
No sábado passado, escreveu-se uma das páginas mais douradas do ténis feminino italiano. A tenaz Jasmine Paolini conquistou o torneio mais importante da sua carreira (pelo simbolismo do mesmo, pois já tinha ganho um torneio da mesma categoria no Dubai em 2024), ao bater na final do WTA 1000 de Roma a norte-americana Coco Gauff, pelos expressivos parciais de 6-4 e 6-2, em apenas uma hora e meia de jogo.
Uma vez terminado o jogo com mais um serviço ganhante, Paolini abriu os seus braços e soltou aquele sorriso bem rasgado, que já é a sua imagem de marca. Apesar do seu ténis ser bastante competitivo e da tenista italiana ser uma guerreira, também se carateriza pela sua boa disposição dentro do court, onde são constantes os momentos em que sorri de forma tremendamente genuína.
No fim do jogo, Coco Gauff deixou umas palavras de apreço à sua tenista adversária, dizendo que Paolini “é uma extraordinária pessoa e jogadora”. Não são muito frequentes as vezes que vemos alguém dentro do circuito feminino (que se pauta por uma generalizada rivalidade entre todas as tenistas), utilizar estes adjetivos tão enfáticos, depois de perder uma final.
Respaldada por um Foro Itálico completamente cheio, a tenista italiana conseguiu superar o nervosismo inicial, quebrar uma segunda vez o serviço de Coco Gauff e fechar o primeiro set com um parcial de 6-4 após um jogo de serviço em branco. Foi um set não muito bem jogado devido às condições de jogo que se faziam sentir em Roma, motivado por um tempo bastante nublado, e pela terra batida estar um pouco mais pesada do que o habitual.
Não foi um nível altíssimo de ténis, mas com esse set no bolso, Paolini (que havia ganho à mesma Coco Gauff umas semanas antes no WTA 500 de Estugarda) sabia que tinha o jogo e as armas suficientes para levar de vencida a tenista norte-americana.
O público italiano é um público que percebe de ténis e costuma ser extremamente respeitoso em relação aos tenistas de outras nacionalidades, e foi isso que se verificou ao longo do jogo.
Contudo, Coco Gauff (atual número 2 mundial) é uma jogadora que necessita de sentir o apoio do público para se poder exibir ao mais alto nível. O torneio de Roma é um dos torneios de terra batida onde apresenta resultados mais consistentes, tendo chegado a duas meias-finais anteriormente e jogado a final deste ano.
Mas com o apoio massivo a Paolini vindo das bancadas, Gauff voltou a ceder à batalha mental, encadeou uma série muito grande de erros não forçados e facilitou a tarefa da tenista transalpina.
No segundo set, apenas existiu uma tenista em campo. A profundidade da bola de Paolini começou a criar ainda mais problemas a Gauff, que é mais uma tenista de contra-ataque, do que uma jogadora tremendamente ofensiva. Gauff necessita de trocas de bola longas, para encontrar ritmo nas suas pancadas, nomeadamente na sua letal esquerda.
Paolini jogou esta final extremamente motivada, queria ganhar em sua casa. Não queria defraudar todos aqueles adeptos que se deslocaram ao Foro Itálico de Roma para assistir a esta final, e utilizou essa motivação para jogar de uma forma bastante sólida, sem ser brilhante.
A tenista italiana concluiu finalmente o segundo set com o parcial de 6-2 em menos de quarenta minutos de jogo, e foi evidente o carinho que Gauff tem por ela, com um abraço bastante terno à rede no final do jogo.
Este título foi o culminar de uma semana de grande domínio e controlo por parte de Jasmine Paolini, que no dia seguinte à final individual, conseguiu a dobradinha junto da sua compatriota Sara Errani, conquistando igualmente o título de pares.
Na única vez que Paolini se viu em dificuldades nos quartos-de-final contra a jovem talentosa russa Diana Shnaider, o público foi o catalisador que a tenista italiana necessitava para recuperar da desvantagem de um set e 4-0 abaixo no segundo set.
Conseguiu evitar uma eliminação praticamente certa, ganhar seis jogos consecutivos nesse set e forçar um terceiro set, no qual se impôs de forma bastante contundente com o parcial de 6-2.
Foi uma semana perfeita para Paolini, e fundamental para aumentar os seus índices de confiança, em vésperas de uma fase da época onde defende os pontos de finalista de Roland Garros (que começa dentro de dias) e de Wimbledon, que se seguirá muito pouco tempo depois da conclusão do torneio mais importante de terra batida.
Paolini tem 29 anos de idade e podemos dizer que é mais inexperiente do que a sua rival nesta final de Roma, que completou apenas 21 anos no passado mês de Março.
Contudo, Gauff já está na alta roda do ténis desde os seus 16 anos de idade e inclusive já conquistou uma WTA Finals em 2024 e é uma campeã de Grand Slam (Open dos Estados Unidos em 2023) e a sua erupção no ténis foi bastante mais demorada que a de Gauff.
Com 16 anos, Gauff já era considerada um prodígio e já se projetava um número bastante significativo de torneios do Grand Slam para a tenista norte-americana.
Paolini não teve uma carreira de júnior nada relevante, e só com 23 (!) anos conseguiu a qualificação para o seu primeiro Grand Slam (Roland Garros 2019), mas principalmente nos últimos dois anos tem apresentado resultados muito consistentes e tem sido umas das jogadoras mais regulares do circuito feminino.
Com apenas 1,58m, faz uso da profundidade das suas pancadas e da sua forte direita, para se impor a um jogo mais físico e potente das suas adversárias.
É uma grande lutadora e tem igualmente um excelente jogo de rede, sendo neste momento a número 6 mundial do ranking de pares femininos, já havendo conquistado torneios muito importantes nessa variante, como o caso do último torneio olímpico, ao lado da sua grande amiga e compatriota Sara Errani.
Melhorou bastante o serviço nos últimos anos, e isso também faz com que consiga tomar mais a iniciativa dos pontos, e mesmo que assim não seja, devido ao seu grande jogo de pés e e capacidade defensiva, é uma jogadora que consegue passar rapidamente da defesa para o ataque.
A tenista italiana tem conseguido estar no top 5 do ranking mundial há sensivelmente um ano, fruto de um ano absolutamente extraordinário de 2024, nomeadamente com a conquista do título no WTA 1000 do Dubai e presenças consecutivas em finais de Grand Slam, em Roland Garros e em Wimbledon, algo que tem um mérito inquestionável.
Perdeu ambas finais, mas demonstrou a sua versatilidade e talento, pois não são muitas as tenistas que conseguem fazer finais de Roland Garros e Wimbledon, quanto mais no mesmo ano. Que o diga a sua adversária nessa final de Roland Garros no ano passado: a polaca Iga Swiatek, que nunca conseguiu melhor do que uns quartos-de-final.
Na final de Roland Garros, Paolini foi “atropelada” pela grande dominadora do torneio, a polaca Iga Swiatek. Swiatek conseguiu o tricampeonato e quarto título na sua globalidade em Roland Garros, dominando essa final pelos parciais esclarecedores de 6-2 e 6-1 em pouco mais de uma hora de jogo.
Paolini não conseguiu ser uma verdadeira ameaça para a tenista polaca, que apesar de ser mais jovem, é uma jogadora mais experiente e a terra batida é a sua superfície de excelência, onde as suas pancadas em top spin de ressalto muito alto, fazem muita mossa às suas adversárias.
Apesar dessa derrota, algo continuou presente em Paolini: o seu sorriso. Na transição para a relva, e sendo que não havia ganho nenhum encontro no quadro principal de Wimbledon, foi surpreendendo as restantes tenistas e o mundo do ténis com a sua rápida transição da terra batida para a relva, e com o fato de ir ganhando sucessivamente a tenistas dotadas de um grande serviço e de um jogo mais propício ao jogo nessa superfície.
Até essa final, Paolini derrotou pelo caminho uma ex-campeã de Grand Slam (a canadiana Bianca Andreescu), a norte-americana Madison Keys que é dotada de um serviço muito potente, e nas meias-finais venceu num dos melhores jogos do ano passado a croata Donna Vekic (e uma das grandes especialistas de relva da atualidade) num dos melhores jogos do ano de 2024, impróprio para cardíacos e de um elevado nível tenístico de ambas as jogadoras, com os parciais de 2-6, 6-4 e num super tie break com o parcial de 7-6 (8), garantido a inesperada presença na final de Wimbledon após quase três horas (!) de jogo.
Na final, Paolini encontrou uma também surpreendente adversária e sem grande tradição em torneios de relva: a tenista checa Barbora Krejcikova. A variedade de jogo da tenista checa e a sua superior inteligência em pontos chave, fez a diferença, ganhando a final com os parciais de 6-2, 2-6 e 6-4.
Apesar de derrotada, o sorriso contagiante de Paolini conquistou todos os presentes no All England Club de Wimbledon, que se caracteriza por receber um público mais conservador e sisudo.
Não se pode dizer que Paolini estava a fazer um mau ano de 2025 até ao momento, pois apesar de por vezes ter perdido em rondas iniciais de alguns torneios, as suas derrotas foram contra adversárias como a bielorrussa Aryan Sabalenka (grande dominadora do circuito no último ano e atual número um mundial), a letã Jelena Ostapenko (que quando inspirada, pode ganhar a qualquer jogadora do circuito), ou a sempre complicada tenista ucraniana Elina Svitolina.
Antes do torneio de Roma, Paolini sofreu a derrota mais pesada da temporada no WTA 1000 de Madrid frente à grega Maria Sakkari (que chegou a ser número 3 mundial em 2022), que não atravessava um grande momento de forma e que inclusive saiu fora do top 100 fruto de várias derrotas em rondas iniciais dos últimos torneios disputados.
Foi uma derrota dececionante em menos de uma hora e meia com os parciais de 6-2 a 6-1 a favor da tenista grega, mas que também se pode explicar por ser dos primeiros torneios em que Paolini jogava com uma nova equipa técnica.
Recentemente, Paolini começou a ser treinada por Marc López (antigo campeão olímpico de pares ao lado de Rafael Nadal), pondo fim a uma ligação de mais de 10 anos com Renzo Furlan, o seu antigo treinador, e que havia sido distinguido como o melhor treinador do ano pela WTA pelo grande trabalho que tinha vindo a desenvolver com a tenista italiana.
E novos métodos de trabalho demoram o seu tempo a ser assimilados, além de que Madrid se disputa em altitude e as condições de jogo não são muito favoráveis para a tenista italiana.
E a resposta não podia ter sido mais afirmativa e um dissipar de dúvidas perante todos aqueles que já começavam a apontar um decréscimo de forma da tenista italiana.
Com esta vitória no WTA 1000 de Roma, um torneio que Paolini assistia quando era uma criança e que agora conseguiu ganhar, parte como uma das grandes favoritas à conquista do torneio em Roland Garros, onde as condições de jogo são perfeitas para o seu tipo de jogo.
Vai jogar a primeira ronda contra a tenista chinesa Yue Yuan, onde Paolini parte claramente como a favorita para esse jogo. As primeiras rondas são sempre traiçoeiras, mas acredito que a experiência e a qualidade da tenista transalpina irão sobressair.
Não tem o melhor dos quadros em Roland Garros, pois ficou na mesma secção de Iga Siwatek, de Jelena Ostapenko, de Elena Rybakina, entre outras.
Não é de todo um quadro muito favorável para Paolini, mas acredito que as suas adversárias também não quererão defrontar uma super motivada tenista italiana, que apesar de defender os pontos da final, irá jogar como sempre o faz: com uma movimentação muita solta, um excelente jogo de pés e o mais importante de tudo, o seu sorriso, que delicia todos os adeptos do ténis.
Por toda a sua consistência e por ser uma lufada de ar fresco no ténis feminino por causa da sua personalidade encantadora, eu estarei a torcer para que a tenista italiana saia de Paris com o troféu nas mãos, e conquiste dessa forma o primeiro Grand Slam da sua carreira.
De momento, já conseguiu algo com que sonhava desde menina: ser a imperatriz de Roma.