
Se houve um clube que marcou o último mercado de transferências foi o Vitória SC. O histórico do Minho, crónico candidato ao apuramento para as competições europeias, começou um novo ciclo com a chegada de Luís Pinto ao comando técnico, após ter realizado um trabalho brilhante com o Tondela. Depois de uma temporada com três treinadores distintos, era notório que António Miguel Cardoso e restante direção da equipa de Guimarães teria que começar um projeto, ainda que o plantel contasse com pedras basilares. Algo que sempre esteve presente nas equipas dos conquistadores eram jogadores que sentissem verdadeiramente o clube, mesmo sendo formados bem longe de Guimarães. Tiago Silva, Bruno Varela, Samu Silva, Nuno Santos ou Tomás Handel são exemplos demonstrativos disto. De branco, sempre deram o seu máximo.
Havia inclusivamente um certo entusiasmo como a nova época do Vitória SC (como existe sempre, embora não fique na memória), com a ilusão de que em 2025/26 o conjunto poderia lutar pelo Top 4, algo adensado pela chegada de Carlos Vicens ao Braga, já que o espanhol era um pleno desconhecido. Sem provas europeias, a equipa teria igualmente um calendário mais folgado e com mais tempo de descanso. O mercado de transferências realizado pelos conquistadores acabou com estas expectativas e as atitudes tomadas causaram surpresa entre os adeptos.

Não está só em causa a quantidade de saídas existentes do plantel. O julgamento faz-se através do timing das vendas e da quantia de dinheiro recebida por elas. Era um facto de que o plantel do Vitória SC iria sofrer mexidas, embora se esperasse a manutenção de várias pedras basilares. A saída de Bruno Varela praticamente se dava como um facto, tal como a de Toni Borevkovic. Mikel Villanueva e João Mendes terminavam contrato e os aficionados eram conscientes que iam rumar a outras paragens. Porém, as mudanças de Tiago Silva, Nuno Santos ou Filipe Relvas não eram aguardadas. O espanto aumenta quando se verifica o valor pelo qual estes jogadores foram negociados. Eis o valor de algumas das vendas do Vitória SC:
- Bruno Varela- 500 mil euros
- Toni Borevkovic- 1 milhão de euros
- Filipe Relvas- 3,25 milhões de euros
- Tomás Handel- 3,1 milhões de euros
- Nuno Santos- 1 milhão de euros
- Tiago Silva- custo zero
Esta pequena lista enfureceu os adeptos e os especialistas do mundo do futebol continuam sem perceber o que levou António Miguel Cardoso a realizar tais negociações. Afirmar que isto é gestão danosa pode não ser descabido. Os jogadores podiam ter saído do D. Afonso Henriques por verbas substancialmente superiores, garantindo ao Vitória SC mais capital em caixa. Verifiquemos o valor de mercado precisamente dos jogadores (dados Transfermarkt):
- Bruno Varela- 2,5 milhões de euros
- Toni Borevkovic- 5 milhões de euros
- Filipe Relvas- 3 milhões de euros
- Tomás Handel- 13 milhões de euros
- Nuno Santos- 2,5 milhões de euros
- Tiago Silva- 3 milhões de euros

Somente no caso de Filipe Relvas o Vitória SC conseguiu ‘ficar a ganhar’. Nos restantes, os representantes do clube poderiam ter conseguido negócios que dessem outro tipo de rendimento aos minhotos. O exemplo de Tomás Handel é possivelmente o mais grave. Em janeiro foi associado ao AC Milan e ao FC Porto, mas em agosto termina na Sérvia, ao serviço do Estrela Vermelha, que, embora um histórico, está longe de ter uma dimensão europeias dos citados anteriormente. No caso de Tiago Silva, como se pode deixar um médio de tal qualidade sair a custo zero (sendo que foi associado ao Sporting de Rui Borges), quando o mesmo queria terminar a carreira no D. Afonso Henriques?
António Miguel Cardoso vendeu extremamente mal e falhou no tempo de venda. O mercado de transferências começa oficialmente a 1 de julho, para terminar no começo de setembro (prolonga-se em vários países, como na África do Sul, para onde rumou Nuno Santos). O Vitória SC até poderia vender todos estes atletas (o que não seria igualmente correto), mas numa fase mais embrionária do mercado, de modo a ter tempo de conseguir contratar substitutos, de maneira a que o valor do plantel não caísses drasticamente, o que acabou por acontecer. Jogadores que iriam ser suplentes viram-se surpreendidos com um posto no onze titular quando ainda não estariam prontos para tal.
Segundo o Transfermarkt, o valor de mercado do plantel do Vitória SC é de 26 milhões de euros, quando no final da última temporada estava perto dos 50 milhões de euros. Foi uma queda de 50%. Na Primeira Liga 2025/26, o Vitória SC é apenas o 13.º classificado neste aspeto, atrás inclusivamente de um recém-promovido (Alverca- 29,63 milhões de euros).

Por curiosidade, a equipa que está no quinto lugar (posto ao qual o Vitória SC é sucessivamente apontado) é o Famalicão, que tem uma equipa avaliada em 62,3 milhões de euros. Isto é fruto do bom trabalho de Miguel Ribeiro ao serviço da SAD, que conseguiu negociar de forma exímia os ativos do Famalicão nos últimos anos, precisamente o inverso realizado por António Miguel Cardoso, que deixou os adeptos desesperados e surpreendidos com as atitudes tomadas. Estamos a falar de um clube vendedor, tal como todos os portugueses. O Real Madrid não tem a obrigação de olhar para os valores de mercado. O Vitória SC, tem. O dinheiro que existe em caixa é fundamental para todos os prazos.
O presidente tentou ainda justificar algumas saídas:
«Precisávamos de ter uma equipa mais jovem, com «fome». Precisávamos de menos vaidade no balneário. Para se sustentar, o Vitória precisava desta mudança. Estamos convencidos de que é o melhor para o Vitória e de que o futuro vai ser risonho».
Resultado destas declarações? A troça de alguns jogadores nas redes sociais e as críticas dos aficionados nas redes sociais. António Miguel Cardoso deixou de ser uma figura popular no seio vimaranense (se é que algum dia o chegou a ser). Já era sabido que o presidente tinha pouca paciência para os treinadores, com o caso Daniel Sousa e ser a bandeira de tal caraterística. Porém, ser um crítico de jogadores que tanto deram com D. Afonso Henriques ao peito, foi novidade.
Os resultados de tal política estão à vista. À segunda paragem de seleções, o Vitória SC ocupa o modesto sétimo lugar, com 11 pontos, não conseguindo aproveitar o começo com o pé esquerdo do rival Braga, e vendo outras equipas a transformarem-se em ser potenciais rivais pelo quinto posto, como Moreirense, Gil Vicente ou Famalicão (este mais esperado), sendo que todas elas praticam um futebol com carisma e que dá gosto em acompanhar. Luís Pinto tem pouca culpa no cartório. Chegou com créditos ao norte do país e foi surpreendido por uma debandada provocada pela direção desportiva.

Nomes como Rodrigo Abascal, Orest Lebedenko, Matija Mitrovic ou Fabio Blanco trouxeram qualidade, isso é inegável, mas precisam de competição nas suas posições para poderem crescer e melhorar. A equipa do Vitória SC tem potencial, mas não era apenas isso que se pedia. Um centro de campo com Beni Mukendi, Samu Silva, Diogo Sousa, Gonçalo Nogueira e Matija Mitrovic tem uma média de idades muito baixa. Alioune Ndoye e Nélson Oliveira não têm números de goleadores e cabe-lhes a responsabilidade de fazer golos (Jesús Ramírez voltou ao Nacional da Madeira e está novamente a revelar-se um matador, mas no D. Afonso Henriques não funcionou). A pobreza dos números mostra tudo: nove golos marcados e 12 sofridos. Tais valores são acompanhados por uma pobreza de jogo que antes não se via por Guimarães.
Não é garantido que o Vitória SC conseguisse ter mais pontos, caso não adotasse a política que assumiu, mas a probabilidade é grande. Teremos ainda que esperar mais de dois meses para verificarmos se António Miguel Cardoso vai corrigir os erros, investindo em reforços para o imediato, mas o cenário da aposta na formação é a tendência (não que esteja errado apostar na formação, mas tem que existir alguma contenção e adaptação à realidade). Outra questão é a manutenção de Luís Pinto no cargo. O presidente dos minhotos não é o mais paciente e o técnico tarda em obter resultados, ainda que sem ovos não consiga fazer omeletes. 2025/26 podia ser uma época em grande para o Vitória SC, mas ficou danificada logo em agosto. Haverá tempo para efetuar correções?
