Posto isto, é tempo de olhar para a questão do arquivar do processo e consequente ilibar de Chris Froome, que não só escapa a uma suspensão e pode correr qualquer prova, como também evita perder o título da Vuelta 2017, prova em que se deu o tal resultado.
No comunicado que informa da decisão, a UCI afirma ter decidido arquivar o processo indo de encontro à posição da WADA, que se baseia na opinião dos especialistas de ambas as partes e perante um caso em que houve acesso à informação do atleta sem paralelo noutros casos.
Um dos pontos a favor de Froome é o enorme número de controlos a que foi sujeito na Vuelta já que, como líder da prova desde a terceira etapa, foi testado em 19 etapas. Por um lado, apenas numa se registou esse resultado anómalo e, por outro, permite fazer uma comparação diária dos resultados que ajuda a compreender se esse resultado é ou não justificável.
Outra peça fundamental da defesa é um estudo recentemente publicado que coloca em questão o valor usado pela WADA para aferir se foi ou não ultrapassado o limite de consumo diário. Segundo esta investigação, os falsos positivos poderiam ocorrer em mais de 15% dos testes.
É claro que é impossível dizer se foi ou não feita justiça sem sabermos todos os pormenores discutidos no caso, mas não se pode deixar de admitir que, perante que o veio a público, há um bom grau de razoabilidade nesta decisão, que faz com que a possamos aceitar.
Um último ponto que pretendo a abordar é o sentimento de justiça de forma mais abrangente no ciclismo e no desporto. Uma coisa é certa quanto a este caso, tal como acontece também na vida comum em muitos tribunais, a justiça é diferente consoante os meios e as posses que se tem. Froome teve a capacidade de organizar a sua defesa e recorrer a meios de prova de um jeito que muito poucos têm possibilidade de fazer e casos semelhantes podem ter tido desfechos diferentes exatamente por isso.
Por isso, seria também tempo de relembrar que a intenção é a apanhar quem quer trapacear o desporto e isso não quem somente tem menos meios para se proteger. Ou seja, por muito importante que condenar os dopados seja, as instituições devem sempre ter consideração a defesa dos direitos dos atletas e não entrar por caças às bruxas. Porque a credibilidade do ciclismo e dos outros desportos depende tanto da condenação dos culpados como da exoneração dos inocentes.
Foto de Capa: Le Tour de France