«Costumo dizer que fui o guarda-redes com mais sorte mas, ao mesmo tempo, com mais azar» – Entrevista Bola na Rede a Paulo Lopes

Em entrevista ao Bola na Rede, Paulo Lopes falou sobre a carreira que o levou de Mirandela ao topo do futebol português. Com passagens por Gil Vicente, Barreirense, Estrela da Amadora, Trofense e Feirense, somou três subidas à Primeira Liga antes de regressar à Luz em 2012. Viveu o ano mais duro do clube, com três finais perdidas em apenas uma semana, mas também os quatro seguintes, marcados pela conquista histórica do tetracampeonato. Penduradas as botas em 2018, iniciou o percurso como treinador. Esteve nos sub-23 do Benfica e agora decidiu assumir um novo desafio fora de portas, no Al Ahli do Bahrein.

Bola na Rede: Paulo Lopes, antes de mais, obrigado por ter aceitado o nosso convite.

Paulo Lopes: É um prazer estar aqui.

Bola na Rede: Como é que nasceu a sua paixão pelo futebol em Mirandela? Sempre quis ser guarda-redes?

Paulo Lopes: Os meus irmãos são mais velhos e jogavam futebol, e o ‘bichinho’ da bola esteve sempre lá. O hobby na aldeia era ir trabalhar para a horta, como era habitual, ou então era jogar futebol na rua com os mais velhos. O futebol esteve sempre presente na minha vida, e como era o mais novo, tinha de ir à baliza. Era o normal na altura (risos).

Bola na Rede: Em juvenis, transferes-te para o Benfica. Como é que foram esses anos de formação no Benfica?

Paulo Lopes: Foi um misto de muitas emoções. Primeiro, sair de uma cidade pequena como Mirandela… em termos de logística era muito mais difícil. Para teres uma noção, demorava 12 horas a chegar a Lisboa. Sair de junto da família e ir sozinho não foi fácil. Por outro lado, num ano estava a jogar no Mirandela, num clube mais pequeno e numa cidade pequena, e de repente vou para um dos maiores, ou o maior clube de Portugal. Foi fantástico para mim. Acabei por superar tudo com essa vontade.

«Nos primeiros dois anos de Benfica estive com o Michel Preud’homme e o Sergei Ovchinnikov, dois dos melhores guarda-redes na altura».

Bola na Rede: Depois de terminares a formação, sobes à equipa principal do Benfica e mais tarde és emprestado ao Gil Vicente e ao Barreirense. Sente que esses empréstimos foram muito importantes na sua carreira para o desenvolvimento enquanto jogador?

Paulo Lopes: Antigamente, a dificuldade de subires à equipa principal era muito maior em comparação com agora. Na altura não havia equipas B e conseguires ficar no plantel principal era muito difícil. Nos primeiros dois anos de Benfica estive com o Michel Preud’homme e o Sergei Ovchinnikov, dois dos melhores guarda-redes na altura. O Michel Preud’homme, um dos melhores do mundo, e o Sergei Ovchinnikov, considerado um dos melhores guarda-redes da Rússia. Foi muito gratificante e aprendi muita coisa. Não joguei, mas absorvi muito daquilo que faziam e da forma como o faziam. Depois acabei por ter esses dois empréstimos. No Gil Vicente, a nível pessoal, não correu tão bem, mas em termos de equipa foi muito bom, porque acabámos por fazer uma grande época. Mas o Barreirense foi o ponto-chave, porque foi quando comecei a jogar mais e a pôr em prática o que tinha aprendido até então. Foi ótimo. Foi uma época boa, mas muito difícil, porque cometi muitos erros, mas aprendi muito com isso. Foi o clique: sair da Primeira Liga no Gil Vicente e ir para a Segunda B, que agora é a terceira divisão… Ser internacional nos sub-20 e sub-21, e de repente cair… Fez-se o clique de que tinha de trabalhar mais, porque senti que só aquilo não chegava.

Paulo Lopes João Pereira
Fonte: Ana Beles / Bola na Rede

Bola na Rede: Foi protagonista de várias subidas de divisão à Primeira Liga em vários clubes (Estrela, Trofense, Feirense). Consegue eleger a subida de divisão preferida?

Paulo Lopes: É difícil escolher uma, porque em cada uma delas aconteceram coisas completamente diferentes. Na primeira, no Estrela da Amadora, tínhamos um grupo fantástico, não só pela qualidade, mas também por tudo o que se vivia no clube: os ordenados em atraso, as dificuldades que enfrentávamos no dia a dia, e mesmo assim a união que existia no balneário era enorme. Lutávamos todos pelo mesmo. Não havia egos, e isso foi, de facto, muito bom. No Trofense, foi ser campeão da Segunda Liga e colocar o clube na Primeira Liga pela primeira vez na história. É algo que guardo com muita alegria. E no Feirense, que na altura já não estava na Primeira Liga há pelo menos 30 anos, conseguimos devolver o clube a esse patamar. Foi mais uma grande conquista. E ainda fui eleito o melhor guarda-redes da Segunda Liga. Se tivesse de escolher uma, não estaria a ser justo (risos). Felizmente tenho boas recordações das três.

Bola na Rede: Em 2010/11 foi eleito o melhor guarda-redes da II Liga, numa época que culmina também com a subida do Feirense à Primeira Liga… Qual foi o sentimento ao receber essa distinção?

Paulo Lopes: Foi uma enorme satisfação e alegria receber esse prémio. Mas é importante dizer que esse reconhecimento também é dos meus colegas de equipa e da equipa técnica. Costuma-se dizer, e é verdade: uma equipa de futebol não é só um jogador, são todos os que compõe o plantel. Foi com a ajuda deles que consegui crescer porque me obrigavam a ser melhor todos os dias.

«Defender um pénalti do Hulk, que na altura era o melhor jogador do Campeonato, foi especial, claro».

Bola na Rede: Como descreves aquela tua exibição frente ao Porto em 11/12 no Estádio do Dragão em que defendes o pénalti do Hulk e fazes uma série de defesas de grande dificuldade? Foi uma das melhores exibições da tua carreira?

Paulo Lopes: Felizmente lembro-me de vários bons jogos que fiz durante a minha carreira (risos). Mas sim, esse ficou-me marcado. Defender um penálti do Hulk, que na altura era o melhor jogador do campeonato, foi especial, claro. Quando jogas contra uma equipa grande não precisas de motivação e a realidade é que toda a nossa equipa estava motivada e quisemos também mostrar que tínhamos qualidade.

Bola na Rede: Tem mais alguma exibição que lhe fica na memória até hoje?

Paulo Lopes: O que fica mais na memória são aqueles jogos que fazes contra o Benfica, Sporting, Porto porque é que quando mais pessoas vêm o jogo e mais te abordam sobre isso. Lembro-me de uma exibição do Estrela contra o FC Porto que ganhamos com um golo do Anselmo. Já quando estava no Trofense empatamos no Estádio do Dragão e ganhamos em casa contra o Benfica com golos do Reguila e do Hélder Barbosa. No Feirense, em nossa casa, perdemos 2-1 contra o Benfica, mas fiz uma exibição fantástica. Felizmente, foram muitas.

Bola na Rede: Como surgiu o convite para regressar ao Benfica em 2012?

Paulo Lopes: O convite surgiu através do Rui Costa, o atual presidente do Benfica. Ele perguntou-me se estava interessado, conversámos sobre vários assuntos e acabei por aceitar. Foi com grande orgulho que regressei ao Benfica.

Paulo Lopes
Fonte: SL Benfica

Bola na Rede: Como é que a equipa lidou com aquela época de 12/13 em que perdem 3 decisões importantes em pouco mais de uma semana?

Paulo Lopes: É sempre um sentimento triste chegar à fase decisiva e perder todos esses jogos. Mas, olhando para trás, foi também uma grande aprendizagem para nós. No ano seguinte acabámos por ganhar quase tudo, menos a Europa League. Para ganhar qualquer coisa tens de estar nas finais, e alguém tem de as perder, faz parte do jogo. Foi com essa experiência, com essas vivências, que conseguimos melhorar e crescer enquanto equipa.

Bola na Rede: Como encarou o papel de terceiro guarda-redes num plantel tão competitivo? Nunca sentiu frustração por jogar pouco?

Paulo Lopes: Eu tinha um gosto enorme pelo treino e pelo futebol. E esse gosto traduzia-se nos cinco dias de treinos diários. Todos nós queremos jogar como é lógico, mas não tinha uma tarefa fácil. Eu costumo dizer que fui o guarda-redes com mais sorte, mas, ao mesmo tempo com mais azar. (risos) No Benfica, além dos guarda-redes que apanhei na primeira passagem, ainda tive o Artur Moraes, que tinha sido considerado o melhor da Primeira Liga, e depois o Júlio César, o Jan Oblak e o Ederson, que são ou foram dos melhores do mundo. A partir daí, fica muito difícil dizer que és melhor que eles (risos). O mais importante, e acho que eles concordam comigo, foi eu ter contribuído para ajudar a equipa e ajudá-los também a eles a crescer.

«Em termos de qualidade de guarda-redes, para mim o melhor foi o Jan Oblak».

Bola na Rede: Qual foi o melhor companheiro de equipa em termos de qualidade nessa segunda passagem pelo Benfica: Jan Oblak, Júlio César, Artur Moraes ou Ederson Moraes?

Paulo Lopes: Em termos de qualidade de guarda-redes, para mim foi o Jan Oblak. Mas todos tinham características totalmente diferentes. O Ederson, por exemplo, tinha uma qualidade incrível com os pés, o Artur era muito forte na leitura de jogo, o Júlio César tinha uma elasticidade fora do comum. E por isso chegaram ao nível que chegaram. É muito difícil escolher, mas se tivesse de escolher, elegia o Jan Oblak.

Bola na Rede: Esteve presente nos anos do tetracampeonato do Benfica. Como era o ambiente interno nessa altura? Jogadores entraram, jogadores saíram, dois anos com Jorge Jesus, dois anos com Rui Vitória mas a realidade é que o Benfica continuou a ganhar…

Paulo Lopes: Nós eramos uma família. Quando digo uma família, as pessoas podem interpretar mal as coisas, uma família não tem de ser necessariamente dentro e fora do campo, eramos uma família dentro do campo, onde todos lutávamos pelo mesmo. Não havia ninguém que fosse para lá e que fosse mais do que quem quer que seja.  Todos nós estávamos embutidos no mesmo espírito por ganhar e fazer história no Benfica. Essa sede e essa vontade tornou-nos numa família dentro de campo. Diria que a chave do sucesso foi estarmos todos no mesmo barco durante todos esses anos.

Bola na Rede: Trabalhou com Jorge Jesus e Rui Vitória em momentos de grande sucesso. Quais as principais diferenças entre os dois, enquanto líderes?


Paulo Lopes:
São duas personalidades completamente distintas. O míster Jorge Jesus sempre com o estilo dele, a vontade de ser perfecionista em todos os aspetos, a exigência do pormenor ou num passo mais à esquerda ou mais à direita. Já o míster Rui Vitória era um treinador muito mais sereno e com uma calma totalmente oposta à do mister Jesus. Cada um com as suas qualidades e realidade é que os dois ficaram marcados na história do Benfica.

«No Benfica não tenho dúvidas que o título mais especial foi a conquista do primeiro Campeonato Nacional (2013/2014)».

Bola na Rede: Foi campeão várias vezes e levantou muitos troféus. Qual foi o título mais especial para si?

Paulo Lopes: No Benfica não tenho dúvidas que foi a conquista do primeiro Campeonato Nacional (2013/2014). Eu tinha feito a formação no Benfica e havia aquele sonho de jogar na equipa A e no Estádio da Luz. Esse primeiro foi o mais marcante. Também o título da Segunda Liga pelo Trofense. O objetivo dos clubes na Segunda Liga é subir e o ser campeão costuma vir por acréscimo e a realidade é que subimos pela primeira vez à Primeira Liga pelo Trofense e acabamos também por ser campeões. Recordo-me perfeitamente da festa que fizemos.

Bola na Rede: Qual foi a sua reação ao ser eleito pela BBC a melhor terceira opção do mundo para guarda-redes? Conquistou 12 títulos pelo Benfica…

Paulo Lopes: Foi um orgulho ter recebido essa distinção. Á primeira vista ser distinguido dessa forma pode parecer algo mau, mas a realidade é que foi muito bom para mim. Foi o reconhecimento de ser uma opção válida e respeitada não só no Benfica, mas no futebol em geral.

Bola na Rede: Desses quatro anos do tetracampeonato, consegue eleger o melhor jogador com quem treinou?

Paulo Lopes: Essa pergunta é muito difícil de responder (risos). Todos tem características fantásticas e poderia dizer-te jogadores como o Pablo Aimar, Nico Gaitán, Jonas, Pizzi, Lima, Cardozo, Witsel, Javi Garcia, Garay, Luisão, Jardel, Eliseu, André Almeida… São muitos jogadores com uma qualidade acima da média, é difícil eleger só um. Cada um com características específicas, mas jogadores fantásticos e que também ficaram marcados na história do clube.

Paulo Lopes Benfica
Fonte: Benfica

Bola na Rede: Há algum episódio marcante de balneário desses anos no Benfica que possa partilhar?

Paulo Lopes: Lembro-me de um episódio no último ano em que fomos campeões. Fomos jogar a Vila do Conde, era um dos últimos jogos do campeonato, e estávamos no banco eu e o Raúl Jiménez. A certa altura, o míster manda o Raúl aquecer e ele percebe que não tinha a camisola de jogo com ele. Eu disse-lhe logo: ‘Não te preocupes, eu vou ao balneário buscar e ainda vais marcar o golo da vitória.’ Fui a correr buscar a camisola, ele entrou… e acabou mesmo por marcar perto do fim. Foi uma vitória muito importante para a conquista do tetra. São estas pequenas histórias que ficam e nos fazem sorrir quando olhamos para trás.

«Desde os 18 anos que tiro apontamentos e analiso o trabalho dos treinadores, aquilo com que me identifico e também o que me faz menos sentido».

Bola na Rede: Começaste como treinador de GR no Benfica. Ainda assim, o objetivo foi sempre tornar-se um dia treinador principal?

Paulo Lopes: Sim, sempre me interessei pela parte do treino. Desde os 18 anos que tiro apontamentos e analiso o trabalho dos treinadores, aquilo com que me identifico e também o que me faz menos sentido. Foi sempre essa a minha prioridade. Como eu treinava quando era jogador, a análise das equipas e do próprio jogo também foi algo que sempre me apaixonou.

Bola na Rede: Na sua passagem pelo Benfica, treinou jogadores como João Neves, António Silva, Tomás Araújo…Esperava que estes jogadores chegassem à equipa principal e até à Seleção Nacional?

Paulo Lopes: Sinceramente, esperava. Pela qualidade que já demonstravam na altura, era previsível que isso fosse acontecer. A qualidade e o aspeto físico era facilmente visível. O que costuma fazer a diferença quando somos mais jovens é o aspeto mental. E a realidade é que eles também tinham esse aspeto bem desenvolvido.

Bola na Rede: Há algum jogador da formação que ache que pode vir a integrar a equipa principal do Benfica no futuro?

Paulo Lopes: Tem vários. O João Fonseca, o Leandro Santos, o João Veloso, o Diogo Prioste, Gustavo Varela, tem alguns jogadores que podem chegar lá. Depois, claro, é preciso muito trabalho e um bocadinho de sorte, porque num clube como o Benfica tudo depende também do momento, das posições disponíveis e das necessidades da equipa. Mas, de um modo geral, acredito que alguns deles podem chegar à equipa principal.

Bola na Rede: Que balanço faz da temporada do Benfica? Como vê o plantel das águias neste momento?

Paulo Lopes: No geral, é um plantel individualmente muito bom. O Benfica, como é normal, tem sempre plantéis muito bons. Não foi uma época excelente na perspetiva do Benfica porque acabaram por ganhar somente a Taça da Liga, mas foi uma boa época porque tiveram nas decisões todas. Tiveram até ao último jogo para ser campeões, foram à final da Taça de Portugal, ganharam a Taça da Liga. O mais importante é o clube continuar focado no projeto, porque os resultados acabam por aparecer.

Bola na Rede: Há algum jogador que destaque da época do Benfica?

Paulo Lopes: O Pavlidis neste momento está a ser uma bela surpresa e uma mais-valia. Não teve o melhor início, mas foi subindo de rendimento no decorrer da temporada. Apesar disso, jogadores como o Kerem Akturkoglu, Orkun Kokçu, o Florentino, o Nicolás Otamendi, o Álvaro Carreras, o Dí Maria…. Têm muito jogadores de qualidade que podem fazer a diferença.

Bola na Rede: Depois de tudo o que viveu na sua carreira e dos clubes por onde passou, sente que acumulou muita experiência e ensinamentos que hoje em dia aplica como treinador?

Paulo Lopes: Não tenho dúvidas nenhumas sobre isso, a minha carreira como jogador deu-me a possibilidade de ter várias vivências e contextos. O de Segunda Liga para subir de divisão, de Primeira Liga para ser Campeão e Primeira Liga para não descer onde vivi, claramente, experiências diferentes. O teu estado mental e estado de espírito é totalmente diferente quando estás a lutar para subir lutar ou para ser campeão ou a lutar para não descer. O comportamento do grupo é totalmente diferente. Com a quantidade de jogadores com muita qualidade com quem eu joguei e outros com menos competências, fez-me absorver muito conhecimentos e adquirir várias vivências. No geral, fui um felizardo.

Bola na Rede: Assumiu o Al Ahli do Bahrein em novembro de 2024 e encontrou uma equipa nos lugares de descida. Os primeiros tempos no clube foram difíceis ou rapidamente percebeu o que tinha de fazer para dar a volta à situação?

Paulo Lopes: Fui muito bem recebido pelas pessoas e não foi difícil nessa parte. Na questão da qualidade em comparação com as outras equipas, de facto, foi um desafio. Foi trabalhoso, foi preciso os jogadores acreditarem e penso que acreditaram muito na minha ideia e acabou por surtir efeito. No final e dentro de muitas dificuldades que tivemos, acabamos por atingir o principal objetivo que era manter o clube na Primeira Liga.

Bola na Rede: No final das contas, conseguiu colocar o Al Ahli no 7º. Lugar da competição. Como descreve a época no cômputo geral?

Paulo Lopes: Foi muito boa. Quando analisei os dados da Liga depois da época acabar, vimos que fomos a 4.ª equipa com mais posse de bola, a 4.ª com mais remates à baliza, a equipa que ganhou mais duelos defensivos e duelos aéreos. Também fomos a 4.ª equipa com mais passes, a 4.ª com mais passes em profundidade, a 3.ª com mais passes decisivos, a 2.ª com mais passes longos e a 4.ª com mais passes no último terço do adversário. Além disso, fomos a equipa com mais passes inteligentes que resultaram em golo e a que mais fez passes progressivos. Analisando tudo isto, acho que fizemos um bom trabalho.

«Gosto de privilegiar a bola. Tendo a bola, consegues gerir melhor o ritmo e criar mais oportunidades para marcar».

Bola na Rede: O que é que gosta de privilegiar no seu jogo?

Paulo Lopes: Gosto de privilegiar a bola. Às vezes as pessoas pensam logo no estilo do Guardiola, mas não é bem assim. No meu jogo há um misto, mas ter a bola torna tudo mais fácil porque a equipa adversária acaba por correr mais. Também fomos uma equipa com poucos remates sofridos, e isso está muito ligado a controlar o jogo. Tendo a bola, consegues gerir melhor o ritmo e criar mais oportunidades para marcar. Mas claro, isso depende sempre da qualidade dos jogadores que tens.

Paulo Lopes Benfica
Fonte: SL Benfica

Bola na Rede: Como olha para o crescente desenvolvimento do futebol do Médio Oriente? Sente que nos próximos anos, as ligas árabes (sobretudo a Arábia Saudita) poderão estar ao nível do futebol europeu?

Paulo Lopes: Em termos de infraestruturas e de qualidade individual, o futebol do Médio Oriente é desenvolvido. Agora a mentalidade do jogador árabe é totalmente diferente da mentalidade do jogador europeu. Se fizer uma retrospetiva, lembra-me um pouco a mentalidade do futebol de há 30 anos atrás. Eles estão a querer melhorar e a evoluir nesse aspeto, mas é um processo que ainda vai demorar. E quando falo em mentalidade, refiro-me à forma como encaram o treino, a alimentação, o descanso. Muitas vezes, o treino é como se fosse mais um dia.

Bola na Rede: Sente que o fator calor e humidade influencia esses problemas?

Paulo Lopes: Eles estão habituados a isso, mas também diria que é um dos motivos. Não é fácil treinares com o calor e a humidade que se faz sentir. Mesmo no mês do Ramadão também é difícil, o humor deles muda completamente, tens de treinar a horas tardias (9:30 / 10:00 da noite) por causa da alimentação. É um contexto totalmente diferente. Enquanto aqui na Europa só um ou dois jogadores fazem Ramadão, lá é praticamente toda a equipa.

«A mentalidade do jogador árabe é totalmente diferente da mentalidade do jogador europeu».

Bola na Rede: Conseguiu habituar-se rapidamente à cultura do país e a essas novas rotinas de treino?

Paulo Lopes: Não foi difícil porque eu ia mentalizado para o que ia e preparei-me para o contexto que ia encontrar. Obviamente que há dias que são mais difíceis que outros, é normal, mas fui claramente preparado em todos os aspetos.

Bola na Rede: Quais são os planos a curto/médio prazo? Já tomou uma decisão sobre o que vai fazer para a próxima temporada?

Paulo Lopes: Ainda não. Tenho o convite do Al Ahli para continuar, tive também convites de clubes de campeonatos do Médio Oriente. Alguns convites na Europa, mas neste momento tenho de ponderar e ver o que é melhor para mim e para a minha família.

Bola na Rede: Quais são os principais desafios que enfrenta hoje como treinador e que não enfrentava enquanto jogador?

Paulo Lopes: De facto, é muito diferente. Enquanto jogador, pensava só em mim, como é natural. Já como treinador, tenho de pensar como se tivesse a cabeça de 23 jogadores ao mesmo tempo. Tento perceber a reação de cada um e aplico as experiências que tive para entender o que se passa na cabeça deles. Não é simplesmente “hoje o jogador não quer treinar, não joga”. Tento perceber o porquê dessa insatisfação, porque às vezes basta uma conversa para mudar a postura e o ânimo do jogador. Procuro ser cuidadoso nesse sentido, colocar-me no lugar deles, mas depois a decisão é sempre minha e a tomada de decisão é sempre consciente. Em qualquer trabalho, quando te sentes valorizado, isso faz toda a diferença. Tento fazer aquilo que, por vezes, não fizeram comigo ao longo da minha carreira. Não foi intencional, claro, mas procuro ao máximo entender essa parte.

Bola na Rede: Obrigado pela entrevista Paulo.

Paulo Lopes: Foi um prazer.

Rodrigo Lima
Rodrigo Limahttp://www.bolanarede.pt
Rodrigo é licenciado em Ciências da Comunicação e trabalha atualmente na área do jornalismo desportivo. Apaixonado pelo mundo do desporto, tem no futebol a sua principal área de interesse e análise.

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