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Nenhum acidente é o melhor acidente

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Todos conhecemos o processo. Quando queremos uma atualização sobre a Fórmula 1, vamos às muito bem geridas contas das redes sociais, seja Facebook, Twitter ou YouTube, e a probabilidade de nos aparecer pelo caminho um vídeo relativo a “Melhor(es) acidente(s)”, ou “Despistes mais Espetaculares” é extremamente alta.

Estamos perante um dos desportos motorizados mais seguros do mundo. Nos últimos quase 30 anos, há a registar três fatalidades de pilotos ao volante de carros de Fórmula 1, ou com complicações relativas a acidentes (Roland Ratzenberger, Ayrton Senna e Jules Bianchi). Acidentes como aqueles que vemos hoje em dia, nos quais, em cinco segundos, o piloto sai do carro sem um arranhão, trariam consequências muito mais graves no passado, como, infelizmente, se verificou inúmeras vezes.

Isto levou a que, hoje, as redes sociais da Fórmula 1 se enchessem de vídeos como aqueles que descrevi acima, classificando-os de “melhor a pior”, ou vice-versa, como preferirem. Isto, a mim, incomoda-me bastante. Estamos a falar de pessoas dentro destes veículos, a mais de 300 Km/h, por vezes sobre-humanos nos reflexos e na coragem que mostram. Contudo, isto não significa que os devemos deixar de tratar precisamente como tal: seres humanos.

Um dos exemplos mais gritantes desta situação de glorificação de acidentes é o assustador acidente de Romain Grosjean, no Grande Prémio do Bahrain de 2020. Já todos vimos as imagens – o que não era difícil, tendo em conta a quantidade de vezes que foram transmitidas.

Eu próprio fiquei horrorizado no preciso momento do acidente, sendo que, durante dois minutos, a imagem súbita de uma bola de fogo ficou gravada na minha memória, e eu só queria saber se Grosjean estava bem. Ao final desses cerca de dois minutos (que pareciam uma eternidade), a transmissão mostrou o piloto francês dentro do carro médico, abalado, mas, aparentemente, seguro. De seguida, havendo a certeza de que tudo estava bem, tivemos acesso às primeiras imagens do horrível choque que partiu o monolugar da HAAS ao meio, envolvendo Grosjean de chamas.

Pouco depois, chegaram as imagens do momento em que os homens do carro médico ajudam o gaulês a sair das chamas. No período de bandeira vermelha que se seguiu, enquanto os comissários limpavam os detritos e corrigiam as barreiras, as imagens do acidente multiplicavam-se.

Foi neste momento que a situação me começou verdadeiramente a incomodar. Eu, no conforto do meu sofá, começava até a perder a vontade de ver a corrida. Imagino a força mental para me voltar a sentar num monolugar, após ver tal coisa. E como o drama e a tensão vende, a Fórmula 1 fez questão de repetir dezenas de vezes o acidente nos ecrãs espalhados pelo circuito, inclusive aliando isto a imagens dos pilotos como forma de aumentar a tensão.

Ou seja, a partir do momento em que perceberam que Grosjean tinha sobrevivido, trataram de normalizar o que tinha acontecido para vender mais um pouco. Pilotos como Daniel Ricciardo e Sebastian Vettel repudiaram isto, e com razão. É bom perceber como aconteceu e se está tudo bem, claro. Porém, num ápice, passou de algo informativo para um momento de “entretenimento”. Acidentes com potencial de retirar vidas nunca podem ser tratados como passatempo.

Há saudosistas pelo perigo dos “tempos áureos” da Fórmula 1. A essas pessoas eu digo que deixem de ver, que saiam desta comunidade. A vossa sede de sangue nada tem a ver com gostar do desporto em si, é uma autêntica falta de respeito por todos os que perderam a vida e que acabaram a motivar este desporto a tornar-se tão seguro como é. A vossa coragem é imensa, até serem vocês atrás de um volante a velocidades estonteantes, sabendo que, ao mínimo erro, as coisas podem correr mal.

Há também quem tenha gosto em ver toda a fibra de carbono a voar e a destruição, dizendo “oh, não tem mal, o piloto está bem”. Sim, está, mas podia não estar. Se queres destruição, vê um filme do Michael Bay: há lá fogo de artifício mais do que suficiente. Não te esqueças de que na Fórmula 1 as pessoas são reais, e não um boneco digital atrás do volante. Enquanto te regozijas com estes momentos, esqueces-te de que lá dentro está alguém que, em muitas situações, vê a vida a passar-lhe à frente dos olhos, enquanto o acidente não para.

Há, por fim, a Fórmula 1 e a comunicação que fazem. Eu sei, são muito seguros. Estes acidentes graves raramente tem consequências, mas podem ter. Vocês são uma categoria de corridas em circuito, não de derbys de demolição. Estão a errar no que promovem. Coloquem mil vídeos de batalhas em pista, que ainda existem, não vídeos a analisar o acidente do Marcus Ericsson, em Monza, de 489 ângulos diferentes (este número pode estar errado pelo valor exato de muito).

O espetáculo e a destruição pode vender, mas a decência não se compra.

Foto de Capa: Fórmula 1

Artigo revisto por Mariana Plácido

Luís Manuel Barros
Luís Manuel Barros
O Luís tem 21 anos e é de Marco de Canavezes, tem em si uma paixão por automobilismo desde muito novo quando via o Schumacher num carro vermelho a dominar todas as pistas por esse mundo fora. Esse amor pelas 4 rodas é partilhado com o gosto por Wrestling que voltou a acompanhar religiosamente desde 2016.                                                                                                                                                 O Luís escreve ao abrigo do novo Acordo Ortográfico.

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