
Em todos os países, na área do futebol, existe uma série de títulos para conquistar. O Campeonato e a Taça nacional são os mais importantes, existindo igualmente a Supertaça e eventualmente uma Taça da Liga. Alguns emblemas ainda têm a proeza de conseguir disputar competições internacionais, o que leva a um aumento de troféus que pode erguer no final de uma temporada desportiva. No mundo das seleções, existem as taças continentais e intercontinentais, geralmente mais curtas e com uma fase qualificação. Porém, concentremo-nos nos clubes.
Pegando no exemplo de Portugal ou Inglaterra, podemos ter no máximo quatro vencedores distintos de competições. Em Espanha, Itália ou Alemanha apenas são três, isto excluindo escalões inferiores. Quando termina uma época, ou um projeto chega à sua fase final, há sempre adeptos clássicos, que gostam mais de olhar para o palmarés do que para o jogo em si, que defendem o seguinte:
«O X treinador /a Y equipa pode ser muito bom(a), mas não se ganhou nada…»
O futebol pode medir-se por resultados, isso é um facto. Porém, nunca nos podemos esquecer que apenas uma equipa ganha no fim. Quanto muito quatro em Portugal/Inglaterra e três em Espanha/Itália/Alemanha. Isto significa que o sucesso somente chegou a esses emblemas? Aos olhos destes aficionados, aparentemente sim, mas a resposta mais correta é o não.
Este debate ganhou peso devido à passagem de Jurgen Klopp pelo Liverpool. Foram praticamente nove temporadas completas, depois de um largo sucesso no Borussia Dortmund e Mainz. Pelas terras de Sua Majestade, levantou Uma Premier League, uma Taça da Liga, uma Taça de Inglaterra e uma Supertaça, além de uma Champions League. Há duas maneiras de olhar para isto. Verificar que são cinco títulos em nove épocas e defender que é manifestamente pouco, já que é uma turma que investiu forte no mercado de transferências e a reputação do germânico, visto com o grande rival de carreira de Pep Guardiola, é alta desde os anos 2010. Ou então verificar todo o contexto. O Liverpool antes da chegada de Jurgen Klopp era uma equipa extremamente irregular, que quase nunca conseguia lutar pela Premier League. O mais perto que conseguiu foi o segundo posto em 2013/14, com a inesquecível escorregadela de Steven Gerrard. Entre 2009/10 e 2014/15, época anterior a Jurgen Klopp, o Liverpool apenas por uma vez (precisamente 2013/14) conseguiu entrar no top 5 do campeonato inglês.
Era sem dúvida um gigante adormecido, que passou de lutar pelo título para ser uma equipa que queria o apuramento para a Liga Europa, algo que não caía bem no seio dos aficionados. Porém, com Jurgen Klopp, que entra a meio de 2015/16, apenas nessa época ficaram fora do top 5, conseguindo estar no top 3 por cinco ocasiões. Uma evolução brutal de um técnico e de uma estrutura, maioritariamente liderada por Michael Edwards, que fez com que o Liverpool regressasse a outro patamar.
Uma outra forma de comprovar o sucesso deste projeto, não apenas de Jurgen Klopp é a comparação dos onzes iniciais do Liverpool à sua chegada, no seu prime e na sua despedida.
Primeiro jogo- Tottenham vs Liverpool: Mignolet; Clyne, Skrtel, Sakho, Moreno, Lucas Leiva, Can, Lallana, Milner, Philippe Coutinho, Origi.
Final Champions League 2018/19- Liverpool x Tottenham: Alisson, Trent Alexander-Arnold, Van Dijk, Matip, Roberton, Fabinho, Jordan Henderson, Wijnaldum, Salah, Mané, Firmino.
Último jogo- Liverpool x Wolverhampton: Alisson, Trent Alexander-Arnold, Van Dijk, Quansah, Robertson, Wataru Endo, Harvey Elliot, Alexis Mac Allister, Salah, Luis Díaz, Cody Gakpo.
A evolução entre o primeiro onze inicial e o da final da Champions League é brutal, já que este último contava com alguns dos melhores jogadores do mundo dessa fase. E isto explica o sucesso de Jurgen Klopp, mesmo com ‘poucos’ títulos. O alemão conseguiu reconstruir um clube, dando-lhe de volta uma identidade, que não se fazia sentir. Isto fora o facto dos reds conseguirem praticamente sempre fazer uma quantidade enorme de pontos, mesmo batidos pelo Manchester City.
Pensemos num nível interno e olhemos ao caso Rúben Amorim. Imaginemos por uns momentos que a Primeira Liga 2023/24 tinha caído para o Benfica de Roger Schmidt e o Sporting tinha ficado em segundo lugar. Teria conquistado um campeonato, duas Taças da Liga (que pouco ou anda conta) e uma Supertaça. Em termos de palmarés, pode ser considerado curto, dada a grandeza do emblema. Porém, tal como no exemplo de Jurgen Klopp, a turma de Alvalade ganhou outro rosto com o antigo médio do Benfica e a sua continuidade seria desejada pela maioria dos adeptos, mesmo com a perca do título para o outro lado da Segunda Circular.
Com isto não se quer dizer que vencer títulos não importa, é igualmente relevante. Mas é a consequência de um trabalho que tem outras maneiras de ser medido. Olhando para o Real Madrid, claro que o objetivo será ganhar tudo e uma época sem uma celebração será um tremendo insucesso. Porém, este exemplo não ilustra a maioria dos casos. Não há nem meia dúzia de emblemas que podem pensar assim: PSG, Bayern Munique, Manchester City e Real Madrid. Num segundo patamar aparece o Inter Milão, a Juventus, o Barcelona (mesmo coma crise que vive), o Liverpool (de hoje em dia)…
Em certos casos, a disputa de troféus não mede a capacidade de um treinador. Gareth Southgate é o perfeito exemplo disto. Chegou a duas finais de Campeonatos da Europa e a uma semifinal de um Mundial. Estes bons resultados, dado a prateleira de conquistas da seleção inglesa são satisfatórios. Porém, o antigo atleta desperdiçou uma grande geração, que tinha praticamente obrigação de chegar à final do Euro 2024, depois de ter calhado no lado mais fácil do quadro, mas que por sorte não foi eliminado por Eslováquia ou Suíça. Inglaterra não ganhou praticamente nenhum desafio contra turmas do seu nível com Gareth Southgate ao comando. Salvam-se uns oitavos de final no Euro 2020, contra a Alemanha. Até à final, em que perdeu com a Itália, jogou contra Ucrânia e Dinamarca. No Mundial 2018, bateu na fase a eliminar a Colômbia e a Suécia, perdendo com a Croácia. Já no de 2022 venceu o Senegal e a França mandou-a para casa. Gareth Southgate tem finais, mas pouco sumo, mesmo com tudo nas suas mãos para vencer pelo menos uma competição.
Como conclusão, vencer troféus obviamente que é importante, mas o mundo do futebol vai além disto. Tem que se saber o que se passa dentro e campo, praticar um futebol com uma ideia, dar uma identidade ao clube, criar uma relação entre o projeto e os aficionados, desenvolver a cantera, etc. Há muitos ‘medidores’ que devem ser tidos em conta para verificar se X ou Y tem sucesso. Títulos? Se formos por aí, apenas há meia dúzia de clubes a atingir os objetivos e a merecerem o aplauso. Felizmente, não funciona assim.