A história e o legado de Gregg Popovich | NBA

modalidades cabeçalho

Após 29 temporadas no comando dos San Antonio Spurs, o treinador Gregg Popovich anunciou a sua retirada do cargo. O técnico com o maior número de vitórias na história da NBA irá agora voltar para a função de presidente das operações de basquetebol da equipa e coloca um ponto final num dos legados de maior longevidade na história da liga.

É preciso recuar até 1996 para encontrar um jogo dos San Antonio Spurs que não tivesse com técnico Gregg Popovich. Na altura, “Pop” era diretor das operações da equipa e despediu o treinador Bob Hill e assumiu ele próprio o cargo, numa história que viria a durar perto de três décadas.

Os primeiros tempos ao comando dos Spurs não foram fáceis para Popovich, que na sua primeira temporada, com a lesão da principal estrela David Robinson, teve o pior recorde da história da franquia, de apenas 17 vitórias e 47 derrotas. O resultado? Os Spurs ganharam a primeira escolha da lotaria do draft e selecionaram na primeira posição um talento há muito ansiado na NBA: Tim Duncan. O gigante das Ilhas Virgens Americanas, onde Popovich tinha viajado para o conhecer antes do draft, trocou palavras com o seu novo técnico logo após a escolha.

Estava dado o primeiro passo naquele que seria o legado que Popovich viria a construir em San Antonio. Tim Duncan juntou-se a David Robinson e ambos formaram “as torres gémeas”, uma dupla imparável no garrafão que transformou o registo da época anterior numa temporada de 56 vitórias e 26 derrotas.

O primeiro título não demorou a chegar. Foi na temporada 1998-99, quando as equipas jogaram apenas 50 jogos na temporada regular devido à gripe. Nos playoffs, os Spurs eliminaram Timberwolves, Lakers e Blazers e chegaram às finais contra os New York Knicks, onde venceram por 4-1. Foi o primeiro título da época dos Spurs e o primeiro da década de 90 que, enquanto Michael Jordan estava na liga, não foi parar às mãos do número 23 dos Chicago Bulls. O MVP das finais foi precisamente Tim Duncan, que começava assim o seu legado como um dos melhores power fowards da história.

Seguiram-se os anos de dominância dos Lakers de Kobe Bryant e Shaquille Oneal. Os Spurs ainda enfrentaram a dupla durante as finais de conferência de 2000-2001, mas saíram derrotados por 4-0. No entanto, o processo de construção dos Spurs, preparando também a retirada de David Robinson, não abrandou. Em 1999, selecionaram com uma discreta 57ª escolha o argentino Manu Ginobili, que só se viria a juntar à equipa em 2002 após um período na Europa. Em 2001, Tony Parker foi escolhido na 28ª posição do draft. Os Spurs começavam assim a formar uma equipa repleta de talentos não americanos, algo incomum na NBA da época.

Em 2002-03, os texanos terminaram com um registo de 60 vitórias e 22 derrotas. A equipa teve uma campanha de playoffs exemplar, vencendo por 4-2 todas as séries que disputou no Oeste, contra Phoenix Suns, LA Lakers e Dallas Mavericks, respetivamente. Os texanos chegaram às finais novamente contra os New Jersey Nets de Jason Kidd e Dikembe Mutombo, vencendo por 4-2 e garantindo o segundo título da sua história. Tim Duncan, que já tinha sido MVP da temporada regular, venceu o prémio de melhor jogador das finais e despediu-se com um título de David Robinson, que terminou a carreira após a conquista.

A retirada do “Almirante” em nada afetou o sucesso dos Spurs na década de 2000. Passados dois anos, novo trófeu Larry O´brien a caminho de San Antonio, após vitória sobre os Detroit Pistons nas finais. Este campeonato foi a afirmação dos texanos como uma potência da NBA, tendo como figuras principais Tony Parker, Manu Ginobili e o inevitável Tim Duncan, que juntou mais um prémio de MVP das finais ao seu palmarés. O projeto de Popovich, apesar de ter bastante sucesso, ainda tinha um núcleo jovem e promissor para competir durante largos anos na NBA.

Em 2006/07, os Spurs voltaram às finais, após vencerem a conferência Oeste com facilidade. Pela frente tinham um jovem Lebron James, que jogava as primeiras finais da carreira pelos Cleveland Cavaliers. Os Spurs venceram por uns claros 4-0 e sagraram-se novamente campeões. Tony Parker foi eleito o MVP das finais, tornando-se o primeiro europeu a conseguir a distinção.

O sucesso durante a temporada regular permaneceu durante os anos seguintes, mas os Spurs tiveram ainda uma longa ausência das finais da NBA. Foi apenas em 2012/13, perante os Miami Heat, que voltaram a pisar o palco das decisões. Num dos momentos mais memoráveis de sempre, os Spurs tinham já uma mão no troféu no jogo 6, quando lideravam por 3 pontos a cinco segundos do fim e Ray Allen, talvez no lançamento mais icónico da NBA, marcou um triplo para forçar o prolongamento. Os Spurs viriam a perder o jogo e consequentemente as finais no jogo 7. Lebron James, que outrora tinha saído derrotado em 2007, vingava-se dos texanos e conquistava o seu primeiro título.

O auge de Popovich: Os Spurs de 2014

Foi precisamente nesta série que começou a ser escrita a história dos San Antonio Spurs de 2014. A turma de Popovich encontrou na dura derrota das finais o espírito necessário para uma temporada de reafirmação. Na temporada regular, um registo letal de 62 vitórias e apenas duas derrotas. A máquina de Gregg Popovich, baseada no trabalho de equipa e na solidez defensiva, estava mais oleada que nunca e os Spurs chegavam aos playoffs com fortes possibilidades de reaver um título.

Na primeira ronda, Tim Duncan e Dirk Nowitzki protagonizaram um duelo icónico a sete jogos entre as duas equipas texanas. Os Spurs saíram por cima com uma expressiva vitória por 119-96 no derradeiro jogo 7 em San Antonio, avançando assim para a segunda ronda. Nas semifinais de conferência, o trabalho foi mais fácil, dado que a equipa afastou os Portland Trail Blazers em cinco jogos. No caminho para as finais, surgiam os Oklahoma City Thunder, de Kevin Durant e Russell Westbrook, uma das fortes potências da época. Os Spurs levaram a melhor com uma vitória por 4-2 no total da série e voltavam a enfrentar os Miami Heat nas finais.

A história de 2013 não se repetiu. Os texanos dispunham de um dos melhores sistemas coletivos da história, com o tridente Duncan, Parker e Ginobili a fazer-se acompanhar de peças como Patty Mills, Danny Green, Tiago Splitter, Boris Diaw ou Marco Belinelli. Todos os jogadores desempenharam um papel fulcral nas finais que ditaram o quinto título da franquia de San Antonio, com aquela que foi a maior diferença pontual de sempre numa série das finais. Surgia ainda um nome que conseguiu parar Lebron James e foi eleito MVP das finais no seu terceiro ano na NBA: Kawhi Leonard.

Os anos que se seguiram foram naturais para os Spurs, que após um afastamento surpreendente na primeira ronda perante os Clippers, realizaram em 2015-16 uma das melhores temporadas regulares que há memória, ofuscada pelos Golden State Warriors que terminaram 73-9. Os Spurs não ficaram longe da equipa com o melhor registo de sempre na temporada regular, terminando com 67 vitórias e 15 derrotas. Especial destaque para o registo em casa, onde a equipa perdeu apenas um jogo, precisamente frente aos Warriors. Os playoffs não correram como esperado, dado que a equipa foi afastada na primeira ronda pelos OKC Thunder, naquele que foi o último momento de Tim Duncan com a camisola dos texanos.

A vida dos Spurs pós-Duncan podia ter sido com muito mais sucesso que muitos esperavam. A equipa tinha em Kawhi Leonard o melhor defensor da NBA e uma opção viável no interior como LaMarcus Aldridge. Os playoffs de 2016-17 foram, aliás, um dos momentos que ditaram o fim do legado dos Spurs. Uma lesão de Kawhi Leonard no primeiro jogo das finais frente aos Golden State Warriors viria não só a ditar a eliminação dos Spurs, como a desencadear uma autêntica “novela” entre a equipa e o jogador, que acabou trocado para os Toronto Raptors um ano depois.

A fase decadente dos Spurs foi chegando, como a todas as equipas da NBA. A equipa viu a sua sequência de 22 presenças consecutivas nos playoffs (ainda hoje record da NBA) cair em 2020, na “bolha” de Orlando. Entre trocas, novos jogadores e alguma sorte à mistura, os Spurs foram começando a reconstrução com o mesmo homem que operara todo o sucesso das duas décadas anteriores: Popovich.

O lendário treinador, que alcançou o maior número de vitórias da NBA em março de 2022, nunca revogou ao cargo e assumiu papel para construir novamente um projeto de sucesso para o futuro da equipa. Em 2023, os Spurs venciam novamente uma lotaria do draft e, à semelhança de 1997, Popovich apanhou um avião para Paris e conversou com Victor Wembanyama, informando-o que este ia ser o pilar do futuro dos texanos. Na noite do draft, o francês revelou-se encantado com a possibilidade de seguir os passos do compatriota Tony Parker e poder ter sucesso nos “Silver & Black”, trabalhando lado a lado com uma lenda como Popovich, que lhe ligou na noite do draft.

O projeto dos Spurs estava bem encaminhado. Após “Wemby” vencer o prémio de rookie do ano, a equipa entrava para 2024-25 com o espírito renovado e a esperança por voltar aos playoffs. Com poucos jogos disputados na temporada, Gregg Popovich sofreu um AVC, em início de novembro, tendo sido afastado. A saúde do técnico de 76 anos foi um tema central da temporada dos Spurs, que entre altos e baixos, falharam o acesso aos playoffs, mas conseguiram desenvolver mais um novato com potencial de estrela em Stephon Castle.

O estado de saúde de Popovich permaneceu em dúvida, até que no mês passado terá tido um novo episódio de AVC num restaurante em San Antonio, algo que alertou toda a comunidade de fãs quanto ao futuro do técnico. Na semana passada, foi confirmado o afastamento de Popovich como treinador principal dos Spurs, dando o lugar ao seu assistente Mitch Johnson. No entanto, o técnico de quase três décadas da equipa não abandona o barco e voltará à posição de presidente das operações de basquetebol da equipa. “Já não sou treinador, sou “El Jefe””, declarou Popovich na sua apresentação, lado a lado com Tim Duncan e Manu Ginobili, que o auxiliavam a cada movimento, dado o seu estado claro de debilitação. O humor de “Pop” permaneceu, envergando uma t-shirt em que era visível o nome do cargo que acabava de intitular.

O trilho de Gregg Popovich enquanto treinador pode ter acabado. O técnico é considerado um dos melhores, se não o melhor, treinadores de sempre. Termina a carreira com 5 campeonatos, 22 presenças nos playoffs e o número assombroso de 1592 vitórias, mas o seu legado vai muito além dos números, a que também se junta uma medalha de ouro pelos EUA em 2020. Popovich assumiu o comando dos Spurs e tornou uma das franquias mais isoladas e com menor mercado da NBA numa escola de disciplina e companheirismo. O técnico instaurou uma autêntica cultura vitoriosa e de competência que ficará para sempre associada à espora no emblema dos texanos. O treinador criou uma autêntica família entre os jogadores do atual plantel e lendas do passado, como é o caso de Tim Duncan, Manu Ginobili ou David Robinson, que marcam frequentemente presença em sessões de treino ou momentos de imprensa da equipa.

O legado de Gregg Popovich é talvez uma das histórias mais bonitas da NBA, tal como de maior longevidade e soberania. É uma figura de maior respeito ao redor da liga e acarinhada por todos os jogadores, que tendo ou não sido treinados por ele, reconhecem a sua influência no jogo moderno.

Em San Antonio, inicia-se um novo capítulo, mas sempre perante o olhar do eterno técnico, que mesmo com todas as debilitações, manter-se-á presente nos bastidores daquele que pode vir a ser o novo projeto de sucesso dos Spurs.

Sabe Mais!

Sabe mais sobre o nosso projeto e segue-nos no Whatsapp!

O Bola na Rede é um órgão de comunicação social de Desporto, vencedor do prémio CNID de 2023 para melhor jornal online do ano. Nasceu há mais de uma década, na Escola Superior de Comunicação Social. Desde então, procura ser uma referência na área do jornalismo desportivo e de dar a melhor informação e opinião sobre desporto nacional e internacional. Queremos também fazer cobertura de jogos e eventos desportivos em Portugal continental, Açores e Madeira.

Podes saber tudo sobre a atualidade desportiva com os nossos artigos de Atualidade e não te esqueças de subscrever as notificações! Além destes conteúdos, avançámos também com introdução da área multimídia BOLA NA REDE TV, no Youtube, e de podcasts. Além destes diretos, temos também muita informação através das nossas redes sociais e outros tipos de conteúdo:

  • Entrevistas BnR - Entrevistas às mais variadas personalidades do Desporto.
  • Futebol - Artigos de opinião sobre Futebol.
  • Modalidades - Artigos de opinião sobre Modalidades.
  • Tribuna VIP - Artigos de opinião especializados escritos por treinadores de futebol e comentadores de desporto.

Se quiseres saber mais sobre o projeto, dar uma sugestão ou até enviar a tua candidatura, envia-nos um e-mail para [email protected]. Desta forma, a bola está do teu lado e nós contamos contigo!

Subscreve!

Artigos Populares

Luis Enrique antevê final da Champions League: «Somos uma equipa que joga muitas finais»

Luis Enrique realizou esta sexta-feira a antevisão da partida entre o PSG e o Inter Milão, relativo à final da Champions League.

Benfica de olho em avançado do Genk para a próxima temporada

O Benfica está atento a Tolu Arokodare, jogador que pertence ao Genk, equipa onde foi destaque na última temporada.

Inglaterra aplica goleada a Portugal na Liga das Nações Feminina

A Inglaterra goleou Portugal por seis bolas a zero, em jogo relativo à quinta jornada da Liga das Nações Feminina.

Real Madrid liberta jogador que tinha contrato desde 2015

O Real Madrid comunicou durante esta sexta-feira que Jesús Vallejo não vai continuar na equipa principal.

PUB

Mais Artigos Populares

Luís Castro já chegou a acordo com equipa da Ligue 1 e pode deixar o Dunkerque

Luís Castro pode assumir o comando técnico do Nantes na próxima temporada. O conjunto gaulês milita na Ligue 1.

Galatasaray encerra a Liga Turca com vitória

O Galatasaray recebeu e venceu o Basaksehir por duas bola a zero durante a tarde desta sexta-feira, em jogo da Liga Turca.

Mercado: 4 internacionais portugueses que podem regressar a Portugal no próximo verão

O mercado de transferências está perto de abrir e alguns internacionais portugueses poderão regressar à Primeira Liga.