi as propostas e a que mais me agradou foi a do Sporting CP. Acho que ninguém sabe essa história, é a primeira vez que vou contar para a imprensa. Fui para o Porto às sete horas da noite para o apartamento do Jorge Mendes e lá estava o Costinha, que era diretor do Sporting CP naquela época, só que quem tratava das finanças na altura era o…

    BnR: O José Couceiro?

    M: Couceiro, sim. Era ele que tratava do dinheiro, mas estava no Brasil. Fizeram-me a proposta, até posso falar em valores: foram 600 mil euros de prémio de assinatura e 60 mil euros de salário. Eu disse: «está fechado». No dia seguinte, acordo com a notícia: «Costinha sai do Sporting». Ligaram-me a dizer que não ia dar certo e não se falou mais nada… Mas já tinha tudo certo, era só o Couceiro regressar do Brasil, assinar um papel e pagar-me… Ainda havia as outras propostas, eu falei com a minha esposa na época e discutimos as propostas que havia. Só faltavam seis meses para acabar o contrato e parei de jogar, o meu último jogo foi com a União Leiria.

    BnR: Mas ainda jogaste com o Shakthar Donetsk na Ucrânia…

    M: Sim. Foi o último jogo nas competições internas, com o Leiria. Eu discuti as propostas com a minha ex-esposa e ela perguntou quem pagava mais: era o Dnipro. Fomos para a Ucrânia e já estava certo para depois do jogo eu assinar pelo Shakthar… Olha a resenha. Só que o diretor do Dnipro estava no estádio e alimentaram mais aquela proposta. Aí o Marcelo, o meu empresário, falou-me num salário absurdo, um prémio de assinatura absurdo, eu passava de um Mini Cooper para um Hummer. Só que liguei para o Dnipro e perguntei se podia ficar os últimos seis meses no SC Braga e ia depois livre para a Ucrânia, só que eles queriam-me logo e eu disse que, agora, o SC Braga não me ia libertar, tinham de pagar. Se não me engano, tirei do meu contrato – é a primeira vez que conto esta história – 1,3 milhões de euros para dar ao SC Braga.

    BnR: Então a tua venda para o Dnipro teve de ser paga por ti?

    M: Como se fosse por mim, uma parte saiu do meu contrato. Eu falei com o Salvador e disse que havia esta proposta e ele – que um cara com quem eu gostava de trabalhar um dia, porque é espetacular, fora de série – pegou no papel e disse: «Eh miúdo… Não tem como segurar-te… Boa sorte». Pegou na minha mão, ainda perguntou se eu aceitaria «isto» mais «isto» de bónus, só que era pago em quatro anos, mas eu disse que tinha de ser logo na hora. E ele disse «vai com Deus, boa sorte».

     BnR: E como foi a chegada à Ucrânia?

    M: Cheguei à Ucrânia, mas a mãe da minha filha acabou por não ir e separámo-nos… Foi aí que entrei em depressão. Nunca tinha estado longe da minha filha… Comecei a beber muito e eu não era de beber… Saía para a noite e não treinava… Nos primeiros meses do Dnipro, se não me engano, joguei três jogos e incompletos. Porque estava em depressão, não era o Matheus. Oito meses longe da minha filha que, em Portugal, às sete da manhã eu levava à escola, ia treinar e voltava a ir buscá-la, íamos para o parque à tarde… E foi um choque para mim. Pedi para me ir embora, já não queria jogar futebol, não aguentava mais. Aí o meu empresário, o Marcelo, mostrou-me uma proposta da Turquia, a pagar mais que o que tinham pago por mim, mas não aceitaram… O PAOK pagava duas vezes mais para me levar, não aceitaram… Até um clube da China, o Guangzhou R&F, pagava os meus salários atrasados, mas nem assim me libertaram. Aí o diretor-geral chamou-me e perguntou como estava a minha situação, eu disse que estava complicado, tinha vindo para ajudar, mas não estava a conseguir, às vezes escutava pelos cantos o Juande Ramos a dizer que eu não era profissional, não me devia ter contratado… E ele disse: «eu não te vou dispensar. Se quiseres um tempo para ir para o Brasil, para recuperar, você vai, mas não te vou dispensar». eu disse que não, mas ele respondeu: «Miúdo, de amigo para amigo: se a tua mulher não quer vir, a melhor opção é ires para o Brasil, separares-te e casares com uma ucraniana».

    BnR: E acabaste por ir para o Brasil?

    M: Não, fui para Portugal, fiz recuperação na clínica do [António] Gaspar, em Lisboa. Cheguei lá, fiquei num hotel perto do shopping Vasco da Gama e um dia disse ao Gaspar que precisava de ir ao Brasil resolver a minha situação, separar-me da mãe da minha filha. Só que, todos os dias, o clube pedia o recibo do tratamento. Pedi ajuda ao Gaspar e ele disse que eu podia ir tranquilo e ele assumia tudo. Eu até disse que pagava as consultas do meu bolso, mas ele disse para ir tranquilo. Fui, fiquei 10 dias no Brasil, resolvi a minha situação e quando voltei para a Ucrânia encontrei outra pessoa, a Julia, que ainda hoje é minha esposa e temos dois filhos. Eu sou feliz, a mãe da minha filha também é feliz com o atual marido dela… Somos todos felizes agora, mas aquele período foi muito doloroso, até que um dia estava no Brasil, sentei-me no sofá e pensei «hey, eu não preciso passar por isto». Claro que é preciso acompanhamento, mas só a pessoa sozinha é que consegue sair da depressão e foi aqui que ela desapareceu. Voltei para a Ucrânia e foi no ano seguinte que fui considerado o melhor jogador do campeonato…

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    João Reis Alves
    João Reis Alveshttp://www.bolanarede.pt
    Flaviense de gema e apaixonado pelo Desportivo de Chaves - porque tem de se apoiar o clube da terra - o João é licenciado em Comunicação e Jornalismo na Universidade Lusófona e procura entrar na imprensa desportiva nacional para fazer o que todos deviam fazer: jornalismo sério, sem rodeios nem complôs, para os adeptos do futebol desfrutarem do melhor do desporto-rei.                                                                                                                                                 O João escreve ao abrigo do novo Acordo Ortográfico.