O Benfica actuou na francesa Riviera em modo de treino. Se a escolha do terceiro equipamento, de cores espapaçadas e sem a chama das grandes ocasiões, não transmitiu logo esse sentimento competitivo, a postura encarnada levou a uma exibição esbatida, apenas e só de serviços mínimos.
O bege, que não é Bantou mas mais a puxar o Blanc Avoiraz ou o Jaune Moreau, fascina tanto como a arquetípica personalidade francesa – a clássica caricatura do chauvinista-intelectualóide todo aperaltado, orgulhoso de si próprio e maniento até à exaustão – e essa percepção apoderou-se do futebol benfiquista, que se sabia superior e rapidamente se percebeu, para todos, que era uma questão de números, mais ainda que de tempo.
Bruno Lage acomodou o melhor onze possível, estruturando-o em 4-4-2 para poder fazer coabitar a novidade Ivanovic como parceiro de Pavlidis. Deu-se a esse luxo, relegando para o banco Barreiro e Florentino, guardados na prateleira porque há brinquedos novos. Exactamente como num treino, as atenções não se focaram tanto no desfecho do placard mas na destreza e qualidade técnica do novo ponta-de-lança do Benfica. O croata, mostrando-se logo interventivo e muito autoritário nos duelos, parecia mesmo o craque de rua que se estreia num ringue dum bairro vizinho – há vontade em querer mostrar-se, a bola é para ser sua, não há mal de se agarrar a ela por mais uns segundos e não se tem medo do choque.
Fez muito boa figura. O golo, que resulta dum requintado cruzamento de Fredrik Aursnes, mostrou que há ali o ‘killer instinct’ dos monstros de área (o pormenor de Franjo ter chegado à Portela nos mesmos preparos estéticos do Cardozo de 2007 tem importância) e um rol de oportunidades que se seguiram – já que o Nice desistiu aí da tímida intenção de disputar a eliminatória – podiam ter tornado a boa estreia nalgo memorável. Mas, sendo um treino, surgiu a natural displicência.

O 4-4-2 permitiu discernir uma série de detalhes que poderão dizer muito do que será a época e das possibilidades de sucesso, ficando o plantel como está: há parelhas associativas que dão muita força à química do conjunto, como a protagonizada por António e Otamendi, a de Aursnes com Dedic ou a de Dahl-Schjelderup (e que bela joga dos meninos, hein?); mas a Supertaça, entre Sporting e Benfica, já tinha servido para se criarem certas desconfianças quanto à capacidade de entendimento na intermediária, entre Barrenechea e Ríos – um joga demasiado simples, o outro complica em demasia; um devolve quase sempre de primeira, que não encontrou ainda o espaço mental de ser ele próprio a cada momento, e o outro insiste muito no passe difícil, no passe em rotura, na maioria das vezes como momento último dum transporte esforçado, levando a um taxa de sucesso de meter os comentadores, quer da rádio quer da televisão, a exasperar a dizer que ‘estava fora dela’.
Indesmentível, apesar das evidências, é a questão monetária: a inteligência do argentino justifica perfeitamente o valor dispensado, enquanto a capacidade física do colombiano justificaria até valor mais avultado. Darão os dois imenso jeito, sobretudo em jogos de maior calibre tático.

Se mereciam a titularidade tão apressada? Ou melhor, merecia Florentino ser relegado para terceira opção – que ainda há Manu! – de forma tão pronta, tão fria? O charutão que resulta no segundo golo é a melhor resposta que podia ter sido dada, ainda mais quando acompanhada pelas suas intervenções sempre assertivas na retenção e recuperação da posse.
Quando Lage decidiu trancar um jogo que já estava ganho há séculos, colocando Tino e Barreiro, os dois mostraram que serão sempre opções muito válidas – porque mesmo em contexto de treino, deram mais segurança, mais clarividência, mais controlo. Lage percebeu a dica dos dois e deu-lhes o carinho merecido no final do Nice x Benfica: «Florentino? Não jogou a titular, mas está sempre pronto para jogar. Pode ser ele o titular ou até jogar com o Enzo, cabe a mim analisar o adversário e preparar o melhor onze. Destaco o Florentino e o Leandro Barreiro, que saltaram do banco e ajudaram a consolidar a vitória e aumentá-la, inclusive».
A reter do relaxado passeio português na Côte d’Azur: o craque é mesmo craque e há médios para todos os gostos no plantel. Sem extremos superlativos e em contexto de treino, ficou por experimentar um losango…