Há, na segunda parte do Benfica x PSG, um lance caricato. As parisienses vinham tentando cercar a área encarnada e aproveitavam todas as bolas paradas e cruzamentos para criar perigo quando Merveille Kanjinga, sem preparação, rematou duas vezes para onde estava virada. Ambas as bolas foram parar ao poste, o Benfica respirou de alívio e o caos passou.
Mais do que o perigo que o Benfica sentiu de forma constante sempre que as jogadoras do PSG, com uma presença física desproporcional e assinalável, se acercavam à baliza de Lena Pauels, o lance é, de certa forma, definidor de um percurso encarnado na Champions League Feminina traduzido em zero vitórias e apenas dois pontos. Entre deméritos naturais e as circunstâncias de um sorteio complicado, o Benfica conseguiu crescer.


A equipa feminina encarnada vive um período de transição. O ciclo vitorioso de Filipa Patão chegou ao fim, algumas das principais referências encarnadas nos últimos anos perderam espaço – Andreia Faria saiu, Andreia Norton lesionou-se gravemente, Carole Costa já não é indiscutível – e o próprio momento do futebol feminino em Portugal e lá fora, aumentou a décalage para as principais potências.
Excetuando o embate diante do Twente, uma equipa relativamente próxima ao Benfica, a verdade é que os restantes jogos encarnados eram complicados. O Barcelona e o Arsenal disputaram a final da última Champions League Feminina, a visita à Juventus apresentava grau de dificuldade elevado e os emblemas de Paris, pela maior competitividade nacional e presença física, são desafios complicados. Não havia jogos fáceis e havia muitos jogos difíceis.
A Champions League Feminina constitui um contrassensso natural para qualquer equipa portuguesa que lá chegue, no caso o Benfica, hegemónico no plano nacional. O futebol feminino em Portugal cresceu, mas a diferença dos jogos semanais, diante de equipas cada vez mais organizadas e estruturadas, não foi capaz de reduzir também a diferença entre as equipas nacionais e as principais potências europeias.


A verdade é que, sem ser brilhante nem ter jogos transcendentes, o Benfica foi competente. Foram poucos os momentos em que, mesmo diante de clubes e equipas de outras dimensões, as águias foram claramente inferiores ou dominadas. Os resultados, sem diferenças de golos superiores a dois, assim o comprovam. E esse é o mérito do Benfica.
Faltou outra capacidade ofensiva na chegada à frente e capacidade de concretização de oportunidades à equipa de Ivan Baptista para conseguir levar os jogos em frente a seu favor. Defensivamente, apesar dos erros e das falhas habituais, o Benfica foi competente. Ofensivamente, houve um crescimento natural e evidente na capacidade de criação e ligação, com Anna Gasper e Beatriz Cameirão a ganhar destaque, mas faltou outra clareza na capacidade de agredir a baliza.
É daí que chegam as carambolas e os ressaltos à imagem de metáfora da participação do Benfica nesta Champions League. Nesses lances casuais, faltou outra sorte, mas também engenho. O calendário e o sorteio obrigavam o Benfica a agigantar-se. E, por agora, ficou a capacidade de igualar. O que, por si só, já vale de alguma coisa.


BnR na Conferência de Imprensa
Bola na Rede: Numa fase de liga da Champions League em que o Benfica acaba por, apesar da pontuação e dos resultados, ter poucos momentos em que foi amplamente dominado, conseguindo equilibrar os jogos, onde é que taticamente o Benfica mais conseguiu crescer e quais os desafios que permitiram às jogadoras crescer na prova?
Ivan Baptista: Obrigado pela questão. Estes jogos são jogos que não temos no nosso campeonato. Muito raramente temos este tipo de estímulos no campeonato, infelizmente. Do ponto de vista tático, o que fizemos em Barcelona nunca vamos ter que o fazer no nosso campeonato. A exposição que tivemos em organização defensiva, no nosso meio-campo constantemente, como tivemos de fazer contra essa equipa, é algo que do ponto de vista tático tivemos de crescer muito na preparação para esse jogo, e foi uma preparação curta, e durante o jogo tivemos de conseguir corresponder. São pequenos pormenores. Naturalmente a este nível, com as intérpretes que as equipas adversárias têm, temos de rapidamente começar a encontrar outro tipo de estratégias. Não é fácil nestes contextos de Liga dos Campeões contra um PSG, um Arsenal, conseguirmos lidar e confiar por si só, por exemplo, nos duelos individuais. São jogadoras que são diferenciadas do ponto de vista individual e que, não facilmente, mas com grande probabilidade, conseguem sair dessas marcações individuais. São jogadoras muito rápidas e fortes. Hoje vimos aqui jogadoras de 19 ou 20 anos com um físico impressionante. No campeonato damo-nos ao luxo de estar mais confortáveis num bloco a 50 metros a pressionar o adversário, mas neste tipo de contexto temos de ter as jogadoras e as linhas mais próximas umas das outras, para ter coberturas e que a equipa esteja organizada. Ainda que alguma jogadora falhe, porque neste tipo de contexto contra estas intérpretes, é provável que aconteça, temos de conseguir corresponder como equipa no momento de organização defensiva. No momento de organização ofensiva, são equipas com muita mais capacidade na pressão, que nos obrigam a procurar outro tipo de estratégias e soluções, não só curtas, mas longas. Hoje até conseguimos do ponto de vista curto quebrar muitas vezes a pressão do PSG. São estas pequenas coisas que nos ajudam e que nos acrescentam no processo. Um processo que para nós é muito rico, porque nos ajuda a crescer nas competições internas, mas infelizmente não temos este tipo de estímulo maus; vezes na Liga ou na Taça.
Bola na Rede: Foi notória a capacidade do PSG criar perigo a partir de bolas paradas e cruzamentos para a área. Qual a estratégia do PSG para este momento de jogo?
Paulo César Parente: Neste momento de jogo, queríamos desequilibrar o Benfica nas costas da defesa. Tivemos bastantes bolas paradas que não soubemos aproveitar, mesmo que existisse a possibilidade porque temos muito boas jogadoras de cabeça. Houve essa oportunidade e tivemos muitas ocasiões nas bolas paradas. Tínhamos de ter concretizado essas bolas paradas para que pudéssemos ficar mais tranquilos no jogo. Foi um jogo bastante equilibrado. O Benfica não chegou tanto à nossa baliza, mas as jogadoras batalharam muito a meio-campo. No meio-campo temos jogadoras bastante novas e jovens e faltou um pouco de maturidade à equipa. A estratégia era desequilibrar pelo lado. Conseguimos fazê-lo algumas vezes, mas não traduzimos em golo as ocasiões que tivemos.

