Jogos Olímpicos | A confirmação da supremacia de Espanha

    Parc des Princes 18h horário local. Sexta-feira 9 de Agosto. Um calor abrasador em Paris. O estádio onde habitualmente joga o PSG recebeu a final olímpica do torneio de futebol masculino entre Espanha e França. Uma rivalidade histórica que viveu este novo capítulo absolutamente inesquecível.

    Com um estádio a abarrotar de franceses num apoio esmagador à sua equipa, a seleção francesa comandada por Thierry Henry (uma das maiores estrelas do futebol nos anos 2000) defrontava uma Espanha que foi de menos a mais nesta competição e que vinha de ganhar a Marrocos, uma das seleções mais fortes deste torneio olímpico.

    A seleção espanhola vinha moralizada com essa vitória mas do outro lado encontrou uma França bastante motivada e com uma equipa repleta de jovens promessas, sendo que uma delas está chamada a ser um dos grandes nomes do futebol mundial nos próximos anos: Michael Olise, já contratado pelo Bayern Munique.

    Um extremo puro de drible desconcertante, com muita velocidade, qualidade técnica e uma dor de cabeça para qualquer defesa. Para além de Olise, a França chegou a esta final suportada no equilíbrio defensivo dado pelo seu excelente médio-defensivo Manu Koné e pela eficácia do seu ponta-de-lança Jean-Philippe Mateta (um avançado fortíssimo e um dos jogadores mais experientes desta seleção) e que vinha de marcar golos decisivos nos quartos-de-final contra a Argentina e nas meias-finais contra o Egito.

    A Espanha sabia que teria hipóteses de ganhar se se mantivesse fiel ao seu estilo. Apoiados essencialmente num enorme Fermín López (que vinha de ser campeão europeu com a seleção principal da Espanha e que foi de longe o melhor jogador deste torneio olímpico) e em Sergio Gómez, a Espanha sentia que tinha as armas necessárias para contrariar o poderio ofensivo francês e partir os corações dos gauleses.

    O jogo começou bastante equilibrado e com algum nervosismo de parte a parte. As equipas a estudarem-se mutuamente, até que à passagem do minuto 11, a França conseguiu inaugurar o marcador através de Enzo Millot com uma grande colaboração do guarda-redes espanhol Arnau Tenas. Um frango de todo o tamanho como se costuma dizer na gíria futebolística.

    Mas o que se viu nos minutos seguintes foi uma lição de futebol. Durante dez minutos, a Espanha mostrou o porquê do seu domínio no futebol mundial ao nível das seleções. 

    A identidade de todas as seleções (seja as seleções de escalões mais jovens até à seleção principal) é muito própria e visível através de um jogo de toque, de posse, de ataques construídos pacientemente, com muita troca de bola e constantes movimentações. 

    E no espaço de dez minutos, conseguiu enlouquecer a defesa francesa e num ápice, passou de estar atrás no marcador a estar a ganhar por 3-1, com um bis do inevitável Fermín López (seis golos em todo o torneio olímpico, um número impressionante dado que se trata de um médio) e dum livre direto muito bem marcado por Álex Baena, outro dos jogadores que havia sido campeão europeu com a seleção absoluta.

    Apesar disso e embalada pelos seus adeptos, a França conseguiu refazer-se desse duro golpe e tomou o controle do jogo. Até ao fim da primeira parte, foram-se sucedendo as oportunidades para reduzir o marcador mas sem sucesso.

    No regresso do intervalo, a França ainda pressionou mais os jogadores espanhóis que já acusavam o cansaço de um torneio olímpico no qual os jogadores têm que fazer seis jogos em 16 (!) dias (uma absoluta barbaridade e é algo que tem que ser revisto urgentemente pela FIFA e pelo COI).

    Com a entrada do médio-ofensivo Maghnes Akliouche, a França cresceu muito no jogo e foi desperdiçando imensas oportunidades claras de golo, sendo de destacar que neste momento, foi Arnau Tenas que susteve o ímpeto ofensivo francês, o guardião espanhol que à primeira vista se destaca pela sua baixa estatura mas que fez duas grandes defesas a negar golos cantados da equipa francesa. Naquele momento, Arnau já se tinha refeito do erro garrafal do primeiro golo e mostrou toda a sua qualidade.

    Do outro lado, a Espanha podia ter acabado com o jogo, só que Abel Ruiz (ex-jogador do Braga) tem muita qualidade, é muito inteligente, trabalha imenso para a equipa mas tem uma grande lacuna no seu jogo: a finalização. Algo que vimos vezes sem conta nos relvados nacionais.

    Apesar de serem os dois melhores jogadores desta seleção olímpica espanhola, o desgaste de uma época longa já era mais do que evidente em Fermín e Baena e o selecionador espanhol Santi Denia apercebeu-se disso e resolveu retirá-los do campo e a equipa ganhou com isso.

    Entraram para os seus lugares Adrian Bernabe e Beñat Turrientes e a equipa voltou a conseguir ter bola e a ter posses de bola bastante prolongadas, desesperando os franceses que queriam chegar o mais depressa possível ao segundo golo para depois poderem sufocar a Espanha e obter o empate tão desejado pela equipa francesa e por quase todos os presentes no estádio. 

    Apesar de um maior controlo dado por esses jogadores, a Espanha sofria bastante porque o domínio da França começou a ser avassalador e Kalimuendo, Doue e principalmente Olise são jogadores muito desequilibradores e que sozinhos conseguem criar lances capazes de desmontar uma defesa, por mais organizada que esta esteja.

    A dez minutos do fim, a França teve um livre descaído do lado direito do seu ataque e conseguiu reduzir o marcador por intermédio de Akliouche.

    Faltavam dez minutos mais o tempo de descontos que o árbitro quisesse dar e a França sabia que ainda era possível dar a volta ao marcador e foi com tudo para cima da Espanha. Já perto do minuto 90, um puxão claro de Turrientes a Kalimuendo foi descortinado pelo VAR (o árbitro tinha mandado seguir o jogo) e Mateta colocou o empate no marcador. Pensava-se que a Espanha ia ceder finalmente, ainda para mais sem as suas duas grandes estrelas em campo.

    Mas logo na jogada seguinte, a Espanha mostrou a sua enorme personalidade. Voltou a trocar a bola de um lado ao outro e Sergio Camello (um jogador que era reserva e que só foi suplente por causa da lesão de Samu Omorodion) fez uma grande jogada individual que acabou nos pés de Turrientes e que só não deu golo e o respetivo ouro olímpico à Espanha naquele momento, porque o remate embateu na barra e o guardião francês Restes ainda tocou na bola, evitando o 4-3 espanhol.

    Chegados ao prolongamento (e muito à semelhança do que se viu com a seleção principal no prolongamento contra a Alemanha), a seleção espanhola foi sustendo os ataques franceses, ignorou a pressão das bancadas e deu um recital de bom futebol, superiormente conduzidos por Sergio Gómez, por Turrientes, por Pablo Barrios e por Bernabe. Os jogadores espanhóis desfrutam do jogo e jogam como se tivessem no jardim de suas casas. À exceção de Gómez, os outros jogadores provavelmente serão desconhecidos da maioria do público mas eu acredito que isso irá mudar depois da forma como se exibiram contra toda uma França neste prolongamento que foi uma autêntica loucura.

    Ao minuto 100, o jogo mais esclarecido de Espanha teve os seus frutos. Jogada deliciosa de envolvimento ofensivo do ataque espanhol e um passe genial de Bernabe para a desmarcação de Camello nas costas da defesa francesa e o avançado espanhol picou de forma perfeita à saída de Restes, colocando novamente a Espanha em vantagem no marcador e de forma justíssima, atendendo ao que se via no relvado.

    Não é nada fácil mantermo-nos fiéis ao nosso estilo quando a nossa capacidade física já não é a mesma e os intérpretes não têm a mesma qualidade. Mas quando há uma ideia de jogo clara e bem trabalhada e que vem desde os escalões jovens, este é o resultado.

    A França em desvantagem no marcador, arriscou tudo, Thierry Henry fez várias substituições ofensivas mas os ataques franceses eram quase todos inofensivos e muito pouco organizados, abusando do individualismo. Uma defesa minimamente compacta, consegue lidar com ataques mal construídos e foi isso que a Espanha foi fazendo, não se livrando de um ou de outro susto, o que é absolutamente normal tendo em conta o cansaço dos seus jogadores e a qualidade da equipa francesa.

    Na segunda parte do prolongamento, a tónica foi a mesma. Arnau Tenas continuou muito seguro, Eric García e Pau Cubarsí foram dando conta do recado e no minuto 120 chegou a sentença final. 

    Em mais uma brilhante desmarcação de Camello (que prolongamento fez este miúdo!), Arnau Tenas lançou uma bola longa com as mãos e o avançado espanhol partindo antes do meio-campo, ganhou em velocidade a Lukeba e novamente com um toque de imensa classe, mostrou todo o seu talento e frieza e fez o 5-3 para a Espanha, dando o ouro olímpico à seleção espanhola 32 anos depois, depois dos Jogos Olímpicos de Barcelona em 1992 (uma geração que tinha Luis Enrique e Guardiola como jogadores).

    Um grande jogo de futebol numa final eletrizante com oito golos na melhor e maior promoção possível ao desporto-rei, que teve poucos motivos de destaque e de que se orgulhar durante este torneio olímpico.

    É vital que comece a haver outra postura por parte de todos os intervenientes no futebol e que comecem a prezar mais o incrível espírito olímpico que se vive na generalidade dos outros desportos, sob pena de que o futebol masculino possa deixar de ser uma modalidade olímpica num futuro próximo.

    A vitória de um processo sólido, construído com paciência e sem a pressão do imediatismo dos resultados, que faz com que os jogadores muitas vezes não consigam exprimir o seu potencial na sua plenitude.

    Numa altura de autêntico caos federativo no futebol espanhol, a Espanha é atualmente campeã europeia de sub-19, foi à final do último Europeu Sub-21, é campeã europeia de séniores e agora é campeã olímpica, certamente um título de pouca expressão e relevância no mundo do futebol mas os jogadores sabem o difícil que é conquistar um ouro olímpico e valorizam-no certamente. É algo que tem muito mérito e deve ser devidamente reconhecido.

    Com este ouro olímpico, chega a confirmação da supremacia do futebol espanhol.

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