Não é preciso abdicar dos princípios, basta adaptá-los e foi assim que o 1.º Dezembro complicou a vida do Braga

Não é assim tão raro ver, ler e ouvir que, contra equipas de outro nível, é preciso adotar uma estratégia diferente, procurando evitar ao máximo sofrer um golo e ir arrastando o jogo. Os momentos de transição e as bolas paradas são, neste cenário, chave para ferir um adversário que, dada a tamanha diferença de plantel, orçamento e infraestruturas, tem de ser travado desta forma. O 1.º Dezembro esteve muito perto de travar o Braga e não foi assim que o fez.

Porque não é abdicando dos princípios que se está mais perto de surpreender, mas sim adaptá-los. É preciso um lirismo desmedido para acreditar que, sem mudança qualquer, um David consegue travar qualquer Golias. Será também preciso um ceticismo imensurável para acreditar que é abdicando de todas as armas que permitiram, precisamente, estar olhos nos olhos com Golias, que se está mais perto de lhe fazer frente.

O 1.º Dezembro também teve de sofrer, como sofreria em qualquer jogo que disputasse diante do Braga. Ainda assim, não abdicando dos seus princípios, colocou também o Braga em apuros, obrigando ao mais experiente dos soldados a usar o último dos trunfos que carregava consigo. E aí, há mérito do 1.º Dezembro por não ter abdicado dos princípios elementares do seu jogo. Mesmo com uma derrota no marcador.

Sem bola, desde cedo que se percebeu que o conjunto de Sintra não queria fechar-se num bloco baixo remetido à sua área. Também aconteceu, principalmente nos primeiros 30 minutos, mas precisamente por mérito do adversário, encostando-se à área do 1.º Dezembro e fazendo a bola deambular. Sempre que possível, o conjunto orientado por João Nuno procurou subir a pressão, obrigando a bola a fugir dos médios e procurando apertar os criativos espalhados pelos corredores.

Fonte: Pedro Barrelas / Bola na Rede

Num 4-4-2 com Pedro Jesus a subir e a colocar-se ao lado de Gabriel Morais, o 1.º Dezembro conseguiu balançar a pressão, preenchendo a zona central e impedindo a bola de entrar nos médios arsenalistas e procurando fazer a bola desaguar nos corredores. A muita mobilidade do Braga nos minutos iniciais, com Ismael Gharbi e Yuri Ribeiro a trocar constantemente de posição, com Ricardo Horta e Rodrigo Zalazar a deambularem em campo e a aproximar-se da bola e com Rafik Guitane encostado ao corredor, procurando receber longe da marcação e beneficiando do posicionamento interior – frequentemente mais baixo – de João Ferreira, trouxe problemas ao 1.º Dezembro.

A verdade é que nesta temporada o Braga tem sido sempre mais forte quando não está em vantagem no marcador e, depois do golo inicial, acabou por baixar os índices de agressividade sem bola e de intensidade com esta e o 1.º Dezembro, que a espaços já conseguia ter bola, cresceu. Mantendo a identidade e a procura em construir curto, atraindo o adversário para explorar o espaço criado, a equipa de João Nuno ganhou conforto a sair a partir de trás, construindo pelo guarda-redes e pelos centrais e começou a valorizar os principais ativos.

Tiago Santos, o mais silencioso e menos exuberante, partia do vértice mais recuado do triângulo do 4-3-3 do 1.º Dezembro para funcionar como um pêndulo. Aproximando-se da bola e baixando no terreno, conseguiu jogar de costas e dar andamento ao jogo do conjunto de Sintra, retendo a bola e rapidamente encontrando caminhos para a escoar. Superada a teia da pressão do Braga, e com espaço na frente para explorar, o 1.º Dezembro conseguiu chegar com perigo, principalmente pelo corredor direito.

Evandro Barros teve no corredor direito o expoente do jogo dentro do jogo que protagonizou. Encarando o lateral, o extremo do 1.º Dezembro raramente hesitou em partir para cima e tentar o 1X1. Nem sempre foi bem-sucedido, decidiu mal em vários lances, mas a coragem e ambição em arriscar, demonstram o espírito do jogo. Pedro Jesus, interior direito, destacou-se pelo trabalho sem bola, atacando o espaço e pisando a área.

Com mais holofotes sobre si, Gabriel Morais fez uma exibição que, em muitos jogos, valeria um prémio de homem do jogo. Mesmo com a missão ingrata de funcionar como referência a solo, batalhando por muitas bolas e travando lutas em todas as zonas do campo, conseguiu ter sucesso e funcionou como elo de ligação de ataques ou como válvula de escape para atacar o espaço. Forçou e aproveitou erros e foi um perigo à solta. Mereceu o golo para recompensar uma exibição esforçada e capaz de criar problemas.

Braga Jogadores x 1.º Dezembro
Fonte: Pedro Barrelas / Bola na Rede

Foi sem abdicar dos seus princípios – ofensivos e defensivos – que o 1.º Dezembro chegou aos 94 minutos com um empate recompensador que daria direito a, pelo menos, mais 30 minutos de futebol. Não contou com a mira afinada de João Moutinho que, aos 37 anos e após dois meses longe dos relvados, voltou a dizer presente. Os génios são intemporais e, principalmente, demoram muito mais tempo que os comuns mortais a dissipar-se perante as curvas da idade.

A verdade é que o sonho não foi alcançado, situação que ainda não se registou este ano. Numa altura em que ainda não houve espaço para tomba-gigantes, não havendo espaço para o resultado imediato e efémero, que haja para o crescimento. Porque o 1.º Dezembro saiu mais forte, mesmo perdendo. E, se tivesse abdicado de todos os princípios, nunca assim sairia de uma derrota.

BnR na Conferência de Imprensa

Bola na Rede: Foram muito evidentes, principalmente nos primeiros minutos de jogo, as muitas dinâmicas do Braga nos corredores laterais, à esquerda com o Gharbi e o Yuri Ribeiro a mudar de posição e à direita com o Rafik Guitane mais preso ao corredor e o João Ferreira, mais baixo ou mais alto, por dentro. Quão importantes são estas dinâmicas e a harmonia por fora nestas muitas conjugações, porque o Braga tem muitos jogadores capazes de jogar nos corredores, para o Braga continuar a crescer e começar a ser um bocadinho mais dominante nos jogos?

Carlos Carvalhal: Uma boa análise porque isso realmente aconteceu. Foi trabalhado e a equipa teve várias alternâncias de saída, com muita mobilidade entre os jogadores. Não tivemos a eficácia ofensiva nem a presença entrelinhas que deveríamos ter. Acho que foi isso que nos faltou na primeira parte, os jogadores jogavam muito longe da baliza. O Ismael [Gharbi] veio buscar muito jogo atrás, o Ricardo Horta também e às vezes com o Rafik [Guitane] na direita, o Amine [El Ouazzani] ficava sozinho no meio. Perdemos alguma ligação, porque o nosso jogo é muito ligado, então perdemos ligação. Em termos das dinâmicas, elas funcionaram, principalmente nos primeiros 30 minutos. Funcionaram muito bem, mas depois faltou sequência mais à frente. Tivemos duas ou três oportunidades boas, mas acabou por ser pouco. Na segunda parte resolvemos fixar um pouco mais os jogadores. É uma situação nova, são dinâmicas novas e não queríamos correr riscos, então fixámos um pouco mais dentro do nosso funcionamento. Mas globalmente, em termos do que treinámos, fiquei satisfeito com uma parte e não fiquei tão satisfeito com a outra parte da sequência dessa mobilidade. Tem de ser melhor e há de ser melhor com certeza, mas necessita de tempo para ser trabalhada.

Bola na Rede: Já mencionou a coragem do 1.º Dezembro querer sair a jogar, muitas vezes desde trás e com os médios muito participativos, procurando estar perto da bola e ligar setores para depois, atraindo por dentro, jogar por fora e encontrar os extremos no 1X1. Foi este o segredo para o 1.º Dezembro conseguir disputar tão bem o jogo e como é que se explica esta ambição e vontade de jogar o jogo mesmo perante um adversário com outros argumentos?

João Nuno: Explica-se pelo acreditar naquilo que trabalhamos. Foi isso que disse aos jogadores. Eu abordei o jogo ao contrário do que se fala quando jogamos com estas equipas. Dizem que não temos nada a perder, mas tínhamos muito a perder aqui. E ganhámos muito porque fomos jogar com o Braga como somos. É óbvio que temos de nos adaptar, se vamos pressionar a campo inteiro o jogo todo, não temos hipótese. A realidade é esta, mas dentro da nossa estratégia conseguimos. Essa forma de sair é a nossa forma de jogar todos os jogos. Gostamos de atrair para depois procurar o espaço e pedi aos meus jogadores para o continuarem a fazer, sabendo que o Braga pressiona mais forte e mais rápido e tínhamos de pensar mais rápido. Trabalhámos durante a semana e conseguimos. Não fomos uma equipa que só se preocupou em defender, procurámos o golo, tivemos mais de três oportunidades para o fazer. Tivemos bola e conseguimos sair várias vezes. Estou muito satisfeito pelo que os meus jogadores fizeram e pela coragem que demonstrámos. Ganhámos. Não o resultado, mas há muita qualidade nesta equipa e foi isso que eu pedi. Acho que conseguimos defrontar o adversário olhos nos olhos.

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Diogo Ribeiro
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O Diogo é licenciado em Ciências da Comunicação, está a terminar o mestrado em Jornalismo e tem o coração doutorado pelo futebol. Acredita que nem tudo gira à volta do futebol, mas que o mundo fica muito mais bonito quando a bola começa a girar.

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