Recordar é Viver: Agostinho decide o Tour mais importante da História

    O ATAQUE

    De Grenoble a Orcières-Merlette, os ciclistas percorreram 134 quilómetros, grande parte deles pela Route Napoléon, por onde Napoleão fez primeira parte da sua marcha até à derrota final em Waterloo. Espalhadas pela estrada, encontram-se estátuas da águia imperial francesa, mas para Ocaña bem poderiam ser lembretes da águia de Toledo – Federico Bahamontes, à data o único espanhol a ter ganho o Tour – a inspirá-lo para uma das mais épicas cavalgadas a duas rodas.

    Para Ocaña e o seu Diretor Desportivo, De Muer, havia um plano claro, mas era preciso ajuda e o homem certo para isso dava pelo nome de Joaquim Agostinho. A participar no Tour pela terceira vez, poucos dias após conquistar os campeonatos nacionais tanto no contrarrelógio como em fundo, Agostinho tivera uma primeira parte da Grande Boucle tranquila e ansiava pelas dificuldades montanhosas para escalar a tabela classificativa.

    Os homens da equipa Bic recrutaram-no, então, para ajudar a colocar a pressão desde o primeiro momento. Assim, na noite anterior à etapa, De Muer explicou o plano a Agostinho e este dispôs-se a ajudar. Numa das últimas entrevistas que concedeu antes de falecer, o técnico francês não poupou elogios ao torreense: «Agostinho era assim, uma estrela de ciclista, um dos melhores rapazes que havia, alguém que se tornou a grande figura esquecida do desporto».

    Assim, na primeira das três subidas do dia – o Côte de Laffrey, com 7,5 quilómetros a 18% de pendente média -, Joaquim Agostinho assumiu a dianteira, pôs prego a fundo e deixou toda a gente em dificuldades. No final da subida, com ele já só restavam Ocaña, Pettersson, Zoetemelk e Van Impe e foi este grupo que trabalhou afincadamente para colocar tempo entre si e Merckx.

    Na segunda escalada da jornada, Ocaña mostrou a sua superioridade e rapidamente se isolou na frente, e, daí em diante, o espanhol foi somando minuto após minuto e chegou à meta com quase seis minutos sobre Van Impe, e mais de oito sobre o grupo do Canibal. A grande escapada era recompensada, Ocaña era o novo herói da maillot jaune e, envergando pela primeira vez o símbolo de líder do Tour de France, fazia-o com a soberba de ter oito minutos e 43 segundos de vantagem sobre o segundo, Zoetemelk.

    O próprio Merckx, perseguindo praticamente sozinho durante toda a etapa, fez uma exibição soberba e ainda acabou em terceiro do dia. Contudo, nos seus Carnets de Route desse ano, chamou-lhe «a mais terrível derrota da minha carreira». A mais de nove minutos e meio do líder e declarando que «sou incapaz de atacar», parecia que a era do Canibal estava a chegar ao fim.

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