Acabou o duplo pivô, e agora?

eternamocidade

5 de março de 2014 será com certeza um dia relembrado pelos portistas durante os próximos tempos. Afinal de contas, o desejo de muitos realizou-se. Perto das 12h30, era comunicado à CMVM a saída de Paulo Fonseca enquanto treinador do FC Porto. Para muitos, finalmente chegou ao fim o pesadelo de ver Fonseca no comando dos portistas. Para tantos outros, nos quais eu me incluo, a saída do ex-treinador do Paços de Ferreira só veio resolver parte do problema instalado nas hostes azuis e brancas.

Confesso que antes do início da pré-época, quando Paulo Fonseca foi apresentado como novo treinador do FC Porto, soltei um sorriso. E acredito que agora que Fonseca já não estará no banco no domingo frente ao Arouca posso deixar-lhe estas palavras para a posteridade. O meu sorriso naquele momento simbolizou o pensamento que tive ao saber que o treinador revelação do campeonato, ao alcançar um impensável terceiro lugar no Paços de Ferreira, iria treinar o tri-campeão nacional. Depois dos dois anos de Vítor Pereira – que culminaram ao minuto 92 com o remate de Kelvin no Dragão – considerei que Fonseca era o homem certo no sítio certo porque parecia um treinador cheio de competências, o que fazia com que a chegada a uma equipa grande parecesse natural para si.

Durante a pré-época, os resultados e as exibições iam agradando aos adeptos, que em cafés e tertúlias iam debatendo aquela que era a grande novidade apresentada por Fonseca: o duplo pivô. Confesso-lhe que não sou um “catedrático” da tática, mas depois de cada jogo gosto de analisar como as equipas se comportaram dentro de campo, destacando principalmente o papel dos verdadeiros artistas, os jogadores, dentro daquilo que é modelo da equipa.

Por essa razão, a questão do duplo pivô foi sempre uma temática que me acompanhou na análise a este FC Porto de Fonseca, uma equipa necessariamente diferente com esta alteração no meio-campo. Com a saída de João Moutinho para o AS Mónaco no final da temporada, penso que é justo dizer que o “coração” do tri-campeonato abandonou o Dragão. Bem sei que jogadores como Hulk, James e Falcao foram determinantes na conquista do tri-campeonato, mas, para mim, que dou importância a bem mais do que os golos num jogo de futebol, sempre tive a ideia de que o FC Porto tinha deixado sair a sua pedra mais preciosa para o clube monegasco. Já sei que o mercado não dá tréguas quanto aos grandes jogadores, mas o futuro desportivo portista depois daquela saída parecia prever um caminho difícil de percorrer por quem quer que fosse o técnico que tivesse que pegar num FC Porto “sem coração”.

João Moutinho era o "coração" da equipa  Fonte: Mirror
João Moutinho era o “coração” da equipa
Fonte: Mirror

Paulo Fonseca foi incumbido de resolver um problema que não criou. Chegaram Herrera, Josué, Quintero e Carlos Eduardo, mantiveram-se Defour, Lucho e Fernando, e perto do início da época André Castro foi emprestado. Com tantas alterações, questionava-se a capacidade do FC Porto de Fonseca para ser dominador como sempre foi, e principalmente de ser vencedor como tem sido. A questão era pertinente, o caminho parecia difícil e a solução para o problema parecia complexa. Com a implementação do duplo pivô, Paulo Fonseca acabou por apresentar um 4-2-3-1 “à moda do Paços de Ferreira” num FC Porto que, a julgar pelos primeiros ensaios da época, parecia estar à altura do novo desafio tático.

A vitória clara na Supertaça frente ao Vitória de Guimarães e os 19 pontos em 21 possíveis alcançados nas primeiras 7 jornadas do campeonato, que davam 5 pontos de avanço para os mais diretos rivais na Liga Portuguesa, faziam de Paulo Fonseca um fenómeno de sucesso nos azuis e brancos pela audácia que parecia estar a ter à frente de um clube vencedor por natureza. As derrotas caseiras na Liga dos Campeões frente a Zenit e Atlético de Madrid, que acabaram por hipotecar a campanha europeia na maior prova de clubes da UEFA, pareciam apenas areia numa engrenagem que para consumo interno parecia chegar e sobrar.

Caro leitor, acredito que já não se lembrasse de alguns destes pormenores do percurso de Fonseca. Bem sei que o futebol é o momento, e por isso muitas das vezes a memória é muito curta e seletiva. No caso de Paulo Fonseca, apenas os últimos assobios e más exibições parecem vir à memória de comentadores e adeptos. Como pretendo sempre ser justo, pareceu-me correto recordar o princípio deste caminho que terminou ontem.

Depois de três meses de sucessos a nível interno e de boas exibições a nível europeu, a 2 de novembro de 2013, o empate no Restelo foi o princípio do fim para Fonseca. O 1-1 insuficiente frente ao Belenenses, assim como o empate que se seguiu em casa com o Nacional e a derrota em Coimbra, fez despoletar o primeiro foco de tensão para o técnico. Os assobios e a “espera” feita pelos adeptos portistas ao autocarro onde vinha a equipa depois do desaire na cidade dos estudantes fez Fonseca render-se pela primeira vez. Ao que constou, aquela derrota em Coimbra foi o mote para o primeiro pedido de demissão de Fonseca. A partir daqueles três resultados negativos na Liga, o FC Porto havia cedido a liderança do campeonato, enquanto a Liga dos Campeões estava perdida com os empates com o Zenit, na Rússia, e com o Áustria de Viena, em casa.

A campanha europeia do FC Porto foi desastrosa  Fonte: MSN
A campanha europeia do FC Porto foi desastrosa
Fonte: MSN

Com apenas 1 ponto conquistado em 3 jogos disputados no Estádio do Dragão na Liga dos Campeões e com o segundo lugar no campeonato, a tensão atingiu o segundo ponto máximo após a derrota, no início de Janeiro, no Estádio da Luz perante o Benfica. A má exibição e, sobretudo, a incapacidade da equipa para demonstrar a fibra de campeão faziam de Fonseca, ao olhar do comum adepto, o principal responsável pela inconstância e pela falta de ideias dos portistas em campo. No início da segunda volta, a derrota por 1-0 no Estádio dos Barreiros originou a terceira derrota na época para o FC Porto, algo impensável até ao fim de Outubro, principalmente porque durante as três épocas anteriores os portistas apenas haviam perdido apenas um jogo no campeonato.

Por entre os maus resultados e as exibições inconstantes, saltava à vista a incapacidade de se ter uma equipa sólida em campo. A cada Domingo que passava, era quase impossível antever o onze titular do FC Porto, tantas eram as alterações jogo após jogo. Ou era Otamendi ou Maicon como companheiro de Mangala; ou então jogava Defour, ou Herrera, ou Carlos Eduardo ou Josué no meio-campo. E sim, não foi por acaso que me esqueci de Lucho nesta equação. No mercado de Inverno, o “Comandante” foi embora e um vazio no balneário parece ter ficado a pairar no Dragão.

A saída de Otamendi para o Valência fez regressar Abdoulaye de Guimarães e, quando nada o fazia prever, o central senegalês pegou de estaca no FC Porto. Impensável para muitos, quando Maicon parecia o sucessor natural. No meio-campo, Herrera, depois de estar afastado dos relvados por opção durante meses, regressou como titular indiscutível. Carlos Eduardo, que chegou a ser comparado a Deco, foi aparecendo e desaparecendo do onze e oscilando na qualidade exibicional. No ataque, a chegada de Quaresma trouxe maior magia ao onze, mas a intermitência de Jackson e a não afirmação de Ghilas faziam deste FC Porto uma equipa menos perigosa no ataque.

Quaresma foi o único reforço de Inverno  Fonte: fcporto.pt
Quaresma foi o único reforço de Inverno
Fonte: fcporto.pt

Cinco anos e quatro meses depois, a derrota em casa frente ao Estoril era o regresso dos desaires do FC Porto no Estádio do Dragão para Liga Portuguesa. A contestação subiu novamente e Fonseca rendeu-se pela segunda vez, pedindo novamente a demissão. Pinto da Costa não aceitou e Fonseca manteve-se para a reviravolta de Frankfurt, num resultado que parecia fazer antever uma recuperação anímica da equipa. Foi pura ilusão, porque três dias depois o empate em Guimarães fez hipotecar de vez a possibilidade da conquista do tetra, e, depois de estar em vantagem por 0-2, o FC Porto perdeu novamente uma vantagem. O presente era um tormento para os adeptos e o treinador, que no último Domingo se rendeu pela terceira vez, pediu novamente para sair.

O ambiente tornou-se insustentável e oito meses depois de ter chegado ao Dragão, Fonseca finalmente saiu. Não me esqueço das exibições paupérrimas em muitas ocasiões, mas também é claro que o plantel deste ano é um dos piores dos últimos anos. Não me esqueço da campanha horrível na Liga dos Campeões, mas também é importante destacar que nunca vi o FC Porto com tantos problemas durante uma temporada. Não me esqueço que Paulo Fonseca terá sido um dos maiores erros de casting dos últimos anos do presidente Pinto da Costa, mas acho justo que se reflita sobre o que se passa no clube, onde parece haver uma real falta de liderança, dentro e fora de campo.

Como em outras ocasiões no futebol, o treinador foi o primeiro a sair. Fonseca não resistiu aos maus resultados e acabou por ser o primeiro a abandonar o barco. Foi o elo mais fraco que saiu, dizem uns. Para mim, foi apenas o princípio porque não acho que Fonseca tenha sido o único responsável. Longe, bem longe disso. E isso preocupa-me.

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