O caso Enzo Fernández: racismo ou ignorância?

    O internacional argentino Enzo Fernández, antigo jogador do Benfica, assumiu um protagonismo inesperado nos últimos dias e não pelos seus atributos futebolísticos.

    Durante os festejos da última Copa América ganha pela Argentina, decidiu fazer um direto no Instagram e durante esse direto, viu-se a Enzo (e não só a ele, há que ser honestos) a cantarem uma música de teor extremamente xenófobo e discriminatório em relação aos jogadores da seleção francesa e de uma forma muito particular a Kylian Mbappé.

    O excerto da música cantada por Enzo e os seus companheiros, fala sobre o fato da seleção francesa ter jogadores de origem africana e filhos de emigrantes (nomeadamente afirmando que todos os jogadores franceses são de Angola) e também coloca em causa a orientação sexual de Mbappé.

    Kylian Mbappé, com a camisola de França, tem sido alvo dos cânticos de Enzo Fernández
    Fonte: Federação Francesa de Futebol

    Quando esse vídeo começou a circular na Internet, a polémica instalou-se automaticamente pelo fato de Wesley Fofana (colega de equipa de Enzo no Chelsea), ter republicado o vídeo nas suas redes sociais no qual o critica fortemente e o apelida de racista.

    Vários colegas de equipa manifestaram-se contra Enzo Fernández, mais de 10 deixaram de o seguir no Instagram e o Chelsea abriu um inquérito disciplinar ao jogador, estando ainda a ponderar qual será a punição a ser aplicada ao médio argentino.

    Há alguns que pedem uma suspensão prolongada para além de uma multa económica e há inclusive outros que pedem que o Chelsea o coloque na lista de transferências, pois consideram que o ambiente no balneário será irrespirável e haverá uma clara divisão do mesmo.

    Sabemos bem da rivalidade histórica entre a Argentina e a Inglaterra (acentuada por causa da guerra das Malvinas) e era lógico que iriam utilizar esta situação para catalogar de racista o povo argentino.

    Sou totalmente contra as generalizações, muitas vezes essas fazem-nos perder a perspetiva das coisas e são bastante perigosas.

    Certamente que há racistas na Argentina, como também os há na França e na Inglaterra. O racismo é um flagelo social numa escala a nível mundial.

    Este caso tomou proporções tão grandes que Victoria Villarruel (vice-presidente da Argentina), resolveu manifestar-se na sua página do Twitter e em vez de procurar que o assunto terminasse, ainda quis deitar mais achas para a fogueira e num tom bastante ofensivo, chamou a França de país colonizador e dizendo que a canção só se remete à verdade dos fatos.

    Macron não se tinha manifestado ainda e tínhamos a vice-presidente da Argentina a atacar fortemente um país, que brevemente irá receber a delegação argentina nos Jogos Olímpicos, causando um conflito diplomático totalmente desnecessário.

    O caso ainda se torna mais bizarro quando vemos o presidente argentino Javier Milei despedir um dos seus secretários de Estado por ter opinado que Messi (na condição de capitão da seleção argentina), deveria fazer um pedido de desculpas publicamente.

    Milei argumentou que nenhum cidadão deverá ter a ousadia de pedir a opinião de algum membro da selecção argentina campeã do Mundo e bi-campeã da América.

    Um exercício de parcialidade ridículo e de claro aproveitamento político de uma situação que devia ser analisada e discutida com a máxima seriedade e sensibilidade.

    É certo que os argentinos vivem o futebol de uma maneira muito apaixonada e muito própria que os seus adeptos são vibrantes.

    A canção que Enzo (a que os argentinos chamam de canción de cancha) entoou junto dos seus companheiros, jamais deveria ser cantada em nenhuma circunstância e jamais devia ser desculpabilizada.

    O próprio Enzo retratou-se imediatamente através de uma story no seu Instagram. Claro está que poderemos dizer que um pedido de desculpas não é suficiente e que deverá receber uma punição severa. Não sou ninguém para o afirmar tão rotundamente. 

    Entoar um cântico racista faz de ti racista? Talvez faça. 

    É justificável entoar um cântico racista fruto da euforia do momento? Não, de todo.

    Enzo Fernández Chelsea 2
    Fonte: Chelsea FC

    Devemos crucificar Enzo Fernández e dizer que ele é um racista por esse motivo? Eu julgo que não. Agora, estão a aproveitar toda esta polémica para lançarem a notícia de que o Enzo pode perder a carta de condução por uma infração de trânsito datada de Novembro do ano passado. Muito conveniente, portanto.

    A discussão sobre o racismo tem que ser bem mais profunda no futebol e em todas as áreas da nossa sociedade.

    Não vou afirmar que Enzo não tinha noção da gravidade do que estava a cantar porque é o próprio Enzo que termina a ligação em direto quando se apercebe do que está a cantar.

    Agora, terá sido a intenção do Enzo atacar toda a seleção francesa e “burlar-se” da sexualidade do Mbappé? Não sei eu e acho que mais ninguém o sabe, a não ser o Enzo.

    Honestamente penso que Enzo não tinha a noção da gravidade do que estava a dizer porque estas canções (mal na minha opinião), são prática recorrente nos relvados argentinos e Enzo está na Europa há muito pouco tempo.

    O seu ADN futebolístico (e apesar da sua tenra idade) é maioritariamente ligado ao futebol argentino, onde esses cânticos fazem parte do folclore e da rivalidade entre clubes adversários.

    Na Argentina, este cântico não é tão ofensivo como em qualquer outro país, é algo que faz parte da sua cultura e que será muito difícil que se altere. 

    Enzo Fernandez leo Messi Argentina México
    Fonte: FIFA


    É bastante usual vermos jogadores argentinos a serem apelidados de El Loco, El Flaco, Cabezón, Colorado, El Negro, etc… E nunca é tido como algo desrespeitoso naquele país. Mas os tempos são diferentes e um jogador de futebol está cada vez mais exposto.

    Vários colegas de Fernández na seleção argentina, já vieram manifestar o seu apoio ao colega, como os casos de Rodrigo De Paul, Alexis Mac Allister e Leandro Paredes.

    Foi imprudente que Enzo tenha feito um direto a cantar essa música e certamente que o próprio já estará profundamente arrependido do mesmo, pois sabe que este momento pode prejudicar muito a sua carreira e a sua imagem dentro do balneário do Chelsea e não só.

    O que eu vejo são movimentos de colegas de equipa que deveriam tentar ter resolvido esta questão internamente e não tentar incendiar um balneário em vésperas de uma nova época.

    É totalmente legítima a sua indignação e frustração, mas há coisas que devem ser tratadas de forma privada, muito mais quando falamos duma equipa de futebol, onde a coesão e união de um grupo de trabalho são fundamentais para se atingirem os objetivos de épocas cada vez mais longas e onde o grau de convivência ainda é maior do que no passado.

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