«Quero ser útil e tenho ambição de voltar a ser treinador principal» – Entrevista BnR a Gabriel Silva

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    Gabriel Silva tem apenas 31 anos, mas ambiciona regressar aos bancos como treinador principal. Após experiências nas camadas jovens e no futebol sénior, bebendo conhecimento de técnicos como Jorge Simão e Nuno Manta Santos, o jovem não esconde a ambição para o seu futuro. Em Entrevista ao Bola na Rede, deu-nos a conhecer o seu historial, numa conversa com muito futebol à mistura.

    Bola na Rede: Gabriel Silva, contas com apenas 31 anos, mas já contas com várias experiências no futebol. Desde cedo te cativou a área do treino?

    Gabriel Silva: Sim, desde cedo me interessou a área do treino. Comecei por ser praticante federado e depois ingressei no curso de Desporto, na Universidade do Porto, onde quis desenvolver os meus conhecimentos na área do treino, para ser treinador de futebol.

    Bola na Rede: Já trabalhaste em clubes com um histórico importante ao nível da formação como o Braga, Boavista ou Leixões. É fácil trabalhar com jovens?

    Gabriel Silva: Sim, sem dúvida. Acho que é diferente trabalhar com jovens do que trabalhar com atletas seniores, mas também há uma valorização pelo trabalho que é feito, no sentido em que acompanhamos e percebemos o crescimento de certos atletas. Em alguns casos, em pouco tempo, consegues verificar várias diferenças, grandes melhorias e isso acaba por ser uma recompensa para um treinador de formação.

    Bola na Rede: Existem muitas diferenças entre trabalhar com seniores e com juniores. Dá um pouco mais de trabalhou, ou é uma missão diferente?

    Gabriel Silva: Acho que se trabalha cada vez melhor e há grandes melhorias em várias áreas, sobre conhecimento do jogo, da preparação integral do atleta, quer da parte técnica, tática, física ou psicológica. Acima de tudo o jogador já vai para o alto escalão mais preparado. Esse é o trabalho base e acaba por ser fundamental. São exigências diferentes. Neste caso, temos de nos preocupar com a formação do jogador, para que o mesmo seja capaz de responder a modelos de jogo, a adversidades e a sentir-se motivado quando as coisas não correm bem. Nos seniores falamos de uma questão muito mais próxima do puro rendimento. A parte humana é na mesma fundamental. Se tudo estiver melhor trabalhado desde trás, fica mais fácil para o treinador principal. Também temos que estar atentos ao recrutamento de jogadores, que têm que ter um determinado perfil, uma forma de estar, de acordo com os objetivos do clube e do modelo do treinador.

    «ACHO QUE A SITUAÇÃO NO AVES NOS FEZ CRESCER ENQUANTO SERES HUMANOS E ENQUANTO TREINADORES».

    Gabriel Silva, treinador de futebol

    Bola na Rede: A tua aventura no estrangeiro ocorreu ao serviço do Al Fayha. Como foi esse período?

    Gabriel Silva: Foi a minha primeira experiência no estrangeiro. A diversidade cultural é muito grande. Foi muito enriquecedor para mim ter que me adaptar às particularidades culturais dos jogadores, do país e da estrutura humana que envolvia a instituição. Esse passo foi fundamental para mim, para me tornar um treinador mais competente e perceber o que é necessário priorizar, o impacto que cada coisa pode ter no sucesso de uma equipa. É diferente treinar uma equipa aqui em Portugal ou uma na Arábia Saudita, ao nível profissional.

    Bola na Rede: Nos últimos anos acompanhaste o Nuno Manta Santos. Como foi a experiência?

    Gabriel Silva: A minha experiência com o Nuno Manta Santos começou no Aves. Na altura tomei a decisão e deixar de trabalhar no Al Fayha, porque queria ter uma experiência profissional diferente, queria passar a ter outra responsabilidade em termos de planeamento do treino. No Al Fayha era um adjunto com mais responsabilidades ao nível físico. No Aves passei a ter mais responsabilidades no planeamento do treino. No Torreense passei para adjunto, algo que também desempenhei no Trofense. Eu sinto-me mais à vontade e aliciado na questão da metodologia do treino e da preparação da equipa. Também gosto da congruência entre o treino e o que apresentamos dentro do jogo. A experiência nesse aspeto tem vindo a ser positiva. Tenho tido essa liberdade e autonomia para trabalhar esse aspeto que tanto gosto.

    Bola na Rede: Em 2019/20 passaram pelo Aves, num contexto bastante complicado. Como foi lidar com todas aquelas adversidades?

    Gabriel Silva: Foi difícil. Tivemos que ter uma forma de encarar os problemas muito robusta, enquanto treinadores e equipa técnica. Acho que também foi um momento que nos fez crescer enquanto seres humanos e enquanto treinadores, além de percebermos que há fatores que não conseguimos controlar, que podem ter um impacto muito grande naquilo que é o sucesso desportivo. Isto deixou-nos mais maduros e preparados para as adversidades, além de nos alertar a lidar melhor com futuras decisões de carreira, ou seja, na gestão das nossas próprias carreiras. Eu vivi isso como adjunto. Infelizmente, o Nuno acabou por viver isso como principal e saiu publicamente prejudicado de todo este momento, por isso teve que dar um passo atrás, com todo o respeito, a uma equipa de Liga 3, sem ter tido responsabilidade no que aconteceu no Aves. Ele era alheio a tudo, mas tudo isto ficou conotada como uma situação desagradável. O que se retira de positivo é a postura que nós fizemos questão em manter, em prol da verdade desportiva, não deixámos nenhum jogo por fazer. Os jogadores, mesmo sem receber salários, deram o seu máximo e fizemos boas exibições. Empatámos com o FC Porto, ganhámos em Braga, em jogos entre os “aflitos”, por exemplo contra o Vitória FC ganhámos esse jogo, com muitos jogadores Sub-23, que hoje em dia estão num patamar superior, como o Ricardo Mangas ou o Bruno Lourenço. Hoje em dia esses atletas estão nas competições profissionais. No meio da adversidade promovemos alguns jogadores que hoje em dia estão num patamar diferente. Se tudo isto não tivesse corrido mal e não tivéssemos que ter apostado nos Sub-23, porventura as carreiras de alguns destes atletas poderiam ter sido bem distintas.

    Fonte: Instagram Gabriel Silva

    Bola na Rede: Conseguiram uma subida à Liga 3 com o Torreense. Consideras que é um escalão muito competitivo?

    Gabriel Silva: Sem dúvida. Foi um grande acréscimo de qualidade ao futebol português. Conseguimos ver emergir qualidade, que de outra forma seria difícil. Aquela décalage que existe entre uma liga profissional e o Campeonato de Portugal, acaba por ser mais esmiuçada com a Liga 3. Também permite que os jogadores jovens de qualidade apareçam, que treinadores de qualidade mostrem o seu trabalho. Há jogadores, que vivem outra fase de carreira, podem servir de exemplo para os outros. Temos jogadores que passaram pela Primeira Liga a jogar em emblemas da Liga 3 e são um exemplo para os outros, pela bagagem que trazem, pela forma de estar, pela liderança… isto torna o campeonato muito competitivo. Quando fomos campeões da Liga 3, essa época foi a mais equilibrada em termos estatísticos, vale o que vale, mas revela que há um nivelamento muito grande em termos de qualidade das equipas.

    Bola na Rede: Daquilo que investiguei, o teu ponto forte são as bolas paradas, nomeadamente no panorama ofensivo. Como é que preparas os jogadores para esses lances?

    Gabriel Silva: Nós temos tido essa preocupação, porque achamos que é algo que pode decidir um jogo, nomeadamente quando o nível das equipas se equipara. Até o próprio desenrolar do jogo muda com um golo de bola parada. Uma equipa pode parecer que está muito mal, mas marca um golo de bola parada. O jogo transforma-se completamente, os níveis de confiança são diferentes e o que acontece depois é consequência precisamente desse momento. Em termos de preparação, procuramos dar mais tempo de treino, em comparação com o que deveria ser suposto. Procuramos trabalhar quase todos os dias da semana esse momento, não tem que ser muito tempo, mas alguns exercícios com regras ou situações especificas de bola parada, gostamos de trabalhar. Trabalhamos cantos, livres, lançamentos de linhas lateral, em diferentes zonas, curtos ou longos, para combinações ou cruzamentos. Tentamos ser meticulosos. Ficamos também no pós-treino com alguns jogadores a trabalhar ao pormenor a movimentação, já de uma maneira mais analítica, para criar aquela adaptação neural dos movimentos que se procuram fazer. Mais tarde, colocar alguma complexidade, com adversários, em situação de jogo, onde se tem que tomar decisões em tempo real. Procuramos dar mais densidade do que o habitual. Normalmente treina-se isso um dia antes ou dois dias antes. Nós procuramos fazer um trabalho ao longo da semana.  

    Bola na Rede: Acreditas que saber trabalhar as bolas paradas é cada vez mais fundamental para o sucesso no futebol moderno?

    Gabriel Silva: Sim, claro. Se formos a ver dados estatísticos, conseguimos perceber que quando a competitividade é alta e o nível de equipas é similar, poderá fazer a diferença, tal como outros aspetos. A bola parada é algo em que o detalhe pode fazer muita diferença. Acabam por ser situações mais fechadas, onde não há tantas variáveis, onde podemos ter um impacto maior. Em jogo normal há muita coisa que pode fugir ao controlo. Ali há mais formas de controlar e de criar diferentes nuances, combinações, que podem fazer a diferença mediante como o adversário se apresenta.

    Bola na Rede: O passo seguinte passa por voltares a ser treinador principal?

    Gabriel Silva: Sim, passa por ser treinador principal. Acima de tudo, tem que se ter em conta o projeto e o que me fizer sentir bem. Sinto-me preparado para dar esse passo, não vejo problemas em continuar como adjunto, dependendo daquilo que são as funções que me oferecerem. Tenho que me sentir aliciado e que estou a progredir e aprender. Quero ser útil. Mas tenho obviamente essa ambição de voltar a ser treinador principal.

    «GOSTARIA DE TRABALHAR NA LIGA REVELAÇÃO. TENHO ACOMPANHADO COM MUITO CUIDADO MUITOS JOGOS DA COMPETIÇÃO».

    Gabriel Silva, treinador de futebol

    Bola na Rede: Que cursos da UEFA é que tens, neste momento?

    Gabriel Silva: Tenho o UEFA A, que corresponde ao grau 3 de treinador em Portugal, mas procuro fazer o UEFA PRO já na próxima época.

    Bola na Rede: Como tens a experiência de trabalhar com jovens, a Liga Revelação agrada-te?

    Gabriel Silva: Gostaria de trabalhar lá. É um passo que gostaria de dar. Tenho acompanhado com cuidado muitos jogos da Liga Revelação. Por vezes somente para observar jogadores que possam ser possíveis reforços, mas também pela curiosidade. Vê-se muita qualidade de jogadores, da forma como a competição está organizada e depois tem algo que acaba por ser fundamental: há espaço para trabalhar e ter um processo e uma ideia que faça evoluir os jogadores da melhor forma, sustentada e organizada. Isto não significa que eu tenha problemas com outros cenários. Já sabemos o discurso habitual. Quando uma equipa perde dois ou três jogos, o treinador pode ser despedido. Na Liga revelação há mais espaço para se focar no desenvolvimento da equipa e do jogador e não tanto no resultado, que acaba por ser uma consequência do processo de desenvolvimento dos jogadores e da equipa. Num contexto normal, primeiro tem que se pensar em ganhar e depois colocando, aos poucos, a ideia e o processo que pretendemos. A Liga Revelação era o passo ideal para mim, de modo a recomeçar como treinado r principal, já que tive a experiência no Esmoriz, ainda no Pré-Nacional, em Aveiro. Na Liga Revelação poderia mostrar a minha ideia de jogo e a forma como eu trabalho, aquilo que eu acho que é importante para desenvolver uma equipa e os próprios jogadores.

    Bola na Rede: Qual o estilo de jogo que gostas mais e que gostarias de impor?

    Gabriel Silva: Eu gostaria de uma equipa que sem bola fosse mais pressionante possível de modo a recuperar rapidamente a bola, sabendo que é impossível pressionar os 90 minutos e há momentos em que tem que se definir zonas de pressão para podermos recuperar a posse, em zonas estratégicas. Com bola, uma equipa que procurasse ter a bola, mas que procurasse chegar rapidamente a zonas de finalização, que fosse vertical, que houvesse muita mobilidade e trocas posicionais, procura de entradas no espaço e que colocasse a equipa adversária desconfortável, a maior parte do tempo.

    Fonte: Instagram Gabriel Silva

    Bola na Rede: Neste momento, qual é o treinador que te identificas mais?

    Gabriel Silva: É incontornável, para mim, o nome de Carlo Ancelotti. Tive o gosto de estagiar com ele e com a equipa técnica dele no Nápoles. Acima de tudo pela liderança tranquila, como ele apelida. Ele consegue envolver todos à volta dele, sendo exigente de uma forma natural, promovendo cada pessoa que trabalha à sua volta. É algo que me dá muito gozo e procuro retirar, para um dia poder conseguir fazer as coisas bem-feitas. Quero que as pessoas que estejam à minha volta possam dar o melhor de si e que tenham confiança no seu trabalho, sentindo que quem está ao lado não tem medos. Acima de tudo quero que sintam que quero que os mesmos cresçam e que eu próprio possa crescer com eles. As pessoas que fazem isto tê sucesso. Veja-se o caso de Rúben Amorim em Portugal, é um exemplo para todos. As pessoas que trabalham com ele são um reflexo de uma liderança que envolve toda a gente. Em termos de liderança são estes os dois principais exemplos. O modelo de jogo já depende muito. Depende das equipas onde se está, dos jogadores que se tem.

    Bola na Rede: Para finalizarmos, gostaria de saber se já tens alguma abordagem para 2024/25…

    Gabriel Silva: Já fui tendo algumas abordagens, estamos numa fase de tomada de decisões, mas para já, ainda não tenho nenhuma decisão fechada. Felizmente tenho tido situações para ponderar.

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