Pode a Inglaterra livrar-se do fardo de “underachievers”?

    Clicou para ler este texto e leu o palavrão “underachievers”. O que quererá isto significar? Imagine uma turma composta por alunos muito bonitos, inteligentes e muito acarinhados. Esse grupo de alunos, dado a essa segunda qualidade que enumerei, tem capacidades para mostrar que pode alcançar notas mais elevadas do que aquelas que apresenta. Ora, alguns desses alunos não conseguem encontrar a explicação para chegar a um sucesso maior, que pode trazer mais fruto. Todavia, a vontade de ‘dar o salto’ permanece na consciência de todos. Mas ainda assim, o tempo não perdoa, e chegam novos meninos para quererem brilhar.

    Em bom português, a seleção de Inglaterra pode ter dentro do seu lote de convocados os elementos certos para realizar uma boa campanha no Mundial da Rússia. No entanto, neste momento (e para inglês ver), estamos em período de longa pausa, de ‘chá das cinco’. Digo isto pois os próprios britânicos – depois do remake de um polémico sketch transmitido na Eurovisão, em maio, com Herman José a satirizar uma das mais lendárias figuras da BBC, David Attenborough – “deram-nos” a liberdade aos portugueses de gozarem com os seus hábitos, mas nunca com a voz e figura maior do documentário ambiental Planeta Terra. Mas eles têm um campeonato do mundo, conquistado em 1966, e nós nenhum.

    Portanto, isto da seleção em Inglaterra é algo que não enfurece tanto como a equipa das ‘quinas’ em Portugal, pois lá a terra de um dos melhores campeonatos de futebol do mundo. Não mata, mas mói. E muito. Mas só durante os Mundiais ou Europeus.

    Voltando aos meninos “preguiçosos”. As notas foram tão más que até chumbaram.  Algo que chocou tudo e todos pois ao início eram os mais adorados da escola. A fundação do futebol passa por terras de Senhora Majestade e esses meninos podem estar a sentir uma pressão que carece de definição há algum tempo.

    Já lá vão 15 presenças em fases finais do Mundial para Inglaterra, mas últimas participações inglesas em competições de seleção foram um autêntico murro no estômago. No Europeu de 2016, o segundo lugar de Inglaterra deu a conhecer um País de Gales (1º no grupo B), os colegas da sala ao lado na tal escola que é o Reino, quererem fazer melhor. Depois, nos oitavos de final, ninguém esperaria o fim de campanha contra a revelação Islândia, que podemos chamá-los a outra escola que ninguém liga do mesmo “bairro”.

    Mais atrás, mas não há muito tempo a nota foi quase abaixo de zero. No Mundial de 2014, no Brasil, a Inglaterra ficou em último lugar da fase de grupos com apenas um ponto, num grupo onde a Costa Rica ficou em primeiro lugar, à frente de Uruguai e Itália (por esta ordem), outro dos desaires que este ano nem ao Mundial vai. Desde 1966, ano da sua única conquista que foi em casa, o melhor que Inglaterra conseguiu fazer foi um quarto lugar no Mundial de Itália em 1990. Desde então, nunca mais foram além dos quartos de final (atropelados pelo poderoso Brasil em 2002 e a estrelinha Portugal após penaltys em 2006).

    A Inglaterra, num treino recente, a ver como pode “voar mais alto” em fases finais do campeonato do Mundo. Desde a conquista de 1966 e o quarto lugar em 1990, nunca mais passaram dos quartos de final
    Fonte: Federação Inglesa

    No entanto, como os alunos e meninos são tão adorados, fala-se que a escola trouxe um professor para meter ordem, mas este rumou logo para o cargo de diretor – ou algo parecido – pois ele, pela sua maneira muito própria de ser e estar, deixa marca. Falo de Pep Guardiola. Contra factos pode não haver argumentos, mas o impacto do técnico catalão é sempre marcante. Por ordem cronológica, enquanto treinava o Barcelona, a Espanha foi campeã do mundo, em 2010 (e europeia) e ao comando do Bayern, foi a Alemanha a levar o troféu. Estamos a falar de uma personalidade do futebol moderno que ao tomar controlo de um clube – que por tradição têm sido grandes – é capaz de mobilizar todo um campeonato a tentar fazer melhor e isso terá de extrapolar para o ADN da seleção inglesa.

    Mas aí, muda tudo. Estes meninos podem ser realmente preguiçosos e ninguém ter mão neles, mas vou parar de os julgar pois talento não falta. Hoje, no Manchester City, Guardiola tem apenas Raheem Sterling e Kyle Walker. Apenas pois são apenas dois jogadores do seu clube na convocatória inglesa. Mas é por este corredor direito citizen, 100% inglês, que pode vir a bandeja para várias chávenas de golos de Harry Kane, que regista 12 golos em 23 internacionalizações, cinco deles em seis jogos da fase de qualificação (18 golos totais), o melhor marcador. Todavia, o Barcelona e o Bayern Munique dominavam e ainda, de certa forma, completam as seleções espanhola e alemã, respetivamente.

    Portanto, se desta vez não correr bem, a oportunidade de grande parte dos alunos desta turma vai acabar e o sucesso dos mais novos, as seleções jovens inglesas (campeões do mundo em sub-17 e sub-20 no ano passado) estão a dar que falar, bem como os outros jovens de escalões mais acima.

    É preciso o clique, o abanão ou até, voltando novamente a personificar, a palmada no rabiosque para mais velhos e já, tão cedo, os mais novos, para não se influenciarem e a Inglaterra deixar de ser a seleção de segunda ou até de terceira categoria nesta altura. Numa perspetiva otimista, os alicerces e as condições estão reunidos em Inglaterra, apesar de já não haver os carismáticos Wayne Rooney, Frank Lampard ou Steven Gerrard. O novo selecionador, Gareth Southgate, que rendeu o rosto dos últimos desaires inglês, Roy Hogson, parece ter vontade se impor e limpar a casa. Não chamou Joe Hart para a baliza e Jack Wilshere para o meio-campo.

    Sem qualquer derrota na fase de apuramento, Inglaterra sofreu apenas três golos em dez jogos e aqui surge a desconfiança por levar Gary Cahill, Phil Jones, Harry Maguire e John Stones para o eixo da defesa, onde também pode participar Eric Dier. As quatro opções não tiveram a maior regularidade esta temporada, mas até agora tem resultado. No meio campo, Henderson será o comandante dos criativos Dele Alli e Jesse Lingard que farão tudo para marcar ou dar a marcar a Kane, Marcus Rashford, Sterling, Jamie Vardy e Danny Welbeck. A turma é de facto boa e desta vez é bom que a lição esteja bem estudada.

    Com esta ilustração e respondendo à pergunta do título com o palavrão. Pode a Inglaterra livrar-se do fardo de “underachievers”? Sim. Como? Ultrapassar o medo e a barreira dos quartos de final. Até ver, para passar a fase de grupos, é preciso provar que é mais equipa que as individualidades destacadas na Bélgica e evitar surpresas vindas do Panamá e da Tunísia.

    Foto de Capa: Federação Inglesa

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    Francisco Correia
    Francisco Correiahttp://www.bolanarede.pt
    Desde os galácticos do Real Madrid, do grandioso Barcelona de Rijkaard e Guardiola, e ainda a conquista da Liga dos Campeões do Porto de Mourinho em 2004, o Francisco tem o talento de meter bola em tudo o que é conversa, apesar de saber que há muitas mais coisas que importam. As ligas inglesa e alemã são as suas predilectas, mas a sua paixão pelo futebol português ainda é desmedida a par com a rádio. Tem também um Mestrado em Jornalismo na Escola Superior de Comunicação Social, em Lisboa.                                                                                                                                                 O Francisco não escreve ao abrigo do novo Acordo Ortográfico.