O dia 25 de outubro de 2025 prometia ficar gravado na história do Benfica e do futebol mundial. Em causa estava o futuro do emblema da Luz, dividido entre a continuidade e a mudança de rumo. Antes das eleições, as entrevistas e debates dominaram a agenda dos sócios encarnados, que viram seis candidatos prontos a liderar o clube do seu coração: Cristóvão Carvalho, João Diogo Manteigas, João Noronha Lopes, Luís Filipe Vieira, Martim Mayer e Rui Costa figuravam nos boletins de voto.
Nem o tempo instável conseguiu travar o entusiasmo benfiquista. Rapidamente se percebeu que o recorde de participação em eleições — a nível nacional — seria batido. Contudo, os sócios foram mais longe, superando a marca registada no ato eleitoral do Barcelona em 2010, quando Sandro Rosell sucedeu a Joan Laporta. O sufrágio encarnado tornou-se, assim, a eleição mais concorrida do mundo no contexto dos clubes desportivos.
Ao todo, 85.422 votantes deslocaram-se às urnas entre as 8h30 e as 22h, prontos a exercer o seu direito e dever. Em longas filas, ouvia-se que o 25 de outubro poderia ser o “25 de Abril” da instituição que se orgulha de ser uma democracia. De um lado, sopravam ventos de mudança; do outro, pedia-se uma segunda oportunidade a quem dedicou a vida ao clube.


Foi um dia pleno de Benfica, com as águias a entrarem em campo frente ao Arouca, num encontro que terminou em festa, com um expressivo 5-0. Após o apito final, os arredores do Estádio da Luz esvaziaram-se, à medida que a chuva se intensificava. Os sócios já sabiam que a contagem seria longa, mas ninguém previa a espera que se seguiu.
Nas primeiras horas, João Noronha Lopes ganhou vantagem, conquistando o voto dos benfiquistas nas primeiras urnas apuradas — sobretudo provenientes de comunidades fora de Portugal. No início da madrugada, o cenário dava uma vantagem sólida ao gestor, e grande parte dos associados foi dormir convencida de que o triunfo da Lista F seria uma realidade ao amanhecer. Nada mais longe da verdade.
Rui Costa virou o resultado à medida que chegavam os votos das várias cidades portuguesas. A cada hora que passava, o antigo médio alargava o fosso de forma praticamente irreversível, dominando em todas as regiões do país, do norte ao sul.
Rui Costa (42,13%) e João Noronha Lopes (30,26%) foram os mais votados, numa decisão divulgada no site oficial do Benfica às 17h30 — 19h30 após o encerramento das urnas. O anúncio foi feito através da plataforma digital do clube, e não por José Pereira da Costa, presidente da Mesa da Assembleia Geral, que permanecera na Luz desde as 8h30 de sábado.


O ex-médio venceu em todos os círculos eleitorais nacionais, exceto em Paço de Arcos e no Pavilhão nº2 da Luz. O atual presidente aplicou uma “finta” das antigas, deixando o adversário praticamente fora de jogo. João Noronha Lopes mantém maior apoio entre os sócios mais jovens, detentores de menos votos, o que se revelou insuficiente para travar o rival — ainda que tenha reunido mais votantes na Luz e no estrangeiro. Rui Costa, por sua vez, consolidou o apoio da “velha guarda” e dos associados com maior poder de voto, o que acabou por ser decisivo. A diferença não foi ainda mais expressiva devido à presença de Luís Filipe Vieira na corrida.
As sondagens antecipavam um “terramoto eleitoral” no Benfica, com a possibilidade de segunda volta e João Noronha Lopes em vantagem. No entanto, o candidato derrotado de 2020 não conseguiu convencer o eleitorado mais decisivo, composto por vários escalões de voto. Ainda assim, terá mais duas semanas para tentar fazê-lo, até porque é visto como o candidato da mudança e do “fim do regime”.
Luís Filipe Vieira e João Diogo Manteigas, ao contrário de Martim Mayer e Cristóvão Carvalho, continuam a ter margem de influência nestas eleições. O antigo presidente terminou a primeira volta em terceiro lugar, com 13,86%, enquanto Manteigas atingiu os 11,48%, assegurando a quarta posição.


Ambos esperavam uma prestação superior, mas a força de Rui Costa e João Noronha Lopes diluiu o seu eleitorado. Vieira mantém peso histórico no clube, mas as polémicas do passado não se apagam de um dia para o outro. A sua postura apática e discurso centrado nas vitórias do passado, independentemente dos meios, afastaram parte dos sócios.
João Diogo Manteigas apresentou-se como uma figura fresca, de postura aberta e discurso convincente, mas a comparação nas redes sociais ao “novo Bruno de Carvalho” gerou desconfiança. Apesar dos resultados modestos, o seu apoio pode revelar-se decisivo na segunda volta.
Vieira integra a ala da “continuidade”, e é expectável que os seus apoiantes se inclinem para Rui Costa, podendo o próprio ex-presidente apelá-lo publicamente. Já Manteigas pertence ao campo da “renovação”, sendo João Noronha Lopes o destino natural dos seus votos.


Martim Mayer e Cristóvão Carvalho foram os elos mais frágeis da corrida. O primeiro alcançou apenas 2,1% dos votos, nunca demonstrando total à-vontade ao explicar o seu projeto, centrado na figura de Andries Jonker e com António Simões como mandatário — apoio que, contudo, não bastou para convencer o eleitorado.
Já Cristóvão Carvalho não ultrapassou os 0,18%, e o seu discurso entusiástico não resistiu ao crivo dos sócios. As promessas de tentar trazer Jürgen Klopp e investir 100 milhões de euros soaram irrealistas e desfasadas da atualidade. O advogado acabou por representar um tipo de candidato dos anos 90, quando o que os adeptos procuram hoje são projetos modernos, sustentáveis e credíveis.
No dia 8 de novembro, as urnas voltarão a abrir, com uma diferença de cerca de 12% entre Rui Costa e João Noronha Lopes.
Para alguns, a eleição será uma mera formalidade; para outros, a esperança de uma reviravolta mantém-se viva. Prevê-se novamente uma forte afluência e um dia verdadeiramente à Benfica. No final — seja do dia, da noite ou até do seguinte — apenas uma lista sairá vitoriosa.



