A Fórmula 1 é um dos desportos mais assistidos pelo mundo e tem ganho, substancialmente, mais apoiantes que vibram com cada corrida. Se por um lado, há quem ache crucial esta nova popularidade que tem conquistado, por outro, há quem pense que poderá desvirtuar a essência da modalidade.
Desde que o grupo norte-americano Liberty Media, em 2016, assumiu a promoção do campeonato mundial de Fórmula 1 que muitas alterações aconteceram neste desporto. Houve uma clara tentativa em popularizar esta categoria, de uma forma que, até então, não tinha acontecido. Com uma popularidade gigantesca foram batidos recordes de audiências e financeiros, e houve um aumento significativo do calendário de corridas.
Foi bastante claro que passou a existir uma forte campanha de aproximação da modalidade aos seus seguidores, trazendo não só as redes sociais para um papel principal, mas também apostando numa série de streaming. A série “Drive To Survive”, na Netflix, que mostra os bastidores mais dramáticos do grid, não deixou ninguém indiferente, quer por ter chamado muitos apoiantes que nunca tinham visto uma corrida, quer por todos aqueles que achavam que um “reality show” nunca seria benéfico para o desporto.
Todo este interesse crescente em atrair mais espectadores deve-se à vontade de que exista um maior retorno económico. É bastante óbvio que todos estes investimentos pretendem tornar a Fórmula 1 numa máquina de dinheiro imbatível, e não é por acaso que se orgulham e não se inibem de divulgar retornos financeiros em cada lugar por onde passam.
Se no passado parecia que esta categoria era assistida por um nicho de pessoas bastante definido, hoje é admirada por milhões de pessoas absolutamente leigas nos motorizados.
Será esta a “nova” Fórmula 1?
Já todos percebemos que estas novas preocupações vieram para ficar e que serão cada vez mais frequentes estes espetáculos ainda antes de se apagar o semáforo. Exemplo disso mesmo foi o GP de Las Vegas, onde várias foram as opiniões quanto ao entretenimento que é extraído do desporto. Apesar de ter sido uma das corridas mais entusiasmantes da temporada, contrariando as fracas expectativas, o que ficou na ordem do dia foi o espetáculo de variedades que antecedeu a prova.
Foi no coração de Las Vegas que aconteceu a corrida mais vistosa da temporada, num passeio de celebridades dentro e fora do paddock. Os pilotos tiveram que dividir a concentração e preparação com presenças em vários eventos de marketing.
Não tem sido apenas tema de debate entre fãs da modalidade e comentadores, mas também entre pilotos. Max Verstappen é uma das vozes mais ativas, pronunciando-se contra este “show” e esta tendência em deixar o desporto para “segundo plano”. Essa é uma crítica comum vinda de opiniões mais céticas e puristas que receiam que se desvirtue a essência do desporto em prol de popularidade.
Apesar de tudo isto, é impossível negar todo o trabalho que tem sido feito para cativar cada vez mais apoiantes, principalmente nos Estados Unidos. A forte e criativa presença que a F1 tem tido, nos últimos anos, permitiu que fosse criada uma nova geração de fãs, rejuvenescendo a marca. Contudo, existe sempre o reverso da moeda e é, muitas vezes, questionado se os motivos que fixam os novos apoiantes são os mais importantes. Será que procuram saber mais e entender a modalidade? Será que se interessam pela sua história? Ou será que se entusiasmam pelo piloto mais popular ou pela equipa dominadora?
Como não tenho respostas para nenhuma destas perguntas, resta-me acreditar que pode ser positivo existirem mais interessados neste desporto. Considero que o entretenimento, em doses moderadas, pode não ter apenas aspetos negativos, no entanto, não deve ser a razão para nos ligarmos a uma modalidade. Não são as passadeiras vermelhas ou o fogo de artifício, nem as limusines ou as câmaras da Netflix que fazem a essência do desporto. São as ultrapassagens e as estratégias de equipa, tal como a experiência de um veterano ou a irreverência de um rookie que nos fazem não tirar os olhos dos monolugares.
Acredito que tudo é uma questão de equilíbrio e que o entretenimento pode ser um complemento. Pode haver espaço para a história de Monza e para a extravagância de Vegas. No entanto, espero que a competição continue a ser o principal foco e que pouco mais importe para além daquilo que se passa dentro da pista. Enquanto apreciadora de Fórmula 1, não considero que existam holofotes capazes de pôr em causa a beleza das corridas.