«Sou portista e tive duas oportunidades de ir para lá» – Entrevista BnR com Elpídio Silva

    Elpídio Pereira da Silva Filho. O pistoleiro. Ele é O “cara”. Atende-me com um olho no telemóvel e outro na televisão, no Tondela-FC Porto. Como disse? É isso mesmo, Silva confessa-se adepto dos dragões, clube que esteve perto de representar por duas vezes. Da passagem pelo SC Braga, recorda a gratidão a Vítor Oliveira e a “desfronta” com Manuel Cajuda. No Boavista, afirmou que iria ser campeão e todo o balneário se riu, incluindo o presidente João Loureiro, o que fez com que Silva o obrigasse a colocar uma cláusula especial no contrato. Da passagem pelo Sporting, recorda um clube grande mas mal gerido, a admiração por Fernando Santos e um golo muito especial no derby com o Benfica. É bola na rede e Silva faz: Bang! Bang!

    – De Campina Grande para o mundo –

    “Eu via muitos filmes de cowboys e disse para o Duda “Qualquer dia eu vou fazer igual”

    Bola na Rede [BnR]: Alô Silva, tudo bem?

    Elpídio Silva[ES]: Tudo! [Silva está com um olho no telemóvel e outro na televisão]

    BnR: Dá-te jeito falar agora?

    ESSim, sim. Estou só aqui a ver o FC Porto…

    BnR: A sério?

    ESSim. Eu sou portista.

    BnR: Ai é?

    ESEhehe sim.

    BnR: Mas nunca jogaste no FC Porto.

    ESÉ, foi o clube em que eu nunca joguei mas tive oportunidade duas vezes de ir para lá. Só que não consegui, não se fechou contrato. Mas era um clube em que eu gostava muito de ter jogado em Portugal.

    BnR: Quando é que estiveste para ir para o FC Porto?

    ESFoi no tempo do SC Braga.

    BnR: Porque é que acabaste por não fechar contrato?

    ESA primeira vez foi o Presidente do SC Braga que não me liberou no tempo. Acho que ele estava com medo dos adeptos. A segunda vez foi já na saída, estavam indecisos entre eu e Benni McCarthy e foram para ele.

    BnR: O que é a tua ocupação hoje em dia?

    ESTemos aqui um hotel, trabalhamos com festas de casamento e tenho também um projeto com campos de futebol que alugo.

    BnR: Em Campina Grande?

    ESNão, é uma cidadezinha que se chama Lagoa Seca. Fica a cinco quilómetros de Campina Grande.

    BnR: Já não vens há quanto tempo a Portugal?

    ESFui a Portugal em dezembro, passei aí uns 20 dias.

    BnR: Para estar com o teu filho?

    ESSim, também. Passámos o Natal. Já faz dois anos que ele não vem cá.

    BnR: Qual foi o primeiro impacto quando chegaste cá em 1998?

    ESCheguei a Portugal vindo de um futebol completamente diferente, o futebol japonês. Cheguei aí e estava há dois meses de férias no Brasil, estava muito fora de forma. Fui muito bem recebido em Braga pelo treinador Vítor Oliveira, a quem eu devo muita coisa. Até hoje agradeço-lhe tudo o que fez por mim, deixou-me muito à vontade desde que cheguei e por isso é que me adaptei muito mais rápido do que eu pensava. Deu-me muito tempo para perder o peso a mais.

    BnR: Como é que uma pessoa de Campina Grande vai parar ao Japão?

    ESCara, essa história… Eu tenho muita vontade de um dia lançar um livro ehehe. Foi uma coisa de repente, mesmo. Eu estava muito bem no Atlético Mineiro e o empresário disse assim “Tu gostarias de jogar no Japão? Vais ganhar 10 vezes mais do que ganhas aqui.”

    BnR: E tu?

    ESAí eu virei-me para ele e disse “Onde é que está o contrato para assinar?”.

    BnR: Ehehe

    ESCheguei ao Japão sem noção nenhuma. Estava frio lá na altura em que eu fui. Lembro-me que fui com camisa de seda e quando cheguei lá eu via a galera a sair do avião toda encasacada. Quando eu saí do avião levei aquela pancada de vento frio… Cara, na sexta-feira eu adoeci. Eu quando cheguei lá fiquei em casa do Edilson Capeta, o Capetinha.

    BnR: Craque da canarinha.

    ESÉ. E jogou no Benfica também. Eu fiquei com ele duas semanas e apanhei catapora, aí em Portugal diz-se varicela. Fui internado lá no Japão e passei 14 dias em isolamento total, perdi 12 quilos. É um país que eu até hoje falo muito bem porque tem uma educação, é um país de primeiro mundo, adoro o Japão.

    BnR: Quando decidiste começar a festejar os golos como pistoleiro, tinhas ideia que ia ficar para sempre como a tua imagem de marca?

    ES[Silva ri-se com gosto] Não, por acaso foi uma brincadeira, eu sempre gostei daqueles filmes dos cowboys. Eu brincava muito com o Duda, tinha uma grande amizade com ele, e quando íamos para a concentração eu via muitos filmes de cowboys. E eu disse para o Duda “Qualquer dia eu vou fazer igual”. Por incrível que pareça, foi logo no primeiro jogo do campeonato, contra o Beira-Mar. Eu fiz o golo e comemorei como pistoleiro. E a galera gostou, porque quando eu atirava todo o mundo caía. Sinceramente não esperava que ficasse para sempre e para mim é um orgulho quando as pessoas vêm ter comigo e me dizem “Pistoleiro”, com carinho.

    BnR: Lembras-te do teu primeiro golo em Portugal? Dou-te uma ajuda, também foi contra o Beira-Mar

    ESÉ, no Braga também marquei contra o Beira-Mar, no primeiro jogo. Os clubes a quem eu fiz mais golos em Portugal foram o Beira-Mar e Santa Clara. E o guarda-redes a quem eu fiz mais golos foi o Jorge Silva.

    BnR: Repito: Lembras-te do teu primeiro golo em Portugal?

    ESLembro, sim. Eu concentrava-me muito nas primeiras oportunidades no jogo. Só para você ver, eu era um jogador que não rematava muito mas quando rematava era sempre com perigo, com eficácia. Eu falo sempre para o meu filho também “Quando você joga, tem de estar sempre concentrado nas primeiras oportunidades. Porque às vezes a gente não tem mais oportunidades.” Não sei se você já viu alguns golos dele…

    BnR: Sim, quando estava a fazer a pesquisa para a entrevista.

    ES[Silva alonga-se na reação] Ehhhh, ele sabe fazer golo.

    BnR: Filho de peixe sabe nadar.

    ESSinceramente, a gente colocou ele aí mas não foi com intenção de ser jogador de futebol. Queremos que ele estude mas ele está a conciliar o futebol com os estudos. Vamos ver se ele aparece mais para a frente.

    BnR: Um antigo colega teu contou-me que não gostavas nada dos treinos físicos do Manuel Cajuda. Nem de treinar de pitons de alumínio, porque o mister Cajuda obrigava a subir as bancadas do 1º de Maio.

    ESÉ verdade, é verdade. Não é que eu não gostasse do trabalho do Manuel Cajuda mas tinha uns treinos que não tinha nada a ver com o futebol. Nada.

    BnR: Então?

    ESÀs vezes fazíamos uns treinos ao pé de Braga que era… sem noção. Ele era uma pessoa do tempo mais antigo e nós fazíamos, mas acho que 90% dos jogadores não gostava do trabalho dele. Eu não gostava nada de treinar com pitons de alumínio porque nos deixava muito pesados e nos desgastava muito. Já no Boavista praticamente era obrigatório treinar com esses pitons também. Eu “briguei” muito ainda com Jaime Pacheco, briguei entre aspas, eu pedia-lhe “Vamos jogar com chuteira mista”. Mas ele na cabeça dele era jogar e treinar assim. Deu certo no primeiro ano e na cabeça dele tinha que dar certo sempre.

    BnR: Como é que era carregar o Idalécio às costas nas dunas de Ofir?

    ESEhehe. Eu falo muito com o Idalécio nas redes sociais. Ele também era um dos que dizia “Cara, tem treinamentos aqui que não tem nada a ver com futebol”. No meu tempo no Braga eu pesava uns 83/84kg, o Idalécio pesava 102kg!

    BnR: “Só” mais 20 quilos…

    ESÉ, e era eu a carregar o Idalécio e ele a carregar-me a mim nos exercícios físicos. Há coisas na vida que nós temos que sofrer para ter sucesso lá na frente. Eu passei uns tempos com o Manuel Cajuda que não gostei e levo até hoje com uma “desfronta” comigo e com o Presidente do SC Braga. Na altura foi um dos motivos por que eu pedi para sair do Braga.

    BnR: O que se passou exatamente?

    ESEu estava com uma pubalgia, passei um tempão doente aí no SC Braga. O pessoal achava que eu estava brincando, a querer fazer tudo para sair do Braga mas não foi isso que se passou. Eu sei o que eu passei, fui a Espanha fazer o meu trabalho de recuperação com uma infiltração na região do púbis. Eu passei… foi na altura em que eu conheci a minha esposa, na altura minha namorada, e ela viu o sofrimento que eu tinha. Não desejo a ninguém, não se vê a lesão mas você sente. É muito difícil a recuperação desta lesão. E pronto, eu não aceitei o que ele fez comigo e aí já fiz de tudo para ir embora.

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