«Se soubesse o que sei hoje, não teria ido para o Sporting» – Entrevista BnR com Wender

    – A caminho de Braga –

    BnR: Antes de assinar pelo Sporting de Braga, sei que estiveste perto do Vitória de Guimarães. O que aconteceu para teres optado pelos bracarenses?

    W: É verdade, nesta quarentena ao arrumar uns papéis em casa, acabei por encontrar os contratos que assinei com o Vitória de Guimarães antes (risos). Lembro-me que no final de janeiro, o Adelson ligou-me a dizer que eles estavam interessados em mim e queriam-me contratar. Quando soube disso, falei: “Olha muito bem, é um clube tradicional da Primeira Liga. Vamos em frente”. Ele falou em valores, e recordo-me que nesse tempo tinha um Fiat Punto e arranquei da Figueira da Foz para Guimarães para me reunir com o Adelson. Chegados lá, almoçámos com o presidente do clube, o Pimenta Machado, depois conversámos e ficou tudo certo, fomos então assinar o contrato e pegar o dinheiro do prémio de assinatura, pois estava no último ano de contrato com a Naval e já podia assinar por outro clube em janeiro. Recebi o envelope com o dinheiro, comecei a contá-lo e reparei que havia algo de errado, voltei a contar e continuava a dar errado, e disse ao presidente: “Presidente, alguma coisa está mal. Conto, conto e não dá certo”. E ele “Vou ajudar a contar então” e começamos todos a contar o dinheiro. Entretanto, o Pimenta Machado pede para lhe mostrarem o contrato, e digo: “O que está mal é essa parte do ilíquido, pois falámos em líquido e não ilíquido” (risos). Pois ilíquido tinha de ter os descontos, e o que ficou acordado foi líquido.

    BnR: O “i” no início faz toda a diferença (risos).

    W: O presidente “Ah está bem, foi a secretária que se enganou, vou pedir-lhe para fazer a alteração e trazer a parte em falta”. Isso acaba por se resolver, assino, recebo o que faltava e vou-me embora para a Figueira da Foz. No regresso, rezei o caminho todo para o carro não falhar pois tinha aquele dinheiro todo comigo, tanto que vim na estrada a 20km/h (risos). Cheguei à Figueira, enviei o dinheiro para o Brasil, e passadas duas semanas, trouxe a família para conhecer Guimarães, fomos passear e visitámos o castelo e até disse “É aqui que vamos agora morar”. Chega final de Março, o Adelson começa-me a ligar e diz “Ó Wender, o Braga está interessado em você” e eu “Tu queres complicar a minha vida? Já assinei o contrato”. “Não fica descansado que eu resolvo isso”, “Mas isso não vai dar confusão? Posso ficar um tempo sem jogar e levar com um processo”. “Não, fica descansado que eu trato disso”, e digo “E outra coisa: eu já enviei o dinheiro para o Brasil (risos). Já não tenho sequer um euro daquele dinheiro que recebi”. “Não, fica tranquilo e até vou arranjar uma outra forma de receber algo do Braga também” e eu “Ah, melhor ainda (risos). Vamos nessa então”. Vou depois ao Braga, eles queriam ter-me como reforço e deram um pouco mais de prémio de assinatura, só que o contrato era de dois anos e tinha assinado um contrato de três anos com o Vitória de Guimarães. Comecei a ver, e até os valores eram inferiores aos do Vitória, só que depois falei “Eu já peguei o dinheiro do Vitória e não vou ter de devolver. Estou a receber este dinheiro do prémio de assinatura do Braga, e se juntar os dois prémios vai dar o valor do último ano de contrato. E se o Adelson está a fazer isso, é porque o Vitória não me quer muito” e então decidi assinar pelo Braga, apesar do contrato ser apenas de dois anos, mas mentalizei-me que ia trabalhar muito para prolongarem o contrato. Foi esse o meu pensamento e felizmente correu tudo bem. Passado um tempo, eu depois fiquei a perceber o porquê de não ter ficado no Vitória: nesse ano, havia a regra de um clube ter apenas quatro ou cinco estrangeiros que poderiam jogar, e eles precisavam de um ponta-de-lança, tanto que contrataram o Ferreira que jogava no Farense, e necessitavam que um estrangeiro saísse para ele poder jogar. Assim, eles aceitaram que fosse negociado sem dar qualquer justificação e acabei por vir para o Braga e correu tudo bem.

    BnR:  Isso aconteceu sem teres a noção da rivalidade história entre o Sporting de Braga e Vitória de Guimarães.

    W: Não, eu na altura já tinha a perceção da rivalidade existente entre os dois clubes. E ainda bem que ninguém sabia que tinha assinado pelo Vitória, senão ia ser um caso bem complicado (risos).

    BnR: Acabas por te estrear na Primeira Liga. Quais foram as maiores diferenças sentidas entre a Primeira e Segunda Liga ao nível do ritmo de jogo?

    W: Ao nível do ritmo de jogo não se nota tanto, é mais por causa do terreno. Na Segunda Liga, os terrenos são mais pesados, o futebol é diferente. É mais compacto, mais de luta e parece que toda a gente está atrás da bola e há pouco espaço. E na Primeira Liga, o futebol é mais bem jogado, onde todos os jogadores conseguem ocupar o seu espaço de forma racional, e é um jogo diferente. Não fica tanto aleatório, às vezes quando se ouve falar em Segunda Liga, associa-se a um futebol mais de força e poder físico, pois os treinadores usam muito o princípio de chegar rapidamente à baliza ou ficam à espera de uma bola parada para poder definir um jogo, é mais nesse sentido.

    BnR: Em Braga, apanhas o Jesualdo Ferreira como treinador da equipa. O que aprendeste com ele?

    W: Aprendi muito. Trabalhei com o Jesualdo Ferreira durante dois anos e meio. No princípio, eu apanhei o espanhol Fernando Castro Santos. Tinha coisas muito boas no treino, ao nível da intensidade e exercícios. Só que, quando chegávamos aos jogos, treinávamos a semana inteira de uma forma e ele pedia outras coisas, e não te dava tanta liberdade para colocar o teu potencial em prol da equipa. Quando o Jesualdo veio, isso foi crucial para o momento difícil que estávamos a atravessar, e, no início dessa época, senti que o Fernando Castro não confiava muito na equipa e nos jogadores que tinha, o que acabou por se refletir na época menos positiva que fizemos em que lutámos para não descer de divisão. Com a chegada do Jesualdo que tinha outro princípio de jogo e uma mentalidade diferente, foi aí que o meu futebol deu um salto, ainda mais com o que ouvia dele: a forma como um extremo tem de virar o corpo para não perder a velocidade, os apoios dos pés e isso foi interessantíssimo aprender com ele.  

    Fonte: Facebook de Wender

    BnR: E tens alguma história engraçada com o Jesualdo Ferreira?

    W: Tenho algumas. O Jesualdo sempre foi o treinador muito esperto, ele via o que tinha de ver, e às vezes o que tinha de ver não via e isso faz uma diferença total. Lembro-me que no segundo ano dele – ele chegou em março de 2003 -, na época 2003/2004, tínhamos o Pena na equipa e era um jogador difícil de controlar, e há uma confusão no final do treino na Ponte no 1.º de Maio, o mister estava a ir embora, só que o Pena começou a bater boca com outro jogador, a discussão foi ficando mais acesa, e o Jesualdo continuou o caminho para o balneário e aí alguém começa a chamá-lo “Professor, Professor! Olhe a confusão!” e ele: “Não, não, já estou a ir embora e tenho de ir!” (risos).

    BnR: Não queria resolver o problema (risos).

    W: Sim e foram os adjuntos que tiveram de ir lá resolver a confusão (risos). Porque se ele vai lá, era obrigado a tomar uma decisão que às vezes pode ser drástica, não é? De repente, tinha de tirar o Pena da equipa para o jogo no dia seguinte, então achou melhor não se envolver na discussão. Felizmente não foi nada de grave, os adjuntos chegaram, falaram e a discussão acabou rapidamente. Mas se o treinador se envolve na confusão, teria de tomar uma atitude que poderia prejudicar a equipa, já que o Pena era importante para nós.

    BnR: Atuas ainda no 1.º de Maio. Tens alguma memória especial desse mítico estádio?

    W: Eu costumo dizer que peguei duas fases do Sporting de Braga, que era esse contexto de nós passarmos ali no 1.º de Maio e às terças havia a feira, então tínhamos de passar ali no meio dos feirantes para chegar ao campo de apoio. Alguns jogadores até paravam para fazer compras, umas meias e assim (risos).

    BnR: Aproveitavam para fazer as compras da semana (risos).

    W: Sim aproveitavam, e também para conversar com os adeptos, não havia treinos à porta fechada, já que ali dava para ver tudo. Eram outros tempos. A seguir passamos a jogar no Estádio Municipal, já havia outra estrutura, os treinos à porta e o Braga a ser o que é atualmente.

    BnR: No final da época 2004/05, acabas por ser premiado como “Melhor Extremo” da Primeira Liga. Estavas à espera de ser o vencedor no meio de tão fortes concorrentes?

    W: Naturalmente, eu já estava feliz por estar entre os três finalistas e participar na gala de entrega dos prémios. Estás a competir contra o Quaresma que estava em grande forma com os seus 21 anos e o Simão igualmente, mas com 25, e eu já com 30 anos no meio deles. Só por isso já estava feliz por estar entre os candidatos a esse prémio. E quando ganhei esse prémio, sinto que foi merecido pois fiz uma grande época, assim como o Jorge Luiz que foi o melhor lateral desse campeonato. Aquele lado esquerdo do Braga funcionava de olhos fechados, até podíamos estar no escuro e cada um conseguia encontrar o outro (risos). Isso veio premiar o trabalho feito durante a época e deixou-me bastante feliz, e sinto que é um dos meus grandes marcos no Futebol português.

    Fonte: Facebook de Wender

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    Guilherme Costa
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    O Guilherme é licenciado em Gestão. É um amante de qualquer modalidade desportiva, embora seja o futebol que o faz vibrar mais intensamente. Gosta bastante de rir e de fazer rir as pessoas que o rodeiam, daí acompanhar com bastante regularidade tudo o que envolve o humor.                                                                                                                                                 O Guilherme escreve ao abrigo do novo Acordo Ortográfico.

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