Começou o Mundial do Brasil e para além da vergonhosa cachaporra que as autoridades distribuem pela população com o fim de ocultar a pobreza extrema, temos a surpresa da orgulhosa Espanha encher um saco de batatas contra a Holanda. No passado, temos a lenda dos anos 50 quando o Brasil foi derrotado na final do Mundial, também realizado no Brasil, pelo rival vizinho Uruguai. O Rio de Janeiro estava engalanado para a melhor festa; o Estádio do Maracanã rebentava de euforia, mas a bola rolou e o Uruguai escreveu uma das páginas imortais que o Brasil jamais digeriu.
O futebol é um mundo de mitos. Nessa final nasceu ou apareceu um mito chamado Juan Schiaffino. Era um homem sem ofício como se descreveu mais tarde, mas o saber dar pontapés numa bola levou-o para o Penharol. Era filho de imigrantes. Maldini, companheiro seu no Milão, disse que tinha um radar na cabeça, mas além do radar tinha ainda um passe de tira-linhas ao serviço de uma visão de jogo espetacular. Protagonizou, na época, a transferência mais cara do futebol mundial. Chegou a Itália e ficou gravado para sempre nas lendas do Milão. A conquista de três campeonatos sempre foi cara no futebol italiano. No entanto, é no seu Uruguai onde está presente em cada recanto que respira este desporto.
Vencer na catedral de um país como o Brasil, que assume o futebol com religiosidade extrema, leva imediatamente a ser considerado um Diabo. Ainda hoje o Brasil, quando pensa em Schiaffino, tem pesadelos. O curioso do caso é que o seu golo foi o primeiro do Uruguai, mas foi o golo que atemorizou o Maracanã. Pepe, como era e ainda é conhecido, era um jogador primoroso. No entanto, a seleção Uruguaia era conhecida pela garra liderada por Varela. Como em muitos jogos e em muitas equipas, Varela e Pepe tiveram um desencontro. Varela reclamou-lhe mais entrega, mais correr… Pepe, com serenidade, respondeu: “eu corro quando você me passe uma bola ao pé…”.
Instalado em Europa e integrado na equipa do Milão, cedo começaram as comparações, e na década dos 50 o ponto de comparação chamava-se Di Stéfano. Tal como Kopa ou outros, Schiaffino disputou o lugar do argentino Di Stéfano. No entanto, foi humilde e considerava que pelo facto de jogar em equipas grandes as coisas eram mais fáceis. Está considerado entre os melhores dez jogadores de sempre e todas as crónicas falam dele como um arquiteto de fantasias, tanto quando passava como quando goleava. Representou também a Roma. Ganhou uma Taça Latina, três campeonatos italianos e com a Roma ganhou uma Taça UEFA. No seu Uruguai ganhou quatro campeonatos e inundou o Brasil com um mar de lágrimas no Campeonato Mundial de 1950.