A formação como bóia de salvação do Barcelona

    Espanha vive um bom momento ao nível da formação. O nosso país vizinho é o vigente campeão europeu em Sub-19, além de ter conquistado os Jogos Olímpicos 2024. Isto, descontando a conquista do Euro 2024. É inevitavelmente o país da moda. Não é propriamente novidade que existem grandes escolas de formação em Espanha, onde os clubes mostram pouco receio em apostar nas suas canteras. Athletic, Real Sociedad, Barcelona, Celta de Vigo, Real Madrid ou Valência, são exemplos disso. No final de 2024/25, certamente alguém irá escrever um artigo ou realizar um vídeo sobre as pérolas que surgiram durante a época desportiva.

    Há um caso em específico que vale a pena levar um pouco mais ao detalhe. O Barcelona é um gigante espanhol, europeu e mundial e a La Masia é uma fonte inesgotável de talentos. De lá saíram craques como Lionel Messi, Cesc Fàbregas, Pedro Rodríguez, Xavi Hernández, Andrés Iniesta, Sergio Busquets, Carles Puyol, Gerard Piqué… podiam-se expor inúmeros nomes que marcaram uma fase do futebol, mesmo que longe do Camp Nou.  

    Contudo, nomeadamente no período Josep María Bartomeu, a academia deixou de ser a fonte primordial, apostando-se forte no mercado de transferências. Passou-se a olhar mais para fora do que para dentro, ao mesmo tempo que o Real Madrid começava a fazer o contrário. Os merengues passaram a contratar jovens em processo de amadurecimento e encaixavam-nos nos seus escalões de formação, o que gerou alguns conflitos institucionais, inclusive. O clube da capital não está assim tão atrás no capitulo formativo, em comparação ao Barcelona, que se ‘deixou atrasar’.

    Em março de 2021, Joan Laporta regressou ao cargo de presidente do Barcelona e com ele a esperança de uma aposta na formação regressou. Afinal, foi com ele que o clube se desenvolveu no começo do séc. XXI. Esperava-se o regresso a uma política antiga e que novos ‘Messis’ surgissem no plantel principal. Contudo, a história não foi assim tão linear. O dirigente preferiu apostar numa primeira via. Os blaugrana estavam (e estão, já que não se pôde aplicar a regra 1:1) numa crise tão profunda que não podiam realizar grandes investimentos e viam-se obrigados a vender peças importantes e a libertar elementos com salários elevados. Lionel Messi saiu para o PSG porque não havia condições de lhe dar um ordenado digno, por exemplo.

    Joan Laporta lançou-se assim na contratação de jogadores a ‘custo zero’, de modo a apetrechar a equipa, deixando a aposta na formação um pouco de lado. No verão de 2021 chegaram ao Camp Nou, Memphis Depay, Sergio Aguero e Pierre-Emerick Aubameyang (este em janeiro), de modo a produzirem rendimento imediato. Em 2022 a aposta foi firme. Marcos Alonso, Franck Kessié, Héctor Bellerín e Andreas Christensen reforçaram o Barça. Para finalizar, Joan Laporta contratou do mesmo modo no verão de 2023 o médio Ilkay Gundogan e o central Íñigo Martínez.  Nota para o facto de que a transferência, mesmo sendo a ‘custo zero’, conta com um elevado prémio de assinatura e uma comissão de agente bem simpática.

    De todos estes nomes, poucos tiveram o rendimento que se ambicionava na Cidade Condal. Sucesso claro apenas houve um: Ilkay Gundogan, que acabou por sair para o Manchester City, de modo a aliviar a economia do Barcelona. Andreas Christensen, Íñigo Martínez ou Aubameyang (os dois primeiros ainda estão na Catalunha), tiveram um sucesso relativo, como gabonês a mostrar números, mas a permanecer somente meio ano. Os restantes são facilmente perdidos na história (não esquecendo do problema de saúde que afetou Aguero) e até estiveram abaixo das expetativas.

    O que trouxe esta política? Uma La Liga e uma Supertaça de Espanha, tornando-se indiscutível o ponto de que o Real Madrid é o clube mais forte do país e que deverá continuar a ocupar o trono, sem grandes problemas. O Barcelona vive um período de reconstrução e felizmente os responsáveis catalães felizmente viram que grande parte da solução está na formação e na aposta na juventude. Mérito para as equipas técnicas, nomeadamente para a de Xavi Hernández, que teve pouco receio em chamar elementos produzidos em casa.

    Gavi e Alejandro Baldé foram as primeiras apostas claras, em 2021/22 numa equipa em que Nico González e Ansu Fati também possuíam uma grande quantidade de minutos, além de presença constante nas convocatórias de Iñaki Peña, Mika Mármol ou Ilias Akhomach (Ronald Koeman foi o treinador em parte da época). Nas temporadas seguintes outros nomes começaram a ser promovidos, mas em 2023/24 chegaram dois frutos especiais de toda esta aposta, que acabaram por se tornar indiscutíveis. Lamine Yamal transformou-se na estrela da companhia, brilhando inclusivamente no Euro 2024. Pau Cubarsí passou a ser o líder da defesa, quando se procurava o companheiro ideal para Ronald Araújo. Soube-se trabalhar muito bem dentro de portas e os jovens foram ganhando muita influência, perdendo relevância os tais elementos que chegaram a ‘custo zero’ e que pouco deixam saudades.

    2024/25 e a chegada de Hansi Flick é o colmatar de toda esta linha, aplicando algumas diferenças no tiki-taka habitual. Tudo bem, continua a não existir dinheiro para contratar (foi necessária a lesão de Christensen para se inscrever Dani Olmo), mas as convocatórias estão repletas de produtos formativos. Vejamos a lista de convocados para o desafio entre Barcelona e Valência, relativo à primeira jornada:

    11 titular- Ter Stegen, Jules Koundé, Pau Cubarsí, Íñigo Martínez, Alejandro Balde, Marc Bernal, Marc Casadó, Lamine Yamal, Raphinha, Ferrán Torres e Robet Lewandowski.

    Suplentes- Iñaki Peña, Ander Astralaga, Sergi Domínguez, Héctor Fort, Gerard Martín, Andreas Christensen, Álex Valle, Pablo Torre, Pedri González e Pau Víctor.

    A aposta na casa e em jovens jogadores é clara. Não vale a pena contratar atletas para o banco ou ocuparem postos com pouca probabilidade de entrarem no 11 inicial, quando existe tanto talento a ser trabalhado. Foi preferível comprar em definitivo Pau Víctor ao Girona ao invés de gastar uma série de milhões em alguém com um nome mais potente (perdeu-se Marc Guiu, pérola da formação, que foi para o Chelsea por seis milhões de euros). O Barcelona andou igualmente ‘aflito’ em busca de um novo 6. Marc Bernal assumiu a posição sem problemas e apenas foi travado por uma lesão gravíssima, mas Marc Casadó passou a ser a aposta.

    Claro que há que dar mérito às equipas técnicas dos escalões de formação, nomeadamente à de Rafa Márquez, que deixou a instituição no final de 2023/24 para ser adjunto de Javier Aguirre na seleção do México, mas já provou que a sua mais valia é trabalhar com a franja de idade entre os 17 e os 21 anos. A tarefa de Albert Sánchez como suceder ao antigo central como treinador da B não será simples.

    Hansi Flick percebeu algo que Joan Laporta teimou em não entender (e que provavelmente Deco não entenderá, estando em claro ‘cheque’ num cargo que nunca fez merecer por ocupar). A investir, somente em jogadores que façam realmente a diferença. A contratação de Dani Olmo faz sentido. É diferenciado e conhece a casa. É uma aquisição cara, mas com uma margem de erro praticamente nula. Aplicar-se-ia o mesmo discurso se Nico Williams tivesse trocado o País Basco pela Catalunha. Neste mercado não existiram chegadas a ‘custo zero’ e o Barcelona está em primeiro lugar da La Liga, pelo menos para já. Os próprios adeptos ficam mais do que orgulhosos da política aplicada, sendo uma felicidade quando um novo jogador é lançado em campo, para atuar com os profissionais. Não existiu este sentimento com Depay ou Marcos Alonso.

    É preferível que o Barcelona contrate atletas para a sua formação ou com idade para frequentá-la, algo que o Real Madrid anda a fazer. Pedri não é formado no clube, mas é visto praticamente como tal. Com Pau Víctor acontecerá processo semelhante. Vitor Roque não correu bem, mas é algo que acontece (veja-se o exemplo de Reinier). E é certo que na equipa B dos culés existem uma série de jogadores que podem ser apostas no imediato, caso seja necessário. Os nomes de Pau Prim, Quim Junyent ou Toni Fernández (golaço frente ao Ourense) já vêm a ser badalados e podem dar o salto.

    Num clube com as caraterísticas do Barcelona esta é a aposta certa e sempre será assim. Trata-se do seu ADN. Agradece o clube, que terá menos encargos em contratar jogadores e a própria seleção, que se vê apetrechada de mais selecionáveis (Marc Bernal podia ter figurado na mais recente convocatória de Luis de la Fuente, se não fosse a lesão). A cantera é a salvação dos blaugrana, que ainda vivem no ‘vermelho’ e procuram uma aproximação ao topo, numa fase em que o rival é a instituição mais forte de todo o futebol. Chegou-se ao sucesso com Pep Guardiola e com esta política, poderá repetir-se tal feito? A resposta chegará nos próximos anos.

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