Numa galáxia não tão distante chamada mundo do futebol, o Al Nassr conquistou uma épica vitória contra o Al Duhail (4-3) na Champions Asiática. E adivinhem quem estava lá, a brilhar mais do que uma estrela cadente? Claro, o indomável Cristiano Ronaldo, a colecionar golos como se colecionasse cometas pelo espaço!
Na semana anterior, num confronto épico digno de filme, o clube saudita saiu vitorioso contra o Dhamk (2-1), com um golo do CR7 que nos fez viajar no tempo até aos dias dos livres-penalties, que concretizava, sobretudo no Man. United. Ah, os velhos tempos! E, quando pensávamos que o seu brilho poderia diminuir, Ronaldo alinhou-se novamente com as estrelas, e ajudou a nossa constelação nacional a eclipsar a Bósnia e Herzegovina com um retumbante 5-0. Estaria Ronaldo com propulsores estelares? Nesses duelos, no melhor apuramento de sempre da Seleção Nacional, o madeirense assinou não um, não dois, mas nove golos que nos fizeram olhar para o céu em admiração.
É este o Cristiano Ronaldo, aos 38 anos de idade. Sim, aos 38. Quando, normalmente, os futebolistas – ou melhor, ex-futebolistas – se aventuram em peladinhas com amigos ou, no limite, em eventos das estrelas ou jogos dos “amigos de alguém que foi uma estrela do futebol mas, aos 38 anos já pendurou as chuteiras vs o resto do Mundo”, Cristiano Ronaldo prefere desafiar as leis do Universo e orbita no presente ano civil como o melhor marcador do planeta. À frente de Haaland (23 anos) ou de Mbappé (24). Ia escrever “impressionante”, mas é mais do que isso. E não sei qual é a palavra. Julgo que não existe no dicionário.
Ronaldo diz que é diferente dos outros e, por isso, continua a fazer as coisas bem. Se soa a sobranceiro? Sim, talvez. É verdade? Totalmente. Por isso é, que doa a quem doer, quase aos 40, rivaliza com os melhores jogadores do momento, na fina flor da idade, e que lutam pela Bola de Ouro.
E apesar de toda a magia e conquistas, de ser portador -algo sem precedentes- da maior legião de fãs em toda a Terra (e, se calhar, no Espaço), de ter o rótulo de maior embaixador de sempre de Portugal (provavelmente nenhum de nós verá outro igual) CR7, como qualquer super-herói, tem os seus críticos, sobretudo na opinião pública. Querem fazer-nos crer que é “arrogante”, que “só pensa nele” (mesmo que ajude os mais desfavorecidos e doentes, muitas vezes sem querer que tais atos se tornem públicos), que está a mais nas equipas – por muito que seja sempre o melhor marcador e que estas vençam mais títulos quando ele lá está; que já não serve para a Seleção – mesmo que seja o melhor marcador de uma fase de apuramento… aos 38 anos.
Curiosamente, há quase um ano, vimos no Catar uma película inédita: Cristiano Ronaldo, o insólito suplente. Na única vez que em que o capitão foi relegado para o banco, Portugal teve uma prestação galáctica. Falo, claro, e com toda a ironia que o assunto merece, do último Campeonato do Mundo, onde emergiu um Ronaldo desconhecido. Infeliz e basso. Os críticos regozijavam-se. Depois de tanta tinta corrida, de tanto comentário em horário nobre, pareciam, finalmente, ver um CR7 declínio, que já vinha de uma época tumultuosa em Manchester e a tenebrosa entrevista com Piers Morgan.
Nem o arranque no Al Nassr ajudou o astro português, qual lei de Murphy! Mas, os homens – mesmo com capa de super-heróis – não são máquinas. E, como em qualquer bom filme, há sempre uma reviravolta.
Eis que, de repente, surge um salvador inesperado. Luís Castro, um grande Mister que deixou uma marca indelével do Botafogo. Destratado pela torcida do Glorioso, Castro saiu do Brasil depois de elevar o Fogão a patamares há muito esquecidos (leia-se, via aberta para o título do Brasileirão, quase 30 anos depois. Sim, parece impossível, mas o Ser Humano, nomeadamente o adepto brasileiro, é mesmo capaz de coisas incríveis. Vou repetir: o homem que vai dar o título ao Botafogo quase 30 (!) anos depois, foi completamente enxovalhado pelos adeptos desse clube. Um estádio inteiro a mandá-lo “tomar no c%”; botafoguenses a dizerem “prefiro perder do que continuar a aturar o portuga”; espera à porta do centro de treinos. Enfim. Um festival de alarvidades.
Só que, além de ingratos, os torcedores do Botafogo parecem ser masoquistas. Isto porque, se calhar, na casa deles, gostam de ser mal tratados. Quando Luís Castro decidiu fazer-se à vida, deixar de aturar gente doida e ser maltratado, ficaram muito ofendidos e, claro, a arma utilizada foi a mesma: injuria, desrespeito, falta de educação. Mas, calma. Além de tudo isto, hipócrita é uma característica que também assenta bem ao adepto do Botafogo. Que ultraje enorme, um crime gravíssimo, um treinador ter o objetivo de dar mais qualidade à sua vida, com um contrato melhor, que lhe dá a oportunidade de treinar alguns dos melhores jogadores do Mundo. Talvez, o adepto do Botafogo esteja a fazer o mesmo desde que entrou no mercado de trabalho e nunca tenha procurado evoluir e melhorar as suas condições. Deve ser por isso que cada vez que me lembro de um botafoguense, só me vem à cabeça a célebre frase de Albert Einstein sobre as duas coisas infinitas: o Universo e a estupidez humana.
Posto isto, quando os caminhos de Castro e Ronaldo se cruzaram, foi como a união de dois astros. Juntos no momento certo e até já venceram um título. Entretanto, o Botafogo começou a perder jogos consecutivos (vale-lhes a vantagem monstra que Castro lhes ofereceu) e os críticos de Ronaldo, bom, tem de se aguentar.
Nas recentes declarações que prestou sobre a estadia no Al Nassr, Ronaldo disse mais: enfatizou o papel de Castro e da equipa técnica no seu renascimento e que está a divertir como nunca a jogar futebol. Nota-se. Outros como Otávio, Laporte ou Brozovic também viram as suas carreiras redefinidas quando foram chamados a representar os respetivos países. Denominador comum? Sim, Luís Castro.
Depois de levar um histórico clube brasileiro à conquista do título, após quase três décadas, e de ter recuperado o melhor jogador português de todos os tempos, quando parecia acabado, se não for considerado a personalidade do ano no desporto, não sei quem será.