Desde a temporada transata que notei uma certa insistência por parte da Liga para que o SC Braga realizasse os seus jogos de noite e muitas das vezes a uma sexta ou segunda-feira. Para quem gosta de ir ao estádio (e acredito que os adeptos de futebol preferem ver um jogo num estádio do que pela televisão), sair de casa a uma segunda feira de Inverno após um dia de trabalho para ver futebol às 21h parece-me tudo menos apropriado.
Após ver a tarja exibida pelos adeptos do SC Braga no jogo do passado domingo frente ao CD Tondela, decidi estudar o caso, que roça o fenómeno da incoerência e total confusão que vai no futebol português. Num organismo que nem uma calendarização de época sabe fazer, não é de espantar que existam, jornada após jornada, jogos a horas mirabolantes. Ora vamos lá, embarca numa viagem a que chamo de “Caos no futebol português, parte 31783719”.
Vejamos a calendarização de jogos do SC Braga desta temporada a contar para a Primeira Liga:
SC Braga – Moreirense | 11/08/2019 (Domingo) 21h |
Sporting CP – SC Braga | 18/08/2019 (Domingo) 21h |
Gil Vicente – SC Braga | 25/08/2019 (Domingo) 20h30 |
SC Braga – SL Benfica | 01/09/2019 (Domingo) 21h |
Vitória FC – SC Braga | 13/09/2019 (Sexta) 20h30 |
SC Braga – CS Marítimo | 23/09/2019 (Segunda) 19h |
Portimonense SC – SC Braga | 29/09/2019 (Domingo) 18h |
SC Braga – CD Santa Clara | 28/10/2019 (Segunda) 20h15 |
Boavista FC – SC Braga | 31/10/2019 (Quinta) 20h15 |
SC Braga – FC Famalicão | 03/11/2019 (Domingo) 20h15 |
Vitória SC – SC Braga | 10/11/2019 (Domingo) 20h |
SC Braga – Rio Ave FC | 02/12/2019 (Segunda) 18h |
CD Aves – SC Braga | 07/12/2019 (Sábado) 20h30 |
SC Braga – FC Paços de Ferreira | 15/12/2019 (Domingo) 20h |
Belenenses SAD – SC Braga | 04/01/2020 (Sábado) 18h |
SC Braga – CD Tondela | 12/01/2020 (Domingo) 20h |
“Horários indecentes”, cantam eles todos os jogos. Eles, adeptos de praticamente todos os clubes num cântico iniciado pela claque do SC Braga, mas que se espalhou para todo o lado porque é uma luta conjunta, uma luta por condições melhores para algo tão banal como ver futebol a uma hora decente. Se analisarmos a tabela acima apresentada, podemos constatar com facilidade que mais de 90% dos jogos do SC Braga a contar para a Primeira Liga são realizados a dias e, principalmente, horários muito pouco convidativos para “ir à bola”.
A tarja exibida pelos adeptos do SC Braga no último domingo frente ao CD Tondela faz todo o sentido mas, infelizmente, a Liga já não é virgem neste tipo de situações, algo que tem vindo a motivar toda uma série de discórdia e de reclamações por parte de vários clubes. A resposta do Presidente da Liga, Pedro Proença, através da sua Diretora-Geral, Sónia Carneiro, foi simples: Na temporada 19/20 acabaram os jogos à Segunda Feira (a não ser por necessidade de quem joga na Liga Europa) e teremos jogos às 12h45.
Fui educado com a seguinte premissa: “Quando prometes alguma coisa, tens de a cumprir”. Estamos em janeiro e ainda não vislumbramos nenhum jogo do campeonato maior do futebol português no horário das 12h45. Porquê?
Relativamente à medida de terminarem os jogos à segunda-feira excetuando as equipas que joguem para a Liga Europa à quinta-feira, há uma série de incoerências que podemos também retirar. Aqui ficam os jogos que tivemos até à data a uma segunda-feira sem as equipas que compitam nas competições europeias (Liga dos Campeões incluída):
- Vitória FC – CD Tondela
- CD Tondela – Portimonense SC
- Belenenses SAD – FC Paços de Ferreira
- Portimonense SC- CD Santa Clara
- Vitória FC – Boavista FC
- Rio Ave FC – Gil Vicente FC
Parecem-me jogos a mais para não cumprir com uma promessa tão simples de realizar. O facto de sabermos que a cadeia televisiva que detém os direitos de transmissão de todos os jogos do campeonato (à exceção dos jogos em casa do SL Benfica), possui cinco canais para transmitir jogos, facilita imenso, na minha ótica, a transmissão de todos os jogos em dias e horários… normais!
Quando queremos criticar o que de mal se passa no futebol português temos muito a tendência de nos virarmos para outros países, exultando o que de bom se faz lá. Olhemos então para o maior campeonato do mundo, o campeonato inglês. Haver um jogo a uma sexta-feira ou segunda-feira é quase uma raridade. E não venham com a desculpa das competições europeias e dos tempos de descanso! Em Inglaterra, uma equipa joga à quinta e ao domingo (ou até ao sábado) sem problema nenhum.
Todos os jogos disputam-se ao fim-de-semana, com horários extremamente apelativos e a prova disso é a quantidade de público que vemos nos estádios ingleses, seja em que divisão for. Será que nenhum dirigente português não tem vergonha por ver uma terceira ou quarta divisão inglesa ter uma taxa de ocupação nos respetivos estádios tremendamente superior à Primeira Liga portuguesa? Não é preocupante?
O futebol que aprendi a amar e o futebol que os jogadores gostam de jogar é em estádios cheios. Como é possível um adepto minhoto dirigir-se ao Algarve (e vice-versa, obviamente) para um jogo a uma segunda feira às 21h? Isto ultrapassa qualquer lei do bom senso. É uma questão de respeito pelo adepto em Portugal, é uma questão de cultura desportiva, uma questão…de futebol. Do futebol verdadeiro, não esse de plástico que nos obrigam a consumir, com estádios completamente despidos de público em que até adormecemos pela hora tardia, pelo ambiente (ou falta dele) que rodeia o jogo. Mas o consumo está feito e o lucro já chegou à televisão e à Liga. Quem manda ri-se e quem consome o seu produto lamenta-se porque não pode fazer nada.
Que mais clubes sigam o exemplo do SC Braga, que nunca se calou perante estas injustiças, e exijam algo diferente. Porque não há Liga sem clubes e não há futebol sem adeptos. “Basta”, dizem eles. Para se operar uma revolução não é necessária a violência. Usar o argumento e as palavras certas pode fazer milagres. Basta querer, basta usar os meios próprios, basta também dar voz a quem dá o maior lucro do mundo a todos aqueles que vivem do futebol: os adeptos. Deixem os adeptos falar. Basta!
“Querem matar o futebol…”
Foto de Capa: SC Braga
Artigo revisto por Inês Vieira Brandão