O Brasileirão é, por norma, um campeonato extremamente competitivo. Geralmente, o campeão perde mais pontos do que aquilo que acontece nos principais campeonatos europeus e há sempre a sensação de que qualquer equipa pode bater o pé às demais, independentemente da diferença que possa existir nos plantéis de uma e outra.
No entanto, tudo dava a entender que este ano a história seria bem diferente. O Botafogo FR começou a prova a todo o gás e cavou, desde cedo, um fosso considerável para o segundo lugar. Após 12 jornadas, o clube da ‘Estrela Solitária’ era líder com 30 pontos, mais sete que o segundo classificado (Grémio FPA). Depois, Luís Castro decidiu abraçar um projeto no outro lado do Mundo e algumas coisas mudaram, mas não de imediato.
Claudio Caçapa assumiu de forma interina o cargo de treinador e registou três vitórias em três jogos, deixando a Bruno Lage um ‘Fogão’ ainda mais líder. À 15.ª jornada, o Botafogo seguia disparado no primeiro posto do Brasileirão, com uma vantagem de 12 pontos sobre o Flamengo, que ocupava o segundo lugar. Lage não foi feliz no Rio de Janeiro e acabou demitido passadas apenas 10 jornadas. O empate em casa perante o Goiás EC, orientado por Armando Evangelista, foi a gota de água para John Textor (e não só). Contudo, mesmo com um registo pontual bastante pobre, juntamente com a eliminação da Taça Sul-Americana diante do CSD Defensa y Justicia, o português deixou o cargo com o Botafogo na liderança, beneficiando de uma vantagem de sete pontos para o Red Bull Bragantino, treinado por Pedro Caixinha.
Daí para cá, o ‘Fogão’ nada mais fez do que apenas acentuar a sua crise no Brasileirão. O início promissor de Lúcio Flávio – duas vitórias em dois jogos fora de casa – levou até Marçal a dizer publicamente que a equipa tinha voltado a «fazer arroz com feijão». No entanto, parece que rapidamente acabou-se o arroz (ou o feijão). Seguiram-se dois empates e quatro derrotas, das quais destacam-se o duplo 3-4, em casa, contra a SE Palmeiras e o Grémio. Dois jogos que espelham na perfeição o que tem sido este Brasileirão: caótico, apaixonante e imprevisível. Com 33 partidas disputadas, o Botafogo ocupa agora a segunda posição o e está a dois pontos do Palmeiras, mas é a única equipa que depende apenas de si para ‘levantar o caneco’ (o Palmeiras tem mais um jogo realizado).
Até ao final da prova, e já com o técnico brasileiro Tiago Nunes no comando, o Botafogo vai a casa do Fortaleza EC, do Coritiba FC e do SC Internacional. No Rio, os alvinegros vão receber o Santos FC e o Cruzeiro EC.
O ‘Verdão’, que é campeão em título e líder à condição, tem feito uma excelente recuperação na tabela classificativa. A vitória com contornos dramáticos e heróicos, por 4-3, no Estádio Olímpico Nilton Santos, perante o Botafogo, deu à turma de Abel Ferreira um boost extra para o que resta da temporada. Embalados pelo prodígio Endrick, os palmeirenses bem que podem acreditar no bicampeonato. O atual plantel do Palmeiras está longe de fazer jus àquilo que foi conquistado nos últimos anos, mas Abel Ferreira continua a ter à sua volta uma aura vitoriosa. Aliás, no Brasil, e em jeito de brincadeira, há quem diga que o treinador português fez um pacto com o diabo.
A verdade é que com ou sem pacto, e ao contrário daquilo que acontece com o Botafogo, o Palmeiras tem sabido reerguer-se nos momentos mais difíceis, fazendo-me acreditar que, nesta altura, é a equipa com maior capacidade de lidar com a típica pressão inerente à reta final de um campeonato.
O gigante brasileiro esteve mais de um mês sem conseguir uma única vitória (seis jogos), mas nos últimos sete encontros, o ‘Verdão’ venceu seis e perdeu apenas um. Pelo meio, goleou o rival São Paulo, por 5-0, no Allianz Parque. A fim de mudar o rumo dos acontecimentos, Abel Ferreira adaptou a equipa a um 5-3-2 e os resultados têm sido francamente positivos, desde então. Até ao final do campeonato, o Palmeiras vai a casa do Fortaleza e do Cruzeiro, e ainda recebe o Fluminense FC e o América-MG FC.
Como referi acima, o campeão em título não depende apenas de si para confirmar nova conquista do Brasileirão, mas é difícil de acreditar que o Botafogo não vai voltar a escorregar. Vencendo os seus quatro jogos, Abel Ferreira e o Palmeiras terão muito provavelmente motivos para festejar novamente.
Se me dissessem, ainda antes do início do Brasileirão, que o Botafogo estaria nesta altura a lutar ativamente pelo título, eu acharia uma barbaridade, é verdade. Mas, e o que dizer do Red Bull Bragantino? A equipa orientada pelo português Pedro Caixinha tem feito uma época notável. Com 59 pontos, fruto de 16 vitórias, 11 empates e apenas 6 derrotas, em 33 jogos, o ‘Massa Bruta’ é o atual terceiro colocado do Brasileirão. Vencendo o jogo em atraso, o Bragantino cola-se ao Palmeiras na primeira posição.
O clube do Estado de São Paulo tem impressionado pela consistência. É a formação com menos derrotas no campeonato, a segunda equipa menos batida e a terceira com melhor diferença de golos. O apuramento para, no mínimo, as pré-eliminatórias de acesso à fase de grupos da Libertadores está praticamente garantido, mas o objetivo é assegurar a qualificação direta, ou seja, uma das primeiras quatro posições.
No entanto, duas coisas são já certas: a primeira é que a equipa de Pedro Caixinha irá acabar numa posição muito acima daquela em que terminou na temporada anterior (14.º lugar). A outra é que, desde que há este formato de pontos corridos no futebol brasileiro, esta é já a melhor pontuação de sempre do clube. Ainda faltam cinco jogos para o ‘Massa Bruta’ terminar o campeonato, mas o caráter histórico desta campanha sob liderança de Pedro Caixinha já ninguém poderá negar. Há margem para sonhar com o título.
Até ao final, o Bragantino vai medir forças com o CR Flamengo (fora), Internacional (fora), Fortaleza (casa), Coritiba FC (casa) e CR Vasco da Gama (fora).
Falando em surpresas, o Grémio é outra equipa do Brasileirão que merece um verdadeiro destaque. Começou muito bem o campeonato, é sobejamente conhecido como um grande do futebol brasileiro e até tem Luis Suárez no plantel, mas é preciso não nos esquecermos de que o clube de Porto Alegre andou pela Série B na temporada passada.
Talvez não esteja a ser dado o devido reconhecimento, mas a verdade é que Renato Gaúcho tem feito uma temporada fantástica no comando do tricolor, pelo menos no que ao campeonato diz respeito. De acordo com os dados do Transfermakt, o Grémio começou a temporada como o 14.º plantel mais valioso do futebol brasileiro. Assim como nos casos de Botafogo e RB Bragantino, tanto a presença do Grémio na parte cimeira da tabela quanto a séria possibilidade de vencer o campeonato são surpreendentes a todos os níveis. Aliás, não fosse a derrota algo inesperada na última jornada, em casa, perante o SC Corinthians, e a equipa de Renato Gaúcho estava em igualdade pontual com o Palmeiras na liderança.
Quem tem contribuído significativamente para esta fantástica campanha do Grémio no Brasileirão é Luis Suárez. O experiente avançado voltou recentemente a ser convocado para a seleção uruguaia, refletindo o bom momento que atravessa ao serviço do tricolor. Leva já 14 golos e 10 assistências no campeonato. Em toda a temporada, são já 26 remates certeiros e 16 passes para golo.
O calendário do Grémio não é nada fácil, pelo que será difícil imaginar um registo perfeito até ao final. A equipa de Renato Gaúcho vai receber os aflitos Goiás e Vasco da Gama, e ainda terá de visitar o Atlético-MG e o Fluminense.
E porque este Brasileirão está verdadeiramente equilibrado, é necessário estendermos este artigo até ao quinto e sexto classificados. Isto porque entre o primeiro e sexto, apenas cinco pontos separam as equipas. Números impressionantes, ainda mais para um final de época. Atlético-MG e Flamengo têm ambos 57 pontos, mas o clube carioca tem menos um jogo. O Flamengo, agora com Tite no comando técnico, tem desiludido bastante durante esta temporada, mas a verdade é que chega à última fase do campeonato com fortes probabilidades vencê-lo.
É verdade que de entre os mais sérios candidatos ao título, o Flamengo é aquele que tem o calendário mais complicado, mas se nestes últimos cinco jogos a qualidade de jogo da equipa fizer jus ao talento individual nas mãos do ex-selecionador brasileiro, o ‘Mengão’ vai dar muito trabalho.
RB Bragantino (casa), América-MG (fora), Atlético-MG (casa), Cuiabá EC (casa) e São Paulo FC (fora) são os desafios que a equipa de Tite terá de superar para sonhar com o título de campeão.
Já o ‘Galo’, orientado por Luiz Felipe Scolari, não perde a esperança num pequeno milagre. Eduardo Coudet começou no comando técnico do Atlético-MG, mas um mau início de campeonato ditou a saída do argentino.
Definitivamente, entre todas as equipas que ainda sonham com o título, o Atlético parece-me aquela que tem menos possibilidades de vencer. Com 34 jogos disputados, são cinco pontos de diferença para o primeiro lugar, quando ainda há equipas com apenas 33 partidas realizadas. Ao contrário de RB Bragantino, Botafogo e Grémio, a presença do Atlético-MG na parte cimeira da tabela não surpreende minimamente. A seguir ao Flamengo, é o ‘Galo’ que tem o melhor plantel de todo o futebol brasileiro.
Apesar de haver Hulk, a grande estrela tem sido Paulinho. Após cinco temporadas de pouca utilização no Bayer 04 Leverkusen, o extremo de 23 anos regressou ao Brasil e tem dado cartas. Com 14 golos apontados, Paulinho lidera a lista de melhores marcadores do Brasileirão. Nos últimos cinco jogos, marcou seis golos. O bom momento garantiu-lhe mesmo a convocatória para a seleção brasileira, na mais recente lista de Fernando Diniz.
À semelhança do Flamengo, o calendário da equipa de Scolari não tem nada de simpático. Os alvinegros vão receber Grémio e São Paulo e ainda terão de ir a casa do Flamengo e do EC Bahia.
No fundo, fazer previsões desta reta final do Brasileirão é como dar um tiro no escuro. Ainda mais difícil é determinar quem merece ou não vencer. O Botafogo foi líder durante 30 jornadas consecutivas, mas já começou a sentir o peso do momento. O Palmeiras não convence a 100%, mas nunca tirou os olhos do primeiro lugar. RB Bragantino e Grémio têm brilhando contra todas as expectativas, enquanto Flamengo e Atlético-MG fazem-se valer dos seus plantéis de alto nível. O título será bem entregue, e para a história ficará um campeonato que teve de tudo.
Como já dizia o ‘outro’: «o difícil não é chegar ao topo, mas permanecer lá».
