Képler Laveran de Lima Ferreira, conhecido por qualquer amante do desporto rei, por Pepe chegou a Portugal em 2001 para representar o Marítimo. Chegou com aproximadamente cinco euros, que não hesitou em gastar, para ligar à mãe que se encontrava no outro lado do oceano. A partir daí todos conhecemos a história das suas primeiras horas em Lisboa. Com fome, foi pedir comida a um restaurante do Aeroporto da Portela, e a generosidade de quem o atendeu tocou-lhe no coração e Pepe abraçou Portugal para o resto da sua carreira.
Fez três épocas na Madeira, destacando-se como um central muito forte no jogo aéreo e com uma grande capacidade de antecipação. Foi contratado pelo FC Porto e chegou à invicta com a terrível missão de fazer esquecer Ricardo Carvalho. Sem a serenidade ou a tranquilidade do central campeão Europeu, mas com uma tenacidade fora de série, o central luso-brasileiro fez três épocas de grande nível no Estádio do Dragão ganhando cinco troféus, incluindo dois campeonatos.
Parte para Espanha para representar o Real Madrid e procurar afirmar-se como um dos melhores centrais do futebol europeu. Não tardou a tornar esta afirmação numa realidade, algo que na cidade do Porto já se sabia, e forma juntamente com Sérgio Ramos uma das duplas mais icónicas do panorama do futebol europeu no século 21.
É na capital espanhola que vive os momentos mais altos da carreira: ganha 13 títulos incluindo três Ligas dos Campeões. É também enquanto jogador dos merengues que tem o ponto mais alto da carreira enquanto representante da equipa das quinas: ganha o Euro 2016 com uma exibição de encher o olho na final de Paris, ganhando o prémio de homem-do-jogo, ajudando o também enorme Rui Patrício a manter a baliza portuguesa inviolável.
Parte para a Turquia com a bagagem repleta de troféus e com uma carreira praticamente consumada, dando a ideia ao mundo de futebol que o fim estava próximo. Esteve um ano e meio no Besiktas e apesar de ser titular indiscutível não consegue ficar indiferente aos problemas financeiros do emblema turco, aceitando a rescisão sem qualquer tipo de indemnização. Pinto da Costa não hesita e mesmo tendo uma das melhoras duplas de centrais que passou pelo futebol português (Felipe e Eder Militão), faz Pepe regressar ao futebol português no mercado de inverno.
O regresso de Pepe não é brilhante. É factual que o regresso do central quebrou a consistência defensiva daquela que era a melhor defesa do campeonato. Sérgio Conceição passou de um quarteto composto por Maxi Pereira, Militão, Felipe e Alex Telles para encostar o internacional brasileiro contratado ao São Paulo FC para a lateral, dando o eixo central da defesa a Pepe e Felipe. O clube da cidade invicta escorrega demasiado na segunda volta do campeonato e permite a Bruno Lage e aos encarnados recuperarem uma vantagem de sete pontos, sagrando-se campeões nacionais.
Desde então, o central luso-brasileiro, mesmo com os anos a avançar, mostrou uma consistência notável e o que lhe faltava em velocidade, compensava em inteligência na antecipação, um posicionamento fora de série e um sentido de liderança incontestável. Amealha mais oito títulos no clube de coração e deixa em campo exibições para ficar na retina: como aquela noite em Turim – em plena pandemia – onde um pontapé de Sérgio Oliveira colocou os Dragões nos quartos-de-final da Liga dos Campeões. Ou até mais recentemente, no Emirates, onde com 120 minutos nas pernas, anulou as ofensivas daquele que era o melhor ataque da Premier League à época.
Apesar da carreira espetacular, Pepe foi tendo alguns episódios ao longo do percurso que não corroboravam com a inteligência que demonstrava dentro de campo: desde a expulsão sem nexo no Alemanha-Portugal do Mundial 2010, a agressão ao pontapé a Casquero no Real Madrid-Getafe ou até mais recentemente nas expulsões que comprometeram as aspirações da equipa azul e branca em jogos contra rivais: primeiro contra o Benfica na Supertaça Cândido de Oliveira e depois em Alvalade com uma “agressão” em Matheus Reis que permitiu ao Sporting segurar a vantagem com mais tranquilidade. Alguns destes lances foram perseguindo a carreira de Pepe e acredito que só não é considerado consensualmente e de forma unânime, um dos melhores centrais de sempre, derivado a estes episódios.
Não sei se o futuro daquele menino brasileiro que chegou a Portugal para jogar à bola, vai passar pelas arábias, pelo Brasil ou até pela reforma. O que eu sei é que esse mesmo menino se tornou um dos melhores defesas centrais da história do futebol mundial e um exemplo de longevidade, perseverança, humildade e de paixão. Uma paixão tão genuína pela bola. Uma paixão que nos ajudou a fazer história em 2016, a devolver a mística a um clube à deriva e a fazer sonhar mais meninos como o pequeno Képler!