«Apareceu o FC Porto, não deu. Apareceu o Sporting, não deu. Só faltava o Benfica e esse era gigante» – Entrevista BnR com Manduca

    Jogou na formação do Grêmio com Ronaldinho Gaúcho. Foi para a Finlândia e estreou-se na Liga dos Campeões aos 17 anos. Chegou à Segunda Liga portuguesa em 2000 e em seis anos estava no Benfica, mas o regresso de Rui Costa “atirou-o” para a Grécia. Aos 30 anos foi para o Chipre, onde se tornou herói e, talvez, no único campeão como jogador, treinador e diretor… na mesma época. Tudo isto, na mesma hora em que Marítimo e Benfica, dois dos clubes em que se destacou em Portugal, jogavam para a Primeira Liga. Eis Gustavo Manduca, em exclusivo, em entrevista ao Bola na Rede.

     – Do calor brasileiro à neve finlandesa –

    Bola na Rede (BnR): Quando é que começaste a jogar futebol?

    Gustavo Manduca (GM): Ui, pergunta difícil…

    BnR: Então e em clubes, já mais organizado?

    GM: Ah assim fica mais fácil [risos]. Fui para o Grêmio com 13 anos. Antes, dos 11 aos 13, estive no Criciúma, mas ainda era escolinha e no Grêmio já foi um passo maior. Ia à seleção, era um clube maior…

    BnR: Ficaste três anos no Grêmio, mas muito cedo foste para a Finlândia. Como apareceu essa oportunidade?

    GM: Eu tinha saído do Grêmio. A equipa era fortíssima, tinha Ronaldinho Gaúcho, Anderson Polga, Gavião e eu não jogava. O grupo era muito forte, fomos campeões brasileiros e tudo, mas é engraçado: saí porque não tinha espaço na equipa, mas de todos os 40 miúdos que jogavam ali só demos certo o Ronaldinho, eu e o Polga. O resto jogou em clubes menores, acabaram a carreira logo, muitos não chegaram a profissionais… Coisas do futebol. Então vi-me forçado a arranjar um novo desafio e surgiu a possibilidade de fazer um teste na Finlândia, nem tinha nada acertado. Era um clube grande na Finlândia, o Helsínquia, e eu ia ficar duas semanas à experiência, numa residência, até ver se me davam contrato profissional. Foi difícil porque naquela altura não se sabia nada do futebol finlandês, sem cultura de futebol e uma diferença de clima gigantesca: saí do Brasil com 32 graus e quando cheguei lá estavam 20 graus negativos. Nunca tinha visto neve na vida, cheguei ao aeroporto estava tudo branco e pensei: «Meu Deus, que vim aqui fazer».

    BnR: Como era o futebol na Finlândia?

    GM: Era um futebol duro, forte fisicamente, pouca técnica, muito contacto e por causa destas transições verão-inverno, joga-se muito em campos fechados, aquecidos e sintéticos. Hoje qualquer um joga em sintéticos, de certeza que quando jogas uma peladinha aí em Portugal com amigos é num campo sintético, mas naquela época de 1997… Aqui no Brasil não existiam sintéticos, nunca tinha pisado um. Ou era pelado ou era relvado… ou estrada! Então quando cheguei nos sintéticos a bola travava imenso, era muito difícil. Mas eu era novo, 17 anos e correu bem. Destaquei-me logo e eles ficaram comigo.

    BnR: Foi por causa desses obstáculos que acabaste por ser emprestado?

    GM: Não. O que aconteceu é que eu era um jovem de 17 anos numa equipa profissional, que lutava todos os anos para ser campeã no campeonato finlandês e não tinha muito espaço para jogar. A ideia foi emprestar-me a uma equipa de segunda para ganhar experiência e ritmo, só que eu fui para esse clube – que era o Atlantis – e era horrível a estrutura deles: tinha de levar a roupa para lavar em casa, os campos eram maus, eles eram muito ruins a jogar à bola. Passado duas semanas voltei, chamei o Luiz Antônio, meu colega que era mais experiente e traduzia, e disse-lhe «olha, quero falar com o treinador. Fazes a tradução?» ele respondeu: «Vamos lá». Cheguei ao pé do treinador, o Antti Muurinen, que ficou muito conceituado depois daquele trabalho e veio a ser selecionador finlandês, e disse «professor, qual foi a sua intenção de me emprestar ao Atlantis?». Ele falou: «A minha intenção é que você cresça». E eu disse-lhe «então deixe-me treinar com vocês porque ali estou a desaprender a jogar futebol» [risos].

    BnR: E quando voltas para o Helsínquia, estreias-te na Liga dos Campeões com 18 anos.

    GM: O que aconteceu, João, é que eu voltei e era o mais jovem do clube juntamente com o Mikael Forssell, que deves conhecer porque passou pelo Chelsea, Wolfsburgo, fez uma bonita carreira e foi um dos jogadores finlandeses com maior destaque da história. Como éramos os mais jovens, acabava o treino e eu e o Forssell pedíamos ao treinador para ficar a treinar mais e todos os dias ficávamos mais uma hora a treinar, passávamos a bola, um cruzava e o outro rematava, fazer remates de longe no campo todo e divertíamo-nos. E o Antti Muurinen ficava a ver-nos das escadas, mas nunca dizia nada, até que chegou o dia em que qualificámo-nos para a Liga dos Campeões e ele tinha de fazer a lista de 25 jogadores – o nosso clube tinha 30 profissionais e mais nós os dois jovens – e ele reuniu toda a gente e disse: «Pessoal, foi difícil fazer esta lista, mas eu não posso deixar o Gustavo e o Mikael fora da lista. O que eles fazem é um exemplo para todos. Eles querem crescer e eu vou ajudá-los a crescer». Acabámos por ser os mais novos da Liga dos Campeões, num ano em que calhou-nos o Benfica, PSV Eindhoven e Kaiserslautern.

    BnR: Era mesmo isso que te ia perguntar. Três meses antes de vires para Portugal, ficas no banco no estádio da Luz frente ao Benfica. Que te lembras desse jogo?

    GM: Exatamente. Lembro-me que ficou 3-3 ou 2-2, mas lá na Finlândia tínhamos ganho. Era o antigo estádio da Luz e a equipa era forte, com João Pinto, Calado, Preud’Homme. Fizemos um excelente jogo e empatámos, o que para a nossa equipa, na única vez que uma equipa finlandesa chega à Champions, era um feito histórico. E para mim, menino, estar ali presente – ainda por cima com destaque na imprensa porque eu e o Mikael éramos os mais jovens – mesmo sem jogar era uma festa. Mesmo que levássemos cinco estava tudo bem mas vamos lá e empatámos… Para nós foi gozar o momento.

    BnR: Acreditavas na altura que podias chegar a um clube como o Benfica?

    GM: Eu vou ser sincero… acreditava. Com os meus amigos, já dizia «eu vou jogar num grande» e eles riam-se de mim. Uma vez fui ver um jogo do FC Porto em Madrid. Demorei três horas de carro para ir de Chaves a Madrid. Fomos ver o jogo da Liga dos Campeões e disse para eles «eu ainda vou jogar aqui um dia» e eles riam-se de mim: «estás maluco? Tu jogas no Chaves, na Segunda Liga de Portugal. Jogar aqui no Bernabéu?». Depois joguei lá e até marquei um golo. Eu sempre tive o foco de jogar num grande.

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    João Reis Alves
    João Reis Alveshttp://www.bolanarede.pt
    Flaviense de gema e apaixonado pelo Desportivo de Chaves - porque tem de se apoiar o clube da terra - o João é licenciado em Comunicação e Jornalismo na Universidade Lusófona e procura entrar na imprensa desportiva nacional para fazer o que todos deviam fazer: jornalismo sério, sem rodeios nem complôs, para os adeptos do futebol desfrutarem do melhor do desporto-rei.                                                                                                                                                 O João escreve ao abrigo do novo Acordo Ortográfico.