
Se há umas semanas nos dissessem que Pepê ainda estaria no plantel do FC Porto, acharíamos pouco provável, tendo em conta a época transata que realizou ao serviço dos dragões, então liderados por Vítor Bruno e Martín Anselmi. O próprio Samu, que começou a temporada 2024/25 em destaque, foi perdendo protagonismo com a chegada do técnico argentino em janeiro. Alan Varela é outro exemplo: médio que chegou na era Sérgio Conceição, fez uma época regular, mas acabou por perder discernimento em muitas ações, numa temporada bastante aquém das expectativas do plantel azul e branco.
A entrada a todo o gás do FC Porto diante do Vitória SC esteve muito ligada às exibições destes três jogadores. Samu, claramente o destaque do encontro, apontou dois golos, viu ainda outro ser anulado por posição irregular e, na jogada do golo de Pepê, decidiu bem. Pepê, que já não apresentava esta consistência desde o tempo de Sérgio Conceição, mostrou-se mais criterioso e confiante, e o toque de classe sobre Charles para abrir a contagem para os azuis e brancos diante dos vitorianos foi exemplo disso. Alan Varela, mais protegido nas dinâmicas de Francesco Farioli quando recebia a bola de costas, também se destacou: ajudou a linha defensiva nos momentos sem bola e, em posse, deu garantias — como o próprio treinador referiu, em resposta ao Bola na Rede.

As ilações que retiro deste jogo são claras: o contexto de um clube e a fase que atravessa fazem toda a diferença no rendimento dos jogadores. Quando uma equipa acredita no processo do treinador, os resultados podem demorar a aparecer, mas a confiança nas ideias transmitidas, aliada à qualidade individual, acaba por trazer vitórias. Os jogadores precisam de um bom enquadramento para serem melhores coletivamente. Na época passada, o FC Porto viveu um período de reestruturação, contestação e maus resultados, o grande problema é que os próprios jogadores não pareciam acreditar nas ideias sobretudo do técnico ex-Cruz Azul.
Curiosamente, mesmo não respondendo da melhor forma ao perfil de avançado mais associativo que Martin Anselmi procurava, Samu não perdeu o lugar, mas viu o seu jogo perder influência e qualidade. Farioli também privilegia essa ligação com os médios, mas frente ao Vitória SC, Samu apresentou-se no seu melhor: mais participativo, mais ligado ao coletivo e com tomadas de decisão muito mais acertadas. Os jogadores continuam a ser os mesmos, evoluem naturalmente, claro, mas é impensável que tenham sofrido uma evolução técnico-tática tão repentina. O que mudou, de facto, foi o contexto.

É fundamental que os jogadores acreditem nas ideias do treinador. Com as condições certas, regressam ao melhor nível, e Farioli tem sido exemplar na forma como tem revitalizado estes jogadores. Se, como referiu Martín Anselmi numa recente entrevista, a equipa estava mentalmente desgastada, o FC Porto deu sinais de entrar na nova época com outro espírito, outra confiança, mais organizada e outra qualidade, com e sem bola.
Não podemos negar que, neste mercado de transferências, o FC Porto reforçou-se com mais-valias e que existe uma diferença considerável face ao plantel utilizado por Vítor Bruno e Martín Anselmi. Ainda assim, há jogadores que, há apenas dois meses, eram alvo de críticas no Mundial de Clubes e que hoje voltam a ser aplaudidos no Dragão pelas suas exibições. A culpa pelo mau momento passado está longe de ser apenas de Vítor Bruno e Martín Anselmi. O próprio Pepê, recentemente, pediu desculpa pelo atrito que teve com o antigo adjunto de Sérgio Conceição após a derrota frente ao Gil Vicente, admitindo que passava por uma má fase nessa altura.
Para quem já jogou futebol, sabe que a confiança e o aspeto mental de um jogador têm uma grande influência no seu rendimento, tanto na técnica como na tática. É fundamental que o treinador acredite nos jogadores e que estes, por sua vez, confiem no treinador. No FC Porto, isso tem-se tornado cada vez mais evidente. No fundo, a vitória frente ao Vitória SC foi mais do que três pontos: foi a confirmação de uma nova identidade reforçada pela chegada de Francesco Farioli. A temporada ainda agora começou, mas os primeiros indícios são claramente positivos.
BnR na Conferência de Imprensa
Bola na Rede: Qual foi o objetivo tático com a descida de Alan Varela para formar uma linha de 5 no processo defensivo do FC Porto?
Francesco Farioli: É uma solução que temos no nosso jogo há muitos anos, algo que fazemos recorrentemente. Quando estamos mais baixos no terreno, gostamos de usar o número 6 próximo da linha defensiva e acho que o Alan Varela fez um trabalho fantástico. Esteve muito bem com bola e também no jogo sem bola. Mas penso que, na nossa exibição de hoje, é difícil escolher um jogador que se tenha destacado mais do que os outros. Desde os que começaram como titulares até aos que entraram, todos fizeram um grande jogo.
Bola na Rede: O que procurou mudar em termos táticos para tentar travar o caudal ofensivo que o FC Porto evidenciava com a paragem a meio da primeira parte?
Luís Pinto: A questão tática teve mais a ver com a nossa equipa com bola do que propriamente sem bola. O que estava a acontecer é que estávamos a dar-nos muito à pressão: o FC Porto pressionava alto e nós estávamos a ir para as zonas que eles queriam pressionar. A vantagem estava toda sobre o corredor esquerdo e, sempre que conseguíamos atrair e rodar pelo João ou pelo Camará, que estava mais aberto, criávamos situações em que colocávamos o João em 2 contra 1 com o Camará e, muitas vezes, também em espaço interior. Isto tinha muito mais a ver com o aspeto ofensivo do que com o defensivo, porque as primeiras ações do FC Porto foram atrair, procurar bolas longas, explorar a profundidade e obrigar-nos a correr para trás. A partir do momento em que começámos a controlar essas bolas longas e a preparar um pouco melhor as segundas bolas, ganhávamos a posse mas voltávamos a colocar-nos em zonas de pressão. O que quisemos alterar teve mais a ver com esses caminhos ofensivos do que defensivos.