«Nunca mais me esqueço da forma como o João Pinto me recebeu» – Entrevista BnR com João Tomás

    – Seleção A –

    BnR: Estreias-te a 15 de novembro de 2000, contra Israel. Que memórias tens deste dia?

    JT: Ui… Memórias muito emocionais. Recebo a chamada estou a entrar na autoestrada para ir para Lisboa, tinha vindo passar a folga a Oliveira do Bairro, lembro-me perfeitamente de onde estava. Atendo a chamada e era o António Oliveira. “Olá João, daqui fala o mister António Oliveira” e eu caiu-me tudo e disse “Então mister?”. Ele disse que o Sá Pinto se tinha lesionado e que eu estava convocado. A viagem para Lisboa foi muito difícil, mas a emoção foi maior no dia seguinte quando vou à Luz levantar as minhas coisas para ir para Braga. Nunca mais me esqueço da cara do preparador físico, o Ángel Vilda, a emoção que ele tinha, e não me esqueço daquilo que me disse o Mourinho, foi um momento muito importante.

    BnR: Porquê?

    JT: Foi tudo muito rápido, eu nunca tinha jogado em seleção nenhuma, de repente salto do futebol distrital para o Anadia, do Anadia para Académica, de repente estou no Benfica e agora estou na seleção nacional. Como deves imaginar, para um miúdo de Oliveira do Bairro, nos anos 90 e tal, 2000, não era fácil assimilar isso. Os miúdos hoje em dia estão muito mais preparados. Nós éramos mais reservados, tínhamos mais dificuldades perante a novidade. Depois apanhei o avião para o Porto, estava um táxi à minha espera para ir para Braga. São acontecimentos que nunca se esquecem.

    João Tomás somou 4 internacionalizações e 1 golo
    Fonte: FPF

    BnR: Como foi a chegada ao hotel onde já estava a seleção?

    JT: Como deves imaginar, o impacto foi muito grande em termos psicológicos e emotivos, porque estamos a falar da seleção de Vítor Baía, Fernando Couto, Rui Costa, Figo. Aí é que se vê a grandeza dos craques, eu nunca mais me esqueço da forma como o João Pinto me recebeu quando eu cheguei à Luz e nunca mais me esqueço da forma como o Figo me recebeu quando eu cheguei ao hotel da seleção. E pronto, a partir desse momento, tudo fica mais fácil. Porque eles são os verdadeiros campeões em tudo e sabem que aquela situação é difícil para ti, é complicado aquele primeiro impacto. E eu nunca me esqueci disso quando fui capitão, por exemplo no Rio Ave, porque eu percebi que quem está a chegar novo precisa de ajuda.

    BnR: Como era o António Oliveira como selecionador nacional?

    JT: Eu privei com ele duas, três vezes. É uma personalidade que temos oportunidade de ver agora a fazer aqueles comentários no canal 1 ao domingo à noite e ficamos maravilhados com aquela postura.

    BnR: Representar a seleção nacional é o expoente máximo da carreira de um jogador?

    JT: É, não tenho dúvidas.

    BnR: Como era o ambiente na seleção? Havia rivalidade de clubes?

    JT: Não, isso é um mito (risos).

    BnR: Marcas um golo pela Seleção, num amigável com o Kuwait em 2007. Qual é a sensação de marcar pelo teu país?

    JT: Era o que me faltava, digamos que se havia peso que estava ali para sair das costas saiu naquele momento.

    BnR: Sentes que houve alturas em que merecias a chamada à seleção, mas, como não estavas num grande, acabavas por não ser selecionado?

    JT: Sim, claro. Mas isso eu já disse muitas vezes, não vale a pena estar-me a repetir, porque não acredito que tenha sido por eu jogar no Rio Ave. Acredito que, com a performance com que eu estava no Rio Ave, se fosse com o Fernando Santos, não tenho dúvidas que era chamado.

    BnR: A decisão de terminar a carreira é a decisão mais difícil para um jogador?

    JT: Eu tinha a convicção, quando decidi sair do Rio Ave para ir para Angola, que a coisa podia acabar muito rapidamente. Não é que no Rio Ave não fosse acabar, era uma questão de tempo, mas a decisão de ir para Angola foi pensada e deu-me mais-valias em termos de bagagem para o futuro, porque estamos sempre a aprender. Foi uma passagem por África, pelo país onde a minha mãe nasceu e os meus avós viveram muitos anos. Foi um encontro com o destino ir à terra onde a minha mãe nasceu, parte daquilo que eu sou também está ali naquele continente. Adaptei-me muito facilmente, identifiquei-me com muita coisa e foi isso que me fez aguentar um ano inteiro lá. Obviamente que nós sabemos que a carreira vai acabar, mais tarde ou mais cedo. Acabou, podia acabar noutro sítio qualquer, não pensei muito, porque, em primeiro lugar não o devia fazer e, em segundo, porque regresso à faculdade para acabar aquilo que tinha começado há 20 anos e isso tirou-me os pensamentos depressivos da cabeça.

    BnR: Do que é que tens saudades dos tempos de jogador?

    JT: Não existe nada que nós não tenhamos saudades, até mesmo daqueles treinos que nos rebentavam, mesmo os estágios em que estamos privados de tanta coisa. Tenho saudades de tudo, nem gosto de pensar, até evito pisar a relva. Vou-te contar um episódio. Estava uma vez no treino, já como treinador, e havia um jogador da equipa A do Braga, não vou dizer nomes. No tempo do Paulo Fonseca, estávamos a treinar os pontas-de-lança e no final do treino houve uns jogadores que tiveram de fazer treino complementar. Tive a oportunidade de dizer a um miúdo, ainda joga, e disse-lhe “Oh X, não imaginas as saudades que eu tenho de fazer essas aberturas. Por isso, aproveita, não faças cara feia e treina, porque não imaginas o que eu pagava para tirar 10 anos ao meu B.I. e estar aí a fazer essas aberturas ao teu lado. E podes não dar valor ao que eu estou a dizer agora, mas quando acabares a carreira vais lembrar-te do que eu disse.” E é verdade, que saudades que eu tenho de fazer aberturas, que é o exercício mais horrível que há, estarmos a fazer sprints para cima e para baixo.

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