Fonseca e a cidade das Maravilhas

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    As primeiras dez jornadas da Liga Portuguesa 2014/15 trouxeram, à boa maneira lusitana, sucessos inesperados e desilusões surpreendentes. Até ao momento, e “apenas” com dez jornadas disputadas, os maiores destaques vão para o super Vitória de Guimarães, que, com uma equipa de “tostões”, consegue um fantástico segundo lugar, e ainda para o Belenenses, que, por entre as críticas ao plantel feitas por Lito Vidigal no início da temporada, já vai com 20 pontos conquistados e sobretudo com a zona de despromoção bem longe na tabela. Quanto a desilusões, destaco o Sporting, que apesar do bom futebol, está a oito pontos da liderança; o Nacional, uma equipa sempre a lutar pela Europa e cujo plantel parece estar a léguas daquilo que já se viu pela Choupana, e por fim a Académica, que época após época anseia por mundos e fundos e depois acaba sempre com a corda no pescoço.

    Ainda assim, apesar dos destaques a Vitória e Belenenses, opto por escrever, numa semana marcada pelas seleções, do fenómeno Paulo Fonseca e do “seu” Paços de Ferreira. A época 2012/13 trouxe possivelmente uma das maiores surpresas desde que existe a Primeira Liga de Futebol. Com um dos orçamentos mais baixos do campeonato, a equipa da Mata Real conseguiu um “histórico” terceiro lugar, vencendo em casa e fora os jogos contra Sp. Braga e Sporting e sobretudo conseguindo a notável marca do apuramento para o Play-Off da Liga dos Campeões. Assentando na qualidade do “trio dourado” composto por André Leão, Vítor e Josué, a equipa pacense alcançou 54 pontos em 30 jornadas, terminando a temporada com apenas quatro derrotas, frente ao campeão FC Porto e vice-campeão nacional SL Benfica.

    Com uma época tão surpreendente e notável, não foi de estranhar a autêntica debandada do plantel do Paços, a que se juntou a não menos importante saída do seu treinador, Paulo Fonseca. Depois de um apuramento histórico para a Liga dos Campeões, o treinador lisboeta teve, na saída do bicampeão nacional Vítor Pereira, a oportunidade de uma vida: treinar um clube grande em Portugal, o FC Porto. Depois do anúncio de Pinto da Costa, muitas foram as questões que se levantaram, sobretudo sobre a dúvida quanto à real valia de um treinador como Paulo Fonseca quando confrontado com um nível competitivo bem superior ao que encontrara na capital do Móvel. Contudo, o “fantasma” de André Villas Boas ainda estava bem na memória dos adeptos portistas, o que fazia da aposta do presidente portista uma escolha que tinha tanto de arriscada como de esperada junto dos adeptos.

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    Neste regresso à Mata Real, Paulo Fonseca tem sido feliz.
    Fonte: Facebook do FC Paços de Ferreira

    Com as saídas de James Rodriguez e João Moutinho, não se pode dizer que Fonseca tenha tido a melhor das surpresas quando recebeu o plantel portista. Sem duas das peças mais importantes dos últimos anos no clube, o jovem treinador ficou com um plantel órfão de “referências” e sobretudo órfão de qualidade individual. Basta olhar para o plantel do ano passado e perceber (e talvez questionar) a presença de jogadores como Abdoulaye, Defour, Josué, Licá e até Ghilas, para concluir que a tarefa de alcançar o tetra-campeonato não era mais do que uma miragem. Aliás, a única surpresa na última temporada foi o início da época portista, em que a conquista da Supertaça e a liderança no campeonato pareciam milagres perante um plantel insuficiente e que não tinha sequer comparação com o do rival Benfica, sustentado na qualidade de Markovic, Gaitán, Salvio, Rodrigo, Lima ou Cardozo.

    Com apenas 61 pontos conquistados em 90 possíveis, com seis derrotas em 15 jogos fora ou a perda da invencibilidade caseira em jogos do campeonato, mais de cinco épocas depois, a época portista foi um autêntico marasmo, o que levou à saída de Fonseca no início de Março. Depois da dececionante campanha na Liga dos Campeões, com apenas cinco pontos conquistados, e de um campeonato a roçar o medíocre, Paulo Fonseca não conseguiu terminar a época e, após tanta contestação da massa associativa, acabou mesmo por abandonar o barco.

    Obviamente que depois de uma passagem tão má num clube de maior dimensão, rapidamente o panorama futebolístico nacional questionou a capacidade de Paulo Fonseca regressar a uma equipa grande e sobretudo a capacidade de voltar a ser o treinador que havia sido em Paços de Ferreira. Depois de uma época tão traumatizante, a grande questão passava por perceber qual seria o próximo destino de Fonseca, e naturalmente que o estrangeiro seria a escolha mais óbvia e compreensível, pela má recordação que este trazia do FC Porto. Por isso, foi uma autêntica surpresa a decisão do Paços de Ferreira, em junho deste ano, em dar uma segunda oportunidade a Paulo Fonseca e, em traços gerais, em lhe dar uma segunda oportunidade de se reconciliar com o destino e com a sua própria carreira. As dez primeiras jornadas deste campeonato mostraram um Paços tão ou mais atrevido e irreverente do que há duas temporadas: com um futebol atraente e sólido taticamente, sustentado num duplo pivô com Seri e Sérgio Oliveira e na qualidade de Hurtado ou Urreta, o treinador lisboeta voltou ao bom futebol e aos bons resultados que o haviam colocado na ribalta do futebol português.

    Com 18 pontos e um sexto lugar no campeonato, o Paços de Fonseca já entrou na história do clube e promete voltar a entrar na história da Liga Portuguesa. Ciente das suas limitações e das suas fragilidades, olhar para este Paços de Ferreira funciona quase como um apelo à memória, que nos remete para aquela época de 2012-2013 que tantas alegrias trouxe àquela cidade. Mudaram-se os tempos, as vontades e os jogadores, mas neste Paços de Ferreira parece que apenas um traço se revela imprescindível: o de Paulo Fonseca. Nesta história encantada, já poucos se lembram dos assobios no Dragão, dos lenços brancos a cada derrota e daquela célebre chegada portista ao estádio depois da derrota em Coimbra. É que no fim de contas, com Fonseca na Mata Real, regressa aquele treinador que parecia ter uma carreira brilhante à sua frente. Há clubes e treinadores destinados a ficarem eternizados. Paulo Fonseca e o Paços de Ferreira são uma dessas histórias.

    Foto de capa: Facebook do FC Paços de Ferreira

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