Académico de Viseu: um (falso) candidato com um projeto perdido

O Académico de Viseu apresentou-se em 2025/26 novamente como um dos candidatos à promoção à Primeira Liga, embora a tímida temporada de 2024/25 colocasse algumas dúvidas nos adeptos em relação a esse estatuto. O emblema beirão optou por manter Sérgio Vieira no cargo, depois do clube ter terminado a última edição da Segunda Liga no décimo posto, com somente 45 pontos. O técnico conseguiu apenas quatro triunfos em 18 partidas, assistindo semana após semana a um Fontelo cada vez mais despido e com menos crença em relação ao projeto.

Ao mesmo tempo, o Académico de Viseu viu o Tondela, máximo rival da região, ser promovido à Primeira Liga, com uma ideia sustentada e longe de ter um orçamento megalómano. Acima de tudo, no João Cardoso existiu organização e alinhamento, algo que faltou pela capital da Beira Alta, que tem capacidade de contar com um emblema do principal escalão do futebol nacional.

Estamos em outubro de 2025 e a época do Académico de Viseu parece que já acabou. A aposta em Sérgio Vieira revelou-se um ‘tiro no pé’, o que não foi novidade para ninguém. Oito encontros, duas vitórias, exibições de um nível baixo (que não valem de perto o preço do bilhete), decisões técnico-táticas sem qualquer explicação (ver Messeguem perto da linha é de estranhar) e um discurso pobre e pouco convincente por parte do chefe da equipa técnica culminaram num 15.º lugar ao cabo de sete rondas.

Nikos Michelis Académico de Viseu
Fonte: Paulo Ladeira/Bola na Rede

O despedimento de Sérgio Vieira foi celebrado nas redes sociais, mas a culpa do estado do clube está longe de ser apenas do minhoto. O mau futebol e os resultados medíocres são fruto de outros fatores e aí terá que se apontar o dedo à estrutura. Estrutura essa que não vem a público falar e a responder às questões importantes feitas pelos sócios e adeptos. A ausência de um porta-voz dentro do Académico de Viseu, depois de uma série de épocas pouco conseguidas, causará um sentimento de revolta a quem vai ao Fontelo que será difícil de descrever. Os problemas têm que ser admitidos e falados. O silêncio não resolve nada, apenas faz afastar o clube (neste caso a SAD) de quem apoia a instituição.

A Hobra apresentou-se em Viseu com um projeto ambicioso e que animou o universo academicista durante alguns meses. Jorge Costa deixou o Académico perto de uma promoção, mas até na saída do malogrado antigo internacional português houve conflitos e uma desconfiança de que a verdade nunca viria ao de cima. Até hoje, não se soube o que levou verdadeiramente à saída do treinador e possivelmente o tema acabará por cair no esquecimento, porque a imagem de alguém certamente sairá afetada. Resta saber de quem.

Contudo, durante essas épocas, era inegável a existência de um projeto e de uma linha, ainda que o mesmo passasse pela valorização de ativos, em detrimento dos resultados desportivos. Hoje em dia, nem isso existe. Pedro Bessa, diretor desportivo do Académico de Viseu, é acusado pelos adeptos como o grande culpado de toda esta situação e, a meu ver, parte da aura negativa vivida no clube tem o seu dedo (o seu histórico não abona a seu favor). O mercado do Académico de Viseu não tem qualquer lógica nem linha de pensamento. Torna-se inevitável pensar em jogadas de bastidores com empresários, com a colocação de atletas no emblema da Segunda Liga sem qualidade para tal, algo a que estamos habituados a que aconteça em vários clubes e que é absolutamente normal. Porém, num projeto vencedor a maioria de um plantel não pode ser composto assim. Um emblema terá que ter os seus alvos principais mais do que identificados antes do verão, com contactos já estabelecidos. É natural que o Académico de Viseu (ou uma instituição do seu estatuto) não consiga a contratação de todos os elementos que deseja, mas a existência de um plantel sombra deve-se mesmo a isto.

Nils Mortimer e Álvaro Zamora Académico de Viseu
Fonte: Paulo Ladeira/Bola na Rede

Os viriatos contam com uma autêntica Sociedade das Nações no seu plantel, com 12 nacionalidades diferentes e várias línguas a serem faladas dentro do balneário. O jogador estrangeiro é mau? Nada disso, mas a ligação entre os elementos é importante. No Tondela promovido em 2024/25, existiam apenas sete nacionalidades distintas. Com 25 jogadores a terem o português como sua língua de base, além da presença de um espanhol.

O Académico de Viseu não seguiu a linha de outros emblemas da Primeira e Segunda Ligas, fechando em 2025/26 a porta ao mercado espanhol, arma do sucesso de vários clubes, como por exemplo o Torreense, que é destaque pela positiva. O atleta castelhano (ou proveniente dos campeonatos do país vizinho) não é uma garantia de sucesso a 100%, mas os resultados estão à vista, tudo depende do grau de análise realizado. Até dentro do Fontelo houve um fruto desta aposta. Nikos Michelis foi um dos poucos jogadores em destaque de 2024/25 pelos lados do histórico da Beira Alta e chegou do Mirandés. Nils Mortimer, pelo contrário, está longe de convencer, mas a sua utilização no meio campo ou perto do mesmo(promovida por Sérgio Vieira) não ajuda, já que o internacional jovem espanhol é um extremo de origem.

Pedro Bessa e a restante estrutura do Académico de Viseu não apresentam coerência no que ao mercado diz respeito e na Segunda Liga é fundamental que a mesma exista. A janela de transferências é protagonizada por sucessivas chegadas de jogadores para os Sub-19 e Sub-23 (são apresentados ‘às paletes’) na esperança que algum vingue e seja capaz de ser promovido à equipa principal. Atualmente, depois de dezenas de contratações do género, existem três jogadores nos A’s do Académico de Viseu que conseguiram realizar tal percurso: Matheus Sampaio, Gu Costa e Simão Silva. Não teria sido melhor ter dado mais atenção à análise de jogadores mais velhos ou que seriam integrados desde o começo nos seniores? A aposta num plantel de Sub-23 está 100% correta, mas uma equipa com 38 elementos não faz bem a ninguém, mesmo que em termos de resultados funcione. Neste ponto, é normal que os adeptos voltem a desconfiar da colocação de atletas por parte de empresários.

Álvaro Zamora Académico de Viseu
Fonte: Paulo Ladeira/Bola na Rede

O plantel do Académico de Viseu está bem longe de ser espetacular e o mercado de verão fez com que algumas linhas perdessem qualidade. É de elogiar a contratação de centrais experientes no setor e com conhecimento acima da média da Segunda Liga, mas os restantes nomes ficaram a desejar. Álvaro Zamora é a exceção. A situação entre Bruno Brígido e Donen Gril merecia um artigo somente para a mesma. O esloveno está patamares acima do brasileiro, mas o ex-Estrela da Amadora continua a ser aposta, mesmo com erros básicos sucessivos, o que causa estranheza nas bancadas.

Desde cedo que se anteviu que Sérgio Vieira não era treinador para este tipo de projeto e o Académico de Viseu tem em outubro de 2025 uma excelente oportunidade para começar uma mudança profunda, para que seja mesmo uma ideia realista uma candidatura à promoção à Primeira Liga. Mariano López, presidente da SAD, terá que definir o novo técnico (saindo da premissa que Sérgio Fonseca é apenas um nome temporário, dada a sua falta de resultados no futebol sénior) com a ideia de que o mesmo terá que encaixar no estilo de jogo que quer ver dentro do relvado. Vamos assistir no Fontelo a um futebol baseado na posse ou no contra-ataque? Que jogadores encaixam melhor nas respetivas ideias? Todas as peças têm que fazer sentido, na consciência de que tal mudança não será feita numa semana ou sequer num mês. A chave será a paciência na evolução e os adeptos precisam de ser convencidos disso. Porém, alguém da estrutura terá que dar a cara pela ideia que se pretende seguir e esclarecer os sócios. Pedro Bessa tem o seu nome desgastado em Viseu e a sua saída provavelmente melhoraria toda a situação e o novo líder do futebol terá que entender que a sua missão vai mais além de escolher reforços ou acompanhar os treinos. Terá que montar todo um projeto que siga uma linha com sentido e que não seja ‘cancelável’ à primeira má série de resultados.

O Académico de Viseu terá que ligar-se novamente com a cidade, algo que conseguiu fazer num passado recente. Vitórias e bom futebol são algo fundamental para que tal aconteça. Para que serve uma apresentação pomposa do plantel, quando dentro de campo a atitude de vários jogadores está perto do zero? A missão de devolver a esperança aos atletas passará igualmente pelas mãos do futuro treinador, numa era em que o aspeto psicológico é cada vez mais importante.

Se ao dia 7 de outubro de 2025, o Académico de Viseu aparenta um cenário de ser um clube sem um rumo, onde uma despromoção à Liga 3 é mais realista que uma promoção à Primeira Liga, muito se deve à falta de qualidade da estrutura e a uma série de decisões erradas tomadas pela mesma. 2025/26 possivelmente já está perdido, mas os viseenses têm uma oportunidade de montar algo que possa funcionar a longo prazo.

Sérgio Vieira
Fonte: Ana Beles / Bola na Rede
Ricardo João Lopes
Ricardo João Lopeshttp://www.bolanarede.pt
O Ricardo João Lopes realizou a sua formação na área da História, mas é um apaixonado pelo desporto (especialmente pelo futebol) desde criança, procurando estar sempre a par da atualidade.

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