Uma loucura desenfreada, mas com explicações bastante simples | FC Porto x Manchester United

    FC Porto Cabeçalho

    FC Porto e Manchester United protagonizaram um dos jogos mais emocionantes dos últimos anos. E, para ser emocionante, não precisa propriamente de ser o mais bem jogado. É no meio do caos que nascem as emoções mistas de quem aos 20 minutos lamentava uma entrada em falso diante de um Manchester United perfeitamente ao alcance, aos 50 festejava – mais uma – reviravolta épica a marcar a temporada e terminou a bradar aos céus um empate agridoce que fugiu da mão quando muitos já o festejavam.

    Há dois tipos de jogos que terminam com seis golos: ou uma equipa se superioriza de maneira tal que o sentido único desagua sempre na baliza adversária ou ambos os conjuntos apresentam limitações constantemente exploradas. O empate entre o FC Porto e o Manchester United é exemplo da segunda.

    As debilidades do FC Porto em organização e transição defensiva estão à mostra e, pelo terceiro jogo consecutivo, foram expostas pelos adversários. Quer recuperando a bola e lançando a transição quer saindo de forma mais apoiada, superando a primeira pressão do FC Porto e chegando rapidamente ao último terço, os dragões deixam espaço para aproveitar nas costas dos médios. Quando a este espaço se junta a permeabilidade defensiva dos elementos da linha mais recuada, os dragões sofrem. E foi desta maneira que o Manchester United criou perigo.

    Diogo Dalot Martim Fernandes FC Porto Manchester United
    Fonte: Diogo Cardoso / Bola na Rede

    Com Diogo Dalot a jogar por dentro na saída de bola (3+2), Christian Eriksen foi o jogador mais importante do jogo do Manchester United. Procurou receber nas costas dos médios do FC Porto sobre a meia esquerda, fugindo à marcação e encontrando espaço para receber e rodar, vendo o jogo de frente em zonas avançadas e definindo com qualidade. O lado esquerdo foi o mais forte dos red devils e o dinamarquês foi capaz de se relacionar com Marcus Rashford, o outro nome em destaque no Manchester United.

    A pé trocado, Marcus Rashford partiu constantemente da esquerda para dentro, conduzindo com o pé direito e procurando definir em terrenos mais interiores. Superou várias vezes João Mário e Zé Pedro que, nesta altura da época, não têm dado estabilidade defensiva ao FC Porto. Nos primeiros 20 minutos do jogo, sofreram com a capacidade do internacional inglês conduzir e partir para cima. Os red devils vivem da capacidade de produção dos extremos e construíram a vantagem a partir do inglês que, incompreensivelmente, saiu ao intervalo numa substituição que já se encontrava preparada antes do jogo. Destaque ainda para Rasmus Hojlund – num modelo mais vertical acrescenta ao nível da movimentação – e Diogo Costa, que não viveu a mais feliz da noite na proteção do poste mais próximo.

    Em campo há, ainda assim, uma equipa muito mais permeável que o FC Porto. É natural que, num estágio inicial do trabalho, Vítor Bruno ainda tenha muito que melhorar e aprimorar nos dragões. Mais estranha é a incapacidade de Erik ten Hag corrigir problemas que se arrastam à meses e que, de época para época, ganham nova dimensão.

    Defensivamente, o Manchester United é uma peneira. Não há outras palavras para explicar o descalabro de uma organização defensiva que abre crateras atrás e que concede tanto espaço para aproveitar. Os red devils tentam lançar-se numa pressão muitas vezes desorganizada, sobem a linha defensiva e deixam muito espaço entrelinhas, com os médios constantemente atraídos e fora de posição, e os centrais muito expostos e com vulnerabilidades nos duelos.

    Maguire Manchester United Casemiro
    Fonte: Diogo Cardoso/Bola na Rede

    Não é surpresa que, neste contexto, Samu Aghehowa tenha sido o maior destaque do FC Porto. Subjugou Matthijs de Ligt, retrato fiel do desnorte do Manchester United. Desde que deixou o Ajax que o neerlandês perdeu a capa da segurança e se tornou num central pouco fiável com bola e sem esta. A tentativa de reunir nomes de confiança de Erik ten Hag impediu os red devils de olhar para o mercado com outros olhos e o defesa central é exemplo clamoroso da ausência de planeamento para lá de dar ao técnico nomes com quem já trabalhou. E o central mostrou lacunas e debilidades exploradas vezes e vezes sem conta pelo avançado espanhol do FC Porto.

    Falar em autossuficiência é falar de Samu. Funciona como referência, vencendo duelos no corpo e dando ao FC Porto a possibilidade de esticar na frente à procura de uma referência. Consegue atacar a profundidade, rompendo nas costas da linha defensiva e aumentando a desordem já por si evidente e dentro da área tem o seu habitat natural. Sabe posicionar-se, atacando as zonas onde a bola cai, e tem agressividade nos movimentos para rematar em situações de vantagem, ganhando a frente aos defesas. A potência que coloca no remate – especialmente no cabeceamento – é de matador. O avançado espanhol dá inúmeros recursos e o FC Porto consegue trabalhar bem situações de cruzamento para favorecer o espanhol.

    Com os tempos constantemente a jogar por dentro e, pelo menos um médio, a pisar a área, os dragões preenchem todas as zonas sensíveis (primeiro poste, segundo poste, marca do penálti e entrada da área) e, com movimentos de arraste e de atração, dão condições favoráveis a Samu para atacar a bola. A qualidade na batida de nomes como Francisco Moura e João Mário ajuda a explicar a eficiência do FC Porto neste momento.

    Samu FC Porto
    Fonte: Filipe Oliveira / Bola na Rede

    João Mário é também um nome fundamental para explicar o crescimento dos dragões no jogo. Aproveitando o posicionamento mais interior de Diogo Dalot e as fragilidades dos centrais, especialmente de Ligt, o FC Porto aproveitou o momento da reorganização do Manchester United para encontrar espaço para acelerar. E, se João Mário tem algumas lacunas defensivas claras, tem argumentos ofensivos que têm sido constantemente desvalorizados. Consegue associar-se com os colegas, identifica o espaço para se projetar e define com qualidade no último terço.

    Faltou ao FC Porto outra capacidade para gerir o jogo, especialmente com mais um jogador em campo com a expulsão de Bruno Fernandes. Vítor Bruno justificou a descida de linhas como uma reação natural e imediata dos jogadores, procurando segurar o resultado. Falta recuperar algum conforto com bola ao FC Porto para, naturalmente, saber gerir melhor os ritmos de jogo. E é preciso voltar a falar de Samu.

    A entrada de Samu no onze do FC Porto trouxe recursos novos aos dragões, mas obrigou a mudanças na forma de jogar. Se antes faltavam movimentos ao FC Porto na última linha, com Danny Namaso constantemente a baixar em apoio, associar-se com os colegas e a pedir movimentos compensatórios, ao clube azul e branco falta agora resistir à tendência de procurar o mais simples. E o mais simples é procurar a agressividade do avançado espanhol.

    Nico González FC Porto Christian Eriksen Manchester United
    Fonte: Filipe Oliveira / Bola na Rede

    Se antes o FC Porto concentrava muito a bola e faltavam aos dragões movimentos, agora as constantes ruturas precisam de ser conjugadas e geridas com períodos em que o jogo pede a gestão da bola. O processo de crescimento é natural e terá de ser feito para que os dragões não fiquem demasiado viciados na procura constante de um avançado capaz de resolver jogos pela potência, mas que significará posses de bola mais curtas. Cabe a Vítor Bruno encontrar o equilíbrio necessário para dar mais armas aos dragões. E Nico González é um intérprete perfeito para gerir estas situações. É destaque claro e inequívoco da formação azul e branco, gerindo ritmos e oferecendo soluções ao passe. O protagonismo que tem no sistema de jogo do FC Porto não é aleatório.

    Resolver a transição defensiva e continuar a dar passos para um jogo mais completo ofensivamente é o grande desafio de Vítor Bruno. Quanto ao Manchester United, tem uma questão mais complexa a responder, mas que pode ter resposta simples. Erik ten Hag tem – ou deveria ter – cada vez menos margem como técnico dos red devils. E, quiçá, perder diante do Aston Villa pode ser a melhor solução a longo prazo.

    BnR na Conferência de Imprensa

    Bola na Rede: Com o Samu, o Porto ganha uma referência muito capaz de explorar a profundidade e atacar as costas da linha defensiva e, comparando ao início da temporada, o Porto pensa menos os ataques, apostando numa procura mais direta da referência na frente. Taticamente sente que o Porto precisa de crescer para conseguir conjugar este jogo mais direto com uma maior paciência e calma em organização ofensiva?

    Vítor Bruno: Eu percebo a sua questão, se virmos grande parte dos jogos feitos até aqui. São dados estatísticos que eu não valorizo, ou tento valorizar o menos possível. Tudo o que tem sido posse de bola, em todos os jogos nós temos estado por cima em todos os momentos, e muitas vezes a controlar o jogo no meio campo adversário. Hoje era preciso perceber quem estava do outro lado e perceber de que forma era possível ferir a organização defensiva do Manchester United. Com a análise que fizemos, entendemos que uma das formas de os ferir era precisamente essa. Os ataques à profundidade, os ataques à última linha do adversário, esperar muitas vezes e sair em transição, porque sabíamos que eles sofriam. Na análise que fizemos, vimos vários momentos em que sofriam e sofreram a partir de momentos em que estavam instalados no meio campo adversário e levaram com transições. Trabalhámos estes pormenores nos três dias em que foi possível levá-los a treino. Trabalhámos ataques à última linha, em transição e ser muito intencionais nas nossas saídas verticais na direção da baliza adversária. Foi uma questão estratégica e aquilo pelo que optámos hoje. Volto a dizer, há momentos em que a equipa tem de crescer, já falámos das tais dores de crescimento. A equipa vai crescer, matutar comportamentos e ficar mais identificada com o que é pedido. Hoje vou para casa com uma dor de alma gigante, mas com um sentimento de orgulho que, não sendo comparável ao da Supertaça, é muito próximo. Os jogadores foram bravos e mantiveram-se sempre inteiros. E manter-se inteiros a perder em casa por 2-0 com um rival como é o Manchester United sem nunca se desviarem do plano inicial do treinador é o que mais me deixa com orgulho. Hoje vou para casa com um sentimento de orgulho muito grande.

    Bola na Rede: Esta temporada o Diogo Dalot tem, na construção, jogado por dentro. Qual a importância do posicionamento do Eriksen, nas costas dos médios do Porto e muitas vezes pela esquerda, para o jogo ofensivo do Manchester United?

    Erik ten Hag: Foi muito importante. O seu posicionamento aí era parte do plano foi pensado na forma como consegue ligar jogo. Sabemos da capacidade dele para ligar jogo e criar oportunidades. Foi muito útil. No outro lado do campo estava o Bruno Fernandes. Fez parte do nosso plano para atacar.

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