Universo Paralelo: A história de Portugal no Europeu 2020

    16 a 24 de junho 2020

    Em solo húngaro, por entre treinos e conferências, autógrafos e sorrisos, os nossos jogadores preparavam-se para encarar o primeiro desafio deste Europeu. Sabe-se desde o final de março que o oponente na estreia é precisamente a nação anfitriã e que, por isso, iríamos defrontar duas nações que jogariam perante os seus adeptos nas duas primeiras partidas, o que esfriava um pouco os ânimos lusitanos. Apesar de termos o exemplo do Europeu anterior, a desconfiança permanece como um suporte básico natural, bem ao estilo português. Talvez fossem precisas conquistas regulares para ultrapassar esse desígnio e ainda estamos numa fase embrionária deste processo.

    Segue-se o dia de estreia e o campeão europeu entra num Arena Puskas completamente lotado e pintado de vermelho e branco, notando-se uma mancha mais vermelha num dos cantos do estádio. Estima-se que estão cerca de 60 mil húngaros e apenas cinco mil portugueses no interior. Para amostra, este não era bem o cenário idealizado para quem inicia a defesa de um título. Na altura do hino, os 11 selecionados de Fernando Santos entoavam-no com uma firmeza tal que seria complicado para os húngaros pararem esta equipa se estes jogassem com o mesmo empenho com que, emocionados, cantavam “A Portuguesa”. Talvez fosse um importante antídoto em relação à ideia de jogar em terreno altamente hostil.

    E a primeira parte foi tudo menos tranquila, com a equipa da casa a mostrar-se bastante confiante e a jogar como se a vida dependesse daquilo. Ainda assim, o nulo ao intervalo era um resultado ajustado, face à escassez de oportunidades. Embora as dificuldades sentidas no primeiro tempo fossem evidentes, a verdade é que a Seleção entrou por cima na etapa complementar e chegou ao primeiro golo por volta dos 65’. Aos 85’ fez o segundo e descansou definitivamente os seus seguidores. Com um bloco forte desde trás e com boas saídas para o ataque, Portugal demonstrou ser superior à Hungria e teve a arte de silenciar um estádio que, no início, se assemelhava a um vulcão. “O primeiro já está” afirmava o capitão Cristiano aos microfones à saída para os balneários.

    Como sempre, quando se inicia um Europeu a vencer, a felicidade era notória no rosto dos jogadores e equipa técnica no dia seguinte. E Portugal só o conseguiu em duas ocasiões: 2000 e 2008. Através das equipas de reportagem que, exaustivamente, costumam cobrir o dia a dia da Seleção, era possível observar um ambiente descomprimido durante os dias seguintes que serviam de preparação para o embate frente à Alemanha. Seria o estigma frente aos alemães finalmente ultrapassado? Era sobre esta questão que os diários desportivos nacionais debatiam nos últimos dias. Agora que (ainda) somos detentores do título Europeu, devemos mostrar que temos capacidade para rivalizar com qualquer um.

    Cristiano Ronaldo capitaneou as quinas mais uma vez numa fase final de um Campeonato da Europa
    Fonte: Carlos Silva / Bola na Rede

    A verdade é que este era o jogo mais temido da fase de grupos, precisamente por ser contra a Alemanha. Lá estavam os portugueses, uma vez mais, apreensivos e desconfiados à partida. E mais ficaram quando, como em Budapeste, viram o primeiro plano da Arena de Munique repleto de apoiantes locais todos de branco, como manda a tradição.

    Se antes enfrentámos um vulcão, agora mais parecia uma montanha de neve daquelas difíceis de escalar. Num ambiente totalmente favorável à equipa da casa, estes chegaram à vantagem a meio da primeira parte e fizeram o segundo já perto do intervalo. Parecia bater certo a inquietação da maioria dos lusos que já tinham visto este filme vezes demais. Os alemães, fortes e sagazes, arrumaram o jogo com um terceiro golo na segunda parte e nem o tento lusitano, quase no fim, serviu para incomodar. “Perdemos bem e agora é levantar a cabeça’’ exclamava o experiente Rui Patrício, com Fernando Santos a pedir fé e a mostrar confiança na passagem à próxima fase.

    “Ainda não foi desta que superámos o estigma”; “Venha o próximo” – titulavam os jornais no dia seguinte. De volta ao quartel general na capital húngara, a Seleção tinha à sua espera bastantes adeptos que, juntamente com o staff daquele local, aplaudiam e mostravam confiança numa boa prestação futura. O ambiente era positivo e agora faltava, pelo menos, não perder a próxima partida para assegurar desde logo presença nos oitavos de final.

    Chegava então o último dia da fase de grupos, sendo que à Alemanha era difícil perder o primeiro lugar no grupo F, bastando-lhe ganhar em casa à Hungria que já estava eliminada. No Arena Puskas, Portugal reencontrava um adversário que lhe ‘deu’ a maior alegria no Europeu de há quatro anos, mas desta vez os franceses mostravam-se mais cautelosos. Na altura dos hinos oficiais, voltava-se a entoar “A Portuguesa” de uma maneira impressionante, com uma ligação emocional entre os jogadores de fazer inveja a qualquer haka neozelandês. Voltava aquele momento especial que se tinha sentido no primeiro jogo e que transmitia a segurança necessária para se perceber que o foco e o empenho estavam na dose certa.

    O recinto encontrava-se lotado, sendo a maioria apoiantes franceses (aqui somos sempre menos). No campo, a partida desenrolava-se num ritmo médio/baixo, notando-se respeito de ambas as partes. As oportunidades iam surgindo aqui e ali, e o jogador em maior evidência ia sendo Mbappé que nos assustava sempre que recebia a bola com um pouco mais de espaço. A turma lusa conseguiu aguentar o maior ímpeto francês durante o primeiro tempo e entrava no segundo com uma cara renovada. Começou a assumir o jogo e a criar perigo de quando em vez, até que, a partir do flanco direito e através de combinações entre Ricardo Pereira e Gelson Martins, este último cruza para a área onde surge o recém-entrado Rafael Leão – também ele novidade na convocatória – que cabeceia depois de fugir à marcação de Lenglet e faz o golo. Delírio total e triunfo confirmado cinco minutos depois.

    Como se pode imaginar, a festa foi enorme, mas Fernando Santos não queria grandes agitações, ele que estava ali para completar a missão e esta ainda teria um longo caminho. A imprensa nacional desde logo destacou os três envolvidos no lance do golo e escrevia: “Tão improvável quanto real”, aludindo ao facto de estarem a viver um sonho, sobretudo Ricardo e Gelson que há poucos meses nem contariam estar ali.

    Em todo o lado podia ler-se “Déjà-vu saboroso” e ia sendo restaurada a confiança que parecia faltar no início deste Europeu. Assistiam-se a pequenas reportagens dentro do grupo e sentia-se que este estava unido e confiante para levar a missão até ao fim. Sempre que iam treinar, os jogadores eram acompanhados por centenas de adeptos e regressava o ‘regime liberal’ do selecionador, que permitia aos atletas passarem o dia com amigos e familiares. Parecia estar de volta o espírito do Europeu de 2016.

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    André da Silva Amado
    André da Silva Amadohttp://www.bolanarede.pt
    O desporto em geral atrai este jovem aveirense mas é o futebol a sua maior paixão. As conversas com amigos e familiares costumam ir dar ao futebol, hábito que preserva desde sempre. Poder escrever sobre esta vertente é o que o satisfaz, com o intuito de poder acrescentar algo de positivo ao ambiente em torno do futebol nacional.                                                                                                                                                 O André escreve ao abrigo do novo Acordo Ortográfico.