As dores de crescimento de Sporting e FC Porto

Numa temporada em que a maioria dos clubes em Portugal – incluindo os cinco primeiros classificados da última edição da Primeira Liga – trocaram de treinador, quatro deles com a época já em andamento, não é difícil de entender que há muito por onde crescer. A primeira meia-final da Taça da Liga comprovou-o e deixou expostas feridas antigas a precisar de sutura e que, só com o tempo, poderão ser curadas. Até lá, far-se-ão sentir dores de crescimento numa temporada em que, quem mais as esconder, será quem terminará o ano a sorrir. Sporting e FC Porto procuram fazê-lo.

Rui Borges rompeu com o passado recente no Sporting e resgatou a confiança dos leões, que se tinha dissipado após semanas desastrosas sob o comando de João Pereira, que partilha a cadeira de vítima e de réu. Além do trabalho feito fora de campo, o estímulo mental ao qual o técnico chamou de atitude, o antigo treinador do Vitória SC tem procurado ajustar comportamentos e nuances dentro de campo.

Contra o FC Porto, o Sporting mudou a lógica das duas partidas anteriores e, depois de uma primeira parte mais discreta, acabou por crescer na partida no segundo tempo. Os primeiros 30 minutos verde e brancos apresentaram uma equipa que, sem estar desconfortável, nunca foi capaz de mostrar reais argumentos para ferir o FC Porto. Há nuances a ser alteradas e jogadores ainda a procurar a melhor adaptação a novas posições.

Mantendo a estrutura no 4-4-2 base, ofensivamente Iván Fresneda – antes da saída teve a oportunidade de ser titular – ficava mais baixo e permitia a Matheus Reis projetar-se pelo corredor esquerdo. Nesta fase da carreira o defesa brasileiro sente-se mais confortável a jogar em posições mais recuadas, como um lateral construtor, e nos 14 minutos em que esteve em campo não ofereceu a capacidade de projeção que os leões precisavam, especialmente com Maxi Araújo a atuar tão por dentro. A sua lesão e a adaptação de Maxi Araújo a lateral demoraram a carburar e o Sporting teve dificuldades em fazer circular a bola, sem um construtor desde trás pela esquerda.

Maxi Araújo Sporting
Fonte: Paulo Ladeira / Bola na Rede

À esquerda, Jeremiah St. Juste perde o principal atributo com bola: a capacidade de condução, obrigando o adversário a ter de saltar na pressão e abrindo espaços no bloco. Sem a naturalidade do pé preferencial, os argumentos do neerlandês na saída a partir detrás esfumam-se e não podem ser compensados por Maxi Araújo, um jogador com argumentos no ataque ao espaço e na chegada de trás para a frente. A pé natural, mas sem o conforto que o pé direito lhe possibilita, Geovany Quenda foi quem melhor se ajustou para jogar sob a meia esquerda e voltou a ser importante neste papel.

Sem abrir o campo pelas receções, o jovem é mais um criador que um desequilibrador. O conforto que tem pela direita no 1X1 perde-se, mas ganham-se outras coisas por dentro, baixando em campo para gerar superioridade por dentro e ligar jogo. Com o avançar do jogo ganhou protagonismo e a revolução do corredor esquerdo tem um nome: Hidemasa Morita.

O médio japonês ganhou protagonismo, baixando no terreno, assumindo a construção pela esquerda e arrastando consigo um dos médios do FC Porto (geralmente Stephen Eustáquio), permitindo a Geovany Quenda aparecer ainda mais por dentro e a Maxi Araújo projetar-se por fora. Além da contribuição indireta, é um jogador que participa ativamente no jogo, procurando constantemente dar soluções, aparecendo a diversas alturas e gerindo os ritmos desde trás. Ainda sem estar a 100%, sente-se a diferença quando fisicamente fica mais exposto, tamanho está a ser o impacto no jogo dos leões.

Hidemasa Morita Sporting Wenderson Galeno FC Porto
Fonte: Paulo Ladeira / Bola na Rede

O japonês é, a par de Viktor Gyokeres, o melhor jogador da era Rui Borges. Quanto ao sueco, voltou a ser decisivo – num lance em que faltam as palavras para descrever o passe de Geovany Quenda – e a dar a vitória aos leões. Não fez a exibição mais influente pelo Sporting, mas ser decisivo está-lhe no sangue.

Quanto ao FC Porto, o processo de crescimento é mais duradouro e vive agora uma nova etapa. Entre avanços e recuos, Vítor Bruno tem feito um caminho consolidado que apresenta, ainda assim, os dragões a um nível distante do que permite ser consistente em partidas onde é preciso mais do que gerir o jogo. Ao contrário do seu antecessor, as partidas grandes têm sido o problema dos dragões.

Pensando no processo de crescimento do FC Porto, há um nome que muda os dragões de patamar: Rodrigo Mora. Tem 17 anos, mas é um elemento fundamental na ligação entre o meio-campo e o ataque azul e branco. Contra o Sporting, procurou receber nas costas dos médios e deixou à mostra novamente a agilidade e capacidade de se virar de frente para o jogo e de pensar e decidir em poucos segundos. A assertividade na definição é a característica que mais permite gerar expectativas no jovem português que merecia, ainda assim, outras exibições dos seus colegas. Noutra nota, o futuro de Portugal é promissor e a solidez das exibições de Rodrigo Mora e de Geovany Quenda demonstram-no bem.

Geovany Quenda Sporting
Fonte: Paulo Ladeira / Bola na Rede

A estratégia de Rui Borges reforçou o corredor direito do Sporting (Fresneda mais baixo e Geny Catamo com um importante papel defensivo) e praticamente secou o lado mais vertical do FC Porto. A exibição de Pepê, errático nas decisões e, principalmente nas ações, impediu outro volume ofensivo aos dragões e, principalmente, tornou muito escassas as bolas colocadas perto da baliza de Franco Israel. A temporada do brasileiro – cujo final de linha em Portugal parece mais evidente a cada dia que passa – está abaixo do rendimento e obriga a questionamentos.

No outro lado, André Franco é apenas uma solução a prazo. Não dá para Vítor Bruno pensar o FC Porto com o português como titular, especialmente quando Fábio Vieira está no banco. Recuperar o génio que os pés continuam a mostrar que existe é uma missão exigente, mas a possibilidade de relacionar Fábio Vieira com Rodrigo Mora é demasiado aliciante para a esquecer. Até porque, atraindo mais defesas à marcação dos dois criativos, pode permitir a Samu Aghehowa mais espaço para atacar a profundidade ou mais situações pensadas de cruzamentos favoráveis.

Sem bola, a pressão do FC Porto, que conseguiu condicionar o Sporting traduziu-se em marcações individuais bem definidas no meio-campo (Rodrigo Mora em Hjulmand, Nico González em Francisco Trincão e Stephen Eustáquio a acompanhar Hidemasa Morita) e provocou desconforto durante grande parte da primeira parte. Sendo verdade que o jogo se descaracterizou depois do golo, já antes deste o Sporting criou perigo, através do recuo de Hidemasa Morita e da maior participação de Geovany Quenda num lugar que, anteriormente, contava com André Franco a fechar dentro. Quando o primeiro plano deixou de resultar, faltou engenho a Vítor Bruno para não deixar a partida escorregar. São dores de crescimento que obrigam o treinador do FC Porto a apostar todas as fichas no campeonato e na Europa.

Vítor Bruno FC Porto
Fonte: Paulo Ladeira / Bola na Rede

BnR na Conferência de Imprensa

Bola na Rede: Sobre a pressão do FC Porto, que hoje entrou com referências individuais no meio-campo, pergunto-lhe pela importância do papel dos extremos, principalmente o André Franco, de fechar por dentro para garantir superioridade numérica e o que mudou, entre o final da primeira parte e na segunda, para a menor eficácia da pressão?

Vítor Bruno: Não foram marcações individuais, era preciso ter um cuidado especial pela forma como o Sporting construia. Quisemos ser mais acutilantes num primeiro momento na saída de bola do Sporting e conseguimos na primeira parte a espaços. Na segunda parte parece-me que não houve grande diferença, sinceramente. A diferença é que o Sporting marca cedo e começa a gerir melhor o resultado, mais metido em organização defensiva, com nós a tentar ter outro pendor ofensivo e chegar de diferentes formas à baliza do Sporting. Em momentos de transição o Sporting é forte com muitos ataques em profundidade e uma referência na frente que cria muito perigo. Era preciso estar atento e vigilante e não me parece que o Sporting tenha saído de zonas de pressão com facilidade na segunda parte. O que mudou foi a forma como o jogo foi gerido, em vantagem no marcador era natural que o Sporting tivesse outro tipo de abordagem. Não fomos competentes o suficiente para fazer golo e criar situações de perigo em maior número e é um exercício que temos de fazer no balneário, perceber o que podemos fazer para ferir este tipo de adversários. Em jogos em que o nível é muito igualado precisamos de ter outros argumentos para chegar à baliza adversária, não só por fora, mas também por dentro e sendo mais acutilantes no momento de ferir o adversário. Não o fomos, o Sporting ganhou em detalhes. Volto a dizer, não foi superior ao FC Porto, foi um jogo dividido e equilibrado. Agora acabou, competição arrumada e temos de olhar para o que resta da época, para o campeonato. Temos o pensamento canalizado única e exclusivamente para o jogo contra o Nacional da Madeira, na próxima semana, numa prova que queremos muito ganhar. Estamos há dois anos sem vencer o campeonato e queremos muito fazê-lo este ano e voltar a ser campeões.

Rui Borges: Não foi dada possibilidade ao Bola na Rede de colocar uma questão ao treinador do Sporting.

Sabe Mais!

Sabe mais sobre o nosso projeto e segue-nos no Whatsapp!

O Bola na Rede é um órgão de comunicação social de Desporto, vencedor do prémio CNID de 2023 para melhor jornal online do ano. Nasceu há mais de uma década, na Escola Superior de Comunicação Social. Desde então, procura ser uma referência na área do jornalismo desportivo e de dar a melhor informação e opinião sobre desporto nacional e internacional. Queremos também fazer cobertura de jogos e eventos desportivos em Portugal continental, Açores e Madeira.

Podes saber tudo sobre a atualidade desportiva com os nossos artigos de Atualidade e não te esqueças de subscrever as notificações! Além destes conteúdos, avançámos também com introdução da área multimídia BOLA NA REDE TV, no Youtube, e de podcasts. Além destes diretos, temos também muita informação através das nossas redes sociais e outros tipos de conteúdo:

  • Entrevistas BnR - Entrevistas às mais variadas personalidades do Desporto.
  • Futebol - Artigos de opinião sobre Futebol.
  • Modalidades - Artigos de opinião sobre Modalidades.
  • Tribuna VIP - Artigos de opinião especializados escritos por treinadores de futebol e comentadores de desporto.

Se quiseres saber mais sobre o projeto, dar uma sugestão ou até enviar a tua candidatura, envia-nos um e-mail para [email protected]. Desta forma, a bola está do teu lado e nós contamos contigo!

Diogo Ribeiro
Diogo Ribeirohttp://www.bolanarede.pt
O Diogo é licenciado em Ciências da Comunicação, está a terminar o mestrado em Jornalismo e tem o coração doutorado pelo futebol. Acredita que nem tudo gira à volta do futebol, mas que o mundo fica muito mais bonito quando a bola começa a girar.

Subscreve!

Artigos Populares

Liam Manning é o novo treinador do Norwich City

O Norwich City confirmou a contratação de Liam Manning. O clube do Championship terminou no 13.º lugar.

Norwich City contrata guarda-redes e Sporting vê porta fechar-se à tranferência de Vladan Kovacevic

O Norwich City tem a contratação de Daniel Grimshaw fechada. Chegada do guarda-redes coloca fim ao interesse em Vladan Kovacevic.

Tyrone Mings renova contrato com o Aston Villa

O Aston Villa confirmou que Tyrone Mings renovou contrato. O defesa-central inglês tem agora vínculo até junho de 2027.

Benfica avança com queixas na UEFA, FIFA e International Board pela final da Taça de Portugal

A final da Taça de Portugal continua a ser tema em destaque para o Benfica. Encarnados preparam três queixas.

PUB

Mais Artigos Populares

Lionel Scaloni maravilhado com regresso de Di María ao Rosario Central: «É o ídolo de muita gente»

Ángel Di María vai jogar pelo Rosario Central após o Mundial de Clubes 2025. Lionel Scaloni ficou muito feliz com a decisão.

Sevilha comunica despedimento do diretor-desportivo Victor Orta

Victor Orta já não é diretor-desportivo do Sevilha. O dirigente espanhol abandonou a equipa após duas épocas.

Custou 117,5 milhões de euros e ficará fora da lista do Manchester City para o Mundial de Clubes 2025

Jack Grealish está de saída do Manchester City e nem vai ao Mundial de Clubes 2025. Extremo tem vários interessados.