Quando estiver sem sono, irei acompanhar reality shows | Sporting CP

    Na madrugada de hoje, enfurecido pela ausência do repouso momentâneo ou pelas exibições do Sporting, liguei a televisão. Perdi completamente a cabeça, admito. Desconheço o conteúdo das matérias opacas que encurralavam a parca massa cinzenta e que originaram um trânsito infernal na conceção de ações deste calibre. Aconteceu. É factual. Não há forma de apagar esta bodega e acreditem que não é por falta de pesquisa na internet até horas bem tardias.

    Se considerar estúpido aquilo que descrevi, ria-se de si próprio. As palavras que se seguem podem causar cegueira súbita. É um risco que o leitor corre. Aconselho a paragem na leitura. Aviso-o porque sou seu amigo, apesar de provavelmente não o conhecer. Agora é tarde. Cá vai. Ao invés de devolver ao ecrã um programa passado numa ilha (quase) deserta e repleto de biquínis, fiquei soterrado nas televendas.

    Comprei uma série de coisas, entre as quais um caderno. A aparição deste material nas televendas é rara, então aproveitei. Estava ao preço de um bilhete para ir à bola. É da Moleskine.

    Extraí dele alguns excertos com a finalidade de o público compreender os desabafos de um sofredor. Mandei entregar um exemplar em Alvalade.

     

    Capítulo I

    Primórdios da teoria do espírito de rua

    Sempre que a vontade vos quiser, basta emitir um sinal. Soprado pelo parco vento de Marseille, ou num raio de um astro cimeiro.

    Não é a Lena D’Água, não. É um adepto do Sporting CP. Hoje perdemos 4-1 contra o Olympique de Marseille de forma vergonhosa. A falta de empenho é indesculpável. Estar em primeiro no grupo não dá estatuto de x ou y. Transpirem a camisola. Se demonstrarem devoção, ninguém vos cobrará coisa nenhuma.

    Capítulo IV

    Introdução à teoria do espírito de rua

    O que se viu hoje, novamente com o Olympique de Marseille, é surreal. Antes de canalizarem o pensamento para qualquer triunfo, conversem. Entendam-se. Alguma coisa há de surgir para distribuir felicidade por milhões de pessoas. Importa que se divirtam com a bola nos pés. Os adeptos precisam de sentir essa farra.

    Tenho uma proposta: não se fechem a jogar playstation em casa. Depois dos jogos, saiam à rua em rebanho. TODOS, se possível. Coloquem umas pedras no meio de uma estrada qualquer, façam duas balizas e joguem futebol puro, sem tricas, corantes e conservantes.

    Capítulo X

    Exemplo prático da teoria do espírito de rua

    Os meninos do Varzim SC demonstraram aquilo que a simplicidade pode voltar a trazer ao futebol. Não me venham com a ferrolhada. Quantos de nós, quando jogávamos contra os mais velhos lá da rua, não defendíamos como podíamos? Com o que tínhamos e com o que não tínhamos?

    Sporting
    Fonte: Carlos Silva / Bola na Rede

    Cortes de carrinho no alcatrão ou no paralelo. Calças rasgadas, joelhos e cotovelos esfolados, pôr a cabeça onde só se coloca o pé, ter a estratégia de marcar o jogador adversário – melhor teoricamente – com outro amigo nosso. Sem isto, na rua ou no relvado, não há equipa que resista.

    Realizem um exame à vossa consciência. E acreditem que era preferível analisar a profundidade das mazelas…

    Capítulo XVI

    O “perigo” de andar na rua – breve contextualização

    Ganapos de Arouca passaram-vos a perna com uma serenidade que nos assusta. Tudo ficou Basso, com cedilha. Num canto, onde o Sporting era praticamente exímio a defender, sofremos. O central saltou SOZINHO e resolveu.

    Sejam miúdos. Deixem-se de m*****. Não querem esfalfar-se a correr de um lado para o outro, tudo bem. Nem todos os miúdos gostam de jogar à bola. Mas dirijam esforços para outras atividades: construam casas em árvores, cacem pássaros com fisgas e organizem um jantar para convívio, joguem à macaca ou à apanhada, ao berlinde ou ao peão. Façam o que vos der na gana.

    Mas oiçam o que o B Fachada diz ao Tó-Zé e interiorizem. Não sejam paus mandados, antes insanos e grosseiros para os que se vierem meter convosco. Neste momento, se for preciso andar à bulha, palpita-me que uns quantos ficam para trás.

    Capítulo XXIII

    Espírito de rua – o apocalipse

    Arthur Gomes ligou o Sporting CP à corrente e carregou o dispositivo leonino com 72% de esperança. Depois, o quadro elétrico fundiu, Alvalade ficou às escuras e o Eintracht Frankfurt veio cobrar a fatura inflacionada.

    Rúben Amorim Sporting
    Fonte: Carlos Silva / Bola na Rede

    Frederico Varandas é o protótipo dos pais das novas gerações – onde a minha se insere – que não reúnem capacidade para atingir a importância que as diretivas sobre o espírito de rua encerram. Para estes, é mais fácil e cómodo é atirá-los para as garras de uma tecnologia e da pobreza de espírito. Para o presidente do Sporting, é bem mais confortável esconder-se atrás das calças de Rúben Amorim do que empunhar a decência de vir a público assumir o falhanço da época desportiva 2022/2023.

    Ou muito me engano, ou esta época não vamos voltar a ser miúdos.

    FIM

    Comprova-se o efeito nocivo das televendas na saúde mental das pessoas. Comprova-se também o efeito prejudicial que o não acompanhamento de um reality show produz. Quanto à cegueira, quero juízos construtivos.

     

    - Advertisement -

    Subscreve!

    Artigos Populares

    Pep Guardiola não está arrependido de vender Cole Palmer ao Chelsea

    Pep Guardiola foi treinador de Cole Palmer nos últimos...

    Chelsea com regresso importante aos treinos

    O Chelsea contou esta sexta-feira com Christopher Nkunku no...

    Paulo Fonseca com dois pretendentes na Europa

    Paulo Fonseca encontra-se em final de contrato com o...
    Romão Rodrigues
    Romão Rodrigueshttp://www.bolanarede.pt
    Em primeira mão, a informação que considera útil: cruza pensamentos, cabeceia análises sobre futebol e tenta marcar opiniões sobre o universo que o rege. Depois, o que considera acessório: Romão Rodrigues, estudante universitário e apaixonado pelas Letras.                                                                                                                                                 O Romão escreve ao abrigo do novo Acordo Ortográfico.