O Benfica, no final do dia, conseguiu os três pontos e manter a série de invencibilidade na época e de vitórias na Primeira Liga. Uma avaliação despreocupada, diria que o jogo encarnado foi um sucesso redondo e, se pontualmente até o foi, dentro de campo o Benfica apresentou dificuldades claras diante de uma equipa com mais futebol do que a tabela apresenta.
O contexto do jogo poderia ter ficado facilmente determinado pelo golo de Andreas Schjelderup cortesia de Sergi Gómez, quiçá de todos os reforços do Alverca o mais sonante e o que menos tem correspondido às expectativas. Mas tal não aconteceu e, apesar de ter o controlo do jogo, o Benfica nunca foi capaz de o matar e terminou a sofrer.

Dentro da rotação de início de época, Bruno Lage manteve a espinha dorsal. Numa fase em que o desgaste físico e mental é evidente, o Benfica montou o cerco junto da área do Alverca, projetou os laterais, concentrou muita gente por dentro e, com os médios a lateralizar, procurou subir de forma sustentada por fora e desmontar a defesa do Alverca.
Faltou uma maior coordenação de um meio-campo que voltou a ficar curto. Richard Ríos tem méritos e características evidentes que ainda não mostrou, mas o Benfica precisa de um criativo como o é Sudakov para retirar a melhor versão do colombiano em campo. Por maior que seja a energia de Leandro Barreiro, em jogos destas características o luxemburguês também não vê o melhor sumo espremido. Perante perfis individuais de choque e de batalha, os mais diferenciadores no ataque encarnado acabaram por ser os laterais e Andreas Schjelderup.
Samuel Dahl, pela constância nas ações, é um dos maiores destaques do arranque de época do Benfica. Está algo ofuscado pelo brilho de Amar Dedic, com outros recursos técnicos e criativos. Inventa jogadas pela mudança de direção e capacidade de condução em velocidade e revela um entendimento profundo com Aursnes. Marcou um golo no qual destacou todos os seus atributos. Houve também Andreas Schjelderup, cada vez mais eficiente nas ações e com apurado sentido de oportunidade. Além de ser o mais criativo do Benfica entrelinhas, tem uma capacidade de procurar a baliza que vai sendo cada vez mais desbloqueada.

Com estes perfis individuais em destaque, e principalmente por estes, o Benfica conseguiu traduzir a superioridade posicional em oportunidades e golos, mas nunca esteve impositivo o suficiente para não anular um Alverca que, pese o bloco defensivo compacto e baixo, a solidariedade dos extremos, principalmente Chiquinho, a fechar linhas de seis e sete, e a agressividade dos médios no corredor central (com mais de Alex Amorim com bola), teve argumentos para criar perigo. Terá um dos melhores trios ofensivos em Portugal e ainda tirou Lincoln do banco. Com o Benfica instalado ofensivamente, deixar espaços atrás era inevitável e o Alverca conseguiu saídas, quer em transição quer em atração, para atacá-los.
Chiquinho fez uma exibição de maturidade e definição tremendas. Mesmo a partir de posições baixas, garantiu bons passes e boas ações com bola e conseguiu aparecer à frente. A marcação de Otamendi em Nuozzi permitiu ao belga recuar, atrair o central encarnado e aumentar o espaço a ser aproveitado. Fez, ao contrário dos últimos jogos, um encontro mais de avançado do que de médio de seguimento, como se apresentou em Portugal. Têm técnica para rodar, acelerar e combinar com os colegas e criou situações de perigo. Junta-se a ameaça de Marezi, um avançado para marcar diferenças no futebol português pela capacidade de atacar a linha defensiva e de se impôr pelo perfil físico. Tem um quê de Nick Woltemade no seu jogo.
Com diabos à solta na sempre e coesão atrás, o Alverca causou dificuldades ao Benfica nas duas áreas e Samuel Soares foi mesmo um dos melhores em campo. A chegada de reforços como Sudakov e o interesse em dois extremos pode dar ao Benfica a capacidade de desequilíbrio individual capaz de contagiar o coletivo e de fazer derrubar blocos baixos como castelos de cartas. Por agora, ficaram as sensações díspares do Ribatejo. O Benfica é candidato e está bem mais forte e completo que na última época, mas ainda tem um caminho a fazê-lo. Definí-lo com vitórias é um mérito da equipa e de Bruno Lage.

BnR na Conferência de Imprensa
Bola na Rede: Apesar de jogar muita vezes com um bloco baixo e com extremos muito solidários no processo defensivo, o Alverca conseguiu saídas em transição e com ataques mais verticais e criar perigo. Quão importante foi acionar o Chiquinho e o Nuozzi em posições mais baixas, para conseguirem receber, rodar e acelerar?
Custódio Castro: Nós sabíamos que, no corredor direito, o Benfica acaba por colocar quatro jogadores. Esperávamos um Benfica com dois avançados, mas isto é uma leitura antes do jogo e não decidimos o que o adversário fará. É um bocadinho diferente a dinâmica na esquerda e na direita, onde colocam quatro jogadores: o Ríos, o Dedic, que tem uma importância muito grande de trás para a frente e é um bom jogador que chegou agora ao campeonato, o Aursnes, que é um dos melhores jogadores do campeonato, e neste caso o Barreiro, o segundo avançado. No lado esquerdo não é bem assim e nós tínhamos preparado essa saída através da direita, baixando um bocadinho o Chiquinho, mas acionando-o na transição através do Marezi e com o Cédric a poder pressionar um bocadinho mais alto e a subir do lado contrário para ficar mais perto dos defesas do Benfica e, consequentemente, quando ganhássemos a bola ter esse espaço nas costas do Benfica. Acabou por surgir. Na primeira parte tivemos duas ou três situações boas para marcar através dessa situação.
Bola na Rede: O Benfica atacou com muita gente, com os laterais projetados, muita presença no corredor central e procura de combinações por fora, mas defrontou uma equipa do Alverca com um bloco baixo, compacto e que se conseguiu defender bem, e teve dificuldades em alguns momentos em penetrar a linha defensiva adversária. Como explica as dificuldades, o que aconteceu durante o jogo para isso e como tentou dar a volta por cima?
Bruno Lage: Percebo a sua pergunta. Antes de lá ir, faço-lhe uma questão, como me fizeram na flash. Com quantos homens jogámos na frente?
Bola na Rede: Dois extremos, um médio ofensivo, o Barreiro, e o Ivanovic, dois laterais projetados.
Bruno Lage: Obrigado. Fizemos muitos movimentos e por isso é que criámos os golos daquela maneira. Temos de olhar um pouco para o perfil dos nossos jogadores e para a nossa intenção. Tínhamos de fazer movimentos, e posso falar desta maneira, quando a bola chegava fora, principalmente ao Dedic e ao Samuel [Dahl], diagonais, duplas diagonais com os movimentos do Ivanovic. O que poderíamos ter feito num ou noutro momento? Mais cruzamentos. Quer do Fredrik, e eventualmente do Samuel, mais cruzamentos rasteiros para apanhar a linha defensiva a tentar defender a baliza e encontrar os nossos homens à frente da baliza. Era uma coisa que podíamos fazer e foi o que reforçámos ao intervalo para a equipa fazer. Quando olho para o jogo e para a exigência deste ciclo, sem pré-época, e é uma explicação do momento da equipa: é mais difícil controlarmos o desgaste físico durante o jogo dos jogadores menos usados do que daqueles que vão jogando. Hoje alguns jogadores já vinham com seis e sete jogos, um ciclo muito difícil. Foi nesse sentido que refrescámos a equipa, tentar alterar um jogador por posição, porque sabíamos que na segunda parte os jogadores poderiam baixar o ritmo. Quem entrou: Samu [Soares], grande exibição, que não fiquem dúvidas e antecipando-me à vossa questão que o Trubin é o número 1, mas o Samu é muito importante para nós e hoje fez uma grande exibição; número 2, e já que gosta de falar de técnica e tática, porque é que utilizámos o [Tomás] Araújo?
Bola na Rede: Para ganhar capacidade de construção e penetrar a linha defensiva através do passe.
Bruno Lage: E porque é mais o rápido. O ponta de lança do Alverca é muito rápido a atacar a linha defensiva e o nosso defesa mais rápido é o Tomás Araújo. Foi nesse sentido que o colocámos é controlámos grande parte das transições por ele. Barreiro e Andreas [Schjelderup] muito próximos do homem da frente para manter a equipa unida na pressão. Quando olho para o jogo sinto que o controlámos com e sem bola e defrontámos uma grande equipa. Quando ficámos reduzidos a dez, a equipa fechou-se, segurou os três pontos. Era muito importante fechar este ciclo com mais três pontos.