
O ano de 1968 estava ainda no seu início, meados de fevereiro, quando a maior banda do planeta decidiu viajar. A convite do líder Maharishi Mahesh Yogi, os Beatles deslocaram-se até Rishikesh, no norte da Índia, para participar num curso de Meditação Transcendental.
Mais de 50 anos depois, sentado na tribuna de imprensa de um Bessa envergonhado (segundas-feiras não são dias de “ver a bola”), com vista privilegiada para o Boavista FC x Sporting CP a contar para a 9.ª jornada da Liga Portuguesa 23/24, essa viagem voltou-me à cabeça.
Sou fã confesso de Paul, John, George e Ringo, mas a pergunta que me fazem tem muito sentido – que raio tem isso a ver com este jogo? A resposta, no fundo, também é simples e tem só duas palavras: Ousmane Diomande.
Dezessete jogos no CD Mafra na primeira metade de época 22/23 valeram-lhe, a troco de um preço que deixou muitos adeptos chocados, bilhete de ida para a capital onde rapidamente se estancou no onze de um leão que estava ferido e precisava de “coisas” novas.

Rapidamente se percebeu o impacto positivo que ia ter na equipa e que os cerca de oito milhões de euros desembolsados rapidamente iam ser justificados. Dezessete jogos e um golo depois,
Diomande terminou a época transata com passe comprado para o onze do Sporting CP em 23/24.
Esse lugar foi conquistado devido a muitos fatores associados ao atleta: a sua inteligência no posicionamento, a grande eficácia nos duelos (pelo ar e pelo chão), pela velocidade, pela qualidade e confiança que transmite sempre que se ocupa da bola… Mas para mim há um fator diferenciador, um fator intrínseco à personalidade da pessoa e não do jogador, que quando está presente extrapola todas as outras qualidades existentes – a calma e serenidade com que enfrenta cada segundo do jogo.
Ousmane Diomande transpira tranquilidade sempre que entra em campo e isso é um fator que só assiste os verdadeiros craques. Mais do que a capacidade que isso lhe traz no momento de se impor, é um fator que infeta a restante equipa que ganha também essa capacidade e que revê ali sempre um ponto de segurança.
Este atributo muito particular do costa-marfinense deixa-me a ideia de que não só o mesmo poderia facilmente ter frequentado o curso de Meditação Transcendental junto dos icónicos músicos de Liverpool, como podia levemente recitar um mantra de sua autoria enquanto se estabelecia como mestre na arte da calma.
Diz-se que uma equipa campeã se constrói a partir de trás. Os verde e brancos, liderados pela serenidade do “monge” africano, num equilíbrio de harmonia e competência, têm neste momento aquela que parece ser a defesa mais oleada da liga, sendo até ao momento a segunda menos batida e aquela que claramente tem maior impacto no desenrolar do jogo da restante equipa. Eu explico melhor, os defesas do Sporting, nos momentos de organização ofensiva, têm um papel muito impactante no desdobrar dos acontecimentos, uma vez que seja através das ligações ou dribles recorrentes e desequilibrastes de Inácio e Diomande, ou pela procura da profundidade com passes mais diretos de Coates, muitas das ideias do jogo ofensivo passam pelos pés dos defensores.
Num jogo onde o Sporting foi visitar um Boavista ainda invicto em sua casa, conseguiu-se superiorizar numa grande fatia dos 90 minutos e, excetuando um (grande!) susto aos 77 minutos, pareceu ter sempre o jogo controlado. Vitória incontestada por 2-0 e liderança isolada da liga, com mais três pontos que cada um dos dois históricos rivais.
Palavra para o eslovaco Robert Bozeník que, como já tinha falado na primeira jornada, continua a lutar e a exibir-se a um nível que pede voos mais altos.
Ousmane Diomande acabou o jogo, entre outras estatísticas, com seis recuperações de bola e dois dribles completos, sendo mais uma vez um dos homens em destaque.
Numa altura em que o mundo do futebol escuta semanalmente o hino “Hey Jude” cantado em uníssono a partir de Madrid, para os adeptos do Sporting parece que “Here comes the sun”, contando com a presença de Ousmane Diomande “Here, there and everywhere”.
Artigo de opinião da autoria de Pedro Belo