«Se fosse hoje, não ia para o SL Benfica» – Entrevista BnR com Fernando Mendes

– A transferência falhada para o Barcelona e o inferno da Luz –

“Tive a sensação de que só me tinham ido buscar para beliscar o Sporting”

BnR: Ficaste chateado com o Jorge Gonçalves pelo valor que pediu por ti ao Barcelona?

Fernando Mendes: Um milhão de contos! Só soube disso mais tarde. Recordo-me que fiz um jogo fantástico frente ao Barcelona em Alvalade – fiz 20 anos nesse dia (!) – e tive o 3-0 nos pés, não dei a bola ao lado e atirei por cima do Zubizarreta… A bola até ficou em cima da baliza! No lance seguinte, o Barça faz o 2-1 e fomos eliminados. Havia dois laterias-esquerdos naquela época, pelos quais tinha uma admiração tremenda: o Maldini e o Julio Alberto, também titular da seleção espanhola. O curioso é que quando o jogo acabou, pese, embora os balneários fossem em lados distintos, saíamos todos pela porta 10A, onde estava o leão, saí em simultâneo com os jogadores do Barcelona e, quando estão a entrar no autocarro, o Julio Alberto virou-se para mim e disse-me “Tu para o ano és jogador do Barça”. Fiquei contente de ter um jogador que idolatrava, mas não liguei muito. Mais tarde é que vim a saber que o Presidente tinha pedido aquele valor. Mais caro que o Maradona [risos]. Aquele jogo abriu-me muitas portas e, no final da temporada, vim a saber que o Inter de Milão, o Newcastle e clubes franceses também tinham perguntado por mim. Respondendo-te diretamente: não fiquei chateado, até porque tinha um carinho muito especial pelo Jorge Gonçalves.

BnR: Arrependes-te de ter ido ao Bairro Alto naquela noite em que, na casa da Leonor Pinhão e do João Botelho, tens conhecimento de que o Benfica tinha uma proposta para a tua contratação?

Fernando Mendes: Não me arrependo, porque conheci duas pessoas fantásticas. Aconteceu. Já não recebíamos no Sporting há muito tempo, estivemos oito meses sem receber, a situação não estava fácil e eu não previa um futuro muito risonho para o Sporting, falando claro. Não me arrependo de tê-los conhecido. De ir para o Benfica é outra história: se fosse hoje, não ia.

BnR: À parte os salários em atraso e a tua relação com Sousa-Cintra, receberes o triplo do que recebias no Sporting foi o fator que mais pesou na decisão de assinares pelo SL Benfica?

Fernando Mendes: Tudo pesou. E não foi o triplo, mas foi um bocado mais. A minha situação no Sporting estava a tornar-se insuportável e eu tomei uma decisão. Sou uma pessoa de palavra e, para mim, basta um aperto de mão. As assinaturas para mim são o consumar de uma decisão que eu tomei e já tinha dito às pessoas do Benfica que ia, não precisava de assinar nada. Em relação ao Sousa Cintra, já tinha tomado uma decisão: se o Jorge Gonçalves perdesse as eleições, eu saía do Sporting, mas nunca pensei que fosse para o Benfica, sinceramente. Havia outras soluções para continuar a minha carreira, mas também não saía do Sporting para um clube de menor dimensão. Não gostei das abordagens daqueles que viriam a ser os futuros dirigentes do Sporting, Sousa Cintra incluído, podia ter voltado atrás – tinha o contrato do Benfica na mão -, mas não o fiz.

BnR: É por essa altura que recebes o Renault?

Fernando Mendes: O Renault foi antes. Isso aconteceu quando renovei o contrato com o Sporting. O Jorge Gonçalves tinha feito um contrato com uma empresa de automóveis, a Savenauto em Sacavém, da Renault, para os jogadores que vinham do estrangeiro – veio o Silas, veio o Douglas, o Rodolfo Rofrigues, etc. – terem carro cá e eu também lhe pedi um. O curioso é que, quando subi a sénior, ganhava 40 contos por mês, quando passei a titular aumentaram-me para 120 contos e foi quando renovei, que ia receber 800 contos, que deixei de receber.

Fonte: Facebook Fernando Mendes

BnR: Pelo clube da Luz, em duas épocas, somas apenas 17 jogos. Acreditas que a tua contratação pelo Benfica foi somente com o intuito de enfraquecer o rival de Lisboa?

Fernando Mendes: Hoje, pensando friamente, foi para dar uma “bicada” ao Sporting. O Benfica na altura tinha o titular da seleção que era o Álvaro Magalhães, o Veloso, o Fonseca… E no ano que eu fui, ainda acabou por vir o Schwarz! As coisas não foram fáceis para mim e, como te disse, se fosse hoje não assinava. Tomo as decisões e raramente (…), já fiz tanta asneira, mas raramente me arrependo do que faço. Não está em causa o Benfica, atenção!

BnR: Existiu a “questão Eriksson”…

Fernando Mendes: Isso aí é outra história. Há mais a questão de ter assinado pelo Benfica – tive de andar escondido – e passado uma semana estar a treinar sozinho atrás da baliza. Pouco tempo depois de lá estar tive a sensação de que só me tinham ido buscar para beliscar o Sporting.

BnR: Mas nem tudo foi mau: acredito que tenha sido divertido dividir o balneário com três russos que tinham tanto de geniais dentro de campo, como de marotos fora dele.

Fernando Mendes: Yuran, Kulkov e Mostovoi! Acredita numa coisa: podem dizer o que quiserem, mas eram três pessoas fantásticas. Tinham as coisas deles, vinham de um país complicado e eram tempos diferentes. O Mostovoi raramente jogava, mas era craque. O Kulkov era o mais reservado. O Yuran tinha o feitio mais complicado, tinha a sua forma de ser e não aceitava qualquer coisa – às vezes estávamos a treinar e se ele não concordava com qualquer coisa, era pontapés por tudo o que houvesse à volta -, mas era um bom gajo! Quase todo o plantel tinha uma relação excelente com eles, apesar de não serem pessoas fáceis.

BnR: Pará-los é que também não era fácil.

Fernando Mendes: O Yuran era um animal. O Kulkov era o cérebro, tinha uma inteligência acima da média. O Mostovoi, curiosamente, teve poucas oportunidades e saiu daqui para o Celta de Vigo, tendo estado presente nos 7-0 e, a partir daí, começaram a reconhecer-lhe toda a sua qualidade.

Miguel Ferreira de Araújo
Miguel Ferreira de Araújohttp://www.bolanarede.pt
Um conjunto de felizes acasos, qual John Cusack, proporcionaram-lhe conciliar a Comunicação e o Jornalismo. Junte-se-lhes o Desporto e estão reunidas as condições para este licenciado em Estudos Portugueses e mestre em Ciências da Comunicação ser um profissional realizado.                                                                                                                                                 O Miguel escreve ao abrigo do novo Acordo Ortográfico.

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