CA Boca Juniors 1-2 Fluminense FC | Glória ao Dinizismo

Foi a vitória duma vida para os das Laranjeiras – no mesmo Maracanã onde haviam perdido a final de 2008, os meninos do Fluminense FC de Diniz levaram de vencido um dos Gigantes do Continente. O CA Boca Juniores, com seis troféus, vinha duma caminhada sempre a ganhar nas grandes penalidades e a fazer da intensidade a sua grande virtude.

Contra o Relacionismo de Diniz, foi impotente – até porque o Jogo Funcional que o interino da Canarinha tanto apregoa, com o seu caótico método de gerar superioridades em todo o relvado, puxando da criatividade e imprevisibilidade dos seus atletas, foi hoje apenas recurso temporário. Houve muita alegria futebolística na primeira parte, com o golo do já lendário Germán Cano a traduzir um domínio em certos momentos avassalador – aos 14’ minutos, Diniz subjugava Almirón. Com 84% de posse!

Mas o técnico Xeneize vingar-se-ia na segunda parte, com a tal intensidade, a apertar os craques brasileiros quando o desgaste ofuscou as ideias. E depois, já no prolongamento, a ironia: a uma equipa que se apelidou tantas vezes de frágil e desequilibrada, viu-se um recital de organização defensiva. Com dez, deu-se a tão querida bola ao adversário e protegeu-se a baliza de Fábio. O Boca, que sempre tentou apenas e só com garra, nunca conseguiu imaginar artimanha para desatar o nó. O outro lado tinha as ideias todas. A consagração total de Fernando Diniz.

Os confrontos no pré-jogo, tudo resultado de deficientes ideias de segurança no Rio, premeditavam tumultos no relvado. A rivalidade entre brasileiros e argentinos sintetizava-se no recente palmarés da Libertadores, com vitórias brasileiras desde 2019 a contrapor o domínio do River Plate na década passada. O Boca não ganha desde 2007 e teria aquele gostinho adocicado uma vitória na casa do adversário, ainda que na condição de mandante (por ter sido melhor na primeira fase).  

A experiência poderia falar alto. Diziam na brincadeira alguns brasileiros que o Boca seria… a dama que tira a inocência ao garoto Fluminense: que até lhe poderia dar bola, que teria paciência para o reguila e as suas brincadeiras, mas que no momento certo, daria a estocada. Com aquele misto de cinismo e matreirice, daria esperança ao menino só para ter atenção e depois dar-lhe-ia a barra quando se fartasse do espectáculo.

Não se pensou foi na dupla-face do menino, que se pode chamar Diniz e se pode chamar Flu – que nesta altura e para a História serão quase a mesma coisa depois desta noite: o tricolor das Laranjeiras tem utopia na mente e joga como pensa; é a revitalização do Joga Bonito, porque é na pureza do sonho que começam a definir os carateres da pequenada. O Fluminense, apesar dum clube gigantesco e mais que centenário, era até agora um dos patinhos feios do Brasileirão, exactamente por não ter arcaboiço continental. Era o virgem do grupo, nunca tinha tido a ginga para entrar na maioridade. Agora, podem dizer com orgulho que o fizeram… sim, com a inocência das grandes ideias, muitas vezes demasiado belas para um mundo com tantos obstáculos – mas também, e por isso mesmo, com a noção de que nem sempre delas se poderão servir para vencer na vida.

Houve o habitual relacionismo de Diniz, interpretado heroicamente por André, Ganso ou Keno, e a obsessão pela rebaldaria – e o Boca passou mal na primeira parte, sempre zonzo com o jogo em escada dos brasileiros, diabos à solta a saltar em tabelas. Quando o recreio acabou e os adultos argentinos impuseram a sua vontade, com muito castigo físico à mistura, entraram em cena os campeoníssimos que mantêm Diniz na realidade: Marcelo e Felipe Melo. A equipa apoiou-se neles, foi aguentando o ímpeto xeneize e inspirou-se no estofo dos ídolos para a resistência da segunda parte do prolongamento, uma inacreditável demonstração de destreza tática e capacidade de sofrimento.

Depois do golo de John Kennedy – e que golo esbelto, bonito, lindo, tão simples e tão perfeito, sumarizando perfeitamente o futebol de rua: associação curta, passe picado, amortie de peito, remate à bruta –  o Flu amadureceu, percebeu o contexto, evoluiu para um novo patamar emocional. Soube distanciar-se dos ideais da beleza absurda e entregou-se ao pragmatismo. Soube sofrer, não chorou, aguentou.

Diniz, o sonhador licenciado em Psicologia, vê-se finalmente consagrado depois dum trajecto sinuoso entre a derrota e o escárnio. No final dos noventa regulamentares, reuniu a sua gente e falou, sempre num tom calmo – que nem sempre é seu hábito. Percebido o momento, tentou acalmar as suas próprias convicções, cortando as asas ao deslumbramento tático – coisa raríssima. A sorte, que o abandonou em tantas ocasiões, sentiu que era merecido um inédito abraço àquele homem.

O Dinizismo, como nas histórias de banda desenhada, passou por todas as etapas. Ilusão, desilusão, fracasso, reinvenção, consagração. E aí está, o aplauso merecido a um dos sonhadores do jogo e o estatuto de imortal numa instituição lendária. 

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Adepto da discussão futebolística pós-refeição e da cultura de esplanada, de opinião que o futebol é a arte suprema.

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