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«Um treinador com o meu perfil e com o meu percurso não pode estar parado muito tempo» – Entrevista Bola na Rede a Ricardo Silva

Ricardo Silva concedeu uma entrevista ao Bola na Rede, na qual refletiu sobre a experiência no Paços de Ferreira, as subidas no Vilaverdense, o seu método de trabalho e a sua visão do futebol português.

«O objetivo é continuar num projeto de Segunda Liga ou, idealmente, dar o salto para a Primeira Liga».

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Bola na Rede: Ricardo Silva, bem-vindo. Está atualmente sem clube. Sente que foi uma pausa necessária ou já ente vontade de voltar ao ativo?

Ricardo Silva: Um treinador com o meu perfil e com o meu percurso não pode estar parado muito tempo. Claro que um ou dois meses sabem bem, servem para nos reprogramarmos, reinventarmos, perceber o que fizemos bem e o que fizemos mal. Mas depois de sete meses já começa a ser cansativo. Estamos completamente focados naquilo que poderá ser o próximo passo, mas também é importante que surja no momento certo e com as pessoas certas. Já tivemos uma paragem longa o suficiente para dizer:«Ok, chega, estamos preparados». Queremos abraçar algo em condições e para mim isso significa dentro da lógica do futebol profissional. Não desvalorizando a Liga 3, onde conseguimos subir e fazer um bom trabalho, o objetivo é continuar num projeto de Segunda Liga ou, idealmente, dar o salto para a Primeira Liga. Mas o mercado está difícil, nos últimos anos aumentou muito o número de treinadores estrangeiros nas duas primeiras ligas e isso mexe muito com as oportunidades disponíveis.

Bola na Rede: Referiu a presença crescente de treinadores estrangeiros. Equacionaria fazer o contrário e treinar fora de Portugal?

Ricardo Silva: Sim, se for um projeto bem montado. Nunca iria só pela vertente financeira. Normalmente quando se fala em ir para fora, muitos treinadores pensam logo no lado económico, porque há muitos países onde se paga melhor do que cá. Eu continuo muito ligado à parte competitiva, no jogo. Ainda me motiva muito trabalhar com os jogadores e ajudá-los a evoluir. Agora, ir para mercados como o Médio Oriente apenas por dinheiro, sabendo que os clubes com maior poderio estão ocupados por treinadores de altíssimo nível, não faria sentido neste momento. O meu foco está naquilo que faz sentido desportivamente e que se enquadre na minha forma de liderar e de estar no jogo.

Bola na Rede: Quanta importância atribuiu à forma como os jogadores experientes ajudam no desenvolvimento de jogadores mais jovens?

Ricardo Silva: É fundamental. No caso do Gorby, por exemplo, no Paços, o jogador que mais o influenciou foi o Luís Carlos. Jogavam na mesma posição, viajavam juntos de Braga para Paços e criaram uma proximidade muito grande. O Gorby chegou num momento difícil e vinha com muitas expectativas por ser um jogador que vinha da equipa B do Braga, com alguns minutos na principal, e sentia que ia jogar de início connosco. Nos primeiros três ou quatro jogos não foi titular. Mais tarde, teve oportunidade num jogo da Taça de Portugal, fez uma exibição que aquém do esperado a nível de entrega e a equipa acabou por perder. Eu, enquanto treinador, tive de lhe dizer coisas que ele não gostou de ouvir. Mas depois, através de uma ferramenta que usámos para analisar o jogo, percebemos que ele afinal tinha corrido muito, mas mal, não seguindo o plano de jogo. Fizemos todos (equipa técnica) um mea culpa, e no jogo seguinte ele foi titular. A partir daí agarrou o lugar, fez uma época incrível, evoluiu muito como jogador e como pessoa. Hoje está de pedra e calo na equipa do Braga. Esse momento podia tê-lo deitado a baixo, mas felizmente não deixámos que isso acontecesse. O Luís, pela experiência e forma tranquila de estar ajudou-o muito. Claro que há também os líderes mais ruidosos e assertivos que fazem falta também em alguns momentos. Mas tive a sorte de ter vários jogadores com esse perfil, como o Antunes, Rui Fonte, Marcos Paulo, Ícaro, Marafona. Mas também sinto que, hoje em dia, os jogadores mais velhos estão mais preparados pata ajudar os mais novos. Já não há tanto aquela liderança pela força ou praxe, é uma liderança de entreajuda e empatia.

«O presidente Paulo Meneses sempre me disse que ia conseguir um investidores para ajudar a pôr o clube na Primeira Liga».

Bola na Rede: Que balanço faz da sua passagem pelo Paços de Ferreira?

Ricardo Silva: Cheguei numa fase muito difícil do clube. O Paços vinha de uma descida de divisão dura, com sete derrotas seguidas e problemas financeiros. No início o ambiente era pesado. Tivemos de reconstruir quase tudo: o grupo, a energia, o foco. Entrámos tarde na preparação e com limitações financeiras, o que dificultou o processo de recrutamento. As expectativas eram altas, porque o Paços é um histórico e o adepto pensa logo em subida, mas internamente sabíamos que seria quase impossível no imediato. Mesmo assim, conseguimos montar um bom grupo, com jovens de qualidade e gente experiente que deu o exemplo. Foi um ano de muita aprendizagem e de resiliência. Fomos das equipas no top 2 ou 3 que praticavam melhor futebol e tivemos um excelente período na segunda volta do campeonato. A falta de consistência na primeira metade da prova custou-nos caro, tendo acabado a 10 ou 12 pontos da subida de divisão, mas também com alguma distância para as equipas que terminaram abaixo de nós. Penso que tínhamos uma equipa totalmente preparada para atacar a subida de divisão na segunda época.

Bola na Rede: E foram surgindo convites durante esta experiência?

Ricardo Silva: Em maio tive dois convites, um formal e outro nem tanto. Um de um clube de primeira divisão no contexto de manutenção e outro de um clube de segunda divisão com projeto de subida. Porém, tínhamos mais um ano de contrato e acabamos por respeitar aquilo que foi a vontade da direção. O presidente Paulo Meneses sempre me disse que ia conseguir um investidores para ajudar a pôr o clube na Primeira Liga. A intenção era que isso acontecesse logo no dia 1 de julho da segunda época e nunca chegou a acontecer. Com tudo isto acabámos por perder praticamente a equipa titular toda da época anterior. Acabámos por fazer até uma equipa interessante, tendo em conta as limitações, mas uma pré-época extremamente difícil, com 12 ou 13 jogadores juniores a treinar com a equipa. Anrrancámos o primeiro jogo em Mafra com uma vitória graças ao espírito incrível que tínhamos no balneário que afirmou que estávamos ali para lutar com as armas que tínhamos. Quando se fechou o mercado, senti que o grupo acabou por cair um pouco na desilusão, sobretudo os mais velhos, por existir a promessa e a crença de que poderíamos ter algo mais para lutar nessa época.

«Vilaverdense? Remodelámos a equipa e fizemos um plantel espetacular».

Bola na Rede: Conseguiu um feito invejável para outros treinadores no Vilaverdense, duas subidas em épocas consecutivas. Quão difícil foi e como conseguiu fazê-lo?

Ricardo Silva: Difícil. No primeiro ano éramos “candidatíssimos”, o clube montou-se na época anterior a mim e eu tive a sorte de não fazer esse trabalho. Montámos um plantel à nossa maneira, dentro daquilo que era o contexto do CP (Campeonato de Portugal) e tivemos uma fase regular praticamente imaculada, vencendo-a. Na fase final demorámos um pouco a arrancar, porque vínhamos de um contexto muito vitorioso e encontramos maior competitividade e não estávamos completamente preparados para ele. Acabámos por perder e empatar nos dois primeiros jogos, mas depois voltámos a ligar os motores e a ter resultados muito positivos. O grupo era extraordinário e ficou muito próximo pelas circunstâncias da temporada, como por exemplo, um caso de um jogador que apanhou COVID e tivemos todos de fazer quarentena de 3 ou 4 dias todos juntos. Momentos como estes criaram uma conexão brutal e o grupo nunca mais se desligou uns dos outros. Mas é muito difícil ser candidato e subir de divisão, principalmente em divisões inferiores porque é difícil ganhar o calibre e a confiança desse estatuto em contextos amadores. Na Liga 3 foi completamente diferente. Remodelámos a equipa e fizemos um plantel espetacular, mas no início ninguém dava nada por nós. Munimo-nos de jogadores que estavam com fome, entre os 23 e os 24 anos que estavam a fazer um CP bom e trouxemos também jogadores experientes nas posições certas, o Ivo Gonçalves, o Ericson, André Soares, ou até o Zé Pedro, que foi um jogador importantíssimo para os dois anos de sucesso. Foi à volta destes jogadores com caráter que criamos a nossa identidade e com a ajuda dos nossos motores, que fazem a equipa andar pra frente a nível físico e do modelo de jogo. Criámos uma idea de jogo muito positiva que tentava sempre ser protagonista, com variabilidade dentro do nosso jogo, fruto das nossas características. Arrisco-me a dizer que, com dois ou três ajustes, poderíamos ter ficado nos primeiros sete classificados na Segunda Liga.

Ricardo Silva
Fonte: Paços Ferreira

Bola na Rede: Como descreveria o seu modelo de jogo?

Ricardo Silva: Obviamente tenho um conjunto de coisas que tenho um conjunto de coisas que identifico como valores inegociáveis dentro da equipa. O treinador, para mim, é um farol, um guardião de valores e há coisas inegociáveis que fazem com que um equipa reme e corra toda para o mesmo lado. Qualquer treinador quer ter isto. Dentro daquilo que é o meu modelo propriamente dito, ando sempre à volta de um 4-3-3 clássico, com um ou dois números 6 dependendo das características dos jogadores. É muito importante os nossos centrais terem uma capacidade com bola aceitável, para não dizer acima da média, e que sejam rápidos e agressivos, porque defendemos a 4. Muito importante o timing de saída para conseguir igualar as posições no meio-campo, algo que gostamos de fazer sobretudo na primeira fase de construção do adversário. Gosto que o pé preferido do central seja também o do lado em que joga, o que até conseguimos fazer no Vilaverdense. Gosto também de laterais muito ofensivos e com boa relação com bola. Para além disso, adoro e acho que no futebol atual é essencial, ter extremos rápidos. Passando para a zona central, é muito importantes que os nossos médios tenham capacidade técnica para se relacionarem com os meios espaços e de se enquadrarem para apanhar o jogo de frente. No caso do ponta-de-lança, se tens um jogador mais profundo, jogamos mais por cima e tentamos aproveitar essa profundidade, ou, tendo um jogador mais posicional, tentamos aproveitar esse trabalho e o de apoio frontal para dinâmicas de terceiro homem. Ou seja ajustamo-nos aos nossos recursos, passando para o plano “macro”. Gosto que as minhas equipas sejam protagonistas dentro do campo, com um jogo acelerado que procura sempre criar mais oportunidades. Com os jogadores e o mindset certos, apostamos muito em dinâmicas de terceiro homem, contra-movimentos e ataques à profundidade.

«Identifico-me com Francesco Farioli, do FC Porto».

Bola na Rede: Tem alguma referência de treinadores com os quais se inspire ou identifique?

Ricardo Silva: Nesse sentido, identifico-me muito com o Francesco Farioli, do FC Porto. A primeira fase de construção que ele cria é muito parecida à nossa no processo de atração dos dois médios, na procura de espaços na linha a seguir, na construção baixa dos laterais. Depois, a forma como direciona as coisas é completamente diferente, porque somos personalidades e treinadores diferentes em contextos diferentes. Aprecio também bastante Roberto de Zerbi. Para além disso, treinadores como Paulo Fonseca, Leonardo Jardim e Rui Vitória são exemplos de treinadores que tenho um carinho especial pelo percurso que tiveram, que espero um dia poder replicar.

Bola na Rede: Com o aumento do uso de tecnologia no futebol, quanta importância atribui a questões como a análise de dados?

Ricardo Silva: Bem, eu acho que está cada vez mais instalado dentro das estruturas. Penso que é essencial para termos uma perceção total daquilo que fazemos, e os dados ajudam-nos a ver isso com clareza. Por vezes dizem-me: «as tuas equipas são as que mais tocam na bola dentro da área adversária». Ok, até posso concordar, mas uma coisa é chegar e dizer-me isto assim, outra coisa é apresentar-me os dados fidedignos, trabalhados, que sejam uma prova real daquilo que acontece. Isso muda tudo. Agora, essa informação precisa de ser tratada, se for demasiado pesada só confunde o treinador. É preciso saber filtrar para ter apenas aquilo que ajuda os jogadores e o jogo jogado. No caso dos dados dentro do clube, acho que são fundamentais sobretudo na procura e recrutamento de jogadores. Pode significar ir buscar um jogador que custa um milhão e vendê-lo por 12, em vez de contratar um que custa três e só conseguir vendê-lo por 10. Esse é o tipo de raciocínio que o futebol moderno deve adotar.Acredito cada vez mais que a data, e até a inteligência artificial, se vão apoderar do futebol, não só para o recrutamento de jogadores, como também de treinadores. A tecnologia já está dentro do treino e dos clubes, e o importante é que a informação chegue ao treinador de forma positiva, para que ele a consiga orientar para os canais certos e usá-la em prol da equipa.

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