Jogo Interior #27 – Falhámos dois penáltis, mas sorrimos

Hoje no Jogo Interior falo-vos de um episódio que aconteceu na minha vida enquanto treinador, num jogo de futebol de formação entre crianças/adolescentes de 13 e 14 anos de idade. Tudo se passou no célebre e tão desejado domingo de manhã, o dia de jogo, o dia em que, tanto eu como quem está comigo e como cada um dos jovens que ali se encontra, adora e tanto anseia. É o culminar de uma semana de treinos, é a oportunidade de tentar fazer as coisas bem e, no fundo, é a oportunidade que todos esperam aproveitar e poder desfrutar daqueles minutos a fazer aquilo que tanto gostam.

Inicia-se o jogo e, ao contrário daquilo que tem sido a rotina no campeonato em que participamos, não estamos a ser atropelados pela diferença física da grande maioria dos jogadores adversários. Conseguimos jogar, ter a bola no pé, sentir que podemos expressar-nos com a posse de bola enquanto praticantes desta modalidade que tanto gostamos e pela qual abdicamos de muita coisa. Vi a diversão, o prazer e o desfrutar no rosto daqueles miúdos.

Estamos a poucas dezenas de minutos de terminar o jogo e as coisas continuam a correr bem, apesar de estarmos a perder por dois golos de diferença, vejo o esforço, a entrega e a dedicação com que todos se comprometem no jogo e, quando assim é, nada mais podemos exigir e pedir. No entanto, é assinalado a nosso favor uma grande penalidade. Quem costuma assumir a marcação das grandes penalidades, toma a sua posição e… Falha.

Frustração é a palavra de ordem que surge durante aqueles breves segundos que se seguem após a marcação da grande penalidade, talvez mais na bancada e entre a maioria dos jovens jogadores. Mas, inusitadamente e após esses segundos iniciais, surge-me um sorriso que rapidamente é partilhado com quem comigo permite que estas crianças façam aquilo que lhes dá tanto prazer.

Passam-se cinco minutos e uma nova grande penalidade para nós e, desta vez, outro jovem assume a sua execução. E, novamente, falha. Agora com maior intensidade, talvez juntando irritação ao primeiro sentimento, existe consternação nas bancadas afetas aos pais da nossa equipa. Talvez alguma desilusão também. Entre a equipa técnica, o sentimento inicial é o mesmo, mas depois sorrimos.

Vimos bastante para além daquilo que se estava a passar na prática no jogo, deixámos completamente de lado aquilo que poderia ser um empate no resultado com estas duas grandes penalidades e avaliámos no momento, em pensamento, a aprendizagem que dali levaríamos quando o jogo terminasse. O jogo terminou.

A sensação do que foi bem feito, daquilo que lutámos por conquistar, do prazer que era evidente nas expressões faciais e corporais dos jovens jogadores, e toda a entrega e dedicação que foi colocado naqueles oitenta minutos fez esquecer aquelas duas grandes penalidades falhadas. Daí o artigo no Jogo Interior desta semana.

Porque sorrimos?

Grande parte daquilo que pretendemos que os jogadores coloquem em campo esteve presente e não podíamos estar mais contentes com o que naquele dia aconteceu. Falhámos duas grandes penalidades, mas o que é de valorizar é a aprendizagem que dali veio. Assumir a responsabilidade de marcar uma grande penalidade perante toda a envolvente de um jogo de futebol é de uma carga emocional, de uma audácia e ousadia brutais, da mesma forma que é uma assunção dos “riscos” que isso acarreta.

A grande aprendizagem dali retirada é a capacidade que cada um dos jovens jogadores teve em encarregar-se da marcação da grande penalidade. Não está definido quem obrigatoriamente tem de executar a falta, pelo que fica ao critério de quem no momento está presente dentro de campo. Cabe a cada um dos jovens decidir se está ou não confiante para assumir esta “pequena” responsabilidade da vida.

Ter a ousadia de se encarregar da marcação de uma grande penalidade não é mais do que a preparação para as grandes decisões da vida de cada um dos jovens. Antes de serem jogadores de futebol, são indivíduos prestes a interagir na vida social, a serem responsáveis pelos seus atos e pelas suas deliberações. E é nisso que o Futebol de Formação tem de se focar.

O futebol de formação existe, principalmente, para que cada um dos praticantes cresça e se desenvolva no sentido de se conseguirem capacitar destas ferramentas necessárias para uma vida adequada e saudável na sociedade, no futuro. Por isso sorrimos. E por isso abordo também este tema no Jogo Interior de hoje.

 

Artigo revisto por Joana Mendes

Bruno Alexandre Rodrigues
Bruno Alexandre Rodrigueshttp://www.bolanarede.pt
Desde cedo praticou futebol e o seu gosto pelo desporto foi crescendo. Licenciado em Educação Física e Desporto no ramo de Treino Desportivo e com Mestrado em Ensino da Educação Física nos Ensinos Básico e Secundário, é, atualmente, Treinador de futebol de formação e Treinador Adjunto de futebol sénior. Pretende refletir sobre as situações que vivencia, em primeira pessoa e não só, no dia a dia da modalidade.                                                                                                                                                 O Bruno escreve ao abrigo do novo Acordo Ortográfico.

Subscreve!

Artigos Populares

FPF cria novos especialistas para o VAR: «Momento histórico na arbitragem portuguesa»

A Federação Portuguesa de Futebol realizou pela primeira vez um Seminário de Vídeo-Arbitagem. Houve 48 participantes.

Enzo Maresca queixa-se do calor nos EUA: «É quase impossível fazer uma sessão de treino completa»

Enzo Maresca deixou apontamentos quanto ao calor sentido nos EUA. Treinador do Chelsea lançou jogo com o Espérance Tunis.

Arsenal entra na corrida por craque do PSG

O Arsenal está interessado numa possível contratação de Bradley Barcola ao PSG. Parisienses querem manter avançado francês.

Barcelona já tem data prevista para jogar no novo Camp Nou

O Barcelona poderá regressar ao Camp Nou no dia 10 de agosto. Estádio encontra-se em obras desde junho de 2022.

PUB

Mais Artigos Populares

Diogo Costa quer deixar FC Porto e dar o salto

Diogo Costa quer deixar o FC Porto neste mercado de verão. Manchester City e Manchester United interessados no guarda-redes.

Samuel Portugal quer jogar mais e pediu para sair do FC Porto

Samuel Portugal quer somar mais minutos na carreira. O guarda-redes pediu para deixar o FC Porto e encontrar um novo destino.

Ismael Rescalvo anunciado como o novo treinador do Barcelona SC

O Barcelona SC oficializou Ismael Rescalvo como o seu novo treinador. O técnico espanhol estava nos colombianos do Tolima.