O Ciclismo e (mais) uma aberração olímpica

Apaixonei-me definitivamente pelo Ciclismo no Tour de 2008. Com os comboios de Cavendish, com a abnegação dos trepadores da CSC. Apaixonei-me pelo Ciclismo como desporto de equipa, em que o amparo de um bom gregário vale mais que a potência de uma pedalada.

Paralelamente, sempre fui um admirador dos Jogos Olímpicos. A ideia de juntar no mesmo local e num curto espaço de tempo os melhores dos mais variados desportos encanta-me e não tenho dúvidas que inspirará milhões por todo o mundo e que tem uma contribuição muito positiva para a criação de uma sociedade mais eclética.

Contudo, o apreço pelo Ciclismo nos Jogos Olímpicos não é o mesmo, especialmente em anos recentes. Já aqui neste espaço critiquei algumas das decisões tomadas pela UCI e o IOC, especialmente quanto ao que a Pista diz respeito, mas uma nova alteração anunciada para 2024 obriga-me a voltar ao tema.

A UCI anunciou que, a partir de Paris 2024, haverá paridade entre homens e mulheres em todas as competições. Dito assim, não há como não ficar satisfeito, o problema é quando lemos as letras pequenas da decisão e percebemos que as provas de fundo de estrada terão apenas 90 atletas cada.

Ora, estes números só se atingem através de dois métodos: poucas nações ou poucos ciclistas por equipa. Qualquer das soluções é problemática. Ou deixamos de fora ciclistas de nações menos expressivas na modalidade, contribuindo para que estas continuem sem oportunidades de evoluir ou diminuimos o número de ciclistas por equipa, criando uma corrida caótica e quase individual em que a sorte passa a ser crucial para triunfar.

Efetivamente, este último já estava à vista há algum tempo nas Olímpiadas e desvirtua por completo a prova de fundo, de um modo tal que retira credibilidade ao vencedor e torna o título de ‘Campeão Olímpico’ como algo menos respeitado que aquilo que a história e tradição dos Jogos deveria impor. E, se, em provas com percursos mais acidentados como no Rio de Janeiro, ainda há algumas formas de contornar esta realidade, edições mais planas prestam-se a cenários dignos de amadores, como Londres 2012 bem exemplificou.

Para os que – como eu – admiram o esforço de equipa e se entusiasmam com um golpe tático bem montado, estas alterações colocam os Jogos Olímpicos como adversário do bom nome do Ciclismo, porque lhe fazem a derradeira ofensa, tratá-lo como algo que não é.

Na verdade, sob o disfarce do rótulo da igualdade tenta abafar-se o facto de à prova feminina se dar um aumento que continua a ser, claramente, insufuciente e avança-se mais um pouco na degradação da prova masculina.

Querer considerar como uma prova de excelência uma competição com menos 100 atletas à partida é anedótico para qualquer pessoa que tenha o mínimo de noção sobre Ciclismo. Mais, querer correr uma das provas mais longas do calendário com este número de Ciclistas é um atentado à modalidade.

Para haver igualdade é preciso piorar ainda mais a prova masculina? Para haver igualdade é preciso condenar a prova feminina a nunca se realizar com um número decente de competidoras? A resposta a ambas as perguntas é não, mas seria preciso, isso sim, decisores com bom senso e sem medo de fazer frente ao IOC.

A igualdade de pouco serve se for para ficarem todos mal, mas, a que da UCI venham mais chavões que propostas com impacto positivo no Ciclismo, já estamos habituados.

Foto de Capa: UCI

 

José Baptista
José Baptista
O José tem um amor eclético pelo desporto, em que o Ciclismo e o Futebol Americano são os amores maiores. É licenciado em Direito (U. Minho) e em Psicologia (U. Porto).

Subscreve!

Artigos Populares

Vitorino Antunes assume comando do Freamunde

O Freamunde anunciou a contratação de Vitorino Antunes como treinador principal. É o primeiro trabalho como técnico principal.

Bruno Lage revela que desejou sorte a José Mourinho e explica como geriu a saída do Benfica: «Foi automático»

Bruno Lage falou aos jornalistas no Portugal Football Globes. O antigo técnico do Benfica revelou que deu um abraço a José Mourinho.

Baixa na equipa vale chamada de Gustavo Varela à seleção de Portugal de Sub-21

Gustavo Varela foi chamado à Seleção de Sub-21 de Portugal. O avançado de 20 anos foi o escolhido para render Vivaldo Semedo.

Cristiano Ronaldo e Marcelo Rebelo de Sousa entre os distinguidos: Todos os vencedores do Portugal Football Globes

A Federação Portuguesa de Futebol organizou a primeira edição dos Portugal Football Globes. Eis todos os prémios e respetivos vencedores.

PUB

Mais Artigos Populares

Roberto Martínez após prémio entregue: «Diogo Jota vai continuar connosco para sempre»

A Seleção Nacional de Futebol Masculino recebeu o Globo Seleção do Ano. Roberto Martínez subiu ao palco e discursou.

André Villas-Boas recebe prémio e deixa recado a Rui Costa: «Queremos chegar à Primeira Liga e oferecer ali ao Rui Costa uma competição mais...

André Villas-Boas recebeu, em nome do FC Porto, o prémio dos Portugal Football Globes destinado à aposta no Futebol Feminino. O presidente dos dragões deixou uma mensagem para Rui Costa.

FPF distingue quarteto do PSG: «Queremos manter este nível, mas se possível fazer melhor porque ainda nos escapou um título»

Vitinha, Nuno Mendes, João Neves e Gonçalo Ramos receberam o Globo Estrelas do Ano. PSG conquistou vários troféus na época passada.