Uma seleção pouco natural | Portugal

O apuramento para o Mundial do Catar em 2022 arrancou no passado mês de março e a seleção portuguesa partiu como favorita no grupo A, ao lado de Sérvia, Luxemburgo, Azerbaijão e República da Irlanda.

Os mais ambiciosos até pediam oito vitórias em outras tantas jornadas, mas nem os mais pessimistas esperavam o desempenho na tripla jornada no final de março. Apesar do primeiro lugar do grupo, em igualdade pontual com os sérvios, as exibições ficaram bastante aquém do plantel à disposição – e dos que ficaram de fora.

A vitória pela margem mínima (1-0) diante dos azeri apareceu através de um autogolo de Maksim Medvedev e fez soar os alarmes; era preciso apresentar muito mais se o objetivo era o apuramento.

A segunda jornada corria de feição ao intervalo, fruto de uma seleção sérvia estranhamente apática e de um Diogo Jota a provar que merece a titularidade na equipa nacional. Contudo, a seleção da península Balcânica acordou no segundo tempo e com maior assertividade e pressão revelou as inúmeras fraquezas de uma seleção portuguesa frágil.

Enquanto se perderam horas a discutir o golo que não foi validado a Ronaldo, e que daria a vitória, não se discutiu o fraco jogo português, a facilidade com que se encaixou o empate ou a sorte que Portugal teve em não sair de Belgrado com a derrota.

Uma vez mais, pouco ou nada se aprendeu com as dificuldades dos jogos anteriores e a partida contra o Luxemburgo serviu, uma vez mais, para a “grande potência” se passear em países de menor relevância futebolística. Os comentários na transmissão televisiva davam conta disso mesmo – de uma superioridade ridícula em relação ao adversário.

Ridícula porque dentro de campo isso não era evidente e o futebol praticado ia de mal a pior. Só alguém muito desatento conseguiu ficar surpreendido com a merecida vantagem que os atletas visitados alcançaram ao minuto 30.

O susto foi revertido e a vitória por dois golos de diferença (1-3) colocou Portugal na liderança do grupo e trouxe uma falsa sensação de dever cumprido nesta pausa para compromissos internacionais.

A hora agora é de reflexão e exige-se que esta seja profunda. É hora de questionar um pouco de tudo, ou o caminho far-se-á de forma descendente. Desde logo, a convocatória. A chamada de Nuno Mendes é merecida e lógica, mas retirar o atleta da fase final do europeu sub-21, disputado ao mesmo tempo, significaria uma aposta séria na seleção principal.

Na primeira jornada atuou os 90 minutos, mas na segunda foi relegado para o banco de suplentes. Acabou por entrar aos 72 minutos, mas não se percebe a troca com Cédric. Mais incompreensível do que isto só mesmo o facto de Cédric ser ainda aposta numa seleção com tanta oferta nas laterais. O erro foi naturalmente reposto na terceira jornada e Nuno Mendes alinhou os 90 minutos no Luxemburgo.

Além de Cédric, há outros casos de aparente titularidade/convocatória asseguradas e que carecem de forte explicação. Com Ronaldo à cabeça. Tenho sérias dificuldades em montar o onze nacional e deixar de fora Bernardo Silva, André Silva, Bruno Fernandes, João Félix ou Diogo Jota. Ronaldo, no entanto, parece-me óbvio que a sua transferência para uma linha de segundas escolhas já peca por tardia.


Em nenhum momento se coloca em causa o que já foi feito pelos atletas, mas sim o que se quer do futuro da selação nacional. Vamos ficar eternamente a alinhar de início jogadores pelo tanto que nos deram no passado? Se assim fosse, Quaresma não teria desaparecido das convocatórias…

Félix é um talento geracional, inegável e que sai prejudicado pelo contexto do clube para onde se transferiu, mas a qualidade está lá e ninguém o pode esconder. Jota deslumbrou Klopp e vai assinando exibições vistosas, antes e pós-lesão. André Silva é só o segundo melhor marcador da liga alemã, com 22 golos, atrás de Lewandowski. No entanto, na seleção, alinhou em apenas 75 dos 270 minutos das três jornadas de apuramento para o Mundial do Catar.

Tendo em conta que há ainda Pedro Neto e Trincão à perna, fica para mim impossível encaixar Ronaldo no onze inicial. Como “CR7” já fez a Raúl González no Real Madrid CF ou a Simão e Rui Costa na seleção, há páginas a virar e em nenhum momento se colocou em causa o valor de quem deu palco às novas gerações.

Não é por acaso que as duas equipas que estão construídas à volta do português – Juventus FC e seleção portuguesa – passam por uma fase crítica de resultados e exibições. Nunca deu grande resultado apoiar o futebol de um coletivo numa individualidade.

Acima de tudo, o que os últimos jogos da seleção portuguesa demonstraram foi uma urgência em operar renovações. No onze, na convocatória, nas escolhas. E até no cargo de treinador principal.

Para sempre vamos dever a Fernando Santos a maior conquista do futebol sénior português de seleções, mas o conjunto de fatores irrepetíveis que nos levou de empate em empate à vitória final é algo ainda por explicar.

Se não o tivesse vivido diria que todo o europeu de 2016 era uma simulação utópica e impossível. Mas tal como Ronaldo, parece-me que chegou a vez de Fernando Santos terminar o seu ciclo como selecionador nacional.

Scolari levou-nos a uma final e não era amado por todos. Sofremos com alguns dos seus substituitos, mas a vida seguiu. Apesar de tudo, prefiro correr o risco de trocar de selecionador e errar do que desperdiçar provavelmente a melhor geração de jogadores portugueses de sempre num estilo de jogo ultrapassado, monótono e nada adequado à qualidade que evidenciam semana após semana nos melhores campeonatos europeus.

Diogo Pires Gonçalves
Diogo Pires Gonçalveshttp://www.bolanarede.pt
O Diogo ama futebol. Desde criança que se interessa por este mundo e ouve as clássicas reclamações de mãe: «Até parece que o futebol te alimenta!». Já chegou atrasado a todo o lado mas nunca a um treino. O seu interesse prolonga-se até ao ténis mas é o FC Porto que prende toda a sua atenção. Adepto incondicional, crítico quando necessário mas sempre lado a lado.                                                                                                                                                 O Diogo escreve ao abrigo do novo Acordo Ortográfico.

Subscreve!

Artigos Populares

De setembro de 2000 a setembro de 2025: José Mourinho vai assumir o Benfica após 25 anos da sua experiência no clube encarnado

José Mourinho vai voltar a ser treinador do Benfica. O técnico de 62 anos regressa ao clube encarnado após 25 anos.

José Mourinho a caminho do Benfica: negociações praticamente concluídas

José Mourinho está muito próximo de ser confirmado como treinador do Benfica. As negociações estão em vias de ficarem fechadas.

Benfica confirma saída de Bruno Lage em curto comunicado enviado à CMVM

O Benfica confirmou a saída de Bruno Lage em comunicado enviado à CMVM. O técnico foi afastado na noite desta terça-feira.

PUB

Mais Artigos Populares

Bruno Lage na porta de saída e José Mourinho é o eleito de Rui Costa para assumir o Benfica

José Mourinho é o desejado por Rui Costa para assumir o Benfica. O técnico pode estar em vias de suceder a Bruno Lage no comando das águias.

Bruno Lage justifica queda exibicional do Benfica: «O primeiro golo intranquilizou a equipa»

Bruno Lage analisou a derrota do Benfica diante do Qarabag por 3-2 na estreia da Champions League. Técnico encarnado falou em conferência de imprensa.

Bruno Lage assume: «O momento fora de campo não ajudou nem pôs a equipa tranquila para jogar»

Bruno Lage analisou a derrota do Benfica diante do Qarabag por 3-2 na estreia da Champions League. Técnico encarnado falou em conferência de imprensa.