
A 110ª edição do Tour de France tem ficado marcada pelo duelo de proporções históricas entre Jonas Vingegaard e Tadej Pogacar. O dinamarquês e o esloveno eram, já desde julho de 2022, os principais favoritos à vitória final e confirmaram o estatuto com assertividade
Esta rivalidade traz à memória lutas épicas pela “Grand Boucle” desde o embate entre Jacques Anquetil e Raymond Poulidor em 1963 aos confrontos entre Alberto Contador e Andy Schleck no fim dos anos 2000. O BnR olha para algumas edições do Tour de France que chegaram ao fim com menor distância entre primeiro e segundo.
5. BERNARD THÉVENET VS HENNIE KUIPER (1977)
A 64ª edição do Tour também contou com um prólogo e 22 etapas. O elenco era de luxo, com Eddy Merckx a participar naquele que viria a ser último Tour da carreira, já em clara fase descendente da carreira; Luis Ocaña, espanhol que conquistou a amarela em 1973, mas que estava também em fim de carreira e longe dos seus melhores dias competitivos; Também Joop Zoetmelk estava presente, tendo alcançado o segundo lugar da geral em três edições ao longo dessa década, incluindo em 1976. Iria repetir o feito por mais 3 ocasiões, conquistando finalmente a amarela em 1980.
Lucien Van Impe era o maior favorito, sendo o campeão em título. Van Impe conquistou a amarela no ano de 1976 à frente do neerlandês da Miko – Mercier – Hutchinson. Outro grande candidato era o vencedor do Tour em 1975, Bernard Thévenet, ciclista da Peugeot-Esso-Michelin, assim como Hennie Kuiper, ciclista neerlandês de 28 anos, cujo maior feito até então era a vitória no Campeonato do Mundo de 1975.
O ciclista da TI Raleigh viria mesmo a conquistar quatro dos cinco monumentos, falhando apenas a Liége-Bastogne-Liége. Joaquim Agostinho e Fernando Mendes corriam os dois ao serviço da Teka. José Martins era o outro ciclista português, presente na Kas-Campagnolo.
A primeira amarela do Tour foi decidida num prólogo de 4 quilómetros em Fleurance e sorriu para Dietrich Thurau, colega de Hennie Kuiper, com a TI Raleigh a conseguir também o 2º no contrarrelógio. De entre os candidatos à geral, Merckx foi o melhor a 6 segundos de Thurau e Van Impe perdia já quase 10 segundos para o pentacampeão do Tour. A 13 segundos de Merckx, chegou Thévenet.
A etapa com chegada a Pau ficou marcada por um grupo de 14 ciclistas que se isolou e ganhou 18 minutos ao pelotão. Ficava bastante claro que o vencedor sairia desse grupo, com Joaquim Agostinho a ser o nome mais sonante no pelotão, uma vez que os favoritos conseguiram todos chegar na frente.
O 6º dia de corrida foi dividido em duas etapas na cidade Bordéus. A segunda do dia foi mesmo um contrarrelógio de 30 km. O vencedor foi Dietrich Thurau que pulverizou a concorrência, colocando 50 segundos em cima de Eddy Merckx para reforçar a camisola amarela. Hennie Kuiper e Bernard Thévenet não ficaram distantes do belga, sendo que Lucien Van Impe perdeu mais de um minuto para o compatriota. Ainda assim, ficou próximo dos tempos de Zoetemelk e de Ocaña.
Jan Raas ganhava a 6ª etapa com uma pequena vantagem para um grupo onde seguiam Kuiper e Agostinho que colocavam tempo nos demais rivais. O 8º dia do Tour era de jornada dupla e a primeira parecia destinada aos sprinters. Ainda assim, o estilo de preparação de sprints não era, nem de perto, tão organizado como é hoje pelo que o camisola amarela não se coibiu de atacar e de se isolar com Joseph Bruyére, da Fiat. A iniciativa acabou por ser anulada, mas Ocaña perdia tempo antes do contrarrelógio coletivo desse dia.
O contrarrelógio em Angers tinha apenas 4 km, pelo que era um esforço para fazer diferenças mínimas. A Fiat saiu por cima, sendo a única formação a baixar dos 4 minutos, com a Peugeot a ficar apenas 11 segundos atrás. A equipa do camisola amarela e de Hennie Kuipers perdia cerca de 30 segundos para o pentacampeão do Tour, mas Dietrich Thurau continuava a ser o camisola amarela do Tour.
A etapa 9 foi marcada por uma má exibição de Zoetemelk que mantinha tendência do contrarrelógio por equipas. Voltava a perder tempo e já estava a 3 minutos e 40 segundos do alemão da TI Raleigh. Dietrich Thurau não queria largar a amarela e até aproveitava todos os segundos que pudesse conquistar. Em Roubaix, na 11ª etapa voltava a ganhar alguns segundos aos adversários.
A etapa 15 era também dividida em dois setores, com o segundo a ser um contrarrelógio individual de 14 km entre Morine e Avoriaz. Joope Zoetmelk seria o mais rápido, mas a vitória acabaria por lhe ser retirada, uma vez que o neerlandês acusou positivo por consumo de doping (à época, não implicava desclassificação ou suspensão do atleta).
Portanto, Lucien Van Impe ganhou a etapa com 20 segundos de vantagem para Bernard Thévenet. Hennie Kuiper perdia 50 segundos para Van Impe e Eddy Merckx perdia mais de 1 minuto para o compatriota da Lejeune. Dietrich Thurau perdeu quase 2 minutos e largou a camisola amarela pela primeira vez desde o prólogo.
A etapa 16 ficou para a história não por ter sido um dia épico para a geral. Thévenet não foi muito atacado e manteve a amarela mas porque foi o dia em que Eddy Merckx estourou e ficou fora da luta pela vitória no Tour, perdendo 2 minutos e 37 segundos nesse dia. O dia seguinte marcou a chegada ao Alpe d’Huez e foi a prova dos 9 para a TI-Raleigh.
Quem abriu as hostilidades foi Lucien Van Impe que atacou no Col du Granon e chegou à subida do Alpe d’Huez com 2 minutos e 25 segundos de vantagem para um grupo onde rolavam Thévenet, Kuiper, Francisco Galdos e Enrique Martinez (Kas-Campagnolo), bem como Zoetemelk.
Van Impe acabou por não gerir bem o esforço e teve uma quebra que permitiu ao camisola amarela fazer a ponte para a frente, levando Hennie Kuiper na roda. O neerlandês só largou a roda do campeão do Tour de 1975 a 5 km do fim para conquistar a chegada mítica nos Alpes com 41 segundos de vantagem para Bernard Thévenet.
Na geral, Thévenet segura a amarela por 8 segundos para Kuiper, com Van Impe a 1 minuto e 58 segundos. Francisco Galdos era quarto a mais de 4 minutos do francês. 20ª etapa, contrarrelógio em Dijon, com 50 km de extensão. A TI-Raleigh esteve em grande, ocupando três dos quatro primeiros lugares. O que faltou à equipa neerlandesa foi mesmo o primeiro, com Bernard Thévenet a ganhar 28 segundos a Hennie Kuiper e cerca de minuto e meio a Lucien Van Impe. 36 segundos entre Thévenet e Kuiper à entrada para o contrarrelógio final entre Versalhes e Paris.
6 km para decidir o Tour e Thévenet tinha tudo para confirmar a segunda vitória na geral da “Grand Boucle”. Dietrich Thurau confirmou a superioridade em contrarrelógios ao alcançar o 5º triunfo em etapa dessa edição, com o colega de equipa Gerrie Knetemann bem próximo. Kuiper perdeu mais 12 segundos nesse dia, acabando o Tour a 48 segundos de Bernard Thévenet. Lucien Van Impe completou o pódio, a mais de 3 minutos e meio do francês mas com mais de 4 minutos de vantagem para Francisco Galdos.
Uma luta pela geral que ficou muito marcada pela indefinição da corrida até à última semana de prova, pelo que a exibição de Bernard Thévenet e da TI Raleigh, em particular de Dietrich Thurau, chamam mais à atenção do que a luta pela vitória entre Bernard Thévenet e TI Raleigh. Teremos sempre o Alpe d’Huez.
4. STEPHEN ROCHE VS PEDRO DELGADO (1987)
Em 1987, o Tour de France chegava com uma lista extensa de favoritos, com a grande ausência do campeão de 1986 e primeiro norte americano de sempre a ganhar a camisola amarela, Greg Lemond. Charles Mottet e Laurent Fignon eram os principais candidatos gauleses, ambos da Système U. Mottet tinha mesmo ganho o Dauphiné desse ano, prova que conquistaria também em 1989 e 1992, sendo que no anterior conquistara duas etapas na Volta à Espanha.
Já Fignon dispensava apresentações, tendo conquistado o Tour por duas ocasiões, um domínio que não teve continuidade, em parte, pelo histórico de lesões do francês. Mas talvez o principal nome a ter debaixo de olho fosse mesmo o de Stephen Roche. O irlandês que chegava ao Tour com 28 anos, já com 3 vitórias na Volta a Romandia, em corridas como o Paris-Nice, a Volta ao País Basco e, já em 1987, no Giro d’Italia. Já Pedro Delgado chegava à corrida já com vitórias de etapa no Tour e na geral da Vuelta, em 1985. Corria ao serviço da PDM.
O Tour de 87 começou com um prólogo de 6,1 km, em Berlim, um ano depois da queda do muro, assinalando também a maior distância de sempre entre o local de partida da corrida e o território francês. O prólogo foi conquistado por Jelle Nijdam, neerlandês da Supercomfex que envergava a primeira camisola amarela dessa edição da corrida francesa.
As diferenças não foram muito significativas, mas Roche conseguiu distanciar os rivais, com Pedro Delgado a ser o mais próximo do irlandês, a 12 segundos, com Andy Hampston logo atrás. Mottet perdia 19 segundos e Fignon 25. Mais perto de Roche ficaram 2 nomes espanhóis, menos conhecidos nesse ano de ’87: Miguel Indurain, da Reynolds-Seur.
A 2ª etapa em linha, um contrarrelógio coletivo de 40,5 km em Berlim marcou um novo embate entre os candidatos à vitória, no qual Roche esmagou a concorrência, com a sua equipa, a Carrera Jeans – Vagabond a colocar 37 segundos na Système U de Mottet e Fignon, mais de 1 minuto na PDM de Delgado e quase 1 minuto e meio na 7 eleven de Hampston. Stephen Roche já era terceiro na geral.
A meio da etapa 3, com chegada a Estugarda, criou-se um grupo de 22 ciclistas com destaque para a presença de Erich Mächler, colega de Roche, e de Charly Mottet. O grupo acabou por ficar partido, com o francês a perder o contacto, mas com o homem da Correra Jeans a ficar na frente. Quem ficou junto do suíço? O português Acácio da Silva conquistou a sua primeira de três etapas no Tour de France, com Mächler mais preocupado em chegar à amarela.
Mottet ficou a 48 segundos do grupo da frente, mas com mais de 5 minutos para o pelotão. Pedro Delgado ganhava também ganhava 10 segundos ao grupo principal. A etapa 6 ficava marcada pela vitória de Christophe Lavainne, da Système U, com a formação francesa a colocar um corredor muito próximo de Mächler na geral.
A etapa 10 foi o novo palco para a luta pela classificação geral. Um novo contrarrelógio entre Saumur e Futuruscope, numa distância de…87,5 km! Uma monstruosidade para os dias de hoje e num Tour com 26 dias. Stephen Roche provou mais uma vez o seu domínio nesta vertente, com uma vitória clara em que, dos rivais da geral, apenas o francês Mottet, ficou a menos de 1 minuto, chegando à camisola amarela, mas com uma vantagem “gorda” de 3 minutos e 23 segundos para o irlandês. Roche ganhou quase 2 minutos e meio a Delgado, mais de 4 minutos a Fignon e mais de 6 a Hampston que ficava de fora da luta pela geral.
Charly Mottet passou a liderança da geral para Martial Gayant no dia a seguir. Gayant era colega de Mottet e venceu escapado na etapa 11, com chegada a Chaumeil, com 11 minutos de vantagem para o grupo principal, com Pedro Delgado a conquistar mais 17 segundos em relação ao mesmo grupo.
Na chegada a Pau, foi Charly Mottet a assumir de novo o primeiro lugar, com Gayant a perder mais de 16 minutos. Quem escapou foi Jean-François Bernard, da Toshiba, que foi 2º na etapa, ganhando mais de 3 minutos aos rivais para subir ao 2º lugar da geral, a menos de 2 minutos do compatriota que agora vestia de amarelo.
Já em plena cordilheira dos Pirinéus a etapa 13 marcava a chegada a Luz Ardiden com passagem pelo Col de Marie Blanc. Um dia em que a Colômbia se fez representar por “Lucho” Herrera, da Café de Colombia, e Pablo Wilches, da Manzana Postobón. Os favoritos marcavam-se, quando o norueguês Dag-Otto Lauritzen atacou na descida, jogando “gato e rato” com a fuga para conquistar a etapa.
Andy Hampston e “Lucho” Herrera, da Café de Colombia mexiam na corrida, sem uma resposta forte do pelotão, num dia em grande para a 7 Eleven que ganhava a etapa e metia Hampston no top 10. Já no grupo principal, era Pedro Delgado quem ganhava poucos segundos aos rivais, com exceção para Bernard e Mottet. O ciclista da Toshiba perdeu cerca de minuto e 20 para Roche; já Mottet perdia quase 2 minutos, mas continuou de amarelo. O colega de equipa, Laurent Fignon começava a dizer adeus à luta pela vitória, perdendo pouco menos de 4 minutos para o irlandês.
No dia seguinte, Charly Mottet, Jean-François Bernard e Pedro Delgado iam todos ganhar mais de 1 minuto a Roche. No dia seguinte, Roche vingar-se-ia, ganhando 1 minuto e 17 segundos a Mottet. Consigo chegavam Bernard e Delgado, com a diferença para o líder da geral a esfumar-se cada vez mais e a cronoescalada no Mont Ventoux mesmo à porta. Tudo indicava que este quarteto ia disputar a edição de 1987 do Tour de France.
Etapa 18 e era dia de cronoescalada! Muita expetativa para ver como é que Mottet se ia defender, em particular de Stephen Roche, que fora o único a bater o francês no esforço individual com final em Futuruscope.
Pois bem, quem ganhou foi um francês, mas com outras cores ao peito. Jean-François Bernard foi o único a baixar da hora e 20 no Ventoux, batendo um impressionante “Lucho” Herrera que liderava na classificação da montanha. Roche perdia mais de 2 minutos e Mottet era o grande perdedor do dia, com quase 4 minutos de perda para o compatriota. Delgado ficou em terceiro a menos de 2 minutos do rival gaulês. Bernard vestia de amarelo com uma margem superior a 2 minutos e meio para Roche que ocupava a segunda posição.
A chegada a Villard de Lans definiu os dois principais candidatos à geral. Bernard sofreu um furo e com a corrida lançada, os favoritos não aguardaram pelo camisola amarela que era o único ciclista do top 5 que não estava na frente da corrida. Na última subida da jornada, Pedro Delgado atacou com Roche na roda e mais ninguém seguiu o duo.
Pedro Delgado conquistou a etapa, mas não conseguiu grande margem para Roche, que se tornou no terceiro irlandês da história a vestir a amarela do Tour. Bernard perdia 4 minutos e caía para 4º a mais de minuto e meio do líder. Mottet ocupava a 2ª posição.
A 20ª etapa marcava a chegada ao Alpe d’Huez e Pedro Delgado continuou a mostrar a sua capacidade na montanha e atacou, sem resposta direta de Stephen Roche. Essa etapa ficou marcada por um “braço de ferro” entre os dois ciclistas. Roche até começou por meter um bom ritmo, mas o irlandês acabaria mesmo por estourar, perdendo mesmo tempo para Jean-François Bernard.
Depois de passar despercebido para o público casual, Pedro Delgado era finalmente o novo camisola amarela do Tour, com 25 segundos de vantagem para Stephen Roche, cerca de 2 minutos para Charly Mottet e para Jean-François Bernard, com os dois franceses separados por apenas 10 segundos. A 5 minutos e 40 segundos estava “Lucho” Herrera que continuava em grande no Tour e que parecia a única ameaça ao pódio fora dos quatro primeiros.
Pois bem, os maiores campeões do Tour têm todos um momento em que o Mundo soube que eles podiam mesmo ser os vencedores. O momento de Stephen Roche foi em La Plagne, na etapa 21, num dia em que Pedro Delgado até reforçou a liderança na geral e em que o espanhol tinha a possibilidade de ganhar uma distância importante antes do contrarrelógio, o quinto deste Tour, em Dijon.
A etapa levou os ciclistas ao Col du Galibier, ao Col de la Madeleine e ao Col de la Plagne. Delgado tinha um dia perfeito para atacar. Mas foi Roche quem se lançou a atacar, mas no plano antes da subida a Madeleine. Pedro Delgado não respondia pois todo o grupo foi apanhado de surpresa.
O irlandês chegou à penúltima subida com mais de minuto e meio de vantagem para o camisola amarela. O objetivo era gerir a vantagem para o espanhol que liderava a geral, mas a vantagem começou a esmorecer e a iniciativa foi neutralizada antes de La Plagne, muito porque a PDM tinha dois ciclistas para ajudar Delgado. Na última subida do dia, Laurent Fignon atacou com resposta do espanhol Anselmo Fuerte.
Pedro Delgado também atacou e ganhou uma vantagem muito grande para o rival da Correra Jeans, chegando mesmo a existir um minuto a separá-los na estrada. Jean-François Bernard perdia já mais de 4 minutos. O ciclista espanhol mostrava que era o melhor trepador desta edição do Tour, mas não geriu bem o esforço na subida final do dia. Começou por ser alcançado e ultrapassado por Fábio Parra. E para surpresa de muitos, Stephen Roche perdia apenas para 4 segundos para o camisola amarela, ficando a uma distância de 29 segundos para o rival.
A 22ª etapa marcou o último dia de montanha e na frente a vitória ficou rapidamente encaminhada para Eduardo Chozas, ciclista da Teka. Charly Mottet foi o primeiro a ficar para trás, o que hipotecou as chances do francês para o 3º lugar. Fignon não aguardou pelo colega de equipa e seguiu com o grupo dos favoritos. Marino Lejarreta rebentava com o grupo, impondo o ritmo, com o compatriota Pedro Delgado na roda. Foi o homem da Caja Rural quem atacou primeiro, com resposta de Parra.
Pouco depois, a Carrera Jeans abriu um pequeno espaço para o camisola amarela que o conseguiu fechar. Ficavam três ciclistas no grupo: Roche, Eddy Schepers (um gregário do irlandês) e Delgado, mas rapidamente foram alcançados pelo resto do grupo. Na descida para Morrazin, Stephen Roche atacou e uma resposta tardia do camisola amarela, criou uma diferença de18 segundos entre os dois na meta.
Stephen Roche partia para o contrarrelógio com 21 segundos de atraso para Pedro Delgado e tinha 38 km para inverter a situação na classificação geral. Já Jean-François Bernard tinha a luta pelo lugar mais baixo do pódio bem encaminhada, com uma vantagem de 1 minuto e 38 segundos para Charly Mottet.
O contrarrelógio comprovou os prognósticos, com o francês da Toshiba a vencer o seu segundo esforço individual do Tour, depois do triunfo no Mont Ventoux, para garantir o 3º lugar da geral. Stephen Roche recuperou logo 19 segundos para Pedro Delgado no primeiro ponto intermédio; no terceiro ponto, a vantagem já era superior a 1 minuto e na meta rondou o mesmo valor.
Uma excelente defesa por parte de Pedro Delgado que recuperou tempo nos últimos 7 quilómetros, mas não conseguiu impedir a primeira vitória de um irlandês na história do Tour de France. Roche ganhava por 40 segundos numa prova em que o contrarrelógio foi chave para impedir a vitória do trepador que acabaria por conquistar a amarela no ano seguinte.
3. JAN JANSSEN VS HERMAN VAN SPRINGEL (1968)
Anos 60, a 2ª Guerra Mundial terminara 23 anos antes e o Tour disputava-se por seleções, ao invés das equipas com apoio de marcas, o que viria a acontecer a partir do ano seguinte. Um total de 8 nacionalidades representadas em 10 seleções, com a França a ter três equipas e a Bélgica a ter duas. Suíça e Luxemburgo partilhavam o bloco.
Roger Pingeon era o campeão em título e um dos maiores favoritos à vitória, tal como Raymond Poulidor que tinha já terminado duas vezes na segunda posição do Tour. Herman Van Springel era um jovem belga com 25 anos, que até tinha ganho uma etapa no Tour de 67 e que tinha provas dadas em clássicas como a Gente-Wevelgem, que conquistou dois anos antes.
Também Rolf Wolfshohl, vencedor da Vuelta em 1965, chegava com a possibilidade de dar a vitória à República Federal da Alemanha (RFA). Já Jan Janssen ganhara a Vuelta em 1967, a classificação por pontos do Tour em duas ocasiões distintas, assim como o Paris-Roubaix e provas de uma semana, ao longo da carreira. Fora ainda campeão do Mundo em 1964 pelo que era a maior aposta dos Países Baixos para ganhar a Volta à França.
O prólogo de abertura em Vittel, no Luxemburgo foi apenas a segunda instância deste tipo de jornada no Tour. A primeira fora no ano anterior, em Anger. Foi ganho por Charly Grosskost, com Jan Janssen a ser o melhor dos candidatos à geral, com Raymond Poulidor apenas a 2 segundos do neerlandês. Van Srpingel ficava a 23 segundos do vencedor da etapa, com Aimar logo atrás e Roger Pingeon era um dos maiores derrotados do dia, ficando 28 segundos atrás do primeiro camisola amarela do Tour.
O primeiro dia foi plano mas extremamente atacado (era a tradição quase diária na altura) com um grupo de 11 ciclistas a colocar-se na frente na fase inicial do dia. A 35 km, dava-se a movimentação vencedora, com um grupo de 9 ciclistas que incluía Herman Van Springel, o camisola amarela, Charly Grosskost e Italio Zilioli. E foi o homem de amarelo ue venceu novamente num sprint a cinco, ganhando mais de 1 minuto ao pelotão.
Grossskost ia ter um mau dia na 2ª etapa, perdendo mais de 30 segundos para um grupo onde seguiam Van Springel, Zilioli, Janssen e Poulidor, assim como 21 segundos para um grupo onde rodavam Roger Pingeon e José Samyn, ambos da França A.
O 4º dia de competição foi de jornada dupla, com um contrarrelógio coletivo e uma etapa a ligar Forest e Roubaix. No crono de 22 km, a Bélgica A destruiu a concorrência, ganhando com 1 minuto e 41 segundos de vantagem para a formação A Espanha foi a única formação francófona a perder menos de 3 minutos, com a Itália a perder 4 minutos, os Países Baixos 6 minutos e a RFA ficou a mais de 10 minutos! Herman Van Springel chegava à camisola amarela
O belga não tardou a perder a amarela, com Jean-Pierre Genet a recuperar mais de 3 minutos para o grupo principal, num dia em que o gaulês George Chappe conquistou a vitória. O dia seguinte marcou uma nova “cambalhota” na geral, muito potenciadas pelo estilo desorganizado de corrida, com Georges Vandenberghe a chegar à camisola amarela com uma vantagem superior a 3 minutos.
A geral voltou a ser discutida na 12ª etapa, entre Pau e Saint-Gaudens. Um dia em que Georges Pintens foi o mais rápido num grupo de 8 ciclistas e em que Poulidor e Wolfshohl ganharam quase 2 minutos e meio ao grupo principal, conseguindo também ultrapassar Van Springel na geral. A amarela continuava em Vandenberghe. No dia seguinte, Van Springel ganhou a etapa.
O belga ganhou 2 segundos a Jan Janssen nesse dia e o homem dos Países Baixo recuperou os dois segundos na etapa 14, com uma vitória depois de vários top 3, na chegada a Perpignan, com Roger Pingeaud a atacar depois da passagem pelo Port d’ Envalira. O vencedor do Tour de 67 não olhava para trás e ganhava com uma margem de quase 3 minutos para os rivais.
O maior perdedor do dia era mesmo Raymond Poulidor, que cedeu mais de um minuto para o rival, num dia em que foi ao chão.
Na etapa 16, Franco Bitossi foi o primeiro atacar e levou Lucien Aimar consigo. Pouco depois, 9 ciclistas acabaram por se juntar ao duo, sendo que a resposta mais imediata foi de um grupo de 6 ciclistas que incluía Jan Janssen. Gregorio San Miguel, Antonio Gómez e Herman Van Springel. A mais de 20 km do fim, Bitossi e Wolfshohl atacaram, com o italiano a vencer a etapa e o alemão a vestir a camisola amarela. O grupo dos favoritos ficava a mais de 1 minuto e Aimar perdia ainda mais, com uma quebra nos quilómetros finais.
Rolf Wolfhohl ficou fora da luta pela vitória na 18ª etapa, perdendo mais de sete minutos e meio para Roger Pingeon que fez uma nova “maratona” com um ataque no Col du Granier, primeira de três subidas do dia para conquistar quase 4 minutos à concorrência mais direta num dia em que Lucien Aimar recuperou o tempo que perdeu no dia anterior. Jan Janssen chegou acompanhado por três belgas, incluindo Van Springel, o que começava a apontar para a luta final pelo triunfo no Tour. Os outros dois ciclistas no grupo eram Georges Pintens e Antoon Houbrechts.
Andrés Gandarias e Grégorio San Miguel, cederam 50 segundos, pelo que o duo espanhol se conseguiu defender bem, ganhando mais de um minuto a Vandenberghe e a Bitossi. San Miguel vestia a camisola amarela, com o top 10 separado por 3 minutos e 21 segundos.
A etapa 19 chegava a Sallanches e foi o dia em que Herman Van Springel chegou à camisola amarela. A vitória da etapa foi para o britânico Barry Hoban e não teve grande história. Já a geral viu uma mudança de líder com San Miguel a perder o contacto na descida do Grand Colombière com Julio Jiménez a ser o único colega que esperou para o ajudar. Herman Van Springel conseguia ganhar 4 segundos a Pingeon e a Janssen. Gandarias e Aimar também perderam 17 segundos. Ainda assim, as diferenças nas montanhas eram muito reduzidas e o contrarrelógio final ganhava cada vez mais importância, com o top 4 separado por 59 segundos.
O último dia foi de jornada dupla. Um contrarrelógio de 136 km entre Auxerre e Melun, com 55 km de distância. Jan Janssen voou para a vitória, subindo de 3º para 1º no último esforço deste Tour. Herman Van Springel fez quase tudo bem, mas perdeu 54 segundos para um “Holandês voador” que se tornou no primeiro ciclista dos Países Baixos a ganhar a Volta à França. 38 segundos entre 1º e 2º foi a margem de vitória mais curta da história da “Grand Boucle” até então.
2. ALBERTO CONTADOR VS CADEL EVANS (VS MICHAEL RASMUSSEN) (2007)
O Tour de 2007 decidiu-se por uma margem de 23 segundos, a segunda mais curta de sempre numa Volta à França. Todavia a luta mais memorável foi entre o jovem de 24 anos, Alberto Contador, da Discovery Channel, contra o veterano Michael Rasmussen, da Rabobank. O dinamarquês da Rabobank tinha o Tour muito bem encaminhado.
Alberto Contador estava no seu ano de revelação e era um candidato à vitória, depois de ter ganho o Paris-Nice desse ano. Alejandro Valverde, Carlos Sastre, Levi Leipheimer e Christophe Moreau eram outros nomes no radar.
O 8º dia da prova, com chegada a Tignes marcou o primeiro grande “tiro” na geral, com Rsmussen a atacar de longe para meter quase 3 minutos nos rivais mais diretos. Cristophe Moreau e Iban Mayo eram quem mais esticava no grupo perseguidor. O desentendimento do grupo condicionava qualquer perseguição do homem da Rabobank.
O basco da Saunier-Duval acabou por se distanciar a menos de 2 km do fim, perseguido por um grupo com Alejandro Valverde, Christophe Moreau, Cadel Evans, Andrey Kashechkin e Frank Schleck que ficou a cerca de 25 segundos de Mayo. Contador perdia 34 segundos, abrindo uma distância de 4 segundos para Sastre e Denis Mechov dentro dos últimos km.
O dia seguinte ficou marcado por um ataque de Alberto Contador a 40 km do fim, sem resposta direta de Rasmussen, apenas com Cadel Evans a seguir o madrileno. Já Christophe Moreau perdia o contacto, um aspeto que contradizia a forma que o gaulês apresentara no dia anterior. O australiano da Predictor – Lotto não acompanhava mais Contador que passou isolado no alto do Galibier, sendo alcançado numa fase plana antes da meta.
O contrarrelógio em Albi viu Cadel Evans conquistar a etapa (resultado corrigido após desclassificação de Vinokourov) com mais de 1 minuto de vantagem para Alberto Contador. Já Rasmussen perdia quase 2 minutos; Sastre perdeu quase 3 minutos; Fränk Schleck e Haimar Zubeldia perdiam mais de três minutos; já Valverde e Mayo eram os grandes perdedores do dia, cedendo mais de 4 minutos para o australiano.
O minuto e meio de Evans para Contador dava confiança ao australiano que parecia favorito, apenas com um minuto de atraso para Rasmussen antes de três etapas de montanha.
A etapa de Plateau de Beille foi mítica. O ritmo de Yaroslav Popovych destruiu o grupo, com Valverde e Menchov a perderem o contacto gradualmente. Alberto Contador atacava a 7,5 km do final, com Rasmussen, Sastre e Evans a responderem. No contra ataque de dinamarquês, Sastre descolava.
O dinamarquês da Rabobank não parava de mandar esticões para demonstrar a sua força. Apenas Contador e Evans aguentavam na roda. Era um luta de esticões entre Contador e Rasmussen, com Evans a apanhar rodas, abrindo completamente a 5,6 km do final. Perdia quase dois minutos nesse dia. O madrileno ganhava a etapa com a camisola branca e Rasmussen na roda.
No dia seguinte, Contador voltou a atacar e só o camisola amarela conseguiu responder. A luta com Rasmussen permitiu ao “Pistoleiro” ganhar a vantagem necessária para Cadel Evans antes do contrarrelógio final. Só na etapa 15, foi 1 minuto e 16 segundos em cima do australiano. A etapa 16 viu Rasmussen quebrar Contador que apenas ganhou 8 segundos a Evans nesse dia.
Antes da etapa 17, Rasmussen foi despedido da Rabobank, acabando por confessar. em 2013, que recorreu ao doping. O despedimento foi justificado com “violação de regras da equipa” uma justificação que o dinamarquês viria a contestar em tribunal.
Assim, Contador ficava muito perto de ganhar o Tour aos 24 anos, Tinha 1 minuto e 53 segundos de vantagem para um dos melhores contrarrelogistas do Mundo e esperavam-no 55 km de esforço individual na penúltima etapa. Evans esmagou Contador no crono, batendo o castelhano por 1 minuto e 27 segundos, mas perdia o Tour por 23 segundos, a segunda margem mais curta de sempre
1.GREG LEMOND VS LAURENT FIGNON – 1989
Para terminar, voltamos aos anos 80, 2 anos depois do triunfo inédito de Stephen Roche e um ano depois da vitória de Pedro Delgado. Desta vez, o vencedor de 1986, o primeiro americano a alcançar o triunfo final na “Grand Boucle”, Greg Lemond ( da ADR) estava presente mas a lista de favoritos não sofria grandes alterações em relação à de 1987.
“Lucho” Herrera chegava como campeão da Vuelta de 87 e tinha já alcançado um top 5 no Tour. Stephen Roche (agora na Fagor) também estava presente, assim como Charly Mottet (agora na RMO, deixando a liderança da Super U para Laurent Fignon) e Pedro Delgado (agora na Reynolds- Banesto).
O prólogo foi, tal como em 1968, no Luxemburgo, e ficou marcado por um equilíbrio de forças entre Lemond, Fignon e Sean Kelly (da PDM). O principal derrotado do dia era Pedro Delgado que ficava com quase 3 minutos de atraso, depois de chegar 2 minutos e meio atrasado à rampa de partida. Roche também ficou aquém, perdendo 25 segundos.
Erik Breukink, da Panasonic vestia a primeira camisola amarela do Tour. A liderança mudava de mãos no dia seguinte, com Acácio da Silva a conquistar a etapa e a vestir a camisola amarela do Tour, sendo o primeiro e único ciclista português a ter liderado o Tour.
O contrarrelógio coletivo começou a demonstrar quem ia lutar pela camisola amarela durante os três dias de competição. A Super U de Fignon arrasou a concorrência, ganhando 51 segundos a Greg Lemond, mais de 2 minutos a Stephen Roche, mais de 3 minutos a “Lucho” Herrera e mais de 4 minutos a Pedro Delgado, que ficava com um grande desafio pela frente para revalidar a conquista de 87. A PDM, de Sean Kelly, foi 2ª a 50 segundos e a RMO, de Mottet, perdeu pouco mais de 1 minuto. Acácio da Silva mantinha a amarela.
O contrarrelógio individual de 73 km na etapa 5 marcou o novo confronto entre os homens da geral. Greg Lemond conquistou a vitória, com 24 segundos de vantagem para Delgado, mas mais importante, 56 segundos para Fignon (recuperou o prejuízo do contrarrelógio por equipas. Stephen Roche perdeu mais de 3 minutos nesse dia, assim como Mottet. O norte americano vestia de amarelo, com apenas 5 segundos de vantagem para o rival francês.
A etapa 9 viu a revelação do ciclista que se viria a tornar uma lenda. Miguel Indurain atacou, integrou a fuga do dia e seguiu isolado na frente, ameaçando a amarela de Lemond. Na chegada a Cambasque, o espanhol quebrou, mas acabou por ganhar a etapa. Logo no início da subida final, Charly Mottet lançou-se ao ataque, mas foi Pedro Delgado quem atacou com sucesso, ganhando cerca de 30 segundos ao camisola amarela.
Na etapa 10, com passagem pelo Tourmalet, Pedro Delgado voltou a atacar, na roda de Julián Garospe, chegando-se à frente da corrida. Na subida de SuperBágneres, Pedro Delgado perdeu a etapa para Robert Millar, mas conseguiu deixar Mottet (que também tinha ido para a fuga) para trás. Laurent Fignon era o melhor dos favoritos, ganhando 12 segundos a Greg Lemond para vestir a camisola amarela.
A distância entre os dois primeiros era de meros 7 segundos. Charly Mottet estava a 57 segundos e Pedro Delgado já era 4º, mas com 2 minutos e 53 segundos para recuperar. Na etapa 15, Delgado voltava a recuperar uns segundos para Greg Lemond no contrarrelógio em Merlette. Steven Rooks, da PDM ganhou a etapa, num dia em que o norte-americano da ADR a voltar ao primeiro lugar, ao tirar 47 segundos a Laurent Fignon. Charly Mottet já só tinha o 3º lugar preso por 31 segundos.
Em Briançon, apenas Mottet ganhou 1 segundo mas todos estavam com forças muito equilibradas à entrada da última semana do Tour. A etapa 17 contou com a chegada ao Alpe D’Huez e com um pequeno “bluff” de Laurent Fignon que parecia estar em dificuldades na roda de Lemond, apenas para atacar com uma resposta muito tardia de Pedro Delgado, com o duo a deixar o camisola amarela em crise. Fignon e Delgado não discutiram a vitória na etapa, ganharam 1 minuto e 20 segundos ao líder, dificultando muito a segunda vitória de Greg Lemond no Tour.
Na etapa 18, Fignon não teve a companhia de Delgado e ganhou a etapa, colocando mais 24 segundos em Greg Lemond, com Delgado a quebrar um pouco no sprint final.
Laurent Fignon partiu para o contrarrelógio final entre Versalhes e Paris. O homem da Super U tinha 50 segundos de vantagem para o norte-americano e cerca de 2 minutos e meio para Pedro Delgado que tinha o 3º lugar praticamente garantido. Aliás, seria o camisola amarela sem os 2 minutos e 34 segundos de atraso para a partida no prólogo.
O contrarrelógio tinha 24,5 km e Greg Lemond estava obrigado a derrotar Fignon de forma clara, para alcançar a 2ª vitória da carreira no Tour. Pois bem, foi com suspense que Laurent Fignon entrou na reta da meta, com 45 segundos de margem para manter a amarela. E Fignon acabou por ficar em 3º do contrarrelógio, mas a 58 segundos de Greg Lemond que ganhava o Tour por meros 8 segundos, a distância mais curta de sempre na história do Tour de France!