Luís Filipe Vieira e a necessidade de um protagonismo atroz

    Benfica

    Luís Filipe Vieira concedeu uma entrevista à CMTV, que se estendeu por mais de uma hora e meia, onde o antigo presidente do Benfica, debateu o estado do emblema encarnado, pelo menos era essa a ideia. Mais de três anos depois de ter renunciado a um cargo, mostrou-se arrependido de ter indicado Rui Costa como seu sucessor, como se o ex-internacional português não vencera já umas eleições, com mérito próprio e frente a um adversário forte.

    A verdade é que Luís Filipe Vieira passou toda a entrevista a apelar à união, mas ao mesmo tempo deixou ataques brutais a várias figuras do Benfica, nomeadamente Rui Costa e Nuno Costa (totalmente ‘assassinado’ pelo antigo dirigente). Pareciam duas pessoas diferentes que estavam na mesma sala a acompanharem João Ferreira, que se mostrou entusiasmado com o convidado que tinha, o que é normal. Luís Filipe Vieira está com 75 anos e já deu centenas de entrevistas, invadiu estúdios. mas ainda necessita de protagonismo e de atenção. A imagem que quis passar é básica: o Benfica não seria a mesma coisa sem ele.

    Será isto verdade? Possivelmente, já que conseguiu recuperar um clube que vivia um período financeiro complicado e fez parte de momentos importantes do clube. Porém, o discurso que colocou em prática na quinta-feira foi exaustivo, vestindo uma capa de Super-Homem. Basicamente, ele fez tudo e foi tudo. Para mim, o momento que exibe melhor a sua necessidade e sede de protagonismo é a forma como aborda a construção do Estádio da Luz, tendo a ‘ousadia’ de compartir a cena com outros elementos:

    «Mário Dias mandou com os dossiês para dentro do carro. Com as lágrimas nos olhos disse que não queriam fazer o estádio… no dia seguinte estive o dia todo a fazer contas, eu, Mário Dias e Seara Cardoso e à uma da manhã disse-lhe que ia fazer o estádio. Fomos à casa do Vilarinho. A questão era o dinheiro e fomos falar com o presidente da CM Lisboa. Houve homens fundamentais nisto. Fui falar com o Diogo Vaz Guedes e levei o Mário Dias comigo. Disse-lhe que já tinha a aprovação para fazer o projeto finance, mas que não tinha dinheiro para iniciar a obra. O Diogo Vaz Guedes esteve quase um ano sem receber. O Mário Dias foi super importante. Sem Luís Filipe Vieira, Mário Dias e Diogo Vaz Guedes não haveria estádio».

    Contudo, após esta descrição entusiasmante e tão bem vendida, afirma:

    «Fico ofendido quando dizem que fui eu que fiz o Estádio, até pela memória de Mário Dias». Parecem duas pessoas distintas, um pouco à Dr. Jekill e Mr. Hyde. A primeira, com relativa sobranceria. A segunda, repleta de humildade.

    Luís Filipe Vieira abordou o momento do futebol, aquele que realmente mais interessa, deixando farpas a toda a estrutura, vendendo incessantemente uma ideia de que ‘no tempo dele é que era bom’. Criticou a venda de João Neves, que trocou o Benfica pelo PSG por 60 milhões. Ao mesmo tempo, quiçá se tenha esquecido que libertou João Cancelo, Bernardo Silva ou André Gomes por verbas entre os 15 e os 20 milhões de euros, numa fase em que existia uma dependência em relação a Jorge Mendes (e era acusado de estar num ‘triângulo das Bermudas’ com o Valência e o Monaco), sem retirar rendimento desportivo praticamente nenhum dos craques (à exceção do médio). João Neves foi o membro mais importante dos encarnados em 2023/24 e pode-se considerar que tenha mesmo sido mal vendido, que o valor se podia ter aproximado da cláusula. Porém, Luís Filipe Vieira também teve as suas falhas.

    Criticou a preferência do Benfica pelas aquisições de Casper Tengstedt e Andreas Schjelderup, ao invés da de Viktor Gyokeres, elemento referenciado. Hoje é fácil julgar. Mérito ao Sporting que apostou no sueco, mesmo com o seu preço elevado. O mercado funciona assim, não se acerta sempre. Verdade seja dita, o Benfica tem acertado pouco. Mas será que Luís Filipe Vieira teria lutado pelo antigo jogador do Coventry City? Além disto, podemos questionar a veracidade do antigo presidente. Tengstedt e Schjelderup chegaram à Luz em janeiro de 2023, enquanto que Gyokeres aterrou em Lisboa no verão de 2023.

    Seguidamente, revelou que tinha despedido Roger Schmidt muito antes e que Bruno Lage não foi a primeira escolha de Rui Costa. Não se esperava um discurso distinto. Relembrar que o próprio Luís Filipe Vieira tratou de contratar um técnico que havia deixado sair alguns anos antes.

    O antigo presidente do Benfica recordou a sua postura de bom líder. Afirmou que pagou tudo aos jogadores e funcionários mesmo no COVID, que jamais impôs um treinador e que manteve Jorge Jesus contra tudo e contra todos. Apenas faltou levantar-se e ‘autoaplaudir-se’. A meio, acusava Rui Costa de ter tomado decisões erradas, mas em seguida apelava a união dos benfiquistas, algo que foi realçado por Bruno Lage na antevisão do Benfica x Santa Clara.  Luís Filipe Vieira aparentou que ‘tinha que dar tudo’ nesta entrevista, falando de tudo o que desejava falar, mesmo que fosse de pouco interesse e fugindo ao guião de uma entrevista que contava com muito potencial.

    Com isto, não significa que a opinião de Luís Filipe Vieira não interesse, longe disso. É uma figura importante para o futebol português. Não se entende é o motivo para quase duas horas de declarações, num tom pouco simpático e arrogante. Afinal, pouco depois das 22h10, Luís Filipe Vieira anunciava que não ia ser candidato às eleições de 2025, depois de João Ferreira lhe ter perguntado diretamente várias vezes. O ‘não’ custou a sair, já que o empresário teve que novamente aplicar um discurso longo, recheado de críticas e lamentos:

    «Se me vou candidatar? Não, deixe-me responder de outra maneira. É indecente se alguém neste momento anda à procura de eleições. Rui Costa foi legitimado pelos sócios para ser presidente até 2025. Posso discordar dele, mas tem toda a legitimidade para ir até 2025. Vim aqui de boa fé, fui muito criticado e aprendi a ser criticado, aquilo que disse hoje sobre o presidente do Benfica, se calhar ele tem de ser melhor aconselhado. Ouvir menos Nuno Costa, a quem chamam de presidente adjunto do Benfica (…) Candidatura à presidência do Benfica? Deixe-me dizer que, neste momento, o meu objetivo é a minha família. Fui julgado de forma popular, pelo povo. Muita gente foi injusta comigo no Benfica. Fui traído. Depois de sair, de ser detido, o que disseram, o que me fizeram (…) Não vou avançar com uma candidatura para 2025. Muito que fizeram, destruíram a minha família. Os meus filhos, os meus netos… é imperdoável. Há pessoas lá dentro que sabem que eu era incapaz de fazer aquilo e não foram solidários comigo. Há homens que não merecem lá estar».

    Todo este discurso para sabermos uma resposta óbvia. Luís Filipe Vieira não tem margem de manobra dentro do Benfica e está no passado, em conjunto com outras glórias. Procura-se sangue novo e não alguém que já manifestou o que é capaz de fazer. Quanto muito poderá apoiar um candidato, algo que o próprio assumiu. Isso faz sentido. Figuras importantes têm essa função.

    António Tadeia escreveu com toda a razão no seu Substack que a entrevista realizada a Luís Filipe Vieira foi «uma massagem ao ego». A verdade é que o antigo dirigente estava ‘na sua praia’. Pouco ou nada foi contrariado, falou do que quis. O jornalista da RTP adianta que o ex-presidente tem medo sobre o que as gerações irão pensar dele.

    Acho que Luís Filipe Vieira está seguro que vai ser recordado pela maioria dos benfiquistas como uma pessoa que deu algo de positivo ao Benfica, independentemente do fim do seu percurso. Em Portugal, nunca existiu uma personagem que unisse 100% da população. Nem a favor, nem contra. Não será Vieira a fazê-lo.

    Ainda assim, Luís Filipe Vieira pareceu-me preocupado sobre o seu posto no futebol português. Tal como numa telenovela, existem os protagonistas, o antagonista e os personagens recorrentes, além dos figurantes. Não cabe na cabeça de ninguém colocar tal personalidade num protagonismo, que deve ser de quem está dentro das quatro linhas. Como antagonista, poderia não assentar mal, mas há um óbvio candidato ao posto. Assim sendo, Luís Filipe Vieira terá reservado para si um papel de destaque, com a noção de que não é nem o Super-Homem, nem o Batman. Pode marcar uma geração, mas não merece uma estátua.

    Como disse no começo, Luís Filipe Vieira está com 75 anos, uma boa idade para descansar e ‘desligar’ dos problemas. O Benfica tem quem os resolva. Em outubro de 2025, todos os sócios irão decidir qual o futuro do clube. Por isso, deveria confiar em quem irá às urnas, que saberá, possivelmente até melhor que ele, qual a melhor solução.

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